60 SUSPENSÃO DA EFICÁCIA DA SENTENÇA ART. 558, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC APELAÇÃO DE EFEITO SOMENTE DEVOLUTIVO. Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG); Juiz do Tribunal Regional Federal da 2ª Região; Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual (IBDP); Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universidade Iguaçu (UNIG); Membro do Instituto de Pesquisa e Estudos Jurídicos (IPEJ-RJ) 1. SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Eficácia da sentença de mérito. 3. Suspensão do cumprimento da decisão. 4. Princípio da unirrecorribilidade da decisão. 5. Fungibilidade do agravo de instrumento em simples petição. 6. Juízo de delibação necessário e princípio da proporcionalidade. 7. Conclusão. 1. Introdução A sistemática adotada pelos recorrentes, para suspender a eficácia da sentença, quando a apelação tenha sido recebida somente no efeito devolutivo, nem sempre tem sido adequada ao procedimento insculpido no art. 558, parágrafo único do Código de Processo Civil, utilizando-se, para esse fim, do agravo de instrumento. O agravo de instrumento é recurso cabível de decisão interlocutória, e não de sentença, ainda que esta consubstancie antecipação de tutela, pois contra sentença o recurso cabível é a apelação. Estas considerações objetivam enfocar tal questão, lançando um pouco de luz nessa matéria, que não tem merecido estudo aprofundado em sede doutrinária.
2. Eficácia da sentença 61 A eficácia da sentença depende do efeito em que é recebido o recurso, de forma que, admitido no duplo efeito (art. 520), fica ela suspensa até que venha a ser confirmada pelo tribunal de apelação, mas, admitido apenas no efeito devolutivo (art. 518), pode ser provisoriamente executada. É equivocado supor que os efeitos da apelação, à luz do Código de Processo Civil, decorram da lei porque, nos termos do art. 518 do CPC, o juiz pode recebê-la num efeito apenas ou em ambos os efeitos, pois, de outro modo, não teria sentido mandar que declare quais os efeitos em que o recebe, como determina esse preceito legal. Tanto assim é que, se a lei estabelece os dois efeitos e o juiz o recebe apenas num, ou a lei estabelece um e o juiz o recebe nos dois, prevalece, sempre, a decisão judicial sobre a determinação legal. O disposto no art. 520 do CPC não contém mais do que uma previsão legal, que se destina a suprir as decisões judiciais, pois, se o juiz disser simplesmente que recebe o recurso nos seus efeitos legais, ou, como se diz, nos seus regulares efeitos, estes serão os previstos no art. 520, primeira parte (duplo efeito), ou num dos incisos do mesmo artigo, segunda parte (somente devolutivo). Justo porque a eficácia da sentença pode ser imediata, dependendo dos efeitos em que o juiz recebe a apelação, estabelece a lei processual que o apelante possa requerer a sua suspensão, caso seja ela recebida apenas no efeito devolutivo, com o que neutraliza, temporariamente, a sua exeqüibilidade, mesmo sendo esta provisória. 3. Suspensão do cumprimento da decisão O art. 558, caput, do CPC concede ao relator poderes para suspender o cumprimento da decisão até o pronunciamento definitivo do tribunal, e, no parágrafo único, manda aplicar o disposto neste artigo às hipóteses do art. 520. 1 E mail: ipej@ipej-rj.com.br
62 Mas, assim dizendo, não concedeu agravo de instrumento à parte para impugnar sentença de mérito, ainda que contenha pedido de tutela antecipada, senão poderes ao relator para suspender os efeitos da sentença que tenha apenas o efeito devolutivo, o que pode ser feito por simples petição ou no próprio corpo da apelação; jamais em agravo de instrumento. Neste sentido, expus no meu NOVO AGRAVO, verbis: "Diferentemente do pedido de suspensão de decisão (agravável), que só pode ser formulado na petição do agravo, o pedido de suspensão da sentença (apelável) pode ser formulado ou na própria petição da apelação ou em petição separada, até o termo ad quem do prazo recursal, dependendo da urgência da medida. O pedido deve ser dirigido ao relator, se já tiver sido distribuída a apelação, ou ao presidente do tribunal, ou a quem dispuser dessa competência, enquanto não tiver havido distribuição, ficando preventa a competência (art. 10 do RI do TRF-2ª Região - antigo regimento). Também a única condição exigida para a suspensão é que do cumprimento da sentença possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, pelo que, tal ocorrendo, tem o apelante direito subjetivo à suspensão, não ficando esta ao arbítrio exclusivo do relator. Em outras palavras, essa providência significa dar a um recurso um efeito (suspensivo) que, de outro modo, não teria". (, NOVO AGRAVO, 2 ed., 3 tir. Belo Horizonte: Del Rey, 1966, p. 131). 4. Princípio da unirrecorribilidade da decisão Um dos princípios gerais dos recursos é o denominado princípio da unirrecorribilidade, segundo o qual contra cada decisão só tem cabimento um recurso, e, excepcionalmente, dois, quando a lei assim preveja, como acontece com os embargos infringentes e os recursos extraordinário e especial, ou com estes dois últimos recursos. Mesmo assim, o que se dá é a interposição simultânea de dois recursos, nunca o seu julgamento simultâneo. No caso do pedido de suspensão do cumprimento da decisão, não se outorga à parte um recurso, pois, do contrário, estar-se-ia concedendo dois recursos contra um mesmo ato jurisdicional, que é a sentença, permitindo a apelação da decisão de mérito, e, concomitantemente, agravo de instrumento, para dar efeito suspensivo a esse recurso.
63 5. Fungibilidade do agravo de instrumento em simples "petição" Muitas vezes, a parte interessada, antes mesmo de apelar da sentença de mérito, agrava de instrumento da decisão na parte em que o juiz acolheu a antecipação da tutela na própria sentença, para requerer, liminarmente, a suspensão da eficácia dessa decisão. Tal providência não revela má-fé processual, senão inadequação da técnica suspensiva da apelação ao novo sistema criado pela reforma processual, o que não impede seja a petição de agravo recebida como petição de suspensão dos efeitos da sentença, relativamente à antecipação de tutela concedida nela própria. Ao decidir sobre esse requerimento, pode o juiz fazê-lo inaudita altera parte, como acontece com a decisão liminar no recurso de agravo, embora não fique interditada a audição da parte contrária ao pedido, se entender que deva, antes, colher a sua manifestação. O princípio do contraditório, embora não se revele indispensável, em tais casos, pode revelar-se útil, dependendo da natureza da matéria discutida. 6. Juízo de delibação necessário e princípio da proporcionalidade Os pedidos de suspensão da eficácia da sentença apelada não devem ser deferidos em qualquer circunstância, mas apenas se presentes os requisitos da probabilidade (não a mera possibilidade), de poder resultar, do cumprimento da decisão, lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação. Ainda assim, não deve merecer deferimento quando, entre os dois interesses em jogo --, o do apelante em manter suspenso o gozo do direito, até que se julgue a apelação, e o do apelado em desfrutá-lo de imediato -- um deles revele supremacia sobre o outro, como acontece por exemplo com a sentença de procedência da ação em que se pede proventos da inatividade. Em tal circunstância, deve atuar o princípio da proporcionalidade, que recomenda prevaleça o último dos interesses porquanto, além de terem os proventos natureza alimentar, presumem-se devidos -- assim reconhecidos em primeiro grau -- até que, nas vias recursais, se demonstre o contrário.
7. Conclusão 64 Quando o parágrafo único do art. 558 do CPC determina se aplique às hipóteses do art. 520 -- apenas no que tange aos incisos relacionados na sua segunda parte, embora não o diga expressamente -- quis se referir apenas "às hipóteses" de prisão civil, adjudicação, etc., e, dentre elas, "outros casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação", não elegendo o agravo como modo de impugnação, embora o caput seja direcionado a essa modalidade recursal. Destarte, cabe ao apelante requerer a suspensão do cumprimento da decisão, ou na própria apelação --, o que pode ser desaconselhável, em vista do procedimento a que esta se sujeita no juízo de origem, antes de ascender ao tribunal --, ou, diretamente, no tribunal, em petição dirigida ao presidente ou vice-presidente, conforme dispuser o respectivo Regimento Interno, que poderá decidir a respeito, se a medida for urgente, ou distribuí-la a um relator, que apreciará o pedido, ficando com a sua competência preventa para a apelação. O pedido de suspensão é provisório e fica condicionado ao processamento da apelação, de sorte que, se esta não ascender ao tribunal, por motivo de deserção ou qualquer outro motivo que impeça o seu conhecimento (falta de pressupostos recursais, por exemplo), perde a decisão suspensiva toda sua consistência legal, pela perda do seu objeto. Informações bibliográficas: CARREIRA ALVIM, J. E. Suspensão da eficácia da sentença art. 558, parágrafo único, do CPC apelação de efeito somente devolutivo. Panóptica, Vitória, ano 1, n. 4, dez. 2006, p. 60-64. Disponível em: <http://www.panoptica.org>.