A ALIMENTAÇÃO DO LINGUADO Etropus crossotus (PLEURONECTIFORMES, PARALICHTHYIDAE) EM UM BANCO ARENO-LODOSO NA ILHA DO MEL, PARANÁ, BRASIL.

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Transcrição:

A ALIMENTAÇÃO DO LINGUADO Etropus crossotus (PLEURONECTIFORMES, PARALICHTHYIDAE) EM UM BANCO ARENO-LODOSO NA ILHA DO MEL, PARANÁ, BRASIL. The feeding of the flatfish Etropus crossotus (Pleuronectiformes, Paralichthyidae) on a sandy-mud tidal flat in the Ilha do Mel, Parana State, Brazil. Hugo Bornatowski 1 Vinícius Abilhoa 2 Rosemary Aparecida Brogim 3 Resumo A alimentação do linguado Etropus crossotus em um banco areno-lodoso na Ilha do Mel foi estudada. Foram analisados 46 estômagos provenientes de coletas realizadas com redes de arrasto, no período de julho de 1991 e junho de 1992. A composição da dieta foi determinada aplicando-se o método de freqüência de ocorrência. Foram identificados nove itens alimentares, sendo que as espécies de crustáceos das ordens Amphipoda e Decapoda apresentaram maior freqüência. A presença de exemplares de E.crossotus durante todas as estações do ano na região estudada permite inferir que esta espécie é residente no estuário e provavelmente utiliza o banco areno-lodoso como área de alimentação e desenvolvimento. Palavras-chave: Alimentação; Estuário; Linguado; Etropus. Abstract The feeding of the flounder Etropus crossotus in a sandy-mud tidal flat in the Mel Island was studied. A trawl net was used for the surveys, during July (1991) and June (1992). Forty-six stomachs were analyzed and the dietary composition was determined using the method of frequency of occurrence. Nine food items were identified and the diet was basically composed by Crustaceans Amphipoda and Decapoda. The existence of E.crossotus during all seasons at the local of the study, allow the conclusion that the species lives in the estuary studied and utilizes the sandy-mud tidal flat as feeding area. Keywords: Feeding; Estuary; Flounder; Etropus. 1 FACIBEM - Curso de Biologia. e-mail: hugo_bio@yahoo.com.br 2 GPIc Grupo de Pesquisas em Ictiofauna. Museu de História Natural Capão da Imbuia, Prefeitura de Curitiba. 3 Laboratório de Ecologia Bêntica. Museu de História Natural Capão da Imbuia, Prefeitura de Curitiba. 11

Hugo Bornatowski; Vinícius Abilhoa; Rosemary Aparecida Brogim Introdução O linguado Etropus crossotus é um peixe de pequeno porte (< 20 cm), que apresenta uma ampla distribuição pela costa brasileira, ocorrendo com freqüência em ambientes rasos de baías e estuários (FIGUEIREDO; MENEZES, 2000). Apesar disso, poucas informações biológicas sobre a espécie são conhecidas, mas em função de seu comportamento alimentar (Yazdani, 1969) e do ambiente de ocorrência, parecem alimentar-se basicamente de poliquetas e pequenos crustáceos, como registrado por Soares et al. (1993) e Lunardon-Branco e Branco (1995). Neste artigo, são apresentadas informações sobre a alimentação dessa espécie em um banco areno-lodoso no litoral do Paraná. Este trabalho dá continuidade ao levantamento de informações sobre a utilização desse ambiente bastante comum nos estuários da região sudeste-sul do Brasil, verificando como e quais recursos alimentares são utilizados pela comunidade de peixes. Área de estudo A Ilha do Mel está localizada na entrada do estuário da Baía de Paranaguá. Ao norte, separa-se da Baía das Laranjeiras e da Ilha das Peças pelo Canal Norte ou Sudeste. Ao sul, separa-se do continente pelo canal Sul ou da Galheta, que é dragado constantemente para acesso ao porto de Paranaguá. A parte oriental da Ilha é banhada pelo Oceano Atlântico (FIGUEIREDO, 1954). Nessa região, o estuário é considerado uma extensão do ambiente nerítico adjacente e abrange toda a entrada do complexo até o início da região estuarina na altura de Paranaguá (BIGARELLA, 1978; LANA, 1986; BRANDINI et al., 1988). As amostras foram obtidas nas coordenadas 25º30 30-25º32 30 S / 48º13 15-48º15 30 W, entre as regiões denominadas de Ponta do Morro do Meio e Pontinha na Ilha do Mel, localizados em um banco areno-lodoso com aproximadamente 800m de extensão. O banco é caracterizado como um ambiente não vegetado de baixa energia, com sedimentos areno-lodosos, e fica totalmente exposto durante as marés de sizígia. Encontra-se recoberto por detritos de Anomalocardia brasiliana e por manchas de macroalga Acanthophora spicifera (COUTO, 1996). Material e métodos Utilizando-se uma rede de arrasto com portas de 20 metros de boca por 35 metros de comprimento, com malha de 1cm entre nós consecutivos, foram realizadas 12 coletas diurnas e 12 noturnas nos períodos de amplitude máxima de marés de sizígia (lua cheia), entre julho de 1991 e junho de 1992. As amostras foram obtidas por meio de dois arrastos consecutivos de cinco minutos em um banco areno-lodoso na Ilha do Mel (PR). Após a coleta, os exemplares foram identificados, mensurados para a obtenção do comprimento total e padrão, pesados (com auxílio de balança de precisão de centésimo de grama) e dissecados para a observação do sexo e estádio de maturação gonadal segundo escala proposta por Vazzoler (1996). O trato digestório foi removido e fixado em solução de formol 4%, sendo posteriormente conservado em álcool 70%. No Laboratório de Ictiologia do Museu de História Natural Capão da Imbuia, os tratos digestórios foram secionados com tesoura cirúrgica e os conteúdos estomacais foram analisados sob microscópio estereoscópico, sendo que a identificação dos itens foi realizada com auxílio de bibliografia especializada e por consulta a especialistas. Para a análise da alimentação, foi utilizado o método de freqüência de ocorrência (Holden; Raitt, 1975), que corresponde à freqüência percentual do número de estômagos onde ocorre determinado item alimentar em relação ao número de estômagos com alimento. A tabulação dos dados e os testes estatísticos (análise de variância) foram realizados com auxílio do software Statistica 5.1, da StatSoft Inc. (1997). Os valores de comprimento total e peso foram expressos por médias e desvios-padrão das estimativas (+/-). Resultados e discussão As médias de tamanho (F=939,58; p<0,05) e peso (F=107,02; p<0,05) apresentaram variações significativas durante as estações do ano, mas a captura predominante foi de indivíduos imaturos durante todo período amostral (Tabela 1). Muito embora o método de análise de gônadas utilizado não seja preciso e os componentes de uma popu- 12

lação não sejam igualmente vulneráveis a um determinado método de captura, Gomes et al. (1997), os resultados encontrados podem estar refletindo a utilização do ambiente estuarino como área de reprodução e desenvolvimento, como já evidenciado para outras espécies (REIS, 1986; BARBIERI et al., 1992; CHAVES, 1995; VENDEL; CHAVES, 1998; BRAGA; ABILHOA, 2003). Tabela 1. Estrutura populacional de exemplares de Etropus crossotus capturados em um banco areno-lodoso na Ilha do Mel (1991/92). Médias e desvios-padrão (+/-) de comprimento total (cm) e peso (g); estádio de maturação gonadal mais freqüente. Estação do ano Comprimento total (cm) Peso (g) Estádio de maturação Inverno 12,5 +/- 1,65 21,19 +/- 9,72 imaturo / maduro Primavera 11,77 +/- 3,31 26,44 +/- 16,98 imaturo/ em maturação Verão 6,99 +/- 1,28 2,51 +/- 1,69 imaturo Outono 9,12 +/- 1,06 9,16 +/- 3,37 imaturo/ em maturação O espectro alimentar diversificado que foi registrado (9 itens) também permite inferência quanto à utilização do banco areno-lodoso como área de alimentação, como constatado para outras espécies de hábitos bentônicos como Genidens genidens (Rabitto; Abilhoa, 1999), Synodus foetens (Kagiwara; Abilhoa, 2000) e Citharichthys spilopterus (BRAGA; ABILHOA, 2003). Durante o período de estudo, a dieta foi composta basicamente por crustáceos e poliquetas (Tabela 2). As ordens Decapoda e Amphipoda (Crustacea) mostraram maior predominância em relação aos demais itens, sendo que os itens mais representativos foram Gammaridae (56,2%), larvas (25%) e restos de decapoda (25%) (Tabela 3). Esse resultado é diferente do observado para esta espécie por Soares e col. (1993) e Lunardon- Branco e Branco (1995), e pode estar relacionado à diferente disponibilidade dos itens nos locais estudados. Diversos autores mencionam que a preferência por determinados alimentos está realmente relacionada com a disponibilidade destes no ambiente (Wootton, 1990; Moyle; Cech, 1982; Weatherley, 1972), muito embora também existam variações em função de aspectos morfológicos (Knoppel, 1970) e comportamentais (ZAVALA-CAMIN, 1996). Tabela 2. Itens alimentares registrados no conteúdo estomacal de Etropus crossotus coletados em um banco areno-lodoso na Ilha do Mel, Paraná (1991/92). - Crustacea Decapoda Larvas Brachyura restos Amphipoda Caprellidae Gamaridae zooplanctônicos Copepoda Ostracoda - Annelidae Polychaeta 13

Hugo Bornatowski; Vinícius Abilhoa; Rosemary Aparecida Brogim Tabela 3. Freqüência de ocorrência dos itens alimentares registrados no conteúdo estomacal de Etropus crossotus coletados em um banco areno-lodoso na Ilha do Mel, Paraná (1991/92). ITEM ALIMENTAR FREQÜÊNCIA DE OCORRÊNCIA (%) Crustacea Decapoda larvas 25,0 Crustacea Decapoda Brachyura 12,5 Crustacea Decapoda restos 25,0 Crustacea Amphipoda Caprellidae 12,5 Crustacea Amphipoda Gamaridae 56,2 Crustacea Amphipoda zooplanctônico 18,7 Crustacea Copedoda 6,2 Crustacea Ostracoda 6,2 Annelidae Polychaeta 6,2 Considerações Finais Os resultados obtidos para Etropus crossotus indicam que sua dieta está baseada em invertebrados, com preferência pelo consumo de crustáceos decápodes e poliquetas. Variações nas contribuições dos itens em função do tamanho dos exemplares e do horário de captura (diurno/noturno) não foram testadas, o que poderia indicar variações na alimentação de acordo com o tamanho dos indivíduos e com o período amostral. Muito embora essa plasticidade alimentar seja comum em populações de peixes estuarinos, estas análises não foram realizadas em função da quantidade de exemplares capturados e porque houve predominância de indivíduos imaturos nas amostras, o que provavelmente não permitiria a constatação de variações nas percentagens de cada categoria considerada. Referências BARBIERI, L. R.; SANTOS, R. P.; ANDREATA, J. V. Reproductive biology of the marine catfish, Genidens genidens (Siluriformes, Ariidae), in the Jacarepaguá Lagoon system, Rio de Janeiro, Brazil. Environmental Biology of Fishes, v. 35, p.23-35, 1992. BIGARELLA, J. J. A Serra do Mar e a porção oriental do Estado do Paraná, Curitiba: SEPLAN/ ADEA, 1978. BRAGA, M. R.; ABILHOA, V. A alimentação do linguado Citharichthys spilopterus (Gunther, 1862) (Pleuronectiformes, Paralichthyidae) em um banco areno-lodoso na Ilha do Mel, Paraná, Brasil. Estudos de Biologia, Curitiba, v.25, n.51, p.39-47, 2003. BRANDINI, F.P.; THAMM, C.A.; VENTURA, I. Ecological studies in the bay of Paranguá. III; Seasonal and spatial variation of nutrients and chlorophyll. Nerítica, Pontal do Sul, v.3, n. 1, p.1-30, 1988. CHAVES, P. T. C. Atividade reprodutiva de Bairdiella ronchus (Cuvier) (Pisces, Sciaenidae) na Baía de Guaratuba, Paraná, Brazil. Revista Brasileira de Zoologia, Curitiba, v. 32, n. 4, p.759-766, 1995. COUTO, E. C. G. Estrutura espaço-temporal da comunidade macrobêntica da planície intertidal do Saco do Limoeiro Ilha do Mel (Paraná, Brasil). Curitiba, 1996. 186 fl. Tese (Doutorado) Universidade Federal do Paraná. 14

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