Deformação, metamorfismo e magmatismo na região do Porto

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Transcrição:

Universidade do Porto - Faculdade de Ciências Departamento de Geologia 6º Encontro de Campo GGET 2008 Porto, 26 Julho 2008 Roteiro Geológico Deformação, metamorfismo e magmatismo na região do Porto Editores: Helena Sant Ovaia, Armanda Dória, Maria dos Anjos Ribeiro 1

APOIOS Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto Centro de Geologia da Universidade do Porto Reitoria da Universidade do Porto FCT Fundação para a Ciência e Tecnologia. Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior 2

ORGANIZADORES ARMANDA DÓRIA FERNANDO NORONHA HELENA SANT OVAIA MANUELA MARQUES MARIA DOS ANJOS RIBEIRO MÓNICA SOUSA 3

4 GGET 2008-6º Encontro de campo. 26 dejulho 2008

INDICE Preâmbulo 1 Relações deformação, metamorfismo e magmatismo no bordo oriental do maciço do Porto - Gondomar-Fanzeres Maria dos Anjos Ribeiro, Helena Sant Ovaia, Armanda Dória 3 O Complexo Metamórfico da Foz do Douro Fernando Noronha, Manuela Marques, Mónica Sousa 11 Os granitos tardi a pós-tectónicos de Lavadores e o seu encaixante Helena Sant Ovaia, Maria dos Anjos Ribeiro, Helena Cristina Martins 19 Deformação, migmatização e metassomatismo no bordo NW do maciço do Porto Praia de Angeiras Maria dos Anjos Ribeiro, Helena sant Ovaia, Armanda Dória 27 5

6 GGET 2008-6º Encontro de campo. 26 dejulho 2008

PREÂMBULO O 6º Encontro de Campo, no âmbito do GGET 2008 tendo por tema Deformação, metamorfismo e magmatismo na região do Porto, é uma oportunidade para fomentar a discussão e troca de experiências sobre aspectos da geologia regional, principalmente no que respeita à evolução geodinâmica do sector norte do território português e mais concretamente da região urbana do Grande Porto. Pretende-se que seja um encontro de campo informal, de efectiva partilha da experiência e do conhecimento de todos os participantes. Esta partilha será fomentada pelos elementos do DG - FCUP envolvidos em trabalhos de revisão cartográfica, de investigação e/ou de orientação de trabalhos de ensino pós-graduado, já terminados ou em curso na região. A região urbana do Grande Porto é um sector importante na caracterização geodinâmica do Orógeno Varisco, nomeadamente na caracterização da relação entre o magmatismo sinorogénico, a deformação e o metamorfismo. Localizando-se no bordo ocidental da Zona Centro Ibérica (ZCI), englobando ainda o contacto com a Zona de Ossa Morena (ZOM), trata-se de um sector axial da zonalidade geotectónica do Maciço Ibérico. A importância do contexto geotectónico, a boa exposição dos afloramentos, nomeadamente os afloramentos rochosos da orla costeira e a fácil acessibilidade foram factores favoráveis à escolha do roteiro que se apresenta. Foram seleccionados quatro sectores geográficos na envolvente do Maciço Granítico do Porto (Figura 1), três na zona costeira e um quarto na região oriental da cidade, nomeadamente: Foz do Douro; Praia da Lavadores; Praia de Angeiras e Gondomar-Fânzeres. Os quatro sectores têm em comum a sua maior ou menor proximidade ao maciço granítico sintectónico do Porto, mas apresentam especificidades litológicas distintas, resultantes de diferenças litoestratigráficas e tectono-metamórficas. Nos três sectores costeiros, a intensa deformação associada à movimentação varisca no cisalhamento Porto-Tomar é a característica mais marcante, sendo imposta sobre litologias diversas em termos de tipologia e cronologia, e acompanhada por processos magmáticos ante- sin- e pós-cinemáticos. No sector oriental a característica mais marcante é a intensa zonalidade metamórfica, o seu paralelismo com a estruturação varisca das rochas metassedimentares e com algumas das litologias magmáticas. A tipologia das paragéneses metamórficas e a sua relação espacial e cronológica com a deformação e com o magmatismo sintectónico são evidentes. 1

HELENA SANT OVAIA ARMANDA DÓRIA MARIA DOS ANJOS RIBEIRO Porto, Julho de 2008 Figura 1. Excerto da Carta Geológia de Portugal, à escala 1/200 000, folha 1, com indicação dos sectores contemplados no roteiro geológico. 2

GGET 2008 Relações deformação, metamorfismo e magmatismo no bordo oriental do maciço do Porto - Gondomar-Fânzeres Maria dos Anjos Ribeiro 1, Helena Sant Ovaia 1, Armanda Dória 1 1 Depatamento e Centro de Geologia da Universidade do Porto, maribeir@fc.up.pt Enquadramento geológico Na região a oriente do Maciço sintectónico do Porto, mais concretamente na região de Fânzeres-Gondomar, afloram distintas litologias graníticas, com abundantes corpos pegmatíticos, intragraníticos e intrametamórficos, tendo como rocha encaixante os metassedimentos do Complexo Xisto-Grauváquico. As fácies graníticas diferenciadas na Carta Geológica de Portugal, à escala 1/200 000, Folha1, no sector a oriente do maciço granítico sintectónico do Porto são o Granito de Ermesinde, o Granito de Fânzeres, um granito de duas micas de grão fino (Granito do Pedregal) e o Granito de Crasto/Gondomar. Estas distintas fácies graníticas têm diferenças texturais, e algumas diferenças composicionais, mas todos eles são granitos de duas micas e com cronologias ante a sin tectónicas (Figura 1). N st + gr sil+ dis Porto Unidades do Paleozóico inferior CXG Granito de Crasto Granito de Pedregal Granito de Fânzeres Granito do Porto Gondomar st + gr Rio Douro 3 bt Figura 1 - Esboço geológico das diferentes fácies granitas aflorantes na zona a oriente do Maciço do Porto (a pontuado a isograda da estaurolite) (segundo Carta Geologica de Portugal à escla 1/200 000, modificado).

O granito de Fânzeres é um granito de duas micas, granatífero de grão médio, com predominância de moscovite, que ocorre em grandes placas. Este granito, segundo a cartografia referida e tendo em consideração os dados geocronológicos (Pinto, 1984) é considerado como ante a sin-tectónico relativamente à F 1 varisca (Carta Geológica da Portugal, à escala 1/200 000, Folha 1). Embora este granito seja referido como um granito gnássico, verifica-se que a orientação geral N15º a N30º, inclinando 65 a 80º SE, só é vísivel em alguns locais, correspondendo a zonas de cisalhamento dúctil, em geral paralelas a abundantes filonetes, filões e lentículas pegmatíticas, que marcam um bandado paralelo à orientação da deformação. O bandando gnaissico que marca esta estrutura, resulta também processo de diferenciação primária pegmatítica intragranítica (possivelmente condicionada pelo campo de tensões vigente) ao qual se sobrepõe depois uma deformação cisalhante local, que não corresponde a um processo de gnaissificação (ou diferenciação de um granito no estado sólido por deformação). Neste mesmo sentido aponta o facto de as grandes placas de moscovite não apresentarem orientação notória. O corpo granítico apresenta no seu interior alguns encraves xistentos cuja relação com os pegmatitos aí intrusivos também é de paralelismo entre a foliação dos metassedimentos e as pequenas lentículas pegmatíticas (Figura 2). O Granito de Gondomar é um granito de grão grosseiro, rico em turmalina distinto do granito de Fânzeres, por ter uma textura um pouco mais grosseira e pela ausência de deformação. A sul do granito de Gondomar aflora um corpo granítico alongado na direccção NE-SW, com uma fácies de grão fino de duas micas, com frequentes lentículas centimétricas nodulares (1 a 2 cm) de rochas metassedimentares com foliação e com composição essencialmente biotítica. Este granito foi por nós designado como Granito do Pedregal e também apresenta frequentes e abundantes lentículas e veios pegmatíticos (Figuras 1 e 3). As três fácies de granitos descritos, apresentam todas elas abundantes lentículas pegmatíticas intragraníticas e também no encaixante metamórfico próximo. É de realçar que quer os corpos graníticos quer as massas aplito-pegmatíticas que ocorrem em massas, lentículas ou veios no encaixante próximo são, em geral, concordantes com a foliação principal dos metassedimentos do CXG envolvente (Figura 3b). Os metassedimentos apresentam foliação de orientação NW-SE a NNW-SSE, vertical a 70E, paralela à estratificação. Esta folição corresponde, à primeira foliação varisca (S 1 ), afectada por uma fase de deformação posterior, que dobra ou crenula, reactiva e reorienta a foliação anterior. Os pegmatitos intruem nos planos da foliação S 1, num período ante a sin-s 1+1, sendo a deformação D 1-1 responsável pela reactivação e crenulação da foliação em torno dos pegmatitos numa geometria indicadora de cisalhamento direito (Figura 3b). Nos metassedimentos existe uma zonalidade metamórfica indicadora de um forte gradiente térmico lateral, variando de Este para Oeste, numa extensão de apenas 500 metros, de filitos nas zonas da clorite e da biotite, no sector mais afastado das massas graníticas e aplito-pegmatíticas, até micaxistos na zona da estaurolite-granada e zonas da distena e da silimanite restritas às zonas próximas das massas graníticas e aplitopegmatíticas. Localmente nos veios aplitopegmatíticos e nos micaxistos envolventes ocorre em abundância distena porfiroblástica (atingindo 5 cm de comprimento) em geral de orientação aleatória, embora com alguma predominância local de porfiroblastos com orientação NE-SW. As estaurolites são muito poicilíticas com uma foliação interna em continuidade com a foliação externa, e apresentam frequentes sombras de pressão quarztosas. A geometria da foliação interna e a sua relação com a foliação externa permite interpretar a sua blastese como ante a sin- D 1+1, sendo a foliação na parte mais interna dos porfiroblastos a foliação anterior à blastese (S 1 ) e nos bordos dos porfiroblastos a blastese é simultânia da reorientação da foliação em continuidade com a foliação externa devida à actuação da fase D 1+1 (Figura 4 ). 4

N cl st + gr bt sil + dis #1 st + gr sil + dis #3 #2 Conglomerados e arenitos (Carbonífero) Unidade de Sobrido Unidade de Valongo Conglomerado (CXG) CXG 4 km Granito de Fânzeres Pegmatitos Filões quartzo Figura 2 - Esboço geológico do Granito de Fânzeres e seu encaixante metamórfico e da respectiva zonalidade metamórfica. Pormenor da estrutura de encraves de rochas xistentas e das lentículas pegmatíticas associadas. Localização das pareagens. Pg Nodulo xistento a) b) Figura 3 a) Granito de Pedregal com nódulos xistentos e pegmatitos intragraníticos; b) Filões pegmatíticos no encaixante metassedimentar, paralelos à foliação do encaixante metamórfico. 5

A B C D S i S e S 1+1 a) b) Litologia Micaxistos Relação blastese-deformação Min D 1 D 1+1 D frágil Qz Ms Bt Est Gran Dist And Sil Tur c) Figura 4 - a) Microfotografia ilustrativa da estrutura interna e do carácter poicilítico dos profiroclastos estaurolíticos ante a cin-cinemáticos relativamente a D 1+1, com reorientação da foliação interna junto ao bordo do cristal e esboços da relação entre a foliação interna (Si) e a foliação externa (Se) nos porfiroblastos: b) Microfografias da paragénese pós-cinemática em sectores próximos dos corpos ígneos: micrfotografia A: distena + fibrolite + moscovite+quartzo; miroofgrafia B andaluzite + silimanite + moscovite; microfotografia C estaurolite + distena + silimanite + moscovite; microfotografia D distena + silimanite + quartzo; c) Quadro paragenético. A foliação magnética determinada nas fácies graníticas de Crasto/Gondomar e de Fânzeres corresponde a N26-28º; 55-60SE. No entanto na fácies gnaissica os pólos das foliações magnéticas apresentam uma dispersão mínima pelo facto desta fácies apresentar uma foliação visível macroscopicamente. A orientação da foliação magnética é (em ambas as fácies) próxima da orientação preferencial de alguns dos porfiroblastos de distena (Ribeiro et al, 2008). Os dados de campo favorecem a interpretação do sincronismo do magmatismo com o pico das condições térmicas do metamorfismo varisco do tipo Barroviano, com paragéneses estaurolíticas ante a sin-cinemáticas e pós-cinemáticas relativamente à última fase de deformação dúctil. A presença da estaurolite nestas paragéneses e a não observação de cordierite, exclui condições barométricas inferiores a 0,2 GPa, implicando profundidades mínimas da ordem dos 6 a 7 km. A orientação das estruturas de carácter dúctil-frágil que condicionaram a instalação das massas ígneas é coerente com a orientação das foliações magnéticas nelas registadas e com os 6

principais alinhamentos dos planos de inclusões fluidas, assim como com a blastese mais tardia, nos encostos das massa ígneas e/ou quartzosas. Os aspectos descritos favorecem a interpretação do sincronismo do magmatismo com o pico das condições térmicas do metamorfismo varisco do tipo Barroviano, com paragéneses estaurolíticas ante a sin-cinemáticas e pós-cinemáticas relativamente à última fase de deformação dúctil. A presença da estaurolite nestas paragéneses e a não observação de cordierite, exclui condições barométricas inferiores a 0,2 GPa, implicando profundidades mínimas da ordem dos 6 a 7 km. A orientação das estruturas de carácter dúctil-frágil que condicionaram a instalação das massas ígneas é coerente com a orientação das foliações magnéticas nelas registadas e com os principais alinhamentos dos planos de inclusões fluidas, assim como com a blastese mais tardia, nos encostos das massa ígneas e/ou quartzosas. Os fluidos aprisionados nas microfracturas são o registo da sua reactivação na história da deformação frágil varisca e pós-varisca. A zonalidade metamórfica definida no campo e a ausência de paragéneses relíquias de picos metamórficos anteriores, em paralelo com os aspectos atrás descritos, sugere uma evolução metamórfica por advection de fluidos magmáticos e/ou metamórficos em estruturas de carácter dúctil-frágil, e em associação síncrona (precoce a tardia) com as massas ígneas, cuja instalação terá sido condicionada pelas mesma estruturas. Descrição das Paragens 539 540 4559 #2 #3 #1 4558 500 m Figura 5- Excerto da folha topográfica à escla 1725 000, nº 122 Porto, com a localização das paragens #1 Estrada D. Miguel Cruzamento para Ervedosa- S. Pedro da Cova Conglomerados quartzosos intercalados em filitos e gresofilitos, localmente com blastese de biotite pós-cinemática. Filões de quarzto associados e respectiva estrutura (figuras 5 e 6). 7

qz Figura 6 Conglomerados e filitos do CXG (# 1). #2 Gardais Lentítula pegmatítica e filões de quartzo paralelos à foliação com turmalinização intensa no encosto. Limite oriental das ocorrências pegmatíticas em xistos estaurolíticos (Figuras 2, 5 e 7). Figura 7 Lentículas pegmatíticas e quartzosas em xistos estaurolíticos (# 2). #3 Trincheira do supermercado Xistos estaurolíticos, geometria das foliação interna e externa dos porfiroblastos (Figura 8). 8

qz e Figura 8 Xistos estaurolíticos Referências Costa, J.C., Teixeira, C. (1958). Carta Geológica de Portugal, na escala 1/50.000, Notícia Explicativa da Folha 9- C, Porto. Serviços Geológicos de Portugal, Lisboa, 38p Fernandes; J.P., Chaminé, H.I., Borges, F.S. (1998). Considerações sobre o possível signifoicado de marcadores cinemáticos na unidade dos Xistos de Fanzeres (Porto, Portugal). GEOlogos 2, 4ª Conferência GGET, Universidade do Porto, 153-156. Pereira, E, Cabral, J., Cramez, P., Moreira, A., Noronha, F., Oliveira, J.M., Farinha Ramos, J.M., Reis, M.L., Ribeiro, A., Ribeiro, M.-L., Simões, M. (1992). Carta geológica de Portugal, Escala 1/200.000, Notícia Explicativa da Folha 1. Serviços Geológicos de Portugal, Lisboa, 83p. Pinto, M.S. (1984). O granito gnaissico de Fânzeres (Porto, Portugal) Idade e caracteríização geoquímica geral. Memórias e Notícias nº 98, 231-242. Ribeiro, M.A., Dória, A., Sant Ovaia, H. (2008) Relações entre deformação, magmatismo e metamofismo na região oriental do Maciço do Porto. Memórias nº13, Univ. Porto, Depº de Geologia, 8ª Conferência Anual do GGET, 39-43. 9

10 GGET 2008-6º Encontro de campo. 26 dejulho 2008

GGET 08 GGET 2008 O Complexo Metamórfico da Foz do Douro (CMFD) Fernando Noronha 1, Manuela Marques 2, Mónica Sousa 3 1 Departamento e Centro de Geologia da Universidade do Porto, fmnoronh@fc.up.pt 2 Departamento e Centro de Geologia da Universidade do Porto, maarques@fc.up.pt 3 Centro de Geologia da Universidade do Porto, monica.sousa@fc.up.pt 1. Introdução A geologia da zona ocidental da cidade do Porto é dominada pela presença de uma estreita faixa de rochas metamórficas intruídas por granitos variscos muito bem representados em Lavadores, a sul do rio Douro, e no Castelo do Queijo. Estes granitos pertencem ao grupo dos granitos tardi-variscos, com uma idade do Estefaniano inferior (Mendes, 1967/1968; Silva, 1995; Martins et al., 2001), que definem, no seu conjunto, um alinhamento paralelo à zona de cizalhamento Porto-Tomar, que terá condicionado a sua instalação (Chaminé et al., 2003). Na estreita orla litoral entre a foz do rio Douro e o Castelo do Queijo (Forte de S. Francisco Xavier), a faixa metamórfica é representada por magníficos afloramentos de rochas metassedimentares, espacialmente associadas a ortognaisses de diferentes tipos e a anfibolitos, que, no seu conjunto, constituem o Complexo Metamórfico da Foz do Douro (CMFD) (Borges et al. 1985, 1987; Noronha, 1994; Noronha e Leterrier, 1995, Leterrier e Noronha, 1998; Marques et al., 2000; Noronha e Leterrier, 2000; Ribeiro et al., 2006). Estes afloramentos contrastam com os presentes na zona oriental da cidade, os quais não incluem ortognaisses e anfibolitos e onde micaxistos e metagrauvaques, numa sequência relativamente monótona e menos metamorfizada, são também recortados por granitos hercínicos. O CMFD é constituído por duas unidades tectono-estratigráficas distintas (Carta Geotécnica do Porto, 1994; Noronha, 1994): a Unidade dos Gnaisses da Foz do Douro (UGFD) e a Unidade de Lordelo do Ouro (ULO) (Figura 1). Figura 1. Mapa geológico-estrutural da zona ocidental da cidade do Porto (segundo a Carta Geológica da Carta Geotécnica do Porto, 1994). 11

A UGFD é representada por diferentes ortognaisses, por vezes intensamente deformados devido à presença de corredores de cisalhamento. Com base em critérios texturais, mineralógicos e estruturais foi possível distinguir, nesta unidade, vários tipos de gnaisses, nomeadamente, gnaisses biotíticos de composição tonalítica, gnaisses leucocratas, gnaisses leucocratas de tendência ocelada e gnaisses leucocratas ocelados (Borges et al. 1985, 1987). Estudos geoquímicos efectuados com base em elementos maiores, elementos menores e terras raras (Noronha e Leterrier, 1995; Leterrier e Noronha, 1998; Noronha e Leterrier, 2000), confirmaram a presença de diferentes tipos de gnaisses, todos eles com carácter peraluminoso, mas cujas características químicas e químico-mineralógicas permitiram o seu agrupamento em dois grandes grupos composicionais: - Grupo dos gnaisses com composição granodiorítico-tonalítica, constituído pelos gnaisses leucocratas e pelos gnaisses biotíticos; - Grupo dos gnaisses de composição granítico-adamelítico, englobando os gnaisses leucocratas ocelados e os gnaisses leucocratas de tendência ocelada. Os dados geoquímicos indicaram, ainda, uma origem profunda com assinatura mantélica de tipo MD para os gnaisses biotíticos, e uma origem francamente crustal para os gnaisses leucocratas ocelados e de tendência ocelada. Estudos de geocronologia efectuados sobre as rochas gnáissicas pelos mesmos autores (método do U/Pb em zircões) indicaram uma idade de 567 + 6 Ma para os gnaisses biotíticos e de 606 + 17 Ma para os gnaisses leucocratas ocelados e de tendência ocelada. Os ortognaisses da UGFD contactam a NE e SW com formações metassedimentares muito dobradas pertencentes à Unidade de Lordelo do Ouro (ULO), sendo nítida a discordância entre as foliações presentes nos gnaisses e nos metassedimentos (Borges et al. 1985, Ribeiro e Pereira 1992). As sequências metassedimentares são essencialmente constituídas por micaxistos a que se associam, por vezes, rochas calcossilicatadas e anfibolitos. Os anfibolitos são de origem magmática com afinidade toleítica (Bravo e Abrunhosa 1978), apresentando composições químicas compatíveis com basaltos do tipo MORB (Leterrier e Noronha 1998; Noronha e Leterrier, 2000) e, segundo os mesmos autores, uma idade estimada em 1.05 Ga (idade modelo Nd). Uma vez que os metassedimentos da ULO exibem uma xistosidade anterior às foliações presentes nos ortognaisses, o CMFD no seu conjunto (UGFD e ULO) representa uma faixa précâmbrica não pertencente à Zona Centro Ibérica. Sendo assim, a zona de cisalhamento Porto- Tomar (ZCPT) passa próximo do Castelo do Queijo e separa os terrenos do Complexo Metamórfico da Foz do Douro dos da Zona Centro Ibérica, nomeadamente do Complexo Xisto-Grauváquico (CXG), que ocorre na zona oriental da cidade do Porto (Noronha e Leterrier, 2000). Mais recentemente, Ribeiro et al. (in press) colocam o Complexo Metamórfico da Foz do Douro no limite norte da Placa Finisterra, sendo limitado a Este pela zona de cisalhamento Porto-Tomar-Ferreira do Alentejo, considerada como uma falha transformante direita que separa as placas Finisterra e Ibéria (Ribeiro et al., 2007) e, a Oeste, pelas sequências com menor grau de metamorfismo do Proterozóico Superior do Domínio de Espinho, que apresentam afinidades com a Zona de Ossa Morena (Fernández et al., 2003). 2. Localização do itinerário e descrição das paragens O itinerário geológico no CMFD será efectuado na orla litoral da cidade do Porto, de sul para norte, entre a praia da Sª da Luz e a praia do Castelo do Queijo, e constará de 3 paragens cuja localização se apresenta no esboço geológico da Figura 2. 12

P1 P2 P3 Figura 2. Esboço geológico do CMFD (adaptado de Borges et al., 1985, 1987). 2.1. Paragem 1 Praia da S ra da Luz. Neste local afloram diferentes litologias englobadas no CMFD, nomeadamente, gnaisses biotíticos e gnaisses leucocratas aos quais se associam metassedimentos e anfibolitos. As estruturas e relações geométricas entre as diferentes litologias permitem, pelo menos em parte, estabelecer uma hierarquização temporal entre algumas destas rochas. Os gnaisses biotíticos são aqui representados por uma rocha mesocrata de grão fino, com fraca blastese de plagioclase e deformação evidente. Trata-se de um ortognaisse de composição tonalítica, sem feldspato potássico e rico em plagioclase e biotite, evidenciando, por vezes, diferenciações leucocratas. Em algumas zonas ocorre, ainda, uma granada, possivelmente almandina. Estas rochas apresentam uma foliação subvertical com direcção regional N120ºE que, em alguns locais, evidencia um dobramento associado a cisalhamento direito. Em zonas muito restritas é possível observar o contacto discordante entre a foliação dos gnaisses biotíticos e os metassedimentos dobrados, atestando o carácter intrusivo dos gnaisses (Figura 3). Os gnaisses leucocratas, por sua vez, mostram uma foliação mal definida com orientação N120ºE, e ocorrem sob a forma de corpos de diferentes dimensões estirados paralelamente à orientação geral do complexo metamórfico (Figura 3). 13

gnaisse leucocrata gnaisse biotítico metassedimentos metassedimentos Figura 3. Relação entre a foliação do gnaisse biotítico e das rochas metassedimentares dobradas. Neste afloramento ocorre, também, uma brecha ígnea relacionada com a instalação dos granitos biotíticos porfiroides variscos. É constituída por fragmentos de rochas pertencentes ao CMFD, com orientação, forma e dimensões variadas, aglutinados por um "cimento" granítico (Figura 4). A B Figura 4. Vários aspectos da brecha ígnea. A - bloco de brecha caído na praia onde se destacam fragmentos de rochas metamórficas distribuídos aleatoriamente (só visível em baixa-mar). B - pormenor da brecha ígnea. Para além dos aspectos referidos é, ainda, possível ver, em vários locais, a relação da foliação dos gnaisses biotíticos com pegmatitos e filões de quartzo mais recentes, bem como concentrações anómalas de megacristais de feldspato potássico (Figura 5).. A C gnaisse biotítico B pegmatito Figura 5. Outros aspectos da paragem 1. A contacto de um pegmatito com o gnaisse biotítico. B concentração de megacristais de feldspato potássico. C pormenor de B. 14

Muitos dos aspectos observados nesta paragem, em particular as estruturas dos metassedimentos, dos gnaisses biotíticos e dos gnaisses leucocratas, bem como as relações espaciais entre as diferentes litologias, são visíveis em toda a faixa que se estende, para norte, até à praia do Homem do Leme. 2.2. Paragem 2 Praia de Gondarém Neste local aflora um extenso corpo anfibolítico que se destaca nitidamente das rochas envolventes. Encontra-se espacialmente associado a metassedimentos e a gnaisses biotíticos e leucocratas. Trata-se de uma rocha de grão fino e cor negra esverdeada que evidencia uma foliação definida pelo alinhamento de cristais de anfíbola. De norte para sul do afloramento, a foliação roda de N160ºE para N60ºE, como resultado de um dobramento de eixo mergulhante 60º para N310ºE, correspondente ao dobramento regional da faixa metamórfica. Na zona central do afloramento, e em relação com o dobramento acima referido, podem observar-se bonitas dobras métricas, quer no anfibolito, quer nos gnaisses e metassedimentos associados (Figura 6). A B Figura 6. Vários aspectos das dobras no anfibolito e rochas associadas. A dobra megascópica no anfibolito. B dobra redobrada no anfibolito e gnaisse. C dobras no gnaisse e metassedimentos C Localmente, e graças à presença de estreitos filonetes de quartzo distribuídos no seio do corpo anfibolítico, é ainda possível evidenciar um microdrobramento isoclinal. 2.3. Paragem 3 Estação de Zoologia Marítima A norte da Praia do Homem do Leme desenvolve-se uma extensa mancha de gnaisse leucocrata ocelado que se estende até à Praia do Castelo do Queijo. Este gnaisse, embora composicionalmente semelhante ao gnaisse leucocrata de tendência ocelada que aflora a sul da praia da S ra da Luz, apresenta aqui aspectos texturais que permitem a sua individualização relativamente às restantes fácies gnaissicas. Espacialmente associados a esta rocha ocorrem metassedimentos com características semelhantes às observadas nas restantes paragens. Em frente ao edifício da Estação de Zoologia Marítima, as relações geométricas entre estas rochas e o gnaisse leucocrata ocelado são muito claras, evidenciando o carácter intrusivo dos gnaisses (Figura 7). 15

GGET 2008-6º Encontro de campo. 26 dejulho 2008 A B metassedimentos gnaisse Figura 7. Contacto do gnaisse leucocrata ocelado com os metassedimentos. A afloramento em frente do edifício da Estação de Zoologia Marítima. B - pormenor do contacto discordante do gnaisse com os metassedimentos. Em todo o afloramento a rocha evidencia ocelos de feldspato potássico+quartzo com dimensão centimétrica. Apresenta uma foliação de orientação geral N120ºE, localmente dobrada, e um cisalhamento dúctil direito que, em muitos casos, transpõe a foliação (Figura 8). A B Figura 8. Gnaisse leucocrata ocelado. A aspecto em afloramento (praia do Castelo do Queijo). B pormenor dos ocelos. Referências Borges, F. S., Noronha, F. & Marques, M. (1985). Excursão Geológica no Complexo Gnáissico da Foz do Douro. In: Livro-guia das excursões geológicas da IX Reunião de Geologia do Oeste Peninsular, Universidade do Porto. Borges, F. S., Noronha, F. & Marques, M. (1987). Metamorphic terrains of Foz do Douro. In: Ribeiro, A., Dias, R., Pereira, E., Merino, H., Borges, F. S., Noronha, F. & Marques, M., Coords, Guide-book for the Miranda do Douro-Porto Excursion. Conference on Deformation and Plate Tectonics, Oviedo, 11-19 pp. Bravo, M. S. & Abrunhosa, M. J. (1978). Sobre a petrografia, composição e origem dos anfibolitos da Foz do Douro (Porto-Portugal). Publ. Mus. Labor. Miner. Geol. Fac. Ciênc. Univ. Porto, 4ª Sér., 95: 7-26. Carta Geotécnica do Porto (1994). Câmara Municipal do Porto, COBA, FCUP. Chaminé, H.I., Gama Pereira, L., Fonseca, P.E., Noronha, F. & Lemos de Sousa, M.J. (2003). Tectonoestratigrafia da faixa de cisalhamento de Porto-Albergaria-a- Velha-Coimbra-Tomar, entre as zonas Centrop Ibérica e de Ossa Morena (Maciço Ibérico, W de Portugal). Cad Lab. Xeológico de Laxe, 28: 37-78. Fernández, F. J., Chaminé, H.I., Fonseca, P., Mhnhá, J., Ribeiro, A., Aller, J., Fuertes-Fuentes, M., Borges, F.S. (2003). HT-fabrics in a garnet-bearing quartzite from Western Portugal. Geodynamic implications for the Iberian variscan Belt. Terra Nova, 15: 96-103. 16

Leterrier, J. & Noronha, F., 1998. Evidências de um plutonismo calcoalcalino Cadomiano e de um magmatismo tipo MORB no Complexo Metamórfico da Foz do Douro (Porto). In: Azerêdo, A., Coord, Actas do V Congresso Nacional de Geologia (Resumos alargados), Lisboa, 1998. Comun. Inst. Geol. Min./Soc. Geol. Portugal, 84, 1: B146-B149. Marques, M., Noronha, F., Flores, D. & Rodrigues, B., 2000. Geologia da faixa costeira Lavadores-Porto. In: Livro-guia da excursão geológica do XX Curso de Actualização de Professores de Geociências, Departamento de Geologia, Faculdade de Ciências, Universidade do Porto/Associação Portuguesa de Geólogos, Porto. Martins, H.C.B., Almeida, A., Noronha, F & Leterrier, J., 2001. Novos dados geocronológicos de granitos da região do Porto e granito de Lavadores. Actas do VI Congresso de geoquímica dos Países de Língua Portuguesa e Xii Semana de geoquímica, Univ. Algarve, Faro, 146-148 pp. Mendes, F. (1967/1968). Contribuition à l étude géochronologique, par le méthode au strontium, des formations cristallines du Portugal. Bol. Mus. Lab. Min. Geol., Univ. Lisboa, 11 (1), 155 pp. Noronha, F., 1994. Geologia e Tectónica. In: Carta Geotécnica do Porto. Vol. 1, Tomo 1 Memória, Câmara Municipal do Porto, COBA, FCUP, 36-49 pp. Noronha, F., 2000. Enquadramento geológico da região do Porto. In: XX Curso de Actualização de Professores de Geociências, Porto, 2000. Departamento de Geologia, Faculdade de Ciências, Universidade do Porto/Associação Portuguesa de Geólogos, Porto, 1-4 pp. Noronha, F. & Leterrier, J., 1995. Complexo Metamórfico da Foz do Douro. Geoquímica e geocronologia. Resultados preliminares. In: Borges, F. S. & Marques, M. M., Coords, IV Congresso Nacional de Geologia, Porto, 1998, Resumos Alargados. Mem. Mus. Labor. Miner. Geol. Fac. Ciênc. Univ. Porto, 4:769-774. Noronha, F. & Leterrier, J., 2000. Complexo Metamórfico da Foz do Douro (Porto). Geoquímica e Geocronologia. Revista Real Academia Galega de Ciências, Vol. XIV: 21-42. Ribeiro, A. & Pereira, E., 1992. Tectónica hercinica e pré-hercinica. In: E. Pereira (coord.). Carta Geológica de Portugal na escala 1/200 000. Notícia Explicativa da Folha 1. Serviços Geológicos de Portugal, Lisboa, 51-57 pp. Ribeiro, A, Munhá, J.,Dias, R., Mateus, A., Pereira, E., Ribeiro, M.L., Fonseca, P., Araújo, A., Oliveira, T., Romão, J., Chaminé, H., Coke, C., Pedro, J. (2007). Geodynamic evolution of SW Europe Variscides. Tectonics 26 (2007 dói: 10.1029/2006/TC002058. Ribeiro, A, Munhá, J.,Dias, R., Mateus, A., Fonseca, P., Pereira, E., Noronha, F., Romão, J., Rodrigues, J., Castro, P., Meireles, C., Ferreira, N. (in press). Mechanics of thick-skinned Variscan overprinting of Cadomian basement (Iberian Variscides). Ribeiro, M.A, Marques,M., Flores, D., Vasconcelos, C. 2006. Geologia da Faixa Litoral entre Lavadores e o Castelo do Queijo. Simpósio Ibérico do Ensino da Geologia/XXVI Curso de Actualização de Professores de Geociências (Aveiro, Portugal). Livro guia de campo, 7-42 pp. Silva, M.M.V.G., 1995. Mineralogia, petrologia e geoquímica de encraves de rochas graníticas de algumas regiões Portuguesas. Tese de doutoramento, Univ. Coimnbra, 288pp. 17

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GGET 2008 Os granitos tardi a pós-tectónicos de Lavadores e o seu encaixante Helena Sant Ovaia 1, Maria dos Anjos Ribeiro 1, Helena Cristina Martins 1 1 Departamento e Centro de Geologia da Universidade do Porto, hsantov@fc.up.pt Enquadramento geológico A zona de Lavadores do ponto de vista geotectónico localiza-se na fronteira entre a Zona Centro Ibérica e a Zona Ossa Morena. A geologia desta zona é dominada pela presença de uma estreita faixa de rochas metamórficas, constituída por gnaisso-migmatitos, anfibolitos e micaxistos, intruidas pelo granito de Lavadores. O granito de Lavadores é um granito porfiróide de grão médio a grosseiro, biotítico com megacristais róseos e /ou brancos de feldspato potássico. Este granito é ainda caracterizado por possuir numerosos encraves mesocratas e melanocratas geralmente microgranulares e também xenólitos. Para o granito de Lavadores foi determinada uma idade de instalação de 298±12,3 Ma (Martins et al., 2001). As rochas metamórficas encaixantes compreendem diferentes litologias, nomeadamente metassedimentos quartzo-pelíticos dobrados, anfibolitos e gnaisses. Os metassedimentos apresentam uma foliação NNW-SSE a NW-SE com dobramento de eixo subvertical. Os gnaisso-migmatitos são leucocratas e intrusivos nos metassedimentos e nos anfibolitos. Os anfibolitos, por sua vez, são intrusivos nos metassedimentos. Para além do granito de Lavadores aflora ainda uma pequena mancha de um granito biotítico com restitos cuja estruturação planar interna é coerente com a estruturação regional. Todas as litologias são cortadas por um grande número de diaclases subverticais e por filões aplitopegmatíticos. No seu conjunto esta faixa define um alinhamento paralelo à Zona de Cisalhamento Porto-Tomar (ZCPT) (Figura 1A e B). N A Cabedelo rio Douro LEGENDA Terraços fluvio-marinhos Granito de Lavadores Granito da Madalena Falhas Praia de Lavadores Praia das Pedras Amarelas 2 km 19

Casa Branca N B 20 m Filão aplito-pegmatítico Granito de Lavadores Micaxistos, gnaisses, migmatitos, anfibolitos Granito biotítico Figura 1. A. Esboço geológico da zona de Lavadores. B. Detalhe cartográfico de um sector do mapa A. Dados de Anisotropia da Susceptibilidade Magnética (Sant Ovaia e al. 2008), ainda que preliminares, mostram que a estruturação regional é WNW-ESE, e está relacionada com um movimento dextro da ZCPT neste sector. As fácies metassedimentares, anfibolíticas e ortognaissicas leucocratas foram conjuntamente envolvidas numa deformação cisalhante direita, responsável pelo dobramento de foliações dos metassedimentos gerando dobras de eixo subvertical e plano axial NW-SE e pela reorientação da foliação prévia dos anfibolitos. O granito de Lavadores corresponde a uma fácies ígnea mais tardia intrusiva nas litologias anteriores cuja ascensão e instalação decorreu numa fase pós-cinemática mas ainda controlada pelas estruturas transtensivas associadas à ZCPT. Aspectos petrográficos Do ponto de vista petrográfico o granito de Lavadores apresenta a seguinte associação mineralógica: quartzo+ feldspato potássico (ortoclase)+ plagioclase+ biotite+ moscovite+ alanite+ anfíbola+ apatite+ esfena+ zircão+ opacos. Não são evidentes aspectos de deformação nem no quartzo nem nas micas (Figura 2a e b). O anfibolito apresenta uma textura granoblástica de tendência nematoblástica e a associação mineralógica é a seguinte: horneblenda+ biotite+ plagioclase+ quartzo+ calcite+ clorite+ opacos (Figura 2c). Num filão aplitopegmatítico observa-se uma associação mineralógica constituída por quartzo+ feldspato potássico + plagioclase+ biotite+ moscovite+ turmalina+ opacos (Figura 2d). O gnaisse das Pedras Amarelas apresenta a seguinte associação mineralógica: quartzo+ feldspato potássico+ plagioclase+ cordierite+ biotite+ granada+ andaluzite+ opacos. Apresenta um carácter gnaisso-migmatítico com predominância de bandas de textura granular (heterogranular) compostas por quartzo+feldspato+plagioclase+granadas+cordierite+opacos (Figura 2e) e nódulos dispersos de textura granoblástica e mineralogia distinta andaluzite+biotite+opacos (Figura 2f). 20

alanite a) b) c) cordierite andaluzite d) e) f) Figura 2. Fotografias das lâminas delgadas: (a) aspecto geral do granito de Lavadores, (b) cristal de alanite no granito de Lavadores (c); anfíbolas com textura poicilítica no anfibolito; (d) turmalina no filão aplitopegmatítico (e) cordierite pinitizada e clorite no gnaisse das Pedras Amarelas; (f) nódulo de andaluzite no gnaisse das Pedras Amarelas. 100 Descrição das Paragens O percurso inicia-se na Praia de Lavadores, em frente ao restaurante Casa Branca, e prossegue para sul ao longo do litoral, sobre os afloramentos graníticos (Figura 3). P1 P2 P3 Figura 3. Localização das paragens do percurso 1, na Praia de Lavadores. Paragem 1 Em frente ao Restaurante Casa Branca Localização Esta paragem situa-se sobre os rochedos na zona em frente ao restaurante Casa Branca. 21

Descrição geológica O granito de Lavadores é um granito porfiróide, com matriz de grão médio a grosseiro, biotítico (biotite primária), podendo apresentar alguma moscovite e abundantes megacristais de felspato potássico (Figura 4A e B). Os megacristais apresentam orlas de crescimento tardio relativamente à cristalização da matriz envolvente, muitas vezes evidenciadas por «linhas concêntricas» de concentração de biotite (Figura 4D). Verifica-se que a quantidade de megacristais é muito variável, havendo zonas em que se observa grande concentração destes, em detrimento de outras em que ocorrem de modo mais disperso (Figura 4C). A C B D Figura 4. Aspectos texturais e mineralógicos do Granito de Lavadores: A - granito porfiróide, com matriz de grão médio a grosseiro, biotítico, com megacristais de feldspato potássico; B - megacristal de feldspato potássico com plano de macla (macla de Karlsbad) evidente; C - zonas em que se observa grande concentração de megacristais de feldspato potássico; D - orlas de crescimento tardio relativamente à cristalização da matriz envolvente, evidenciada por concentração de biotite. Este granito é, ainda, caracterizado pela presença de numerosos encraves mesocratas e melanocratas, em geral microgranulares, por vezes com alguma tendência porfiróide. Estes encraves têm dimensões variáveis, contactos bruscos e formas mais ou menos ovaladas. Em alguns locais do maciço, os encraves ocorrem em concentrações, por vezes alinhadas (corredores de encraves) que parecem representar, no seu conjunto, estruturas magmáticas relacionadas com a instalação e o fluxo do magma (Figura 5A). Estes aspectos poderão ser explicados por cristalização, mais ou menos simultânea, de dois magmas imiscíveis e com diferentes viscosidades, correspondendo um deles a um magma granítico, e o outro, a um magma possivelmente de composição tonalítica (Silva, 2001). Existem também xenólitos, que correspondem a fragmentos das rochas encaixantes. Estes são, em geral, foliados (o encaixante compreende gnaisses, micaxistos e anfibolitos ou xistos anfibólicos) e são mais abundantes nos bordos do maciço granítico (Figura 5B). Verifica-se que alguns dos encraves apresentam megacristais de feldspato potássico, alguns deles desenvolvendo-se sobre o contacto entre o encrave e o granito envolvente (Figura 5C). Noutros casos, observa-se uma feldspatização mais intensa na envolvente do encrave (Figura 5D). 22

B A D C Figura 5. Aspectos relativos aos encraves do Granito de Lavadores: A - corredor de encraves; B - encraves de diferente natureza, o de maiores dimensões é um xenólito com foliação evidente e englobando micaxistos e gnaisses (rochas do encaixante); C - megacristal de feldspato potássico sobre o contacto entre um encrave microgranular e o granito envolvente; D - orlas de feldspatização envolvendo um encrave microgranular. Estrutura do maciço O maciço granítico apresenta-se com uma coloração amarelada, individualizando-se na paisagem blocos de grandes dimensões (Figura 6A). Em superfícies mais recentes, a rocha apresenta uma coloração rosada devido à presença do feldspato potássico (Figura 6B). À escala do maciço verifica-se que o granito é isotrópico, não evidenciando uma orientação preferencial. Todavia não é homogéneo, uma vez que mostra heterogeneidade na distribuição e abundância dos megacristais e dos encraves. Para além destes aspectos, são também observáveis estruturas típicas de fluxo magmático, caracterizadas pelo alinhamento de bandas escuras essencialmente constituídas por biotite (Figura 6C). Em várias zonas do maciço são visíveis filões aplito-pegmatítcos e quartzosos, subhorizontais e verticais centimétricos, que se instalaram em fracturas numa fase tardia em que o maciço já tinha comportamento frágil (Figura 6D). O maciço granítico apresenta um diaclasamento bastante regular, agrupado em três famílias principais, duas sub-verticais (N30ºE a N40ºE e N120ºE a N130ºE) e uma sub-horizontal (Figura 6E). 23

B A D E Figura 6. Aspectos relativos à estrutura do Maciço Granítico de Lavadores: A - aspecto da coloração amarelada e da individualização de blocos de grandes dimensões condicionados pela fracturação do maciço; B - cor cinzento róseo do granito quando não alterado; C - estruturas de fluxo magmático, marcadas por biotite; D - filões sub-horizontais; E - diaclasamento sub-vertical. C Paragem 2 Uns metros a sul do Restaurante Casa Branca Localização Esta paragem situa-se sobre os rochedos na zona inter-marés, uns metros a sul do restaurante Casa Branca. Descrição geológica Neste local é possível observar o contacto brusco, e bem marcado, entre o granito porfiróide de Lavadores e as rochas metamórficas encaixantes. Junto ao contacto, o granito apresenta uma grande abundância de encraves, alguns deles xenólitos, com foliação evidente. As rochas metamórficas encaixantes compreendem diferentes litologias, nomeadamente metassedimentos quartzo-pelíticos dobrados, anfibolitos e gnaisses-migmatitos mais ou menos leucocratas. As rochas gnaissicas são ortognaisses com relações de intrusão nos metassedimentos e nos anfibolitos: Por sua vez, estes são intrusivos, também, nos metassedimentos. A foliação gnáisso- 24

migmatítica é coerente com o dobramento apresentado pelos metassedimentos (Figura 7). Todas as litologias antes referidas, e os respectivos contactos, mútuos são cortados por um filão aplitopegmatítico (Figura 7). 1 4 B A 4 4 4 3 Filão C D 5 5 E Figura 7. Aspectos do encaixante do granito de Lavadores: A - representação esquemática das litologias presentes: 1 - granito de Lavadores; 2 - filões aplito-pegmatíticos; 3 gnaisso-migmatitos; 4 metassedimentos; 5 - anfibolitos; B a E - fotografias com as litologias anteriores identificadas. Paragem 3 Pedras Amarelas Localização Esta paragem situa-se sobre os rochedos localizados na Praia das Pedras Amarelas Descrição geológica Neste afloramento é possível observar algumas relações de contacto com o granito de Lavadores. Observam-se algumas pequenas apófises graníticas com megacristais, intrusivas numa rocha leucocrata com foliação marcada pela orientação da biotite. Esta foliação é discordante relativamente ao contacto do granito, e tem orientação geral de N110ºE a N115ºE, embora apresente alguma variação. Esta litologia equivale aos gnaisses observados na paragem anterior, mas aqui são a litologia predominante. A fracturação destas rochas é totalmente diferente da do granito de Lavadores. Aqui, o diaclasamento é muito mais penetrativo, não se observando a disjunção em bolas. As diaclases apresentam uma orientação N60ºE;70ºNW e N110ºE a N120ºE;65º-70ºNE. Esta última orientação de diaclasamento é subconcordante com a foliação antes referida. Em condições de maré baixa é possível observar que no interior destes gnaisses existem encraves de anfibolitos e de metassedimentos. 25

Referências Martins, H.C.B., Almeida, A., Noronha, F. & Leterrier, J. 2001. Novos dados geocronológicos de granitos da região do Porto e granito de Lavadores. Actas do VI Congresso de Geoquímica dos Países de Língua Portuguesa e XII Semana de Geoquímica, Univ. Algarve, Faro, p. 146-148. Sant Ovaia, H. Ribeiro, M.A., Cardoso, I., 2008. Caracterização estrutural de fácies ígneas e metamórficas do sector Lavadores-Pedras Amarelas: Estudos de ASM. Memórias nº13, Univ. Porto, Depº de Geologia, 8ª Conferência Anual do GGET, 81-86. Silva, M.M.V.G., 2001. Origens de diferentes tipos de encraves que ocorrem em granitóides. Colóquio Geoquímica e Petrogénese de Rochas Granitóides, Coord. A.M. Neiva, memória da Academia das Ciências, Lisboa: 97-119. 26

GGET 2008 Deformação, migmatização e metassomatismo no bordo NW do maciço do Porto Praia de Angeiras Maria dos Anjos Ribeiro 1, Helena sant Ovaia 1, Armanda Dória 1 1 Departamento e Centro de Geologia da Universidade do Porto, maribeir@fc.up.pt Enquadramento geológico Segundo a cartografia publicada, as rochas aflorantes em Angeiras compreendem litologias graníticas e filonianas, intrusivas em metassedimentos do Complexo Xisto-Grauváquico (CXG) e em rochas anfibolíticas subordinadas, definindo um conjunto de rochas gnaisso-migmatíticas. Todo este conjunto litológico está dobrado pela Orogenia Varisca, evidenciando uma estruturação desenvolvida por dobramento em regime dúctil (Carríngton da Costa & Teixeira, 1957; Teixeira & Cândido Medeiros, 1965, Torre de Assunção, 1962). A deformação dúctil-frágil a frágil associada ao final da Orogenia Varisca, está registada na extensa rede de fracturação, definindo famílias conjugadas que se materializam também, nas estruturas filonianas aí presentes (Carríngton da Costa & Teixeira, 1957; Teixeira & Cândido Medeiros, 1965). Na Praia de Acheiras (Figura 1) assim como na Praia de Vila Chã a norte e nas Praias de Agudela e do Marreco a sul, aflora uma orla de migmatização sintectónica, com metassomatismo associado, relacionada com o bordo do maciço sintectónico do Porto. P-4568 M-523 Figura 1. Localização geográfica (extracto da Carta Topográfica nº109 (Lavra), à escala 1:25 000) Os migmatitos são a principal litologia aflorante na Praia de Angeiras Norte (Figura 2). No afloramento, exposto em boas condições, verifica-se uma grande heterogeneidade litológica, quer em termos texturais, quer em termos mineralógicos. Existem leitos ou lentículas de dimensão variada de composição essencialmente quartzo-feldspática e com texturas ígneas, mais ou menos grosseiras. Estes níveis constituem o leucossoma, onde também podem ser observadas biotite e moscovite.o melanossoma é constituído, essencialmente, por minerais de natureza micácea, sobretudo biotite associada a fibrolite. A fibrolite aparece em feixes esbranquiçados muito bem desenvolvidos, com forma e distribuição bastante irregulares. O bandado gnaisso-migmatítico definido por estes níveis não apresenta simetria bilateral, verificando-se a ocorrência de zonas com predominância de fácies ígneas e outras em que as litologias metamórficas são as mais representadas. O bandado das rochas migmatíticas possui uma orientação média de N170º; sub-vertical e apresenta-se deformado com dobras de geometria variável mas na maioria dos casos são dobras de eixo subvertical ou de forte inclinação, associadas a cisalhamento direito (Lopes e Ribeiro, 2008). 27

s c s c Figura 2 - Fácies gnaisso-migmatíticas da Praia de Angeiras. Migmatização sin-cinemática com deformação cisalhante direita. Os migmatitos apresentam núcleos escuros, de carácter metamórfico e/ou metassomático, constituídos por rochas calcossilicatadas e por vezes anfibolíticas. Os núcleos observados apresentam-se zonados, com diferentes texturas e composições mineralógicas (Figura 3). No centro a rocha é de cor escura, apresenta textura granoblástica e é constituída, essencialmente, por quartzo e anfíbolas (zona 1 da figura 3). Passa externamente, a uma zona quartzo-biotítica, também com textura granoblástica (zona 2 da figura 3). A zona mais externa é uma litologia magmática com textura granular +/ fina, com variação mineralógica quanto à abundância de biotite, associada a quartzo, moscovite e feldspatos (zona 3 da figura 3). Os núcleos de rochas calcossilicatadas possuem dimensões centimétricas a métricas. A variação entre os núcleos e a litologia envolvente traduz-se num contacto brusco sendo que, estes encraves apresentam geometrias irregulares, a tender para o ovóide ou elipsoidal. É possível denotar nos encraves um certo alongamento com uma orientação geral NNW-SSE, paralela à foliação gnaisso-migmatítica. Por vezes apresentam-se dobrados com a geometria idêntica à das dobras dos migmatitos. No seio dos migmatitos também se destacam lentículas de textura pegmatítica, constituídas, essencialmente, por cristais de felsdpato e quartzo bem desenvolvidos, euédricos a subédricos. Associados aos migmatitos existem rochas intrusivas de carácter filoniano de textura aplitopegmatítica e de composição granítica. Estes filões podem conter turmalina sob a forma de pequenas agulhas pretas dispersas. Os filões graníticos, embora em menor quantidade, são filões com uma textura de granularidade fina, constituídos por quartzo, feldspatos e micas (predominantemente moscovite). São rochas leucocratas, muito claras, de tonalidade rosada devido à presença de feldspatos. 28

3 2 1 Figura 3 - Núcleos escuros de carácter metamórfico e/ou metassomático nos migmatitos, constituídos por rochas calcossilicatadas e por vezes anfibolíticas; zonamento: 1 rocha metamórfica com textura granoblástica constituída por quartzo, anfíbolas e granada; 2 rocha metamórfica de textura granoblástica e composição quartzo-biotítica; 3 - rocha magmática com textura granular, com variação composicional +/- biotite, associada a quartzo, moscovite e feldspatos. Os filões intruem discordantemente com a foliação e apresentam uma estruturação interna com variação na textura e composição mineralógicas. São sub-verticais e com grande extensão lateral (Figura 4). No encosto destes filões ou no seu interior, no contacto entre a litologia granítica e a pegmatítica existem biotites e silimanites definido uma foliação paralela ao filão (Figura 4). Figura 4 Aspectos dos filões discordantes da foliação gnaisso-migmatítica e da sua estrutura interna. 29

Aspectos petrográficos O paleossoma das rochas gnaisso-migmatíticas é constituído por metassedimentos do CXG, de natureza quartzo-pelítica, que apresentam como litologia predominante os micaxistos. Estes apresentam-se em geral com uma tonalidade amarela acastanhada, indiciando a presença de óxidos. Macroscopicamente é evidente uma estrutura planar com composição essencialmente biotítica, alguma moscovite e quartzo em percentagem variável. Microscopicamente o carácter granoblástico predomina sobre o lepidoblástico, em consequência da abundância de cristais de biotite subédricos de orientação aleatória mas materializando bandas com uma orientação preferencial, em associação com pequenos cristais automórficos e tabulares de silimanite (Figura 5). Estes aspectos texturais evidenciam a predominância de blastese tardi a pós-cinemática da biotite e da silimanite (Ferreira et al, 2008). A A) B) Figura 5 - A Microfotografia dos micaxistos, com aspectos da textura e composição mineralógica, que evidenciam a predominância de blastese tardi a pós-cinemática (LN); B Microfotografia com pormenor da anterior evidenciando a orientação aleatória da biotite e a sua associação paragenética com a silimanite (LN). Os nódulos de composição calcossilicatada poderão corresponder a estratos metagrauváquicos com muita plagioclase cálcica, metassomatizados no decurso da migmatização ou eventualmente rochas de composição carbonatada. A textura granoblástica destes nódulos e a sua mineralogia com pouca biotite, ficando esta concentrada na zona mais em contacto com as fácies migmatítica externa aponta do sentido de um processo metassomático (Figura 6). Figura 6 - Microfotografias da parte central dos núcleos calcossilicatados com texturas granoblásticas e ricos em quartzo, anfíbola (horneblenda) plagioclase e alguma granada, opacos e esfena. 30