Redução do ph do Solo e Produtividade da Cultura do Mirtilo Submetida à Adubação Nitrogenada Leonardo Oliboni do Amaral 1 ; Elaine Damiani Conte 2 ; Endrigo Soares Golin 3 ; Diego da Rocha Cavalleti 4 ; Lucas de Ross Marchioretto 5 1 Universidade do Estado de Santa Catarina CAV/UDESC, loamaral@ucs.br; 2 Universidade de Caxias do Sul UCS, edconte@ucs.br; 3 Pomar Blueberry Pequenas frutas, esgolin@hotmail.com; 4 Universidade de Caxias do Sul UCS, drcavalleti@ucs.br; 5 Universidade do Estado de Santa Catarina CAV/UDESC, lucasdeross@hotmail.com Resumo: O cultivo de pequenas frutas vem se destacando como atividade de importância econômica na região sul do Brasil. Com grande potencial, a cultura do mirtilo chama a atenção de produtores, devido à possibilidade de alto retorno econômico e de consumidores sobretudo pelas propriedades nutracêuticas da fruta. No entanto, há uma carência de informações técnicas, sobre vários aspectos de produção, visando principalmente a adaptação do manejo nutricional às condições edafoclimáticas locais da região de Vacaria/RS. O trabalho teve como objetivo avaliar os efeitos da adubação nitrogenada na cultura do mirtilo após três anos consecutivos de aplicação dos tratamentos, com diferentes doses e fontes de nitrogênio. O experimento foi conduzido em um pomar comercial localizado no município de Vacaria, RS, sendo utilizada a cultivar Bluecrop. Os tratamentos consistiram na aplicação de nitrogênio nas doses de 0, 50, 100 e 150 kg por hectare, em cobertura. Como fontes do nutriente, comparou-se o uso de ureia e sulfato de amônio, nas doses supracitadas. Avaliou-se o ph e a saturação de alumínio do solo e os efeitos na produtividade da cultura. Verificou-se que doses crescentes de nitrogênio reduzem o ph, aumentando a saturação por alumínio do solo, sobretudo com utilização de sulfato de amônio como fonte do nutriente e que essas alterações resultam em queda da produtividade da cultura do mirtilo. Palavras chave: nitrogênio; pequenas frutas; Vaccinium corymbosum INTRODUÇÃO A cultura do mirtilo encontra-se em fase de desenvolvimento no Brasil. O manejo nutricional praticado atualmente é baseado nas recomendações de outros países onde a cultura possui maior expressão e já se encontra adaptada às condições edafoclimáticas. Estas por sua vez, diferem das encontradas nas regiões de cultivo brasileiras e podem estar exercendo influência nas necessidades nutricionais das plantas e consequentemente na produtividade e qualidade dos frutos. Devido a sua distinta exigência nutricional, muitas práticas de adubação que são comuns à maioria das espécies frutíferas não são indicadas para o mirtilo. (FREIRE, 2006). Isso se deve em parte à origem da planta, que nos remete a locais de solos ácidos onde os níveis de muitos nutrientes se mantém baixos. Portanto, o mirtilo requer pouca fertilidade, tornando seu manejo nutricional específico e diferenciado. (PARRA, 2007). Em seu habitat natural, o mirtilo do tipo highbush (Vaccinium corymbosum) tolera relativamente bem níveis elevados de alumínio (Al), ferro (Fe) e manganês (Mn). A maioria dos solos de locais de ocorrência natural dessa espécie são de ph baixo, textura francoarenosa, baixa fertilidade natural e teor de matéria orgânica elevado, onde os metais antes 1
citados encontram-se complexados. (SILVEIRA et al., 2016). Esta complexação por sua vez, está relacionada com a presença de micorrizas específicas, as quais além de promover maior eficiência na absorção de nitrogênio e fósforo, conferem tolerância aos metais pesados, impedindo a absorção e translocação para a parte aérea das plantas. Após alguns anos desde a introdução da cultura no país, verificou-se que as plantas apresentavam crescimento lento e até morte. Posteriormente constatou-se que o ph naturalmente ácido dos Argissolos, com teores elevados de Al, Mn e Fe tóxicos, associado à não ocorrência de micorrizas para complexação destes metais podem estar contribuindo para o desempenho insuficiente nas condições de cultivo até então empregadas. (SILVEIRA et al., 2016). Devido à estas constatações, foram sugeridas medidas à curto prazo, sendo a principal delas, a correção do ph para 5,5 na implantação de pomares novos e incorporação de calcário na reposição do mulching em pomares já estabelecidos. Esta modificação no ph de referência para a cultura do mirtilo foi incluída na nova edição do Manual de Adubação e Calagem para o RS e SC (CQFS-RS, 2016). Nesse contexto, um fator extremamente importante a ser considerado é de que a adubação de reposição na cultura, especialmente a nitrogenada, pode reduzir ainda mais o ph do solo, aumentando a disponibilidade de elementos tóxicos às plantas, reduzindo o potencial produtivo da cultura. Este trabalho teve como objetivo investigar os efeitos de doses e fontes de N nas características de solo e a influência desta condição na produtividade da cultura do mirtileiro. MATERIAIS E MÉTODOS O experimento foi conduzido em um pomar comercial, na empresa Blueberry Mudas e Sementes Ltda, que está localizada no município de Vacaria/RS, sob as coordenadas geográficas latitude sul 28 26 30, longitude oeste 50 56 35 e altitude de 907 metros. A cultivar escolhida para o ensaio foi a Bluecrop, a qual tem apresentado boa adaptação às condições de clima local. O solo onde foi instalado o experimento apresentava as seguintes características químicas: ph 4,8; índice SMP 4,4; MO 11,6%, Ca 5,7 comol c.dm -3 ; Mg 2,0 comol c.dm -3 ; Al 1,7 comol c.dm -3 ; H+Al 27,4 comol c.dm -3 ; CTCefetiva 10 comol c.dm -3 ; CTCpH7,0 35,7 comol c.dm -3, saturação Al 17%; saturação bases 23,1%; P 22,9 mg.dm -3 S 28,7 mg.dm -3 e K 220 mg.dm -3. Os tratamentos foram aplicados na mesma área experimental por três anos consecutivos, com início em 2014 e repetições em 2015 e 2016, para observação do comportamento produtivo das plantas de mirtilo submetidas às aplicações consecutivas de N. O experimento foi alocado em parcelões, utilizando-se oito filas do pomar, totalizando 0,19 ha. As filas possuem 100 metros de comprimento, foram divididas em quatro repetições de 25 metros, sendo que foram desconsideradas bordaduras de 2 metros entre cada repetição. As adubações de manutenção e reposição foram realizadas através da fertirrigação, exceto a adubação nitrogenada nos tratamentos, a qual seguiu conforme os mesmos. Os tratamentos consistiram na aplicação em cobertura, de duas fontes de N: ureia e sulfato de amônio, nas doses de 50, 100 e 150 kg ha -1 para cada fonte, além de testemunha, a qual não recebeu adubação nitrogenada. O momento de aplicação dos fertilizantes nitrogenados se deu em duas etapas, com a metade das doses em cada uma delas. A primeira aplicação foi feita por ocasião da abertura das gemas florais, e a segunda 30 dias após a primeira. (CQFS - RS/SC, 2004). 2
Foram selecionadas aleatoriamente três plantas dentro da parcela para compor a repetição, de onde foram coletados frutos e amostras de solo na profundidade de 0-20 cm para análise. Compararam-se os resultados de ph e saturação por Al do solo e seus efeitos na produtividade de frutos (Kg ha -1 ). Os resultados das avaliações foram submetidos à análise de variância (p 0,05) e, nos casos de significância, os efeitos de doses foram comparados pela análise de regressão e de fontes (ureia x sulfato de amônio) pelo teste F (p 0,05), com uso do Sistema de Análise Estatística-WinStat. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados demonstram uma redução nos valores de ph com o aumento das doses de nitrogênio aplicadas no solo conforme a Figura 1a. Já a saturação de Al do solo teve aumento com o incremento nas doses de N (Figura 1b). De acordo com Malavolta (2006), quando a percentagem de saturação por Al passa de 20% pode ser considerada prejudicial, sendo que valores acima de 45% são altamente danosos às plantas. Os resultados obtidos com o experimento demonstram que apenas no tratamento sem aplicação de adubação nitrogenada (testemunha), a saturação de Al ficou abaixo de 20%, chegando a 40% na maior dose de N aplicada (150 Kg ha -1 ). Figura 1 ph (a) e saturação por Al do solo (b) em função das diferentes doses de N aplicadas em cobertura. Vacaria RS, 2016. a) b) Quando comparadas as fontes de N, o uso de sulfato de amônio proporcionou maior queda do ph, elevando mais acentuadamente a saturação por Al do solo em relação à ureia (Tabela 1): Tabela 1 ph e saturação por Al do solo em função das fontes de N aplicadas. Vacaria-RS, 2016 Fontes ph (H2O) Sat. Al (%) Ureia 4,55a 22,26b Sulfato de Amônio 4,18b 38,62a CV (%) 5,60 47,78 Médias seguidas pela mesma letra, na coluna, não diferem entre si pelo teste F (p<0,05). A produtividade de frutos por hectare foi influenciada de forma negativa conforme o aumento das doses de nitrogênio aplicadas em cobertura (Figura 2). Já na comparação 3
das fontes de nitrogênio utilizadas (ureia e sulfato de amônio), não foi observado efeito significativo com análise de variância (p<0,05) para a variável analisada. Figura 2 Produtividade por hectare em função das doses de nitrogênio aplicadas em cobertura. Vacaria RS, 2016. A redução de produtividade com as aplicações de N já havia sido observada no segundo ano de realização do experimento. Em estudo semelhante testando as mesmas doses de N no estabelecimento da cultura, Bañados et al. (2012) apontaram a dose de 50 Kg ha -1 de N como a que obteve maior produção de frutos para sua condição de solo. O efeito negativo na produtividade, em todas as doses utilizadas neste experimento, pode ser resultado do ph inicial do solo mais baixo, da maior acidez potencial e dos teores elevados de Al em relação ao trabalho mencionado. CONCLUSÕES A redução no ph e aumento na saturação de Al provocadas pela aplicação de nitrogênio no solo reduziram a produtividade da cultura do mirtilo. Estudos sobre faixas ideais de ph e métodos de correção das áreas já existentes precisam ser realizados para aumentar o potencial produtivo da cultura na região sul do Brasil. AGRADECIMENTOS À Universidade de Caxias do Sul e à empresa Blueberry Mudas e Sementes Ltda. pela disponibilização do local e estrutura para condução do experimento. REFERÊNCIAS BAÑADOS, M. P; STRIK, B. C; BRYLA, D. R; RIGHETTI, T. L. Response of Highbush Blueberry to Nitrogen Fertilizer During Field Establishment, I: Accumulationand Allocation of Fertilizer Nitrogen and Biomass. In: Hortscience. v. 47(5). Maio 2012. 648-655. COMISSÃO DE QUÍMICA E FERTILIDADE DO SOLO (CQFS) - RS/SC. Manual de adubação e de calagem para os Estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. 10. ed. Porto Alegre, 2004. 394 p. COMISSÃO DE QUÍMICA E FERTILIDADE DO SOLO (CQFS) - RS/SC. Manual de adubação e de calagem para os Estados do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. 11. ed. Porto Alegre, 2016. 212 p. 4
FREIRE, C. J. S. Nutrição e adubação para o mirtilo In: ANTUNES, L.E.C; RASEIRA, M. C.B. Cultivo do Mirtilo (Vaccinium spp). Pelotas: Embrapa Clima Temperado, 2006. 99 p. 60-74 (Sistemas de Produção 8). MALAVOLTA, E. Manual de nutrição mineral de plantas. São Paulo: Editora Agronômica Ceres, 2006. 638p. PARRA, I. V. Fertirrigación de arándanos. In: Seminário Brasileiro Sobre Pequenas Frutas, 4, 2007, Vacaria. Anais... Bento Gonçalves: Embrapa Uva e Vinho, 2007. 71 p. 23-28 (Embrapa Uva e Vinho. Documentos, 59). SILVEIRA, C. A. P.; MARTINAZZO, R.; ARAÚJO, V. F. Considerações sobre recomendação de adubação, uso racional de nutrientes e implicações no manejo da adubação das culturas do morango e mirtilo. In: Anais. VII Encontro Sobre Pequenas Frutas e Frutas Nativas do Mercosul Palestras e resumos, Pelotas. 2016. 414-416p. 5