O SISTEMA VOCÁLICO PRETÔNICO DO TRIÂNGULO MINEIRO ENFOQUE SOBRE AS CIDADES DE COROMANDEL E MONTE CARMELO

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Transcrição:

PIBIC-UFU, CNPq & FAPEMIG Universidade Federal de Uberlândia Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação DIRETORIA DE PESQUISA O SISTEMA VOCÁLICO PRETÔNICO DO TRIÂNGULO MINEIRO ENFOQUE SOBRE AS CIDADES DE COROMANDEL E MONTE CARMELO Fernanda Alvarenga Rezende 1 Universidade Federal de Uberlândia Av. João Naves de Ávila, 2121 - Campus Santa Mônica. Uberlândia-MG. CEP 38408-100. E-mail: fernanda.1608@yahoo.com.br José Sueli de Magalhães 2 E-mail: mgsjose@gmail.com Resumo: O objetivo desse artigo é apresentar o que tem sido feito até o momento com relação aos estudos sobre o sistema vocálico pretônico nos municípios de Coromandel e Monte Carmelo, com destaque aos processos fonológicos que ocorrem com as vogais médias altas /e/ e /o/ na posição pretônica, tais como: a elevação, a harmonização, a redução vocálica e a neutralização. Desse modo, utilizamos a fala espontânea dos habitantes de Coromandel e Monte Carmelo, duas cidades do Alto Paranaíba, região que faz parte do Triângulo Mineiro, no estado de Minas Gerais. Palavras-chave: Processos fonológicos; vogais pretônicas; elevação. 1. INTRODUÇÃO Os estudos de Câmara Jr. (1970) sobre o sistema vocálico do Português Brasileiro (PB), mais especificamente sobre o dialeto do Rio de Janeiro, contribuíram bastante para mostrar que a língua oral não é tão simples quanto parece no que se refere ao uso das cinco vogais latinas a, e, i, o, u da escrita. Segundo o autor, na verdade, existem sete vogais distribuídas em muitos alofones, que são as variantes de um fonema. Então, além das cinco vogais já mencionadas, na posição tônica existem também: /é/ (de Eva) e /ó/ (de tijolos). Câmara Jr. (1970) as classifica da seguinte forma: Tabela 1: Quadro das vogais do PB, segundo Câmara Jr. (1970). Anterior Central Posterior Alta /i/ /u/ Média /e/ /o/ alta Média baixa /é/ /ó/ Baixa /a/ No entanto, se na posição tônica, são sete as vogais utilizadas, nas posições pretônica e átona final ocorre uma redução no sistema vocálico. Na posição pretônica, com a redução das vogais médias baixas (/é/ e /ó/), as vogais passam a cinco (/i/; /e/; /a/; /o/; /u/). Mas é na posição de 1 Acadêmica do curso de Letras da Universidade Federal de Uberlândia. 2 Orientador.

sílaba átona final que ocorre a maior redução das vogais, restando apenas três (/i/; /a/; /u/), visto que as vogais médias altas (/e/ e /o/) cedem seu lugar às vogais altas (/i/ e /u/). O que ocorreu com as vogais na posição pretônica foi um processo fonológico denominado neutralização, que é a perda da capacidade distintiva entre dois fonemas num determinado contexto. Além desse processo, existe outro conhecido como redução vocálica, que ocorre no sistema vocálico do português com as vogais na posição átona final. Desse modo, conforme vimos, na posição átona, as vogais no português sofrem uma drástica redução, passando de sete na posição tônica para apenas três na posição átona final (/i/; /a/; /u/). Por isso, temos, por exemplo: surdu-mudu para surdo-mudo e penti para pente. Quanto à neutralização, para Câmara Jr. (1970, p.43), ela ocorre quando: [...] mais de uma oposição desaparece ou se suprime, ficando para cada uma um fonema em vez de dois. Assim, um bom exemplo desse processo são as vogais médias (/e/; /é/; /o/; /ó/), uma vez que na posição pretônica /é/ e /ó/ não se realizam mais, restando apenas /e/ e /o/ para essa posição. No entanto, é importante ressaltar que a não realização das vogais médias baixas na posição pretônica não implica no seu desaparecimento do dialeto do Português Brasileiro. Isso porque, segundo Callou e Leite (1996), a neutralização entre as vogais médias altas e as médias baixas é um dos fatores que diferenciam não só os falares brasileiros, mas também o português do Brasil do português de Portugal. As autoras destacam ainda o fato de que os falantes do Norte do Brasil optam pela realização aberta das vogais, enquanto que os falantes do Sul as realizam como fechadas. Por isso, podemos encontrar palavras como b/é/leza e b/e/leza; c/ó/ruja e c/o/ruja, sem que essas duas formas prejudiquem a compreensão dos vocábulos. Já Collischonn (2006) entende a realização da vogal média baixa na posição pretônica como um processo de abaixamento da vogal, ou seja, nos dialetos do Norte o traço de altura da vogal é abaixado (/e/ [é]); /o/ [ó]). Contudo, Collischonn (2006) considera que os estudos acerca do abaixamento da vogal pretônica nos falares das regiões Norte e Centro-Oeste do Brasil são insuficientes, mas afirma que a elevação das vogais médias é um assunto que vem sendo bem desenvolvido em diversas regiões do país. Para Viegas (1987), a variação das vogais na posição pretônica é um processo originado do latim e na literatura é visto como uma das características que diferem o português brasileiro do português europeu (Câmara Jr. (1976), entre outros). Desse modo, Labov (1972: cap.8) argumenta que o estudo dos ambientes favoráveis e desfavoráveis para a ocorrência das variações, leva à formação de regras variáveis. Assim, é possível dizer algo em um mesmo contexto de maneiras diferentes. Segundo esse raciocínio, em seus estudos sobre o dialeto mineiro, Viegas (1987) observou que a elevação do traço de altura das vogais médias pretônicas é um fenômeno variável, isto é, algumas vezes tem-se a vogal média e outras vezes tem-se a vogal alta, como em: meninge ; comício ; minino ; cumida. Diante disso, a autora verificou que os contextos de alçamento de /e/ e de /o/ são diferentes. Por isso, Viegas (1987) analisou tanto as variantes estruturais (regras), como as não-estruturais (estilos de fala, por exemplo) que favorecem a elevação de cada vogal, separando a vogal média posterior (/o/) da vogal média anterior (/e/). Com relação ao alçamento vocálico, muitos estudos apontam que a variação /e/ [i] e /o/ [u] é um processo que eleva a vogal média na posição pretônica, devido à presença de uma vogal alta na sílaba tônica, por exemplo, c[u]ruja por coruja; m[i]nino por menino. É o que Bisol (1981) denomina de harmonização vocálica. De acordo com a autora, esse processo ocorre porque as vogais médias na posição pretônica assimilam o traço [+alto] da vogal alta da sílaba seguinte. A harmonização vocálica pode ser entendida como um processo em que o traço da vogal alta tônica /i/ se estende até a vogal média da pretônica /e/ em formas como: bebida, ferida, feliz, apelido, fazendo com que essas palavras tenham outra forma possível: b[i]bida, f[i]rida, f[i]liz e ap[i]lido, respectivamente. 2

3 Collischonn (2006) verificou ainda que a harmonia pode atingir mais de uma vogal, como ocorre em mexerico>mex[i]rico>m[i]x[i]rico. No entanto, esse processo não ultrapassa uma fronteira de palavra, logo, não atinge nenhuma vogal que esteja em outros vocábulos; como podemos perceber nos exemplos abaixo. (1) Bloqueio do alçamento vocálico Semi-intensivo *s[i]mi-intensivo; nesse caso, a vogal /e/ não alça, por não estar na mesma palavra que a vogal tônica alta /i/. Dedo-duro *d[i]do-duro, assim como ocorreu com semi-intensivo, a elevação aqui não acontece pelo fato de a vogal tônica alta estar em outro vocábulo. (2) Alçamento vocálico Queria qu[i]ria; nesse caso, a elevação de /e/ [i] ocorre porque tanto a vogal média pretônica quanto a vogal alta tônica estão na mesma palavra. Bonito b[u]nito, o alçamento de /o/ [u] ocorre devido às vogais envolvidas na elevação estarem no mesmo vocábulo. Até o presente momento, entendeu-se o alçamento da vogal média pretônica por meio da harmonia vocálica, porém, existem casos em que a elevação ocorre mesmo sem a presença de uma vogal alta na sílaba tônica, como em: pess[u]al por pessoal; [i]stava por estava; m[u]eda por moeda. Em meio a isso, Viegas (1987) percebeu que com relação ao alçamento, além da harmonia vocálica, havia uma segunda proposta de regra: o enfraquecimento da vogal por assimilação dos traços consonantais adjacentes. Assim, depois de analisar o dialeto de Belo Horizonte, a autora percebeu que um fator favorecedor para a elevação de /o/ [u] são as consoantes que antecedem e sucedem a vogal alçada, como as fricativas (/f/; /v/; /s/; /z/; /ch/ 3 ; /j/ 4 ), as oclusivas (/p/; /b/; /t/; /k/; /g/), a palatal (/lh/ 5 ) e as nasais (/m/; /n/). Com relação ao alçamento de /e/ [i], Viegas (1987) concluiu que a harmonia vocálica é o principal fator que favorece a elevação da vogal pretônica. Isso porque na maioria das vezes o alçamento ocorreu devido à presença de uma vogal alta na sílaba tônica, como em: m[i]ntira ; c[u]mida. Collischonn (2006) também concluiu que a vogal tônica alta contribui bastante para o alçamento da vogal média pretônica, mas a autora ressalta ainda que há outros fatores de menor importância que favorecem a elevação. É o caso das consoantes adjacentes (/p/; /b/; /f/; /v/; /m/; /k/; /g/), que provocam a elevação de /o/ e (/s/; /z/), que colaboram para o alçamento de /e/. Bisol (1981) também obtém esses resultados ao estudar o dialeto do Rio Grande do Sul. Segundo a autora, a elevação de /e/ [i] é favorecida por uma consoante nasal precedente, uma velar precedente ou seguinte e por uma consoante palatal seguinte. No caso de /o/ [u], favorecem o alçamento uma consoante labial precedente ou seguinte e uma velar precedente. 2. MATERIAIS E MÉTODOS Este trabalho foi dividido da seguinte forma: primeiramente, realizamos a leitura de textos sobre o sistema fonológico do Português Brasileiro, em especial àqueles que tratam do sistema vocálico. Enfocamos, nessas leituras, especialmente os processos fonológicos envolvendo as vogais pretônicas, quais sejam: a redução vocálica, a neutralização e o alçamento. 3 /ch/ de /ch/over, por exemplo. 4 /j/ de /J/oaquim. 5 /lh/ de esco/lh/ido.

4 Feito isso, partimos para a coleta dos dados nos municípios de Coromandel e Monte Carmelo. De posse desses dados, eles estão sendo transcritos, para depois serem codificados e analisados com a ajuda do programa GOLDVARB. Por fim, depois de concluídas todas essas etapas, os resultados serão interpretados. 2.1. Coleta dos Dados Para a obtenção dos dados dessa pesquisa foram entrevistadas 18 pessoas, sendo 9 homens e 9 mulheres, moradores das cidades de Coromandel, que conta com uma área de aproximadamente 3296,27 km² e cerca de 27.392 habitantes, está a 477 km de Belo Horizonte e a 170 km de Uberlândia; e Monte Carmelo, cuja área corresponde a 1.354 km² e conta com aproximadamente 44.367 habitantes, está a 486 km de Belo Horizonte e a 120 km de Uberlândia. A coleta de dados realizou-se em duas etapas. A primeira ocorreu no período de junho a setembro de 2008 e a segunda, em janeiro de 2009. Devido ao aumento no tempo das entrevistas, que passaram de dez minutos para meia hora, as entrevistas com os informantes de Monte Carmelo precisaram ser refeitas, por isso, houve uma segunda etapa. Como as entrevistas foram gravadas, para chegarmos ao vernáculo, estilo de fala ao qual o falante não dá atenção ao modo como as palavras são pronunciadas, utilizamos um roteiro de perguntas, com o objetivo de desinibir o entrevistado para que ele não se preocupasse com a sua maneira de se expressar, mas apenas com o conteúdo de sua fala. Conforme Tarallo (1994), esse roteiro de perguntas deve levar o informante a narrar experiências pessoais, pois, nesse caso, ele estará envolvido emocionalmente com o assunto e não se preocupará com a forma que fala. Desse modo, esse roteiro continha 73 perguntas sobre os mais diversos assuntos, como: infância, tempo de escola, atividades profissionais, lazer, entre outros, que são temas relacionados à cidade e ao dia-a-dia do entrevistado. 3. SELEÇÃO DAS VARIÁVEIS 3.1. Variável Dependente A variável linguística dependente são as vogais médias altas /e/ e /o/ na posição pretônica. Para a vogal pretônica /e/, há três variantes: (1) para a realização de /e/: (al/e/gria); (2) para a realização de /é/: (al/é/gria); e (3) para a realização de /i/: (al/i/gria). Para a vogal pretônica /o/ também temos três variantes: (4) para a realização de /o/: (c/o/ruja); (5) para a realização de /ó/: (c/ó/ruja); e (6) para a realização de /u/: (c/u/ruja). 3.2. Variáveis Independentes Determinamos dez variáveis independentes, em que sete são linguísticas e três extralinguísticas. 3.2.1. Variáveis Linguísticas Contexto Precedente Por meio dessa variável, pretende-se identificar se uma consoante (menino, domingo), uma vogal (maioria, poesia) ou uma pausa (#estava) favorece ou desfavorece o alçamento de /e/ [i] e de /o/ [u]. Além disso, o contexto precedente leva em consideração o modo de articulação e o ponto de articulação do segmento que antecede a vogal alçada. Quanto ao modo de articulação, os segmentos precedentes foram divididos em: nasais (menino; notícia), oclusivos (pequeno; bonito), fricativos (vestido; formiga), lateral (leão), vibrante (precisa; procura), africada (demais), pausa (#estava).

5 Quanto ao ponto de articulação, os segmentos precedentes foram assim divididos: velares (queria; começam), alveolar (domingo), labiais (pequeno; bonito), palatal (demais), lábio-dentais (vestido; formiga), pós-alveolar (José). Contexto Seguinte Assim como ocorreu com o contexto precedente, por meio dessa variável pretende-se verificar se uma consoante (então; bonito) ou uma vogal (moeda; pessoal) influenciam ou não o alçamento de /e/ [i] e de /o/ [u]. Quanto ao modo de articulação, os segmentos seguintes foram divididos em: nasal (emprego; começam), oclusivos (pequeno; fogão), fricativos (prefiro; governo), lateral (melhora; escolhido), tepe (queria; aposentadoria), africados (acredito; botina), vogal baixa (cadeado; pessoal). Quanto ao ponto de articulação, os segmentos seguintes foram assim divididos: velar (serviço; corria), alveolares (dezesseis; possível), labial (debaixo; sobrinha), palatal (nenhum; conheço), lábio-dentais (prefiro; governo), pós-alveolar (Alexandre). Especificação da Vogal Tônica Conforme Bisol (1981), as vogais [i] e [u] em posição tônica influenciam o alçamento da pretônica. Desse modo, por meio dessa variável pretende-se verificar se apenas as vogais altas atuam na elevação das vogais pretônicas ou se as demais também exercem alguma influência sobre o alçamento. Por isso, as vogais foram divididas quanto a altura (altas /i, u/; médias-altas /e,o/; médiasbaixas /é, ó/ e baixa /a/), quanto a posição (anteriores /é, e, i/; central /a/ e posteriores /ó, o, u/) e quanto a nasalidade (orais e nasais). Distância da Sílaba Tônica Conforme Viana (2008), com essa variável pretende-se verificar se a quantidade de sílabas que há entre a sílaba pretônica e a tônica favorece ou não a elevação das pretônicas. Assim, estabelecemos quatro distâncias entre a vogal tônica e a vogal pretônica: distância zero (estuda; costura); distância de uma sílaba (expressar; cochilar); distância de duas sílabas (precisaria; movimentado) e distância de mais de duas sílabas (escandalosamente; possibilidade). Distância do Início da Palavra O objetivo dessa variável é identificar se o número de sílabas que existe entre a sílaba pretônica e o início da palavra exercem ou não alguma influência sobre o alçamento das vogais pretônicas. Nesse caso, também estabelecemos quatro distâncias: distância zero (#menino; #está); distância de uma sílaba (sobrecarregada; pessoal); distância de duas sílabas (desacostumado) e distância de mais de duas sílabas (sorridentemente). Tipo de Sílaba Por meio dessa variável pretende-se verificar qual tipo de sílaba mais influencia o alçamento das vogais pretônicas ou se ambos o fazem. Para isso, dividimos as sílabas em dois tipos: a sílaba aberta (formada por consoante-vogal), exemplo: futebol e a sílaba fechada (constituída por consoante-vogal-consoante ou consoante-vogal-nasal), exemplos: costume; comprida, respectivamente. Quantidade de Sílabas da Palavra Com essa variável pretende-se identificar se a quantidade de sílabas da palavra é um fator que contribui ou inibe a elevação das vogais pretônicas. Desse modo, estabelecemos quatro índices quantitativos: palavras com duas sílabas (estou; chover); palavras com três sílabas (ensino; começo); palavras com quatro sílabas (descrédito; política); palavras com mais de quatro sílabas (Aparecida; diretoria).

6 3.3. Variáveis Extralinguísticas As variáveis extralinguísticas estudadas foram as seguintes: Sexo: Masculino; Feminino. Faixa etária: Entre 15 e 25 anos; Entre 26 e 49 anos; Com 50 anos ou mais. Escolaridade: Entre 0 e 8 anos de estudo (ensino primário e fundamental); Entre 9 e 11 anos de estudo (ensino médio); Entre 12 anos ou mais de estudo (ensino superior). 4. RESULTADOS Quanto às variáveis extralinguísticas, um fator que parece influenciar o alçamento é o grau de escolaridade. Nas entrevistas transcritas até agora, notamos que quanto mais estudo o entrevistado possui, menos alçamentos ele realiza, o que contrasta com a fala dos informantes com um tempo menor de estudo. Na fala dos entrevistados com menor grau de escolaridade, a elevação das vogais pretônicas tem ocorrido com maior frequência. De um modo geral, não houve ainda nenhuma ocorrência inesperada, o que chamou a atenção, especialmente com os informantes de Coromandel, foi a alternância na elevação /e/ [i] e /o/ [u] em algumas palavras cujo fenômeno seria esperado, como em: querido e possível, ou seja, ora essas palavras alçam, ora permanecem sem nenhuma modificação. Com relação aos informantes de Monte Carmelo, um fato curioso ocorreu assiduamente na fala de um dos entrevistados. Isso porque o falante, geralmente, diferencia Senhor (Deus) de senhor (homem com mais idade), alçando apenas o segundo termo senhor s[i]nhor - e mantendo o Senhor (Deus) sem qualquer alteração. Acreditamos que essa diferenciação pode ter relação com o fato desse informante de Monte Carmelo ser evangélico. 5. CONCLUSÃO Devido ao fato desse trabalho estar em andamento, os resultados ainda são incipientes. Cremos, no entanto, que resultados mais significativos serão obtidos após ser feito o tratamento estatístico pelo programa GOLDVARB. No momento, estão sendo feitas as transcrições dos dados coletados nos municípios de Coromandel e Monte Carmelo, para, posteriormente, eles serem codificados e analisados pelo programa mencionado. 6. AGRADECIMENTOS Ao professor José Sueli de Magalhães pela dedicação e confiança que depositou em mim durante todo esse trabalho. À Universidade Federal de Uberlândia (UFU) pelo apoio financeiro concedido a essa pesquisa. Aos meus informantes, principalmente, os de Monte Carmelo, onde realizei duas etapas de entrevistas, pela enorme colaboração, paciência e carinho com que me receberam. À minha família, meu pai Marcus, minha mãe Lindeia e meu irmão Júnior, pelo amor, apoio e compreensão em todos os momentos.

7 À amiga Cíntia Aparecida de Sousa, por ter compartilhado comigo seus conhecimentos e por sua ajuda sempre que precisei. À amiga Danielle Stephane Ramos, pela grande colaboração nos assuntos ligados a Iniciação Científica. E a todos que direta ou indiretamente colaboraram para a realização desse estudo. 7. REFERÊNCIAS Bisol, L. Harmonização Vocálica: uma regra variável. Tese (Doutorado em Linguística) - Universidade Federal do Rio de Janeiro, 1981. 335 p. Callou, D; Moraes, J. e Leite, Y. O Vocalismo do Português do Brasil. In: Letras de Hoje, Porto Alegre, v.31, n. 2, p. 27-40, junho1996. Câmara Jr, J. M. Estrutura da Língua Portuguesa. 10ª Edição. Petrópolis: Vozes, 1970. 124p. Collischonn, G. Fonologia do português brasileiro, da sílaba à frase. Porto Alegre: Gráfica UFRGS, 2006/2. 114 p. Labov, W. Sociolinguistic Patterns. University of Pennsylvania Press, Philadelphia, 1972. Tarallo, F. A Pesquisa Sociolingüística. 4ª Edição. Série Princípios, São Paulo: Ática, 1994. 96 p. Viana, V. F. As vogais médias pretônicas em Pará de Minas: um caso de variação lingüística. Dissertação (Mestrado em Lingüística e Língua Portuguesa) Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, 2008. 146p. Viegas, M. C. Alçamento de vogais médias pretônicas: uma abordagem sociolingüística. Dissertação (Mestrado em Lingüística) Universidade Federal de Minas Gerais, 1987. 231p. <http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>,acesso em 22/01/2009. PRE-STRESSED VOWEL SYSTEM OF TRIÂNGULO MINEIRO FOCUSING THE CITIES OF COROMANDEL AND MONTE CARMELO Fernanda Alvarenga Rezende Federal University of Uberlândia 2121, João Naves de Ávila Avenue. Campus Santa Mônica, Santa Mônica District. E-mail: fernanda.1608@yahoo.com.br. José Sueli de Magalhães Federal University of Uberlândia 2121, João Naves de Ávila Avenue. Campus Santa Mônica, Santa Mônica District. E-mail: mgsjose@gmail.com. Abstract: This paper aims at presenting what have been done to the moment regarding studies on the pre-stressed vowel system in the cities of Coromandel and Monte Carmelo. The phonologic processes that occur with mid front vowels /e/ and /o/ in the pre-stressed position, such as raising, harmony, reduction and neutralization are evidenced. This way, we use the spontaneous speech of Coromandel and Monte Carmelo s inhabitants, two cities located in Alto Paranaíba, Triângulo Mineiro - Minas Gerais. Keywords: Phonologic processes; pre-stressed vowels; raising.