PREVISÃO PROBABILÍSTICA DE PRECIPITAÇÃO PARA O RIO DE JANEIRO Gisele dos Santos Alves gisele@acd.ufrj.br Maria Gertrudes Alvarez Justi da Silva justi@acd.ufrj.br Isimar de Azevedo Santos isimar@acd.ufrj.br Mônica Carneiro Alves Xavier monica06@acd..ufrj.br Universidade Federal do Rio de Janeiro CCMN - IGEO - Departamento de Meteorologia Cidade Universitária - Ilha do Fundão Rio de Janeiro - RJ RESUMO Ainda não são plenamente satisfatórias as previsões de precipitação efetuadas por modelos numéricos. Por outro lado, a previsão de algumas variáveis dinâmicas e termodinâmicas da atmosfera efetuadas por estes modelos têm demonstrado um alto grau de precisão. Vários serviços operacionais internacionais têm recorrido ao uso de relações estatísticas para aumentar o grau de confiabilidade de suas previsões de precipitação. Para tanto, usam o estabelecimento de equações de regressão linear múltipla onde a precipitação entra como preditando e as variáveis dinâmicas e termodinâmicas dos modelos numéricos são testadas como preditoras. Neste trabalho estão relatados os primeiros resultados obtidos no estabelecimento de tais relações empíricas na determinação da previsão da probabilidade de ocorrência de precipitação no município do Rio de Janeiro. ABSTRACT Predictions of precipitation made by numerical models are nor yet plenty satisfactory, although the prognostic of several dynamical and thermodynamical atmospheric variables made by those same models has demonstrated high degree of precision. Several operational services around the world has used statistical relationships to elevate the degree of confidence of their precipitation forecasts. They establish multi-linear regression equations where the precipitation is the predictand and the dynamical and thermodynamical variables produced by numerical models are tested as predictors. In the present work, some initial results obtained in establishing such empirical relationships to determine the precipitation occurrence probability in Rio de Janeiro city are presented.. INTRODUÇÃO A precipitação é um dos mais importantes elementos do tempo para as atividades econômicas e de planejamento no Rio de Janeiro. Somente a partir de 994, com a implementação operacional das previsões numéricas pelo CPTEC/INPE, previsões quantitativas de precipitação têm sido disponibilizadas para diversas localidades do país. A precipitação tem características intermitentes e de grande variabilidade no espaço e no tempo. Tanto a topografia local como as demais condições do meio ambiente desempenham um importante papel na distribuição da precipitação. Por estas razões, uma previsão direta de quantidade de precipitação, ou mesmo a probabilidade de sua ocorrência, feita através de modelos numéricos ainda é difícil, particularmente para a região tropical (Kumar et al, 999). Para superar tais dificuldades, pode-se estabelecer relações empíricas entre a precipitação ocorrida e as condições dinâmicas da circulação e certas quantidades termodinâmicas. Tais interpretações estatísticas (IE) dos produtos dos modelos de previsão numérica do tempo (PNT) possuem a capacidade de levar em conta as características da topografia e do meio ambiente que controlam a precipitação e outras características do tempo. As incertezas envolvidas nas relações entre a circulação e o tempo também podem ser formalmente expressas através de tais IE s. 337
Estes esquemas de IE têm sido classificados em dois tipos, denominados de Método de Prognóstico Perfeito (MPP) e de Estatística de Saída do Modelo (Model Output Statistics - MOS), dependendo se o que é usado é a circulação observada ou a prevista numericamente no estabelecimento das relações empíricas (Glahn, 98). A diferença entre o MPP e o MOS reside na maneira como a equação de IE é desenvolvida. No MPP ela é gerada relacionando a variável de interesse, no caso a precipitação, às variáveis meteorológicas "observadas", no nosso caso às análises do modelo numérico, sem defasagem de tempo, e a previsão é feita substituindo na equação de IE os valores das variáveis meteorológicas previstas, no caso os prognósticos do modelo numérico. O MOS utiliza, para o estabelecimento das equações de IE, os campos de prognóstico e deste modo elimina a influência de um possível erro sistemático existente na modelagem numérica. No entanto, possui a desvantagem de exigir o desenvolvimento de novas equações de IE todas as vezes que o modelo numérico sofrer alterações, além de ser necessário que se possuam séries longas de produtos numéricos para a formação de preditores. Este trabalho detalha os resultados obtidos através do uso do MPP na determinação da probabilidade de ocorrência de precipitação no município do Rio de Janeiro.. MATERIAL E MÉTODOS No presente estudo foi usada a regressão linear múltipla para a construção de modelos que relacionam a probabilidade de ocorrência de precipitação (preditando) com um conjunto de variáveis preditoras escolhidas entre o conjunto de parâmetros dinâmicos e termodinâmicos previstos pelo modelo numérico global do CPTEC/INPE. Resumidamente (Draper e Smith, 98), a regressão linear múltipla busca estabelecer uma relação analítica da variável Y que se deseja prever (preditando ou variável dependente) com outras k variáveis X i, denominadas variáveis independentes ou preditoras. A equação resultante é usada para estimar o preditando através de uma combinação linear das variáveis preditoras. Denotando esta estimativa por Y $, tem-se Y$ = a + b X + b X +... + b X onde a é o termo constante e os b i s são os coeficientes da regressão. Estes valores são determinados de tal modo que a soma dos quadrados dos resíduos seja mínima para uma determinada amostra de tamanho n, ou seja: k k S = ei = ( y j yˆ j) = mínimo A redução da variância RV (ou coeficiente de determinação) é uma medida da qualidade da equação utilizada para estimar Y e é dada por: RV n n ( y j y) ( n j= n j= = n ( y j y) n j= y j yˆ ) j RV é uma medida da explicação da variância de Y dada por Y. O coeficiente de determinação é o quadrado do coeficiente de correlação múltipla: RV R Y X X Xk =..... As variáveis dependentes foram escolhidas pela utilização da técnica de regressão por passos que garante a escolha de um conjunto de preditores através da redução máxima da variância. 337
Os resultados apresentados neste trabalho referem-se à metade do ano que compreende o período de outubro a março, o que poderíamos denominar de metade de verão, separação importante na determinação das variáveis candidatas a preditoras, já que os processos geradores de chuva podem ser diferentes a cada estação do ano. Pela limitação do acervo disponível, o período para o estabelecimento das equações empíricas restringiu-se aos períodos de verão de 97/98 e 98/99. Os dados de precipitação da rede pluviométrica da Fundação GEORIO (http://www.rio.rj.gov.br/georio/alerta) foram usados para o estabelecimento do preditando, através do cálculo da razão entre o número de estações onde foi observada a ocorrência de precipitação e o número de estações da rede consideradas neste estudo (total de ). Muitas das estações da rede da GEORIO estão localizadas próximas a encostas, pois têm a finalidade de monitorar a precipitação nos locais onde ela pode provocar deslizamentos. No caso desta pesquisa, apenas as estações pluviométricas relacionadas na Tabela, localizadas longe das encostas, foram consideradas por estarem instaladas em locais com maior representatividade climatológica (ver referência na Figura ). Tabela - Relação das estações pluviométricas escolhidas entre as da rede da Fundação GEORIO. Estação Referência Long. (W) Lat. (S) Urca 43 0 00 57 0 Ilha do Governador 8 43 36 49 03 Bangu 43 7 55 53 0 Piedade 3 43 8 3 53 8 Saúde 5 43 39 5350 Itanhangá 7 43 8 08 59 54 Guaratiba 0 43 34 40 3 03 08 Anchieta 4 43 4 49 36 Campo Grande 6 43 33 4 54 Sepetiba 7 43 4 4 58 06 Itaúna 30 43 5 9 3 00 33 Figura - Localização dos pluviômetros da rede da Fundação GEORIO. 3373
Os campos meteorológicos previstos pelo CPTEC/INPE em épocas simultâneas foram considerados para a retirada de variáveis candidatas a preditoras. Estes campos constituem-se das análises básicas tais como pressão ao nível do mar, temperatura, componentes zonal e meridional do vento, altura geopotencial, umidade específica e umidade relativa em 000, 850, 700, 500, 00 e 00 hpa. A partir destes campos foram calculados outros campos meteorológicos, obtidos usando relações consagradas, parâmetros estes consideradas como relevantes na determinação das condições propícias à ocorrência de precipitação. Na Tabela estão listadas estas variáveis. Tabela - Conjunto de variáveis usadas como candidatas a preditoras. Variáveis Preditoras Vorticidade relativa em 000 hpa Vorticidade relativa em 850 hpa Variação da temperatura potencial equivalente (diferença vertical 000/700hPa) Divergência de umidade em 000 hpa Umidade relativa em 000 hpa Umidade relativa em 850 hpa Umidade relativa em 700 hpa Umidade relativa media (000/850/700 hpa) Umidade relativa media (000/500 hpa) Temperatura em 000 hpa Temperatura em 850 hpa Temperatura em 700 hpa Temperatura em 500 hpa Componente Zonal (u) do Vento em 850 hpa Componente Meridional (v) do Vento em 850 hpa Componente Zonal (u) do Vento em 500 hpa Componente Meridional (v) do Vento em 500 hpa Cisalhamento do modulo do vento entre 850 e 500 hpa Cisalhamento do modulo do vento entre 850 e 00 hpa Modulo do vento em 850 hpa Modulo do vento em 500 hpa Movimento vertical em 850 hpa Movimento vertical em 500 hpa Índice K Índice Totals Vort Vort8 Dtempot Div Umrl Umrl8 Umrl7 Urmed87 Urmed5 Temp Temp8 Temp7 Temp5 Uvel8 Vvel8 Uvel5 Vvel5 Cis85 Cis8 Mag8 Mag5 Vet8 Vert5 K TT 3. RESULTADOS Foi calculada a matriz de correlação entre todas as variáveis consideradas, tanto o preditando quanto os preditores, para os meses de verão. Naturalmente, a correlação entre a precipitação e as variáveis meteorológicas analisadas deve ser levada em conta no estabelecimento das equações empíricas. Deve-se enfatizar, no entanto que, como algumas dessas variáveis são correlacionadas entre si, nem todas seriam necessárias para o estabelecimento da melhor equação de regressão. Foram testados vários métodos para o ajuste da equação de regressão, entre eles o método da regressão por passos. Os resultados a seguir, obtidos através deste método, evidenciaram como mais importantes a variação da temperatura potencial equivalente na vertical, a temperatura e da umidade nos níveis de 000 e 700 hpa, a média da umidade entre os níveis de 000 e 500 hpa, a vorticidade em 000 hpa e a componente meridional do vento em 850 hpa. Estas variáveis explicam cerca de 50% da variabilidade do preditando, resultado comparável com os de Matsuo (99). É interessante notar que, embora duas variáveis da circulação tenham sido ressaltadas pelo 3374
método, fica evidente a grande importância do controle termodinâmico na probabilidade de ocorrência de precipitação na época do verão. Variáveis selecionadas pelo método da regressão por passos Variáveis Coeficiente da equação Devios-padrões de regressão Dtempot 0,794039 7,67505 Temp 59,45653 4,397 Temp7-35,77477 6,73854 Umrl 9,896 3,695700 UmrlL7-5,496684,8 Urmed5,9440,4634 Vort -,95806,36890 Vvel8,6869,7707 Com: R Múltiplo 0,795 R Quadrado 0,5089 4. CONCLUSÕES E DISCUSSÃO Foi estabelecida uma equação de regressão linear múltipla para a previsão da probabilidade de ocorrência de precipitação no município do Rio de Janeiro para os meses de outubro a março. As variáveis preditoras foram escolhidas entre as variáveis dinâmicas e termodinâmicas disponibilizadas diariamente pelo CPTEC/INPE para a área do Rio de Janeiro. O esforço no estabelecimento de equações empíricas para a previsão probabilística de ocorrência de precipitação se justifica em função da necessidade que a maioria dos usuários tem de saber o grau de certeza nas previsões disponibilizadas rotineiramente, para com isso tomar decisões que levem em conta relações de custo/benefício importantes para as atividades específicas de cada um deles. Além disso as previsões numéricas disponibilizadas ainda possuem uma resolução espacial inadequada à correta determinação da precipitação, que tem uma variabilidade espacial muito grande e é muito influenciada por condicionantes que nem sempre podem ser levadas em conta pelos modelos de escala global. Mesmo o modelo regional ETA, com resolução de 40 x 40 Km não pode efetuar previsões no nível de detalhamento que o município do Rio de Janeiro precisa, tendo em vista que este possui uma extensão de 50 x 0 Km com uma topografia acidentada que tem mostrado ser muito importante tanto na determinação da quantidade como na distribuição da chuva sobre a cidade. Os resultados apresentados neste artigo são parciais e precisam ser testados. Está se procedendo ao cálculo de índices objetivos para a quantificação da qualidade da relação ora estabelecida usando o período de verão de 999/000 como período de teste. 5. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem a Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) pelo suporte dado à pesquisa e as bolsas de Iniciação Científica que viabilizaram este trabalho. 3375
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DRAPPER, N. R., SMITH, H., 98: Applied regression analysis. New York, John Wiley, 407 p. GLAHN, H. R., 98: Statistical weather forecasting. In: Proc. Statistical Interpretation of Numerical Weather Prediction Products. Seminar/Workshop. Reading, United Kingdom, ECMWF, pp. 63-30. KUMAR, A., MAINI, P., SINGH, S. V., 999: "An operational model for forecasting probability of precipitation and yes/no forecast". Wea. Forecasting., 4, pp. 38-48. MATSUO, P. T., 99: Previsão probabilística de precipitação intensa a curto prazo com base em parâmetros sinóticos. São Paulo, Universidade de São Paulo, Dissertação de Mestrado, 73 p. 3376