ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE LEITOS DE SECAGEM TRADICIONAL E MODIFICADO NA DESIDRATAÇÃO DE LODOS DE ESTAÇÕES DE TRATAMENTO DE ÁGUA Renato Machado ( ) Engenheiro da Companhia Riograndense de Saneamento - CORSAN, Professor Adjunto do Departamento de Engenharia Civil da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC/RS e Doutor em Engenharia Civil. Catarina De Luca de Lucena Engenheira Química da Companhia Riograndense de Saneamento CORSAN, com Especialização na área de tratamento de água e esgotos. Édio da Luz Vieira Técnico em Saneamento da Companhia Riograndense de Saneamento CORSAN. Endereço ( ) : Rua Vasco da Gama, 565/301-Bairro Rio Branco - Porto Alegre - RS - CEP:90420-111 - Brasil. Tels:(51)3215-5617, Fax:(51)3215-5645,e-mail: renato.machado@corsan.com.br RESUMO O presente trabalho apresenta a comparação entre o leito de secagem tradicional, constituído de tubulações de drenagem, brita, areia grossa, areia média e tijolos maciços, e o leito de secagem modificado, constituído de tubulações de drenagem, brita, manta geotêxtil, areia média e tijolos maciços, na desidratação de lodos de Estações de Tratamento de Água. O trabalho experimental foi desenvolvido em dois leitos piloto, executados em tanques de fibra de vidro de 5000 litros, onde se variou a carga de lodo aplicada sobre os leitos observado-se o tempo de drenagem da água infiltrada e a espessura final do lodo seco. Paralelamente foram analisadas amostras do lodo afluente, da água infiltrada e do sobrenadante. Os resultados mostraram a alta eficiência dos leitos de secagem na remoção dos diferentes parâmetros analisados, independente do tipo de leito utilizado, entretanto, a qualidade e a quantidade do líquido drenado foi ligeiramente superior para o leito modificado. Palavras-Chave: Tratamento, lodo de ETAs, leitos de secagem, desidratação. INTRODUÇÃO Os órgãos de Meio Ambiente têm exigido, com obrigatoriedade de prévio licenciamento, aprovação e liberação de funcionamento, dar disposição adequada aos lodos oriundos das unidades de tratamento de água. Estes resíduos, definidos conforme a NBR 10.004 e NBR 10.006, sob a classificação de resíduos classe 2 (não inertes), contendo constituintes solubilizados em concentrações superiores aos Padrões de Potabilidade da Água, estão sujeitos, portanto, ao tratamento por processo físico. Ressalta-se que estas Normas não são específicas para resíduos oriundos de ETAs, os quais possuem especificidades que os diferem de outros resíduos, devendo a curto/médio prazo serem estabelecidas diretrizes para estes resíduos, a exemplo do que foi estabelecido para as ETEs. Aliado às exigências dos órgãos Ambientais (FEPAM - Fundação Estadual de Proteção Ambiental - RS) a CORSAN, através da Superintendência de Tratamento e do Departamento de Projetos de Produção de Água, já realizou alguns estudos experimentais, com o objetivo de definir uma tecnologia apropriada de desidratação dos lodos, evitando-se o lançamento destas cargas nos cursos de água. A maioria das estações de tratamento de água emprega o sulfato de alumínio como coagulante primário, decorrendo daí a identificação do lodo que geram como sendo lodo de alumínio. A natureza gelatinosa deste lodo dificulta a sua secagem, razão pela qual, várias tentativas de solução foram experimentadas, desde aquelas que contemplam unidades de adensamento e condicionamento, de desidratação (caso dos leitos de secagem), lagoas de lodo, centrífugas, filtros a vácuo, filtros prensa, etc.
A situação econômica que envolve o Brasil não nos permite que se utilizem soluções para os lodos de ETAs similares àquelas usadas nos países mais desenvolvidos. Há de se permanecer ainda com alternativas economicamente compatíveis com as possibilidades de um país em desenvolvimento, que não resolvam o problema como um todo, mas que podem representar uma alternativa intermediária de acondicionamento do lodo para disposição final: é o caso dos leitos de secagem. Experiências recentes têm demonstrado que os Leitos de Secagem apresentam boa eficiência aliada com custos de implantação e operação reduzidos para pequenas Estações de Tratamento de Água, quando comparados com outros sistemas que utilizam processos mecânicos para remoção da umidade do lodo. Estes Leitos recebem os lodos gerados nas unidades de decantação e filtração e promovem a desidratação dos mesmos através da drenagem e evaporação. O sistema de drenagem sendo constituído de tubulações perfuradas envolvidas por camadas de pedregulho e areia na parte superior, permite a retenção dos sólidos e a clarificação do efluente. O efluente líquido drenado poderá retornar para a chegada de água bruta da ETA ou ser encaminhado para o sistema de águas pluviais, enquanto que os lodos secos poderão ser dispostos em aterros sanitários ou serem agregados na fabricação de produtos cerâmicos. METODOLOGIA Montagem do Experimento: O estudo aqui apresentado foi desenvolvido com lodo proveniente da estação de tratamento de água da cidade de Torres/RS, operada pela Companhia Riograndense de Saneamento - CORSAN. Esta estação utiliza o sulfato de alumínio como coagulante no processo de clarificação da água bruta. O experimento consistiu da montagem de um sistema composto de dois leitos de secagem experimentais, executados em tanques de 5000 litros (reservatórios de fibra de vidro) de 1670 mm de diâmetro inferior, 2120 mm de diâmetro superior e 2000 mm de altura, e área de 2,35 m 2 na superfície dos leitos, onde o lodo foi disposto em lâminas de 0,30 m, 0,60 m, 0,90 m de espessura, sobre material suporte constituído de tijolos maciços, areia e brita, de granulometria e espessuras diferentes. O sistema de drenagem foi executado através de tubulações de PVC soldável DN 60, com orifícios de 10 mm de diâmetro afastados de 10 cm. A camada suporte do leito tradicional (leito 1) foi construída com brita n 1 (9,5-19,0 mm), com espessura de 15 cm acima das tubulações de drenagem e o meio filtrante era constituído, sucessivamente, de 15 cm de areia grossa e 15 cm de areia média comum de construção. A camada suporte do leito modificado (leito 2) foi construída com brita n 2 (19,0-38,0 mm), com espessura de 15 cm acima das tubulações de drenagem e o meio filtrante era constituído de 30 cm de areia média comum de construção. Entre as camadas de brita e areia, deste leito 2, foi introduzida uma manta geotêxtil de 220 g/m 2. Acima da camada de areia, em ambos os leitos, foram dispostos tijolos maciços com juntas livres de 2,5 cm. As areias utilizadas no experimento foram peneiradas e analisadas granulometricamente. Os tanques eram dotados de um sistema de extração do líquido sobrenadante, constituído de uma tubulação de PVC DN 60, com possibilidade de extração em diferentes alturas das lâminas líquidas. No interior dos tanques, foram instaladas escalas graduadas para avaliação da altura de lodo adiciona ao protótipo e acompanhamento das variações de nível durante o experimento. As figuras apresentadas a seguir ilustram as principais características dos leitos experimentais. Figura 1 - Vista dos Leitos Experimentais Figura 2 Tubulações de Drenagem dos Leitos 2
Figura 3 Camada drenante com tijolos Figura 4 Leitos em processo de secagem Procedimento experimental: O trabalho experimental foi subdividido em dois ensaios, sendo o ensaio 1 composto de três estudos: E1, E2 e E3, onde variou-se a carga de lodo sobre os leitos, respectivamente, em 30, 60, 90 cm. No final de cada estudo, o lodo seco era retirado, e após a limpeza dos leitos era procedido novo estudo. No ensaio 2 promoveu-se o carregamento dos leitos com recarga de lodo até o limite de saturação, ou seja, com procedimento de carga conforme o ensaio 1, entretanto, procedendo-se a aplicação de nova carga (sem a retirada do lodo seco). Durante a realização dos estudos (E1, E2,...) foram observados e registrados o tempo de drenagem da água infiltrada e analisadas amostras do lodo afluente e da água infiltrada, através dos seguintes ensaios: ph, DQO, fosfato total, nitrogênio total, sólidos totais, alumínio, ferro e manganês. Nas ocasiões que ocorreram precipitações pluviométricas intensas, foram registrados os períodos de duração das mesmas e analisadas amostras do efluente dos tanques, objetivando avaliar as características do lixiviado. RESULTADOS Os resultados apresentados na tabela 1 mostram resumidamente o que foi verificado no Ensaio 1 quando se variou a carga de lodo aplicada sobre os leitos (tradicional e modificado) limpos. Tabela 1 Resumo dos resultados obtidos no Ensaio 1 Estudo E1 Filtro 1 Filtro 2 Carga de lodo aplicada (cm) 30 30 Tempo de duração (dias) 6 6 Altura de chuva (cm) 4,3 4,3 Drenagem superficial (cm) 0,0 0,0 Altura Percolada (cm) 6,1 9,0 Altura Percolada + Chuvas (cm) 10,4 13,3 Estudo E2 Filtro 1 Filtro 2 Carga de lodo aplicada (cm) 60 60 Tempo de duração (dias) 37 37 Altura de chuva (cm) 7,7 7,7 Drenagem superficial (cm) 20,7 20,7 Altura Percolada (cm) 44,6 46,6 Altura Percolada + Chuvas (cm) 52,3 54,2 3
Tabela 1 Resumo dos resultados obtidos no Ensaio 1 (continuação) Estudo E3 Filtro 1 Filtro 2 Carga de lodo aplicada (cm) 90 90 Tempo de duração (dias) 102 102 Altura de chuva (cm) 31 31 Drenagem superficial (cm) 29 29 Altura Percolada (cm) 44 41 Altura Percolada + Chuvas (cm) 75 72 Os resultados obtidos do lodo bruto, no momento de sua disposição nos leitos de secagem, e do efluente percolado nos leitos 1 e 2 durante a realização dos Estudos E1 e E2, são os constantes das tabelas 2 e 3, em seqüência. A última coluna apresentada nas tabelas 2 e 3 estabelece o padrão de emissão dos efluentes líquidos segundo a Portaria N o 05/89 da SSMA/RS Secretaria da Saúde e do Meio Ambiente do Estado do Rio Grande do Sul. Tabela 2 Características do lodo bruto e do efluente do leitos Estudo E1 Parâmetros Unidades Lodo Bruto Leito 1 Leito 2 Padrão emissão DQO Mg/L O 2 1790 107 59 < 160 PH - 6,1 7,5 7,7 6,0 a 8,5 Fosfato total Mg/L P 2,78 0,08 0,00 1,00 Nitratos+Nitritos Mg/L N/NO 3 0,7 1,1 0,2 - Nitrogênio Kjedahl Mg/L N 105 4,8 0,5 - Nitrogênio Total Mg/L P 106 5,9 0,7 10 Sólidos Totais Mg/L 44880 437 431 - Sol. Totais Fixos Mg/L 38890 319 346 - Sol.Totais Voláteis Mg/L 5990 118 85 - Alumínio Total Mg/L Al 4775 0,255 0,119 10 Ferro Total Mg/L Fe 3994 0,19 < 0,08 10 Manganês Total Mg/L Mn 86,8 0,205 0,09 2,00 Umidade % 94,5 NA NA - Massa Específica g/cm 3 1,043 NA NA - NA = não analisado Tabela 3 Características do lodo bruto e do efluente do leitos Estudo E2 Parâmetros Unidades Lodo Bruto Leito 1 Leito 2 Padrão emissão DQO Mg/L O 2 11.000 18 14 < 160 PH - 5,9 8,1 7,2 6,0 a 8,5 Fosfato total Mg/L P 10,2 0,02 0,01 1,00 Nitratos+Nitritos Mg/L N/NO 3 2,4 NA NA - Nitrogênio Kjedahl Mg/L N 233 0,1 0,1 - Nitrogênio Total Mg/L P 235 0,0 0,5 10 Sólidos Totais Mg/L 39440 290 343 - Sol. Totais Fixos Mg/L 34515 NA NA - Sol.Totais Voláteis Mg/L 4925 NA NA - Alumínio Total Mg/L Al 3529 0,409 0,091 10 Ferro Total Mg/L Fe 3280 0,31 <0,08 10 Manganês Total Mg/L Mn 55 0 0,084 2,00 Umidade % 95,9 NA NA - Massa Específica g/cm 3 NA NA NA - NA = não analisado 4
A tabela 4 apresenta os resultados do sobrenadante (líquido removido na superfície dos leitos) registrados no período experimental. Tabela 4 Resultados do Sobrenadante Parâmetros Unidades Mínimo Máximo Padrão emissão Portaria 05/89 Turbidez UJT 3,3 16 - Alumínio Total Mg/L Al 0,10 1,50 10 Ferro Total Mg/L Fe 0,10 0,70 10 CONCLUSÕES Os resultados das análises das amostras do líquido drenado nos leitos de secagem estudados (leito1 e leito 2), mostraram que as cargas de alumínio, ferro e manganês foram extremamente baixas, não se diferenciaram entre si e mantiveram-se abaixo dos padrões de emissão da Portaria 05/89 SSMA. Os resultados máximos de turbidez, alumínio e ferro apresentados pelo sobrenadante mantiveramse abaixo dos padrões de emissão da Portaria 05/89 -SSMA Pode-se concluir, com base nos resultados apresentados, que praticamente toda carga ficou retida no lodo acumulado sobre os leitos. Outros constituintes analisados, tais como DQO, fosfatos, nitrogênio e sólidos apresentaram reduções substanciais, mostrando a eficiência dos leitos de secagem, independente do sistema de drenagem utilizado. O líquido sobrenadante pode ser descartado, evitando-se a passagem deste material pelo meio filtrante e reduzindo-se o tempo de secagem do lodo. A espessura e tipo de meio filtrante influenciou na qualidade do efluente final e na quantidade de líquido drenado, com vantagem para o leito 2 (modificado), constituído de brita 2, manta de geotêxtil e areia média comum de construção. Devido as baixas concentrações de metais no líquido drenado, tanto no leito 1 como no leito 2, é de se supor que o seu lançamento em corpos receptores não causarão maiores prejuízos ao meio ambiente. Os leitos de secagem, desta forma, representam uma alternativa bastante interessante na atenuação dos metais existentes no lodo, há que se analisar, no entanto, a questão da espessura e granulometria do meio filtrante e o tempo de exposição do lodo para se obter uma boa desidratação. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. ACHON, C.L. (2003). Gerenciamento de Lodo de ETAs Remoção de água livre através de leitos de secagem e lagoas. 22 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. Joinville-SC, setembro. 2. ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (1987). NBR 10.004 Resíduos Sólidos. São Paulo SP, setembro. 3. BIDONE, F.R.A.; CASTRO, C.M.B.; ABOY, N. (1997) Monitoramento de parâmetros físico/químicos de lodos de ETAs durante a sua desidratação em leitos de secagem com diferentes espessuras de leito drenante. 19 o Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental. Foz do Iguaçu - PR, setembro. 4. CORDEIRO, J.S. (1993). O problema dos lodos gerados em decantadores de estações de tratamento de águas. São Carlos. 342 p. Tese (Doutorado) Escola de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo. 5