DESEMPENHO DE RECEPTORES GPS DE NAVEGAÇÃO NO CÁLCULO DE ÁREAS THIAGO MARTINS MACHADO 1 FABRÍCIO PINHEIRO POVH 2 JOSÉ VITOR SALVI 3 JOSÉ PAULO MOLIN 4 RESUMO: O Global Positioning System (GPS) é um sistema de rádio navegação desenvolvido pelos Estados Unidos que permitem posicionamento por coordenadas geográficas ao redor do mundo. Apesar de toda a tecnologia incorporada ao sistema, há fatores internos e externos que prejudicam a sua acurácia, gerando erros que variam de acordo com a qualidade do equipamento receptor. O presente trabalho teve como objetivo avaliar a acurácia de receptores de GPS de navegação no cálculo de áreas tendo como referência um receptor Real Time Kinematics RTK. Foram instalados sobre um trator dois receptores de GPS de navegação e um receptor RTK. Foram utilizados três talhões de tamanhos diferentes e formatos semelhantes em dois dias de ensaios. Os resultados mostraram que as áreas assim medidas tenderam a um valor inferior ao da referência. No talhão de maior área o erro variou de 0,93% a -3,14%, enquanto que nos talhões de menor área o erro foi de -0,17% a -7,08%. Foi observada uma elevada indefinição de detalhes nos cantos dos talhões, principalmente nas áreas menores e a incerteza na acurácia nas áreas mensuradas deve ser sempre considerada. PALAVRAS-CHAVE: GPS, RTK, cálculo de área. LOW-COST GPS RECEIVERS PERFORMANCE FOR AREA CALCULATION ABSTRACT: The Global Positioning System (GPS) is a radio navigation system developed by USA that allows the positioning by geographic coordinates around the world. In spite of all technology incorporated to this system, there are internal and external factors that reduce its accuracy, generating errors that vary according to the receiver quality. This work had the objective of evaluating GPS receiver s accuracy in areas calculation, having a RTK (Real Time Kinematics) receiver as reference. Two low-cost receivers were installed in a tractor and a RTK receiver. The data were collected in three different fields with similar shape along two days. The results show that measured areas tended to lower values compared to the reference. In the field with larger area the errors varied of 0,93% to -3,14% in relationship to the RTK receiver area, while in the smaller fields the errors were from -0,17% to -7,08%. It was observed a higher lack of definition on the field corners, mainly at the smaller areas and the uncertainty on measured areas has to be a concern to users. KEYWORDS: GPS, RTK, area calculation. 331
1. INTRODUÇÃO Após a Segunda Guerra Mundial, com o domínio da comunicação via rádio e da eletrônica, os soviéticos lançaram em 04 de outubro de 1957 o primeiro satélite na órbita da terra, o Sputnik-1 (KRUEGER, 2004). A partir daí os EUA e União Soviética iniciaram a corrida armamentista desenvolvendo sistemas de localização cada vez mais precisos. Foi assim que surgiu o GNSS (Global Navigation Satellite System) uma tecnologia espacial de posicionamento por satélite, onde um dos principais componentes desse sistema é o GPS, desenvolvido pelos EUA (ROCHA, 2004). Cada satélite transmite continuamente sinais em duas ondas portadoras L, sendo a primeira, L1, com freqüência de 1575,42 MHz e comprimento de onda de 19 cm, e a segunda, L2, com freqüência de 1227,60 MHz e comprimento de 24 cm. Sobre estas ondas portadoras são modulados dois códigos, denominados códigos pseudo-aleatórios. Na banda L1, modula-se o código Clear Access ou Coarse Acquisition (C/A) e o código Precise (P). A banda L2 é somente modulada pelo código P e sobre as portadoras L1 e L2, modula-se o código P (ROCHA, 2004). Segundo Molin (1998), o GPS deixou de ter a importância que tinha na época de sua concepção, devido ao fim da Guerra Fria e, no início da década de 90, essa tecnologia, tornou-se uma importante ferramenta na agricultura, proporcionando a acelerada expansão das técnicas de agricultura de precisão. De acordo com CERQUEIRA et al. (2006) o GPS pode ser de três tipos: navegação, topográfico e geodésico. O GPS de navegação é de menor acurácia, baixo custo e trabalham apenas com o código C/A, fato que limita seu uso em trabalhos que exigem alta acurácia. O GPS topográfico pode trabalhar com uma ou duas freqüências (L1 ou L1/L2), o que garante uma maior acurácia do levantamento. Esse tipo de receptor tem sido o mais difundido entre as aplicações em engenharia, devido a sua alta acurácia e o seu custobenefício. O GPS geodésico é o receptor de GPS de maior acurácia, muito usado na implantação de redes geodésicas ou transporte de coordenadas com alta acurácia. O termo precisão relaciona-se com a variação do valor medido repetidamente sob mesmas condições experimentais em torno do valor médio observado, enquanto que acurácia refere-se à exatidão da medida, ou seja, o quanto próximo está o valor medido do valor real (DA SILVEIRA, 2004). Nos últimos anos em determinadas operações agrícolas tem se exigido aparelhos de alta acurácia com correção dos dados em tempo real. Esses aparelhos são denominados de RTK, são compostos por dois receptores L1/L2 com as respectivas antenas e um link de rádio para transmitir e receber correções da estação de referência (SEGANTINI, 2005). A utilização do sistema GPS para o cálculo de áreas para finalidades agrícolas tem sido muito comum, mas faltam dados sobre o nível de incerteza nos cálculos de área cometidos por esses receptores. Este trabalho tem como objetivo determinar o erro no cálculo de área com o uso de receptores de GPS de navegação tendo como referência receptores RTK. 2. MATERIAL E MÉTODOS O ensaio foi realizado entre os dias 23 e 24.04.2007 em três talhões denominados de A, B e C de tamanhos diferentes na fazenda Centenário localizada no município de Pradópolis, SP. Os equipamentos utilizados foram dois receptores GPS de navegação marca Garmin, modelos Vista (1) e Vista CX (2), que utilizam o código C/A, e um receptor RTK L1/L2, marca Trimble, modelo AgGPS RTK Base 450, com freqüência de atualização de dados de 5 Hz configurado para fazer correções via radio a cada 1 segundo. A base estava localizada a 8 km das áreas selecionadas. A coleta de dados foi feita a cada 0,5 metro ou 2 segundos, priorizando sempre o menor intervalo. O datum configurado em todos os receptores foi o WGS-84. Os receptores foram fixados na cabine de um trator que fazia o contorno dos talhões a uma velocidade média de 8 km h -1. Os receptores foram configurados em dois modos Area Calculation (X) em que o receptor escolhe automaticamente a freqüência de coleta e Active 332
Log (Y) no qual o usuário escolhe a freqüência de coleta. No talhão A para verificação da influência da freqüência de coleta de dados no cálculo de área, o receptor 2 foi configurado em modo Y para coletar dados com uma freqüência maior que o receptor 1 em modo X. No talhão B os aparelhos foram configurados com a mesma freqüência de coleta de dados em modo Y. No segundo dia de ensaios o operador fez o mesmo percurso do talhão A seguindo o rastro deixado no dia anterior. Os receptores 1 e 2 foram configurados na mesma freqüência de coleta de dados no modo Y. No talhão C, por possuir tamanho semelhante do talhão B, os receptores GPS foram configurados nas freqüências de coleta modo X e Y para verificar a deformação do mapa e a influência do erro em áreas menores. Os dados dos cálculos de áreas foram anotados em planilha após leitura nos monitores dos respectivos aparelhos. As áreas escolhidas possuem os formatos semelhantes, tendo inclinação do terreno no sentido noroeste de 3,4 %. Figura 1 Contorno dos talhões A, B e C 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Durante a realização dos ensaios a diluição da precisão horizontal (HDOP) variou de 0,8 a 1,0 no dia 23.04 e no dia 24.04 manteve-se constante em 1,0. Os resultados sintetizados na Tabela 1 mostram que em áreas de menor tamanho os receptores de GPS tiveram uma tendência a aumentar os erros. No talhão A, de maior área, o erro variou de 0,93% a -3,14% em relação a aquela obtida com o receptor RTK, enquanto que nos talhões B e C, de menor área, o erro foi de -0,17% a -7,08%. A área do talhão A apresentou diferença no receptor RTK do primeiro dia em relação ao segundo, por que em algumas partes do trajeto a marca do rodado deixado no dia anterior foi apagada. De acordo com o trabalho realizado por Stombaugh et al. (2003) foi verificado que em determinados formatos de área quanto maior a área menor o erro. Os erros encontrados por esses autores variaram de -0,14% a -2,14 %, mostrando que os GPS de 333
navegação têm uma tendência em errar a área para um valor inferior ao da área de referência como verificados neste trabalho. Tabela 1 - Resultados do ensaio obtido com os dois receptores de navegação e comparados com aqueles obtidos com o receptor RTK em três talhões diferentes. Data Receptor Talhão Área (ha) Freqüência de coleta de dados (Hz) Diferença em relação ao RTK (%) 23.04 RTK A 11,81 * referência 23.04 1 A 11,92 * 0,93 23.04 2 A 11,44 0,33-3,13 23.04 RTK B 5,71 * referência 23.04 1 B 5,70 0,10-0,17 23.04 2 B 5,78 0,10 1,22 24.04 RTK A 11,78 * referência 24.04 1 A 11,41 0,20-3,14 24.04 2 A 11,41 0,20-3,14 24.04 RTK C 5,36 * referência 24.04 1 C 5,08 * -5,22 24.04 2 C 4,98 0,20-7,08 * Coleta dos dados no modo automático com freqüência definida pelo fabricante. O receptor 1 configurado em modo X, no talhão A, no dia 23.04, teve erros menores que o receptor 2 em modo Y com freqüência de 0,33. No talhão B, no mesmo dia, os receptores 1 e 2 em modo Y, configurados para 0,10 Hz tiveram diferenças de área, sendo o maior erro no receptor 2. Já no dia 24.04, no talhão A, os receptores 1 e 2, trabalhando em modo Y, com freqüência de 0,20 Hz, não tiveram diferenças de áreas. O receptor 1 em modo X apresentou um erro menor que o receptor 2 em modo Y, com freqüência de 0,20 Hz no talhão C. A configuração do receptor 2 em freqüência de 0,10 Hz no talhão B e 0,20 Hz no talhão C, tendo o formato e áreas semelhantes, mostra que em freqüências altas o erro tende a aumentar. O mesmo problema foi observado no talhão A e somente no receptor 1, em que os erros foram de 0,93 % em baixa freqüência e -3,14 % em alta frequência. O receptor 2 manteve resultados semelhantes com -3,14 % e -3,13 % em baixa e alta freqüência, respectivamente. Os receptores de navegação, código C/A, têm uma freqüência média de atualização de dados de 0,5 Hz, enquanto os receptores L1/CA e L1/L2 trabalham entre 1 e 10 Hz. Essa baixa freqüência de atualização de dados dos receptores de navegação implica em deformações, principalmente nos cantos dos talhões, ocasionando grandes erros nos cálculos de área (STOMBAUGH et al., 2003). Já Cerqueira et al. (2006) observaram que receptores de navegação em áreas pequenas apresentam sobreposição de pontos mostrando uma área geometricamente incoerente e deformada em comparação à real. No talhão C (Figura 2) os erros de geometria ficaram mais evidentes, mostrando o erro de resolução em mudanças bruscas de direção dos receptores, principalmente nos cantos do talhão. Os receptores de navegação, por serem os aparelhos mais comuns, de menor preço e terem tecnologia inferior àqueles específicos para levantamentos topográficos mostram erros consideráveis variando de -0,17 % a -7,08 % em relação ao receptor RTK, portanto são indicados apenas para estimar áreas, informações essas utilizadas somente para aspectos de menor comprometimento e associadas ao gerenciamento agrícola. 334
Figura 2 Exemplos de erros de paralelismo no talhão C Em áreas maiores os erros foram menores, mas em trabalhos futuros deve-se prever repetibilidade e trabalhar em freqüências, formatos e tamanhos de áreas diferentes para validação dos dados e também viabilizar a realização de ensaios para verificar a acurácia do receptor RTK na mensuração de área. 4. CONCLUSÕES O receptor 1 apresentou resultados superiores no cálculo de área tanto na configuração Area Calculation quanto Active Log. Os erros tenderam a um valor inferior ao da referência. O erro dos receptores de navegação se acentua nos cantos dos talhões e em freqüências mais altas. A utilização de dados de área de talhões obtida com receptores de GPS de navegação deve ser cuidadosa pelo nível de incerteza envolvido. 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CERQUEIRA, E.S.A.; REIS, L.R.; BAESSO, M.M.; MODOLO, A.J.; MARÇAL, D.Q.de. Análise da exatidão do GPS topográfico com e sem correção diferencial. In: II CONGRESSO BRASILEIRO DE AGRICULTURA DE PRECISÃO 2006, São Pedro. Anais... São Pedro: ESALQ USP, CD. DA SILVEIRA, A.C.; Avaliação de desempenho de Aparelhos Receptores de GPS. 2004.Dissertação (Mestrado em Maquinas Agrícolas) Faculdade de engenharia Agrícola, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2004. KRUEGER, C.P. Apostila de Posicionamento por Satélites. Curitiba, 2004. 111p. MOLIN, J. P. Utilização de GPS em Agricultura de Precisão. Eng. Agrícola, Jaboticabal, v.17, n.3, p.121-132, 1998. ROCHA, C.H.B. Uso eficiente do GPS de navegação no cadastro de feições lineares. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CADASTRO TÉCNICO MULTIFINALITÁRIO, 2004, Florianópolis. Anais... Florianópolis: UFSC, 2004. p.1-7 SEGANTINE, P.C.L. GPS: sistema de posicionamento global. São Carlos: Suprema, 2005. 381 p. STOMBAUGH, T. S; KOOSTRA, B.K; SCOTT, SHEARER, S.A. Using Low-Cost GPS Receivers for Boundary Mapping. ASAE Meeting Paper N º 031010, St. Joseph: ASAE, 2003. 335