RELATÓRIO DE AUDIÊNCIA PRÉVIA E CONSULTA sobre o projecto de decisão de revogação da licença para o fornecimento de uma rede de radiodifusão sonora digital terrestre (T-DAB) I. Enquadramento Por deliberação de 3 de Março de 2011, o ICP-ANACOM aprovou o projecto de decisão de revogação do acto de atribuição do direito de utilização de frequências para o serviço de radiodifusão sonora digital por via terrestre (T-DAB) detido pela, ora, Rádio e Televisão de Portugal, SA (RTP), e, consequentemente, o título que consubstancia o direito de utilização atribuído (Licença ICP nº 004/99-RPT), recomendando, ainda, que a RTP proceda à comunicação pública da decisão de cessação das emissões T-DAB com uma antecedência superior aos 15 dias a que legalmente está obrigada. Mais deliberou submeter o referido projecto de decisão a audiência prévia da RTP, nos termos dos artigos 100.º e 101.º do Código do Procedimento Administrativo, e ao procedimento geral de consulta, previsto no artigo 8º da LCE, fixando um prazo de 20 dias úteis para pronúncia. Tendo presente o dever de cooperação entre o ICP-ANACOM e a Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) previsto, respectivamente, no artigo 7º da LCE e no artigo 11º dos Estatutos da ERC, aprovados pela Lei nº 53/2005, de 8 de Novembro, esta Entidade Reguladora foi especificamente notificada 1 do projecto de decisão para que, querendo, se pronunciasse sobre o mesmo. O Conselho Regulador da ERC emitiu parecer, em 6 de Abril de 2011 2. 1 Através do ofício ANACOM-S023945/2011, de 07.03.2011. 2 Enviado através do ofício com referência n.º 4749/ERC/2011 e recebido no ICP-ANACOM a 12.04.2011. 1
Até ao termo do prazo fixado para a recepção de comentários (07.04.2011) no âmbito do procedimento geral de consulta, foram recebidas as respostas da seguinte entidade e pessoa singular: - Associação Portuguesa de Radiodifusão (APR) - Eliseu A. Macedo Notificada para o efeito 3 a RTP não se pronunciou em sede de audiência prévia. O presente relatório inclui uma síntese das posições manifestadas sobre o projecto de deliberação submetido a consulta, bem como o entendimento desta Autoridade sobre as mesmas. Atento o carácter sintético deste documento, a sua análise não dispensa a consulta das referidas respostas, as quais serão disponibilizadas no sítio do ICP-ANACOM na internet em simultâneo com o presente relatório, na parte em que não foi solicitada a confidencialidade. O presente relatório constitui parte integrante da decisão relativa à revogação da licença para o fornecimento de uma rede de radiodifusão sonora digital terrestre (T- DAB). II. Comentários recebidos e entendimentos do ICP-ANACOM 1. Decisão de revogação da licença T-DAB A ERC faz uma síntese do processo de implementação da rádio digital terrestre em Portugal e refere experiências de outros países. Afirma que o insucesso do projecto no nosso país resultou da conjugação de vários factores, que ocorreram também 3 Através do Ofício ANACOM-S023943/2011, de 04.03.2011, recepcionado pela RTP a 07.03.2011. 2
noutros países, como por exemplo os custos do simulcast, o preço dos receptores, a falta de coordenação com a indústria automóvel para a inclusão dos novos modelos de receptores compatíveis com a nova tecnologia e o receio de marginalização das rádios locais. E adita que há, no entanto, factores específicos da experiência portuguesa, designadamente a fraca ou inexistente publicitação das vantagens e dos contornos do projecto da rádio digital terrestre e a não definição legal das condições de acesso à rede T-DAB pelos operadores privados. A ERC entende que havendo concordância de todos os interessados e não estando em causa direitos indisponíveis, a revogação do acto administrativo em causa acto de atribuição do direito de utilização de frequências não suscita entraves legais face ao disposto no CPA. O Conselho Regulador concorda que, para efeitos da revogação, os demais operadores de rádio não são interessados. O Conselho Regulador da ERC admite que a conclusão do projecto da rádio digital, nos moldes em que foi delineado e na actual conjuntura económica, implicaria um esforço financeiro desproporcionado relativamente às perspectivas de adesão do público no curto/médio prazo, pelo que admite que a decisão de revogar a licença no presente contexto é a única que salvaguarda o interesse geral da gestão eficiente dos dinheiros públicos. A ERC concorda que é fundamental que a RTP comunique ao público a decisão de revogar a licença, sendo que os meios e o prazo (45 dias de antecedência) indicados pela RTP para o efeito são considerados adequados. A APR não se opõe à decisão de revogação, relembrando que a posição desta Associação sempre foi de grande dúvida quanto ao T-DAB. Apesar de a APR ter a certeza de que o futuro da rádio será em digital, as dúvidas colocadas assentaram na tecnologia a adoptar tendo em vista essa mesma digitalização. 3
Com efeito, a APR considera que esta tecnologia nunca teve hipótese de afirmação, tendo em conta a demora da implementação do DAB, devido essencialmente ao pouco interesse manifestado pela indústria, pelos ouvintes e operadores de radiodifusão, e motivada também, sem qualquer hipótese para dúvida, pelo aumento de custos previsível, não só ao nível do investimento inicial mas também ao nível da manutenção do sistema, sem uma perspectiva clara de um aumento de proveitos, pelo que entende que todas as regras do bom senso, e até da boa gestão, justificam a confirmação desta situação a revogação do direito de utilização de frequências do T-DAB atribuído à RTP. Eliseu Macedo considera que o pedido da RTP para encerramento do serviço T- DAB não é, de todo em todo, desprovido de fundamentos. O respondente afirma que, efectivamente, esta tecnologia de difusão digital nunca chegou a ter penetração significativa no mercado nacional, por força da escassez e preço dos terminais necessários para a sua recepção. Considera também que no momento actual é bastante pertinente o argumento relativo à necessidade de uma eficiente gestão dos recursos públicos afectos à RTP, num quadro de rigorosa exigência de contenção orçamental. No entanto, Eliseu Macedo considera frustrante que a alternativa ao fim das emissões digitais T-DAB seja o sistema FM - um sistema analógico com várias décadas de existência. Seria, no seu entender, legítimo esperar que a evolução tecnológica que se tem vindo a desenrolar há já vários anos, nomeadamente no que diz respeito aos novos meios de transmissão digital, se pudesse de algum modo aplicar também à difusão rádio para o grande público. Entendimento do ICP-ANACOM O ICP-ANACOM regista a não oposição à decisão de revogação da licença T-DAB e o reconhecimento da legitimidade e adequabilidade da motivação subjacente a esta decisão. 4
Neste contexto, esta Autoridade mantém o sentido da sua decisão. 2. Outras propostas A ERC, apesar de reconhecer que a revogação da licença T-DAB é justificada, não deixa de notar que tal decisão contraria o esforço, à escala europeia, de prosseguir o objectivo da convergência digital, pilar da construção do mercado comum de serviços da sociedade de informação, e adia o projectado dividendo digital. O Conselho Regulador da ERC entende, assim, que o caminho da migração da radiodifusão para o plano digital deve ser prosseguido em Portugal no futuro, sendo essencial para o efeito que se alargue a discussão sobre as opções a tomar neste domínio a todas as partes interessadas, aproveitando as experiências retiradas dos países que estão neste momento na vanguarda da radiodifusão digital. Para o efeito, a ERC entende que a faixa de frequências 224,880 226, 416 MHz deverá permanecer reservada à concretização do projecto de rádio digital terrestre em Portugal. Nesta oportunidade, a APR reitera a necessidade de, na definição de qualquer matéria relacionada com a utilização do espectro radioeléctrico, serem tidas em linha de conta todas as necessidades do sector de radiodifusão, alertando o ICP- ANACOM para a importância de garantir que as necessidades dos operadores de radiodifusão sonora se encontram devidamente asseguradas. No seu entendimento estas necessidades resumem-se a apenas uma premissa: é imperativo garantir a reserva de espectro suficiente para permitir a transição dos operadores de radiodifusão sonora actualmente existentes, todos eles sem excepção, para as novas plataformas digitais, independentemente das opções tecnológicas que possam vir a ser tomadas neste âmbito. Eliseu Macedo propõe que os actuais programas difundidos digitalmente na plataforma T-DAB da RTP/RDP sejam emitidos na plataforma digital de Televisão 5
Digital Terrestre (TDT), após o encerramento da primeira. Suporta esta sua proposta nas seguintes razões: - Capacidade disponível. Considera o respondente que actualmente o único Multiplexer em operação, MUX A, dispõe de bastante capacidade disponível, devido ao reduzido número de programas (apenas 4) e à utilização do codec H.264. A utilização de parte da banda para difusão de rádio (utilizando por exemplo codec HE-AAC) irá ter um impacto marginal, já que a exigência de largura de banda do sinal áudio é muito inferior à do vídeo. - Custo muito reduzido. Quanto a este aspecto, o respondente afirma que a plataforma TDT já está em operação e cobrindo uma vasta área do território e não existem custos adicionais significativos para implementar esta medida. A rádio digital via DVB-T iria assim utilizar uma plataforma recém instalada, com capacidade disponível, e contribuiria para rentabilizar a infra-estrutura. - Possibilidade de recepção fixa de rádio com alta qualidade e em modo digital. O respondente argumenta que, aproveitando as sinergias e as condições criadas com as recentes normas para infra-estruturas de telecomunicações em edifícios e urbanizações (ITED/ ITUR), seria apropriado dispor de recepção rádio em modo digital em alternativa ao FM. Paralelamente, realça que os receptores TDT (DVB- T) estão habitualmente preparados para receber rádio e as tendências actuais apontam para uma gradual integração de serviços, pelo que a recepção fixa de rádio por via DVB-T começa em muitos países a ganhar peso, quer no grande público quer na indústria, em detrimento do sistema T-DAB. - Mesmo para recepção móvel, o DVB-T garante uma razoável protecção à dispersão multipercurso (devido às grandes semelhanças das duas modulações, ambas baseadas em OFDM) e pode por isso proporcionar recepção de qualidade até velocidades moderadas. Considera o respondente que é já possível encontrar no mercado receptores de rádio digital baseados - não em T-DAB - mas sim DVB-T, não só para recepção fixa mas também móvel (dando alguns exemplos do posicionamento da indústria). - Promoção e reforço da TDT. O respondente invoca que a oferta TDT portuguesa é actualmente muito pobre, senão a mais pobre dos países que preparam a 6
exploração do dividendo digital. Defende, assim, que a medida de incluir as rádios de serviço público na TDT seria um pequeno contributo para melhorar e promover a adesão à TDT. - Similaridade com os congéneres Europeus. Eliseu Macedo afirma que Espanha, Reino Unido, Alemanha, são apenas 3 exemplos de países que integraram rádios nas suas plataformas de difusão digital terrestre. Em conclusão, o respondente considera que a medida de passar a incluir os programas actualmente difundidos por via T-DAB na TDT é uma medida com vantagens evidentes que faria uso de uma plataforma já existente, com custos muito reduzidos. Entendimento do ICP-ANACOM O ICP-ANACOM regista os comentários e preocupações transmitidos pela ERC e pela APR. Nesta oportunidade, o ICP-ANACOM reitera que no âmbito da gestão e planificação do espectro esta Autoridade tem naturalmente em conta as necessidades de todos os utilizadores do espectro radioeléctrico. Acresce que as decisões do ICP-ANACOM são necessariamente transparentes, obedecendo a mecanismos que asseguram o adequado nível de participação dos interessados nos processos de tomada de decisão. Mais se adita que, neste momento, não será alterada a reserva da faixa de frequências em causa para o serviço de radiodifusão sonora digital por via terrestre. No que diz respeito aos comentários de Eliseu Macedo, o ICP-ANACOM recorda que, para além das exigências de reserva de capacidade directamente decorrentes da Lei da Televisão (Lei n.º 27/2007, de 30 de Julho) 4, a utilização da capacidade 4 Posteriormente plasmadas no Regulamento n.º 95-A/2008, de 25 de Fevereiro - Regulamento do Concurso público para a atribuição de um direito de utilização de frequências de âmbito nacional 7
remanescente do Multiplexer A (Mux A) foi definida, após consulta pública, na Resolução de Conselho de Ministros n.º 12/2008, de 22 de Janeiro (RCM) 5. De acordo com essa RCM, sem prejuízo das obrigações decorrentes do concurso público, o titular do direito de utilização de frequências associado ao Mux A que veio a ser a PT Comunicações, SA (PTC) pode afectar a restante capacidade a outros serviços de comunicações electrónicas, nos termos da legislação aplicável. É neste contexto, e no âmbito das obrigações da PTC previstas no Direito de Utilização de Frequências ICP-ANACOM n.º 6/2008 6, que a utilização da capacidade do Mux A deve ser avaliada. III. Conclusão Face ao vindo de expor, o ICP-ANACOM mantém o sentido da sua decisão. para a prestação do serviço de radiodifusão televisiva digital terrestre, a que está associado o Multiplexer A (art. 19º). Disponível em http://www.anacom.pt/render.jsp?contentid=958877 5 Disponível em http://www.anacom.pt/render.jsp?contentid=958892 6 Disponível em http://www.anacom.pt/render.jsp?categoryid=303315 8