Controle de parasitoses intestinais na comunidade do Núcleo Habitacional Santa Felicidade de Maringá, Paraná, Brasil

Documentos relacionados
PARCERIA UNIVERSIDADE - COMUNIDADE NO DIAGNÓSTICO E CONTROLE DE PARASITOSES INTESTINAIS

FREQUÊNCIA DE ENTEROPARASITOSES EM CRIANÇAS DE PONTA GROSSA PR

Ocorrência de enteroparasitose na população do município de Goioerê, PR

QUALIDADE DE VIDA DE ENTEROPARASITADOS POR MEIO DO SF-36

A FREQUÊNCIA DE ENTEROPARASITOSES EM CRIANÇAS DE PONTA GROSSA: UM PANORAMA DE 10 ANOS DE EXTENSÃO UNIVERSITÁRIA

Uériton Dias de Oliveira 1 Simone Jurema Ruggeri Chiuchetta 2

16º CONEX - Encontro Conversando sobre Extensão na UEPG Resumo Expandido Modalidade B Apresentação de resultados de ações e/ou atividades

ACADEMIA DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA RODRIGO LUPINO LINHARES DE CASTRO AVALIAÇÃO DE PARASITOSES INTESTINAIS EM ALUNOS DE ESCOLA

ANALISE MICROBIOLÓGICA E PARASITOLÓGICA DA ÁGUA DE TUPARETAMA 1A 1B 2A 2B 3A 3B 4A 4B 5A 5B 6A 6B 7A 7B 8A 8B 9A 9B 10A 10B

FREQUENCIA DE ENTEROPARASITOSES EM CRIANÇAS DE CINCO INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO DE PONTA GROSSA PR DURANTE OS ANOS DE 2014 A 2016

INQUÉRITO PARASITOLÓGICO NA CECAP * DISTRITO-SEDE DE BOTUCATU, ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL

PREVENÇÃO DE ENTEROPARASITOS EM CRIANÇAS E MANIPULADORES DE ALIMENTOS NA CRECHE FABIANO LUCENA DA CIDADE DE JOÃO PESSOA-PB.

PREVALÊNCIA DE PARASITOSES INTESTINAIS EM ESCOLARES NO MUNICÍPIO DE SÃO JOAQUIM, SC *

ENTEROPARASITOSES EM ESCOLARES RESIDENTES NA PERIFERIA DE PORTO ALEGRE, RS, BRASIL

PREVALÊNCIA DE ENTEROPARASITOS EM ESCOLARES DA REGIÃO DE PONTA GROSSA PARANÁ,

PREVALÊNCIA DE ENTEROPARASITAS EM HORTALIÇAS NA CIDADE DE SANTOS SP BRASIL

OCORRÊNCIA DE ENTEROPARASITOSES EM ALUNOS DE DUAS ESCOLAS NO DISTRITO DE ITAIACOCA EM PONTA GROSSA - PARANÁ

ENTEROPARASITOSES EM CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE ABRIGAMENTO

INTRODUÇÃO. 15. CONEX Resumo Expandido - ISSN

FREQUÊNCIA DE PARASITOS INTESTINAIS EM CRIANÇAS E MANIPULADORES DE ALIMENTOS NO CREI SANTA CLARA (CASTELO BRANCO) NA CIDADE DE JOÃO PESSOA-PB.

PREVALÊNCIA E DISTRIBUIÇÃO DE ENTEROPARASITOSES EM CRIANÇAS DE TRÊS CENTROS MUNICIPAIS DE EDUCAÇÃO INFANTIL EM TERESINA-PIAUÍ

CONTROLE DE PARASITOSES INTESTINAIS ATRAVÉS DA EDUCAÇÃO EM SAÚDE EM CRIANÇAS DO ENSINO FUNDAMENTAL DE CASCAVEL PR

OCORRÊNCIA DE HELMINTOS E PROTOZOÁRIOS INTESTINAIS EM IDOSOS

DIAGNÓSTICO DE PARASITOS PATOGÊNICOS E NÃO PATOGÊNICOS EM CRIANÇAS DO MUNICÍPIO DE PONTA GROSSA PR ( )

OCORRÊNCIA DE PARASITOSE INTESTINAIS EM MUNICÍPIOS DO ESTADO DO PIAUÍ: UMA REVISÃO SISTEMÁTICA

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

Ocorrência de parasites intestinais em escolares da Escola Estadual de l. Grau Dom Abel, em Goiânia

TERESA CRISTINA CÉSAR OGLIARI 1 JAQUELINE THOMÉ PASSOS 2

FREQUÊNCIA DE ENTEROPARASITOSES EM CRIANÇAS DE PONTA GROSSA PR NO ANO DE 2017

( 02 ) Teórica ( 02 ) Prática

PALAVRAS-CHAVE Enteroparasitoses. Prevalência. Trabalho Extensionista. Saúde.

AVALIAÇÃO DA FREQUÊNCIA DE PARASITOSE INTESTINAL EM INDIVÍDUOS ATENDIDOS EM UM LABORATÓRIO DE ANÁLISES CLÍNICAS NA REGIÃO CENTRAL DE MOGI GUAÇU

PERFIL PARASITOLÓGICO DE ESCOLARES DA LOCALIDADE DE SANTA MARIA, ZONA RURAL DO MUNICÍPIO DE SÃO MATEUS/ES, BRASIL

PESQUISA DE PARASITOS INTESTINAIS EM INTERNATOS NA CIDADE DE ANÁPOLIS- GOIÁS

PLANO DE ENSINO I IDENTIFICAÇÃO CURSO: NUTRIÇÃO MODALIDADE: - DISCIPLINA: PARASITOLOGIA ( X ) OBRIGATÓRIA ( ) OPTATIVA DEPARTAMENTO: PARASITOLOGIA

Prevalência de Parasitos Intestinais no Município de Sananduva/RS. Keywords: Enteric parasites, helmintos, intestine parasites

PREVALÊNCIA DE ENTEROPARASITAS EM CRIANÇAS DE CRECHES DA PERIFERIA DO MUNICÍPIO DE SÃO MATEUS ES

PREVALÊNCIA DE ENTEROPARASITOS EM IDOSOS

TÍTULO: AUTORES: INSTITUIÇÃO ÁREA TEMÁTICA

PALAVRAS-CHAVE Diagnóstico Laboratorial. Enteroparasitoses. Profilaxia. Crianças.

a to ARTIGO ORIGINAL INTRODUÇÃO

PREVALÊNCIA DE ENTEROPARASITAS EM CRIANÇAS DE UMA COMUNIDADE CARENTE DO MUNICÍPIO DE GUARATINGUETÁ/SP.

INVESTIGAÇÃO DA INCIDÊNCIA DE PARASITOSES EM PARÁ DE MINAS-MG E REGIÃO

PALAVRAS-CHAVE Enteroparasitos. Exames coproparasitológicos. Educação em saúde.

PREVALÊNCIA DE PARASITOSES INTESTINAIS ENTRE OS USUÁRIOS DO CENTRO DE SAÚDE DO DISTRITO DE SOUSAS, CAMPINAS, SP ( )

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DA PARASITOLOGIA

Laboratório Franco. São Mateus, ES. (3)

ANÁLISE DO ÍNDICE DE PARASITOSES INTESTINAIS E ESQUITOSSOMOSE NA ZONA RURAL RIBEIRINHA DO MUNICIPIO DE MOGEIRO, PARAÍBA

MAPEAMENTO EPIDEMIOLÓGICO DAS

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS INSTITUTO DE PATOLOGIA TROPICAL E SAÚDE PÚBLICA CURSO DE GRADUAÇÃO EM BIOTECNOLOGIA Tel (62) FAX

Monitores: Anne Galvão; Edmar Ceia.

artigo original Silvia R. Pavan da Silva, 1 Natacha Arrosi, 2 Roberta Stefanello de Jesus, 2 Roberta Souza dos Reis 1 e Marilise Brittes Rott 1 RESUMO

ENTEROPARASITOSES COMO FATOR DE INTERFERÊNCIA NEGATIVA NOS PROCESSOS EDUCATIVOS DE ESCOLAS DA ZONA URBANA DE SANTANA DO IPANEMA, AL.

Introdução ao Curso. Relação Parasita- Hospedeiro. Aula prática introdutória A e B SA. Flagelados cavitários. Trichomonas. Giardia.

INVESTIGAÇÃO DE ENTEROPARASITOSES EM PRÉ- ESCOLARES NO MUNICÍPIO DE JUAZEIRO DO NORTE, CEARÁ

PREVALÊNCIA DE PARASITOSES EM PACIENTES ATENDIDOS EM LABORATÓRIOS DE PALMAS (TOCANTINS)

PARASITAS INTESTINAIS E DESEMPENHO ESCOLAR DE CRIANÇAS DE ESCOLA MUNICIPAL EM TERESINA-PI

91 10 dias após. 96,1 7 e 14 dias após. 96,6 12 dias após dias após

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DEPARTAMENTO DE ANÁLISES CLÍNICAS PLANO DE ENSINO SEMESTRE 2016/2

OCORRÊNCIA DE ENTEROPARASITOS EM CENTROS DE EDUCAÇÃO INFANTIL NO MUNICÍPIO DE PATOS DE MINAS, MG, BRASIL

PREVALÊNCIA E FATORES ASSOCIADOS À ENTEROPARASITOSES EM ESCOLARES DE UMA ESCOLA MUNICIPAL DE JOÃO PESSOA PB

PREVALÊNCIA DE PARASITOSES INTESTINAIS EM PACIENTES DA UNIDADE MISTA DE SAÚDE EM TANGARÁ DA SERRA, MATO GROSSO, BRASIL

ENTEROPARASITOSES EM ESCOLARES DO DISTRITO DE MARTINÉSIA, UBERLÂNDIA, MG: UM ESTUDO-PILOTO

Curso de Farmácia EMENTA DE DISCIPLINA

Parasitos intestinais: frequência e aspectos epidemiológicos em usuários de um laboratório particular

ENTEROPARASITOSIS IN A CHILDREN S EDUCATION CENTER IN IRETAMA / PR

Curso de Farmácia EMENTA DE DISCIPLINA

Anais do 2º Congresso Brasileiro de Extensão Universitária Belo Horizonte 12 a 15 de setembro de 2004

Curso de Farmácia EMENTA DE DISCIPLINA

OCORRÊNCIA DE ENTEROPARASITOSES EM ALUNOS DA ESCOLA MUNICIPALIZADA DEPUTADO SALIM SIMÃO EM SANTO ANTÔNIO DE PÁDUA (RJ)

PARASITISMO INTESTINAL EM UMA COMUNIDADE CARENTE DO MUNICÍPIO DE BARRA DE SANTO ANTÔNIO, ESTADO DE ALAGOAS

PREVALÊNCIA DE ENTEROPARASITOSES EM CRIANÇAS DO SERTÃO BAIANO PELO MÉTODO DE SEDIMENTAÇÃO ESPONTÂNEA

J. Health Biol Sci. 2017; 5(2): doi: / jhbs.v5i p

Levantamento de dados parasitológicos... SEGOVIA, D. B.; SOUZA, M. A. A. de

Doutor, Professor do Departamento de Análises Clínicas e Toxicológicas da UEPG. 3

PREVALÊNCIA DE ENTEROPARASITOSES, NO MUNICÍPIO DE PARELHAS, RIO GRANDE DO NORTE, BRASIL

Evolução da prevalência de parasitoses intestinais em escolares em Caxias do Sul, RS

Parasitas intestinais e comensais em indivíduos de três Vilas Rurais do Estado do Paraná, Brasil

PREVENÇÃO DE ENTEROPARASITOS EM CRIANÇAS E MANIPULADORES DE ALIMENTOS EM CRECHES DA CIDADE DE JOÃO PESSOA - PB - PROBEX 2012

ANÁLISE DAS CRECHES: AMBIENTE EXPOSITOR OU PROTETOR DAS ENTEROPARASITOSES E SUA PREVALÊNCIA

COMISSÃO ORGANIZADORA

Frequência de parasitas intestinais em um hospital terciário com atendimento SUS

Avaliação inicial da prevalência de algumas enteroparasitoses na comunidade de Palmital, município de Berilo-MG

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS INSTITUTO DE PATOLOGIA TROPICAL E SAÚDE PÚBLICA CURSO DE GRADUAÇÃO EM BIOTECNOLOGIA Tel (62) FAX

INCIDÊNCIA DE ENTEROPARASITOS EM ALUNOS DO ENSINO FUNDAMENTAL (2º AO 5º ANOS) DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL DE SÃO LUÍS MA.

Prevalência de Enteroparasitas em Exames Coprológicos na população geronte da cidade de Pau dos Ferros(RN)

Revista de Biologia e Ciências da Terra ISSN: Universidade Estadual da Paraíba Brasil

Método de trabalho independente: elaboração de relatórios posteriormente às aulas práticas.

Validação do número de lâminas para realização do método de sedimentação espontânea das fezes. Re s u m o. 1 In t r o d u ç ã o

PREVALÊNCIA DE PARASITAS INTESTINAIS EM ALUNOS DE 5 A 12 ANOS DA REDE PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE GURUPI, TOCANTINS, BRASIL.

UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

DESCRITORES: Enteroparasitos. Comunidade remanescente quilombola. Perfis sanitários. Saneamento básico.

PREVALÊNCIA DAS PARASITOSES INTESTINAIS NO MUNICÍPIO DE IBIASSUCÊ BAHIA

Contaminação enteroparasitária em cédulas de dinheiro provenientes das cantinas de um Centro de Educação Superior em Belo Horizonte Minas Gerais.

TÍTULO: CANTINEIROS DO CAMPUS I DA UFPB: FONTE DE CONTAMINAÇÃO PARA SEUS USUÁRIOS? AUTORES: SANTOS*, G. S. O.; LOPES*, T. R. A.; MACEDO Jr*, E. M.

ENFERMAGEM DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS. OUTRAS DOENÇAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS Aula 1. Profª. Tatiane da Silva Campos

ENTEROPARASITOSES EM USUÁRIOS DA REDE MUNICIPAL DE SAÚDE DE CAMPINAS, SÃO PAULO

Parasitologia clínica Curso: Ciências Biológicas Modalidade Médica. Professora Rose

Transcrição:

Acta Scientiarum 22(2):593-597, 2000. ISSN 1415-6814. Controle de parasitoses intestinais na comunidade do Núcleo Habitacional Santa Felicidade de Maringá, Paraná, Brasil Maria da Luz Ribeiro Moitinho*, Andrea Cláudia Bekner Silva Roberto, Eneide Aparecida Sabaini Venazzi, Maria Teresinha Gomes Casavechia e Andréa Brustolin Pereira Departamento de Análises Clínicas, Universidade Estadual de Maringá, Av. Colombo, 5790, 87020-900, Maringá-Paraná, Brazil. *Author for correspondence. RESUMO. Relata-se a experiência do desenvolvimento de projeto envolvendo diagnóstico e controle de parasitoses intestinais junto aos moradores do Núcleo Habitacional Santa Felicidade, em Maringá. O projeto compreendeu avaliação do perfil socioeconômico das famílias, investigação da prevalência de parasitoses intestinais, atividades de educação sanitária e tratamento dos indivíduos infectados. Infecções por protozoários e/ou por helmintos foram encontradas em 47,0% e em 49,4% da população examinada. Exames parasitológicos de fezes, realizados após tratamento, revelaram que foram baixas as taxas de cura obtidas. Embora o projeto tenha permitido o levantamento da real situação das parasitoses intestinais, bem como o tratamento de parte dos indivíduos infectados e a troca entre o saber acadêmico e o saber popular, os resultados da intervenção proposta não foram satisfatórios. As dificuldades encontradas e o baixo impacto das medidas propostas sobre o controle das parasitoses intestinais podem estar associados ao baixo nível social e econômico em que vive essa comunidade. Ações outras que resultem em melhora no nível educacional e conseqüentemente no nível econômico das famílias são necessárias junto a essa comunidade. Palavras-chave: parasitas intestinais, controle de enteroparasitoses, educação sanitária, participação comunitária, tratamento de enteroparasitas. ABSTRACT. Control of intestinal parasitoses in the community of Núcleo Habitacional Santa Felicidade of Maringá, state of Paraná, Brazil. A project of diagnosis and control of intestinal parasitoses carried out in the community of Núcleo Habitacional Santa Felicidade in Maringá, is here described. The project comprised an evaluation of the families socioeconomic profile, investigation of prevalence of intestinal parasites, activities of health education and treatments of the infected individuals. Protozoan and/or helminthic infections were found, respectively, in 47.0% and in 49.4% of the population investigated. Post-treatment parasitological analysis showed low cure rate. Although the project had allowed a survey of the real situation of intestinal parasitoses, the treatment of part of the infected individuals and the exchange of academic and popular knowledge, the results of the proposed intervention were not satisfactory. The difficulties met and the low impact of the proposed measures on the control of intestinal parasitoses may be associated with the low social and economic level of the community. Further actions, which may result in improvement of the educational level of the individuals and consequently in the improvement of the families economic level should be carried out in that community. Key words: intestinal parasites, enteroparasitoses control, health education, community participation, enteroparasites treatment. As infecções parasitárias estão distribuídas praticamente por todo o mundo, e são elevadas as taxas de prevalência em numerosas regiões. Entre as 10 infecções mais comuns observadas no universo estão a amebíase, a ascaridíase, a ancilostomíase e a tricuríase (OMS,1987). Ainda que a mortalidade ocasionada pelas enteroparasitoses seja relativamente baixa, observam-se, às vezes, complicações, que em muitos casos exigem atenção hospitalar. A má-absorção, a

594 Moitinho et al. diarréia, a perda de sangue, a capacidade diminuída de trabalho, a reduzida taxa de crescimento, bem como as deficiências de cognição e de aprendizado, devidas às infecções parasitárias intestinais, constituem importantes problemas sanitários e sociais (OMS,1987; Nokes e Bundy,1994). Para reduzir a prevalência das parasitoses intestinais exige-se uma associação de medidas que envolvem o saneamento ambiental, a educação sanitária e o tratamento dos indivíduos infectados (Botero, 1981; Hayashi et al., 1981). São reconhecidas, no entanto, as dificuldades de combate às parasitoses intestinais, seja pelos altos custos financeiros exigidos para o saneamento básico e para o uso de quimioterápicos, seja pelas dificuldades de mudanças de práticas comportamentais errôneas, observadas principalmente em populações carentes. As dificuldades práticas do controle das parasitoses podem ser amenizadas mediante a implantação de medidas integradas que envolvam parcerias entre instituições acadêmicas, autoridades sanitárias e principalmente a comunidade. Além de atuar no controle e prevenção das infecções prevalentes em suas próprias localidades, a comunidade pode funcionar como um meio de se obter o desenvolvimento de questões outras de saúde, as quais podem resultar no desenvolvimento geral da população envolvida (OMS, 1987; Pedrazzani et al., 1989). Pretendeu-se, através do presente projeto, estabelecer um programa de parceria entre a Universidade Estadual de Maringá e a comunidade do Núcleo Habitacional Santa Felicidade, objetivando o diagnóstico e o controle de parasitoses intestinais. Material e métodos População. O trabalho foi desenvolvido no Núcleo Habitacional Santa Felicidade, o qual está localizado na região sul da cidade de Maringá. O núcleo é constituído por cerca de 246 casas, correspondendo a uma população de aproximadamente 1.200 pessoas. A população dispõe de água tratada para consumo e de vaso sanitário no interior da casa. Exame parasitológico de fezes. Amostras de fezes de crianças e adultos foram colhidas, durante as visitas domiciliares, e encaminhadas ao Laboratório de Parasitologia Clínica da Universidade Estadual de Maringá. Cada amostra fecal foi submetida às técnicas de flutuação, segundo Willis, e de Kato modificada por Katz (Amato Neto e Correa, 1980). A solução saturada de cloreto de sódio, recomendada para a técnica de Willis, foi substituída por solução de sulfato de zinco de massa específica igual a 1.200 kg/m 3 (Golvan, 1977). Paralelamente à obtenção das amostras fecais, foram colhidas, em formulários próprios, informações sobre as condições sociais e econômicas das famílias. Educação sanitária. As atividades de educação sanitária incluíram palestras e/ou orientações sobre os mecanismos de transmissão, sintomatologia e prevenção das principais parasitoses intestinais, além de orientações gerais de saúde. Tais atividades foram desenvolvidas junto aos escolares, durante o período de aula, e junto aos pais, durante a coleta das amostras fecais para exame. As atividades de educação sanitária, junto aos escolares e pais, foram complementadas por meio de apresentação de peça teatral e feira de saúde. Tratamento. Pacientes com resultados de exame parasitológico de fezes positivo foram submetidos a tratamento, sob orientação médica, em consultas agendadas para este fim no posto de saúde local (Posto de Saúde Cidade Alta). Infecções por protozoários foram tratadas com metronidazol, enquanto que o mebendazol foi utilizado para tratar as infecções produzidas por helmintos. Avaliação das medidas propostas. O nível de alcance dos objetivos propostos foi avaliado mediante observação dos conhecimentos adquiridos pela população, durante as discussões realizadas com a comunidade, e mediante a reanálise de amostras fecais entre 2 e 5 meses após o tratamento dos indivíduos infectados. A taxa de cura foi expressa como a porcentagem de casos com exame de fezes negativo para uma dada espécie de protozoário ou helminto, em relação ao número total de casos positivos registrados antes do tratamento. No que se refere à taxa de infecção, esta foi expressa como a porcentagem de casos positivos para uma dada espécie não diagnosticada antes do tratamento, em relação ao número total de casos avaliados após tratamento. Resultados e discussão Entre um total de aproximadamente 1.200 pessoas que integravam a comunidade do Núcleo Habitacional Santa Felicidade, 621 (51,8%) submeteram-se a exames parasitológicos de fezes. Destas, 292 (47,0%) mostraram-se infectadas por protozoários e/ou helmintos intestinais (Tabela 1), sendo que 102 (34,9%) interessaram-se pelo

Controle de parasitoses intestinais 595 tratamento. Entre os pacientes tratados, apenas 29 (28,4%) submeteram-se a um novo exame parasitológico de fezes. Como a avaliação do tratamento e das medidas de educação sanitária ficou prejudicada pelo baixo número de pessoas que atendeu a uma nova solicitação de exame parasitológico de fezes (29 entre as 102 tratadas), decidiu-se recomeçar o trabalho, o qual ficou restrito, desta vez, aos moradores de 3 ruas, entre as 5 existentes no bairro. Nesta etapa foram realizados 235 exames parasitológicos de fezes. Ovos de helmintos e/ou cistos de protozoários foram encontrados em 116 (49,4%) das amostras examinadas (Tabela 2). Das 116 pessoas infectadas, 65 (56,0%) submeteram-se a tratamento e 45 (69,2%) foram reavaliadas mediante uma nova série de exames parasitológicos de fezes. Os índices de prevalência observados em ambos os levantamentos realizados não diferiram substancialmente entre si. Foram, no entanto, superiores aos índices registrados para a maioria dos inquéritos realizados, nos últimos 5 anos, em outras populações da cidade de Maringá (Casavechia et al., 1996; Casavechia et al., 1998; Moitinho et al., 1999). Excluindo-se as infecções por protozoários comensais, os resultados do primeiro levantamento realizado mostram que as espécies mais freqüentes foram Ascaris lumbricoides (9,8%); Hymenolepis nana (8,7%); Giardia lamblia (8,4%); ancilostomídeos (6,6%) e Strongyloides stercoralis (6,1%). No segundo levantamento, os maiores índices de positividade foram registrados para as infecções produzidas por A. lumbricoides (14,5%); H. nana (9,8%); S. stercoralis (8,5%); Entamoeba histolytica (7,2%) e G. lamblia (5,5%). Os altos índices de prevalência registrados para as espécies acima mencionadas denotam uma alta exposição da população ao solo contaminado e a hábitos higiênicos precários. Resultados dos exames parasitológicos realizados após o tratamento são mostrados na Tabela 3. As taxas de infecção registradas mostraram índices inferiores a 4,1%. Com relação a taxa de cura, e considerando-se como um todo as infecções por protozoários e por helmintos, pode-se dizer que foram baixas as taxas de cura obtidas. Chama a atenção, no entanto, os baixos índices registrados para as infecções por H. nana (35,7%); T. trichiura (50,0%); S. stercoralis (57,1%); ancilostomídeos (60,0%) e G. lamblia (60,0%). As baixas taxas de cura podem estar associadas a vários fatores, entre os quais podemos destacar o uso inadequado ou o não uso das drogas recomendadas, já que a medicação foi administrada em casa, e o fato de poder ter havido reinfecções no período decorrido entre o tratamento e a avaliação parasitológica realizada. Tabela 1. Prevalência de protozoários e helmintos intestinais em crianças e adultos residentes no Núcleo Habitacional Santa Felicidade, no período de junho a dezembro de 1997, associada à faixa etária Faixa Etária Amostras Prevalência (%) Examinadas Positivas Protozoários Helmintos (anos) (N o ) (%) GL EH EC EN IB AL AN SS EV TT HN TA SM <=01 41 31,7 24,4 0,0 2,4 2,4 0,0 4,9 0,0 2,4 0,0 2,4 4,9 0,0 0,0 02 a 05 84 57,1 21,4 5,9 25,0 7,1 1,2 14,3 0,0 1,2 1,2 3,6 21,4 0,0 0,0 06 a 10 101 65,3 11,9 2,0 30,7 5,9 2,0 23,8 7,9 4,9 6,9 8,9 18,8 1,0 0,0 11 a 15 70 48,6 4,3 8,6 15,7 10,0 0,0 10,0 5,7 8,6 7,1 5,7 11,4 0,0 0,0 >=16 321 40,2 2,8 4,0 19,6 7,5 0,9 5,0 9,0 7,5 0,0 1,6 1,9 0,6 0,3 * 04 50,0 0,0 0,0 25,0 0,0 0,0 0,0 0,0 25,0 0,0 0,0 25,0 0,0 0,0 Total 621 47,0 8,4 4,2 20,6 7,1 1,0 9,8 6,6 6,1 2,1 3,5 8,7 0,5 0,2 * Idade não fornecida; GL= Giardia lamblia; EH= Entamoeba histolytica; EC= Entamoeba coli; EN= Endolimax nana; IB= Iodamoeba butschilii; AL= Ascaris lumbricoides; AN= Ancilostomídeos; SS= Strongyloides stercoralis; EV= Enterobius vermicularis; TT= Trichuris trichiura; HN= Hymenolepis nana; TA= Taenia sp; SM= Schistosoma mansoni Tabela 2. Prevalência de protozoários e helmintos intestinais em crianças e adultos residentes no Núcleo Habitacional Santa Felicidade, no período de maio a dezembro de 1998, associada à faixa etária Faixa Etária Amostras Prevalência (%) Examinadas Positivas Protozoários Helmintos (anos) (N o ) (%) GL EH EC EN IB AL AN SS EV TT HN TA <=1 06 33,3 16,7 0,0 0,0 0,0 0,0 16,7 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 02 a 05 44 52,3 18,2 4,5 13,6 4,5 0,0 22,7 0,0 2,3 4,5 2,3 20,5 2,3 06 a 10 45 64,4 2,2 15,6 31,1 17,8 0,0 26,7 2,2 6,7 0,0 8,9 15,6 0,0 11 a 15 25 40,0 4,0 8,0 16,0 8,0 0,0 16,0 4,0 8,0 0,0 0,0 8,0 0,0 >=16 115 45,2 1,7 5,2 20,9 10,4 0,9 6,1 6,1 12,2 0,9 0,9 4,3 0,9 Total 235 49,4 5,5 7,2 20,4 10,2 0,4 14,5 3,8 8,5 1,3 2,6 9,8 0,9 GL= Giardia lamblia; EH= Entamoeba histolytica; EC= Entamoeba coli; EN= Endolimax nana; IB= Iodamoeba butschilii; AL= Ascaris lumbricoides; AN= Ancilostomídeos; SS= Strongyloides stercoralis; EV= Enterobius vermicularis; TT= Trichuris trichiura; HN= Hymenolepis nana; TA= Taenia sp.

596 Moitinho et al. Tabela 3. Resultados de exames parasitológicos de fezes entre 74 moradores do Núcleo Habitacional Santa Felicidade reavaliados após tratamento Protozoários/helmintos Resultados após tratamento Cura Não cura Taxa de infecção após tratamento N % N % N % Giardia lamblia 6/10 60,0 4/10 40,0 2/74 2,7 Entamoeba histolytica 9/10 90,0 1/10 10,0 3/74 4,1 Entamoeba coli 16/31 51,6 15/31 48,4 3/74 4,1 Endolimax nana 11/15 73,3 4/15 26,7 1/74 1,3 Ascaris lumbricoides 14/16 87,5 2/16 12,5 2/74 2,7 Ancilostomídeos 6/10 60,0 4/10 40,0 0/74 0,0 Strongyloides stercoralis 8/14 57,1 6/14 42,9 1/74 1,3 Enterobius vermicularis 3/3 100,0 0/0 0,0 2/74 2,7 Trichuris trichiura 3/6 50,0 3/6 50,0 0/74 0,0 Hymenolepis nana 5/14 35,7 9/14 64,3 2/74 2,7 Taenia sp 1/1 100,0 0/0 0,0 0/74 0,0 Um outro fato para o qual chamamos a atenção é o de que nos esquemas de tratamento das parasitoses intestinais propostos pelos serviços de saúde utilizam-se, normalmente, drogas de amplo espectro, cuja eficácia, para determinadas parasitoses, é sabidamente reduzida. No presente estudo, para o tratamento das infecções produzidas por helmintos foi usado o mebendazol, droga não de escolha, para o tratamento de infecções produzidas por S. stercoralis e H. nana (Rey, 1991a; Rey, 1991c; Dórea et al., 1996). Soma-se a este fato a possibilidade de ocorrência de auto-infecções internas e externas, as quais dificultam sobremaneira o tratamento destas infecções (Rey, 1991a; Rey, 1991b). Embora o projeto tenha permitido o levantamento da real situação das parasitoses intestinais e o tratamento de parte dos indivíduos infectados, bem como a troca entre o saber acadêmico e o saber popular, os resultados da intervenção proposta não foram satisfatórios. Nos diversos contatos realizados com a comunidade, durante as visitas domiciliares, observou-se que a percepção dos moradores com relação à importância das parasitoses intestinais na saúde dos indivíduos parece não ter sido alterada ao longo do desenvolvimento do projeto. Isto pôde ser notado pelo pouco interesse da população tanto na coleta das amostras fecais quanto na disponibilidade para o tratamento. Considerando-se ambos os levantamentos, das 408 pessoas infectadas, apenas 167 (40,9%) se dispuseram a fazer o tratamento. Destas, 74 (44,3%) atenderam a uma nova solicitação de exame para reavaliação das medidas propostas. Ainda que se tenha notado na população envolvida ampliação dos conhecimentos adquiridos com relação à transmissão e prevenção das parasitoses intestinais, estes conhecimentos, não foram, de fato, incorporados a sua vida cotidiana. Mudanças de práticas comportamentais errôneas não foram notadas durante todo o desenvolvimento do projeto. As dificuldades encontradas, bem como o baixo impacto das medidas propostas sobre o controle das parasitoses intestinais podem estar associados ao baixo nível social e econômico em que vive essa comunidade. Embora ela disponha de água tratada para consumo e de vaso sanitário no interior da casa, as condições de vida de grande parte da população são precárias. Da análise dos formulários, dos quais foram colhidos dados sobre as condições sociais e econômicas da população, observa-se que os que se submeteram aos exames parasitológicos de fezes, respectivamente, 58,8% e 84,4% pertencem a famílias cujos pais e mães não têm instrução ou apenas apresentam instrução primária incompleta. Cerca de 83,0% têm renda familiar entre menos que 1 até no máximo 3 salários mínimos e 22,2% pertencem a famílias compostas por 9 ou mais membros. Os resultados do presente trabalho, bem como as observações feitas por outros autores (Botero, 1981; Pedrazzani et al., 1989) mostram que o controle das parasitoses intestinais, em determinadas comunidades, deve prever medidas muito mais amplas do que as tradicionalmente recomendadas. Os procedimentos esporádicos de duração e extensão limitadas, que não estejam associados a mudanças fundamentais do modo de vida da população afetada, levam freqüentemente a resultados desalentadores. Assim, pode-se dizer que o sucesso de qualquer intervenção em saúde sobre uma dada comunidade, no sentido de transformá-la, depende necessariamente de ações outras que resultem em melhora no nível educacional e consequentemente no nível econômico das famílias. Referências bibliográficas Amato Neto, V.; Corrêa, L.L. Exame parasitológico das fezes. São Paulo: Sarvier, 1980, p. 56-72. Botero, D. Persistencia de parasitosis intestinales endemicas en America Latina. Bol. Of. Sanit. Panam., 90(1):39-47, 1981. Casavechia, M.T.G.; Moitinho, M.L.R.; Roberto, A.C.B.S. Prevalência e controle de enteroparasitoses em escolares do município de Maringá-PR. In: FORUM DE EXTENSÃO E CULTURA DA UEM, 1, 1996, Maringá. Anais... Maringá: UEM-PEC-DEX-DCU, 1996. Casavechia, M.T.G.; Roberto, A.C.B.S.; Moitinho, M.L.R.; Venazzi, E.A.S. Levantamento de parasitoses intestinais em escolares do município de Maringá-PR. In: SEMANA DE INTEGRAÇÃO DA FARMÁCIA,

Controle de parasitoses intestinais 597 12, 1998, Maringá. Anais... Maringá:UEM-Capes- PET/Farmácia, 1998. Dórea, R.C.C.; Salata, E.; Padovani, C.R.; Dos Anjos, G.L. Control of parasitic infections among school children in the peri-urban area of Botucatu, São Paulo, Brazil. Rev. Soc. Bras. Med. Trop., 29(5):425-430, 1996. Golvan, Y.J. Coprologia parasitária. In: Golvan, Y.J.; Pettory, I.C.; Drouhet, E.; Segratain, G.; Mariat, F. (ed.). Examenes de laboratorio: técnicas en parasitologia, técnicas en micologia. Barcelona: Editorial Jims, 1977. p.18. Hayashi, S.; Suemitsu, T.; Kunni, C. Programa de control de las helmintíases transmitidas através del suelo en Japon. Bol. Chile Parasit., 36:2-5, 1981. Moitinho, M.L.R.; Roberto, A.C.B.S.; Venazzi, E.A.S.; Casavechia, M.T.G. Prevalência de parasitas intestinais em pacientes atendidos pelo laboratório de ensino e pesquisa em análises clínicas da UEM. In: CONGRESSO DE FARMÁCIA E ANÁLISES CLÍNICAS DE MARINGÁ, 3, 1999, Maringá. Anais... Maringá: UEM-DAC-Lepac-DFF, 1999. p. 58. Nokes, C.; Bundy, D.A.P. Does helminth infection affect mental processing and educational achievement? Parasitol. Today, 10(1):14-18, 1994. Organización Mundial de la Salud. Prevención y control de las infecciones parasitárias intestinales. Spain: OMS, 1987. (Série de informes técnicos, 749). Pedrazzani, E.S.; Mello, D.A.; Pizzigatti, C.P.; Pripas, S.; Fucci, M.; Santoro, M.C.M. Helmintoses intestinais - III - Programa de Educação e Saúde em Verminose. Rev. Saúde Públ., 23(3):189-95, 1989. Rey, L. Himenolepíases, difilobotríase e outras Cestoidíases. In:. Parasitologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1991a. p.464. Rey, L. Strongyloides stercoralis e Estrongiloidíase. In:.Parasitologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1991b. p.505. Rey, L. Strongyloides stercoralis e Estrongiloidíase. In:. Parasitologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1991c. p.509. Received on February 15, 2000. Accepted on March 30, 2000.