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Transcrição:

VARIABILIDADE DO SISTEMA DE MONÇÕES DE VERÃO DURANTE O HOLOCENO NA REGIÃO CENTRO-OESTE DO BRASIL, COM BASE EM REGISTROS PALEOCLIMÁTICOS DE ESPELEOTEMAS Marcos Saito de Paula 1 ; Francisco W. Cruz Jr. 1 ; Ivo Karmann 1 ; Hai Cheng 2 ; R. Lawrence Edwards 2 ; Nicolás M. Strikis 1 ; Valdir F. Novello 1 ; Augusto S. Auler 3 msaito@usp.br 1 - Instituto de Geociências, Universidade de São Paulo, Rua do Lago, 562, Cidade Universitária, 05508-080, São Paulo, SP 2 - Department of Geology and Geophysics, University of Minnesota, 55455, Minneapolis, Minnesota EUA 3 - Instituto do Carste, Rua Kepler 385/04, 30360-240, Belo Horizonte, MG Rua do Lago, 562, Cidade Universitária, 05508-080, São Paulo, SP Palavras-chave: paleoclimatologia, espeleotemas, Holoceno, monções, isótopos de oxigênio 1. INTRODUÇÃO A região Centro Oeste do Brasil tem potencial para ser uma importante fonte de registros paleoclimáticos que auxiliem a compreensão do comportamento das Monções Sul Americanas de Verão (MSA). Estas monções controlam boa parte das chuvas do continente sul americano, e uma parte importante deste sistema de monções é a Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS). A ZCAS leva umidade desde o norte da Amazônia até o sudeste do país (Vera et al., 2006), e influencia diretamente o regime de chuvas da região Centro Oeste. Este trabalho utiliza espeleotemas, formações carbonáticas depositadas em cavernas, como fontes de registros das razões isotópicas de oxigênio (δ 18 O) e carbono (δ 13 C). Tais registros têm se mostrado muito importantes no estudo das variações no regime de chuvas associado à atividade da MSA (Cruz et al., 2005a; Cruz et al., 2005b; Wang et al., 2006; Cruz et al., 2006; Cruz et al., 2007; Wang et al., 2007; Wang et al., 2008). Foram utilizados também dados de razões de vários elementos traços como Mg/Ca e Sr/Ca. A combinação de registros de δ 18 O com razões de Mg/Ca a Sr/Ca de espeleotemas sugere que a intensificação da MSA é a principal causa do aumento da paleopluviosidade média anual na faixa subtropical brasileira (Cruz et al., 2007; Karmann et al., 2007). No entanto, existe uma ausência quase completa de estudos em extensas regiões do Brasil diretamente afetadas pelas monções de verão, como a região centro-oeste do país, e é neste contexto que o presente trabalho está inserido.

2. METODOLOGIA Foram utilizados espeleotemas de cavernas do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, precisamente datados pelo método U/Th. Estas amostras em geral apresentam idades que abrangem os últimos 1.000 a 2.000 anos, com crescimento contínuo, possibilitando estudos em alta resolução para o período citado. Para todas as amostras foi coletado material para análise isotópica com resolução de 0,4 mm e para 3 amostras foi coletado material para análise de elementos traços. 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO Neste resumo são apresentados os dados de isótopos de carbono e oxigênio e elementos traços para o espeleotema JAR 4, da caverna Jaraguá, em Bonito MS. O gráfico com estes dados se encontra na Figura 1. Figura 1 Gráficos de isótopos de oxigênio e carbono e de elementos traço para a amostra JAR 4. O primeiro aspecto a ser observado é que os dois parâmetros isotópicos apresentam boa correlação entre si. Se for considerado que o δ 18 O representa quantidade de chuva, sendo

os valores mais negativos sinônimos de maior pluviosidade (Gascoyne, 1992; McDermott, 2004), os dados de δ 13 C também seguem este padrão. Outro aspecto de fácil percepção são dois platôs distintos no gráfico de δ 18 O, o primeiro com valores de -4 a -7, entre 950 e 1300 anos, e outro entre -6,5 e -8, de 1400 a 1800 anos, seguido de uma subida para valores menos negativos próximo do presente. Nestes dois platôs é possível identificar duas anomalias climáticas do último milênio: Anomalia Climática Medieval e a Pequena Idade do Gelo. Não existe uma idade exata para estas duas anomalias na literatura paleoclimatógica, mas em geral considera-se o período de 1300/1400 até 1850/1900 para a Pequena Idade do Gelo e 900 a 1300 para a Anomalia Climática Medieval (Jones & Mann, 2004). A América do Sul como um todo tem boa parte de suas chuvas controlada pelas Monções Sul Americanas de Verão (MSA), e a região Centro Oeste do Brasil está sob influência de uma parte essencial deste sistema de monções, a Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS), que leva umidade desde o norte da Amazônia até o sudeste do país (Vera et al., 2006). De fato, Garcia e Kayano (2010) descrevem o começo e o fim da MSA como variações sazonais de convecção associadas ao Alto da Bolívia, ZCAS e a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT). Outro fenômeno climático a ser estudado será o El Niño/Oscilação Sul (ENOS), que através de suas duas fases (El Niño fase quente e La Niña fase fria) é uma das maiores fontes de variações climáticas interanuais em várias partes do mundo, inclusive a América do Sul (Kayano & Andreoli, 2007). Ainda segundo estes autores, estudos recentes indicam também que esta influência do ENOS nas variações climáticas da América do Sul está também condicionada por modos de variação de baixa freqüência como a Oscilação Decadal do Pacífico (ODP). Os modos e padrões climáticos do Oceano Atlântico também têm seu papel na influência da MSA. Segundo Knight (2006), a Oscilação Multidecadal do Atlântico (OMA) está relacionada a diversas variações multidecadais observadas no clima de algumas porções dos continentes banhados por este oceano. Ainda segundo este mesmo autor, o curto intervalo de tempo coberto pelas observações instrumentais ainda limita a confiança nestas relações, no que os dados deste projeto podem ser de grande valia. Ainda no Oceano Atlântico, existem variações atmosféricas como a Oscilação do Atlântico Norte (OAN), que podem também influenciar as variações da MSA (Kayano & Andreoli, 2004). Fica claro nestes e em outros estudos (como por exemplo em Kayano et al. 2009) a necessidade de registros paleoclimáticos que estendam o período coberto pelas observações instrumentais, com alta resolução e ótimo controle temporal, características presentes nos dados deste projeto. As razões elementares encontram-se também em fase entre si, como mostra a porção inferior da Figura 1 com platôs estáveis entre 1000 e 1400 anos, desde então se observa um aumento progressivo no valor dos dados, culminando entre os anos de 1600 e 1700 anos DC

nas mais altas precipitação dos elementos observados ao longo dos últimos mil anos registrados pela JAR 4. Embora os gráficos de razões elementares estejam em fase entre si, suas variações são inversamente proporcionais quando essas são comparados ao gráfico de δ 18 O. O decréscimo entre os anos de 1500 e 1800 anos DC nos dados de δ 18 O é relacionado a um aumento das razões elementares dos elementos traços, essa correlação ocorre quase perfeitamente ao longo dos últimos 1000 anos registrados, havendo, portanto uma correlação negativa entre as razões elementares e os isótopos estáveis. Diferentemente dos trabalhos realizados em água e espeleotemas da caverna Santana, Iporanga-SP (Karmann et al., 2007), os dados presentes neste relatório não indicam que o mecanismo de Prior Calcite Precipitation (PCP) (Fairchild et al. 2000, Treble et al. 2003) é preponderante na variação da composição química da água que forma os espeleotemas. A análise dos últimos 1000 anos DC registrados pela JAR 4, registra comportamento oposto ao esperado na relação entre as razões isotópicas e elementares se o mecanismo principal para variação das razões elementares fosse PCP, como pode ser observado principalmente no intervalo entre 1400 e 1800 anos DC. Esses registros indicam que algum outro mecanismo hidrogeoquímico é dominante no sistema cárstico no qual a caverna Jaraguá está integrada. Variações na produtividade do solo poderiam explicar a correlação antifásica entre a razão isotópica δ 13 C e as razões elementares de Mg, Sr e Ba (Beynen, et al., 2008). REFERÊNCIAS Beynen, P.E., Soto, L., Pace-Graczyk, K. 2008. Paleoclimate reconstruction derived from speleothem strontium and δ 13 C in Central Florida. Quaternary International, 187, 76 83. Cruz Jr., F.W., Karmann, I., Viana Jr., O., Burns, S.J., Ferrari, J.A., Vuille, M., Moreira, M.Z., Sial, A.N., 2005a. Stable isotope study of cave percolation waters in subtropical Brazil: implications for paleoclimate inferences from speleothems. Chemical Geology, 220, 245-262. Cruz Jr., F.W., Burns, S.J., Karmann, I., Sharp, W.D., Vuille, M., Cardoso, A.O., Ferrari, J.A., Silva Dias, P.L., Viana Jr., O., 2005b. Insolation-driven changes in atmospheric circulation over the past 116 ky in subtropical Brazil. Nature, 434, 63-66. Cruz Jr, F.W., Burns, S.J., Karmann, I., Sharp, W.D., Vuille, M., 2006. Reconstruction of regional atmospheric circulation features during the Late Pleistocene in subtropical Brazil from oxygen isotope composition of speleothems. Earth Planetary Science Letters, 248, 494-506. Cruz Jr, F.W., Burns, S.J., Jercinovic, M., Karmann, I., Sharp, W.D, Vuille, M., 2007. Evidence of rainfall variations in southern Brazil from trace-element ratios (Mg/Ca and Sr/Ca) in a Late Pleistocene stalagmite. Geochimica Cosmochimica Acta, 71, 2250 2263.

Fairchild I.J., Borsato A., Tooth A.F., Frisia S., Hawkesworth C.J., Huang Y., McDermott F., Spiro, B. 2000. Controls on trace element (Sr-Mg) compositions of carbonate cave waters: implications for speleothem climatic records. Chemical Geology 166:255-269. Garcia, S. R.; Kayano M. T., 2010, Some evidence on the relationship between the South American monsoon and the Atlantic ITCZ. Theor. Appl. Climatol, 99:29 38. Gascoyne, M., 1992. Palaeoclimate determination from cave calcite deposits. Quaternary Science Reviews 11, 609 632. Jones, P. D., and M. E. Mann. 2004. Climate over past millennia, Rev. Geophys., 42, RG2002 Karmann, I., Cruz Jr., F. W., Viana Jr., O., Burns, S. J., 2007. Climate influence on trace element geochemistry of waters from Santana Pérolas cave system, Brazil. Chemical Geology, 244, 232-247. Kayano, M. T., and Andreoli, R. V. 2004. Decadal variability of northern northeast Brazil rainfall and its relation to tropical sea surface temperature and global sea level pressure anomalies, J. Geophys. Res., 109, C11011. Kayano, M. T., Andreoli, R. V., 2007. Relation of South American Summer rainfall interannual variations with the Pacific Decadal Oscillation. International Journal of Climatology, 27:531-540. Kayano, M. T., Oliveira, C.P., Andreoli, R. V.. Interannual relations between South American rainfall and tropical sea surface temperature anomalies before and after 1976. Int. J. Climatol. 29: 1439 1448 (2009) Knight, J. R.; Folland, C. K.; Scaife A. A., 2006, Climate impacts of the Atlantic Multidecadal Oscillation. Geophysical Research Letters, v. 33, L17706. McDermott, F., 2004. Palaeo-climate reconstruction from stable isotope variations in speleothems: a review. Quaternary Science Reviews 23, 901 918. Treble, P., Shelley, J.M.G., Chappell, J., 2003. High resolution subannual records of trace elements in a modern (1911 1992) speleothem from southwest Australia. Earth and Planetary Science Letters 16, 141 153. Vera, C., Higgins, A.W., Amador, B.J., Ambrizzi, C.T., Garreaud, D.R., Gochis, E.D., Gutzler, F.D., Lettenmaier, G.D., Marengo, H.J., Mechoso, I.C.R., Nogues-Paegle, J.J., Silva Dias, K.P.L., Zhang, C., 2006. Toward a unified view of the American Monsoon Systems. American Meteorological Society - Journal Of Climate - Special Section, 19, 4977-5000 Wang, X., Auler, A. S., Edwards, R. L., Cheng, H., Ito, E., Wang, Y. J., Kong, X.G., Solheid, M., 2007. Millennial-scale precipitation changes in southern Brazil over the past 90,000 years, Geophysical Research Letters, 34, L23701, doi:10.1029/2007gl031149 Wang, Y.J. et al., 2008. Millennial- and orbital-scale changes in the East Asian monsoon over the past 224,000 years. Nature, 451: 1090-1093.