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Transcrição:

Senhor General Ramalho Eanes, Senhora Ministra da Justiça, Dra. Francisca Van Dunen, Senhor Professor Adriano Moreira, Senhor Professor Francisco Louçã, Senhoras e Senhores Deputados, permitam-me que cumprimente todos na pessoa da Deputada Maria Antónia Almeida Santos, Senhora Embaixadora de Moçambique, Dra. Fernanda Eugénia Lichale, Senhor Dr. José Menezes, Diretor da Comunicação da Leya, Minhas Senhoras e Meus Senhores, Bem-vindos à Assembleia da República, Bem-vindos a esta casa que Almeida Santos soube prestigiar como poucos. 1

António de Almeida Santos deixou-nos há pouco tempo mas a saudade já é imensa, porque as suas qualidades pessoais, políticas e intelectuais eram de facto únicas e inesgotáveis. Almeida Santos foi um grande homem de Estado e um homem de grande cultura. Deixou a sua impressão digital em leis fundamentais e em discursos e textos memoráveis. Ficou célebre a sua facilidade de escrita e o seu gosto pela escrita. 2

Este livro que hoje apresentamos foi a sua derradeira obra, editada já postumamente, e na nota introdutória, os filhos referem-se ao livro como o trigésimo primeiro irmão, tal era o amor que ele tinha à escrita e a tantas obras que publicou. Como homem de Estado e ministro da Coordenação Interterritorial foi testemunha e protagonista de um dos Ds de abril: o D da descolonização. Há 41 anos as antigas colónias africanas tornaram-se nações livres e independentes. 3

Se o 25 de abril de 1974 foi o momento fundador da nossa democracia, as independências africanas representaram o fim do isolamento de Portugal na Europa e no mundo. Se estávamos vergonhosamente sós, e agora estamos orgulhosamente acompanhados, enquanto nação democrática, solidária e cosmopolita, isso deve-se à visão de homens como Almeida Santos. A única coisa que podemos lamentar é que essa visão não tenha sido partilhada mais cedo pelos poderes públicos portugueses. 4

Adriano Moreira recorda no prefácio a esta obra justamente esse «lúcido olhar» de Almeida Santos que logo «anteviu a evolução da ordem internacional e os paradigmas que eram apontados como guias para a dissolução do Império Euromundista». Isso fica muito claro nesta recolha de textos censurados e apreendidos pela PIDE, escritos no seu tempo de Moçambique, um tempo que Almeida Santos recorda como o «tempo do ódio». Estes processos deixam sempre feridas, naqueles que partiram abruptamente deixando tudo para trás e naqueles que ficaram, donos da sua terra mas humilhados por séculos de colonização. 5

Enquanto líder do Grupo dos Democratas de Moçambique, Almeida Santos bateu-se pela descolonização e pelas independências, compatíveis com uma efetiva igualdade de direitos, em paz, sem retornados nem retaliações. Já sabemos que os homens fazem a história mas não escolhem as circunstâncias em que a fazem. As circunstâncias foram as que foram. 6

O que importa agora é que a cooperação dos afetos que temos hoje com a África lusófona, se transforme cada vez mais numa saudável cooperação política e económica, assente numa língua que é das mais faladas em todo o mundo. Em boa hora cedeu Almeida Santos à pressão de publicar estes textos de combate à ditadura no seu tempo de Moçambique. Aqui temos a prova de que as suas qualidades políticas e intelectuais já vinham de longe, tendo-se mantido intactas até ao último dia, como se vê pelo prefácio que assina. 7

Deixem-me só partilhar convosco uma história que ele aqui recorda e que nos recorda o grande contador de histórias que ele era. Em Moçambique, Almeida Santos e mais três signatários europeus assinaram um manifesto contra o Estatuto do Indigenato de má memória. A PIDE decidiu prender dois dos quatro signatários. Almeida Santos, na sua generosidade habitual, defendeu junto do diretor local que ou iam todos presos ou soltavam os dois detidos. Foram soltos. E mais tarde o processo seria mesmo arquivado por intervenção do ministro da Defesa da altura. 8

O motivo do arquivamento não deixa de ser divertido, no meio de uma situação política sem graça nenhuma: é que quer o ministro da Defesa, quer Almeida Santos, acompanharam Amália Rodrigues à guitarra, numa ida da grande fadista a Moçambique. «Os ditadores têm, não raro, as suas fraquezas», remata Almeida Santos. Deixo-vos com esta nota da sua fina ironia. Não vos tomo mais tempo, pois temos mais intervenções neste final de tarde. Agradeço a vossa presença. 9

Agradeço à família, em particular à Maria Antónia Almeida Santos, o convite que me fizeram. Contem sempre comigo para tudo o que signifique honrar a memória deste grande Presidente da Assembleia da República e deste grande português. Mais uma vez, muito obrigado. 10