OS VENTOS, AS ONDAS E AS MARÉS COMO AGENTES GEOLÓGICOS DE SUPERFÍCIE MODELADORES DAS FAIXAS LITORÂNEAS ARTIGO 9. Pelo Geólogo Josué Barroso



Documentos relacionados
DEFINIÇÃO MAIS SIMPLES

; leilanecabofrio@hotmail.com. brunolopescosta@gmail.com ;

GEOLOGIA GERAL CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

OS CLIMAS DO BRASIL Clima é o conjunto de variações do tempo de um determinado local da superfície terrestre.

SEQUÊNCIA DIDÁTICA PODCAST CIÊNCIAS HUMANAS

PRAIAS. i - Terminologia ii Quebra de ondas iii Morfologia iv Transport de sedimentos. v Impcto mpact of tidal ranges on beach morphol

GEOLOGIA GERAL CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

Estrutura da Terra Contributos para o seu conhecimento

CLIMATOLOGIA. Profª Margarida Barros. Geografia

OS ESTUÁRIOS NA MARGEM CONTINENTAL SUL dialética do acontecimento sedimentar

O CLIMA PORTUGUÊS: Noções básicas e fatores geográficos Regiões climáticas portuguesas

Universidade de São Paulo Departamento de Geografia FLG Climatologia I. Pressão Atmosférica

DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA MARINHA BACHARELADO EM BIOLOGIA MARINHA ONDAS MARINHAS ABILIO SOARES GOMES

A TERRA ONTEM, HOJE E AMANHÃ

Elementos Climáticos CLIMA

Climatologia GEOGRAFIA DAVI PAULINO

O Clima do Brasil. É a sucessão habitual de estados do tempo

Fenômenos e mudanças climáticos

Sistema Sol-Terra-Lua

ÓRBITA ILUMINADA HU F 152/ NT4091

HABITATS MARINHOS E COSTEIROS

Elementos e fatores climáticos

GRAVITAÇÃO. 1. (Ufmg 2012) Nesta figura, está representada, de forma esquemática, a órbita de um cometa em torno do Sol:

B I O G E O G R A F I A

Climatologia. humanos, visto que diversas de suas atividades

Clima e Formação Vegetal. O clima e seus fatores interferentes

Faculdade de Administração e Negócios de Sergipe

VARIAÇÃO DA RADIAÇÃO SOLAR AO LONGO DO ANO EM PORTUGAL

45 mm INDICADORES DE PALEOLINHAS DE COSTA E VARIAÇÕES DO NÍVEL DO MAR NA PLATAFORMA CONTINENTAL SUL DE ALAGOAS

Clima, tempo e a influência nas atividades humanas

Colégio Santa Dorotéia

Prof: Franco Augusto

CAPÍTULO 13 OS CLIMAS DO E DO MUNDOBRASIL

Exercícios de Alteração na Paisagem e Morfologia Litorânea

COLÉGIO SÃO JOSÉ PROF. JOÃO PAULO PACHECO GEOGRAFIA 1 EM 2011

Atmosfera e o Clima. Clique Professor. Ensino Médio

CAPÍTULO 2 A ATMOSFERA TERRESTRE

Figura 1: Localização da Praia de Panaquatira. Fonte: ZEE, Adaptado Souza, 2006.

PAUTA DO DIA. Acolhida Revisão Interatividades Intervalo Avaliação

Acumulados significativos de chuva provocam deslizamentos e prejuízos em cidades da faixa litorânea entre SP e RJ no dia 24 de abril de 2014.

CARACTERÍSTICAS MORFODINÂMICAS DA PRAIA DE ITAPIRUBÁ, SC, BRASIL. Palavras-chave: Praias arenosas, morfodinâmica praial, morfologia de praia

COLÉGIO SALESIANO DOM BOSCO

Ano: 6º Turma: 6.1 / 6.2

Interacção Oceano-Atmosfera. O transporte de calor pelos oceanos. Os oceanos como reguladores do clima.

INFORMATIVO CLIMÁTICO

GEOGRAFIA. c) quanto menores os valores de temperatura e pluviosidade, maior é a

Os principais tipos climáticos mundiais

Estações do Ano e Fases da Lua

OS CICLOS BIOGEOQUÍMICOS: ÁGUA, CARBONO E NITROGÊNIO. Profº Júlio César Arrué dos Santos

Escola Estadual Jerônimo Gueiros Professor (a) Supervisor (a): Ary Pereira Bolsistas: Ana Moser e Débora Leyse

Hidrografia: área que estuda as águas. Bacia hidrográfica: Conjunto de terras drenadas por um rio principal e seus afluentes.

Areias e Ambientes Sedimentares

Ciclo hidrológico. Distribuição da água na Terra. Tipo Ocorrência Volumes (km 3 ) Água doce superficial. Rios. Lagos Umidade do solo.

Centro de Ensino Superior do Amapá CEAP. Curso de Arquitetura e Urbanismo. Disciplina: Estudos Ambientais Prof. Msc. João Paulo Nardin Tavares

PREVISÃO CLIMÁTICA TRIMESTRAL

COLÉGIO MARQUES RODRIGUES - SIMULADO

CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

Cada nova camada que se forma sobrepõe-se e comprime as camadas mais antigas, situadas por baixo dela

FUNDAMENTOS DE ESCOLA NÁUTICA FABIO REIS METEOROLOGIA

GEOLOGIA GERAL GEOGRAFIA

PRIMEIROS ANOS. GEOGRAFIA CONTEÚDO P2 2º TRI Água: superficiais, oceânicas e usos. Profº André Tomasini

Sensoriamento Remoto. Características das Imagens Orbitais

TEMA 6 CIRCULAÇÃO GERAL DA ATMOSFERA

CAPÍTULO 8 O FENÔMENO EL NIÑO -LA NIÑA E SUA INFLUENCIA NA COSTA BRASILEIRA

Objetivo Conteúdos Habilidades

Massas de ar do Brasil Centros de ação Sistemas meteorológicos atuantes na América do Sul Breve explicação

SISTEMA SOLAR TERRA, SOL E LUA

IMPACTOS DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS NO LITORAL DO ESTADO DE SÃO PAULO: EFEITOS DA ELEVAÇÃO DO NÍVEL DO MAR

Mariângela de Oliveira-Abans. MCT/Laboratório Nacional de Astrofísica

Esquema: Representação da força de atração gravitacional entre dois corpos de massas M 1 e M 2

Análise sinótica associada a ocorrência de chuvas anômalas no Estado de SC durante o inverno de 2011

NÍVEL MÉDIO DO MAR. Diagrama triangular

GERÊNCIA EDUCACIONAL DE FORMAÇÃO GERAL E SERVIÇOS CURSO TÉCNICO DE METEOROLOGIA ESTUDO ESTATISTICO DA BRISA ILHA DE SANTA CATARINA

45 mm SEDIMENTAÇÃO NO SEGMENTO COSTEIRO DE ITAIPU-CAMBOINHAS (NITERÓI-RJ) DURANTE O PLEISTOCENO MÉDIO/FINAL E HOLOCENO INICIAL.

GEOGRAFIA. Professora Bianca

A importância das dunas frontais na avaliação da evolução da linha de costa- O caso da Praia da Manta Rota

b)condução.- O vapor d água e os aerossóis aquecidos, aquecerão por contato ou condução o restante da mistura do ar atmosférico, ou seja, o ar seco.

Geografia - Clima e formações vegetais

ESTRUTURAS METÁLICAS

RECUO DA LINHA DE COSTA/DEFENDER OU RETIRAR?

Ciências Humanas e Suas Tecnologias - Geografia Ensino Médio, 1º Ano Fatores climáticos. Prof. Claudimar Fontinele

Climas do Brasil GEOGRAFIA DAVI PAULINO

MATÉRIA 6º 2º Dez/13 NOTA

O MEIO AMBIENTE CLIMA E FORMAÇÕES VEGETAIS

LAUDO TÉCNICO DA PRAIA DA PONTA NEGRA MANAUS - AM

CAPÍTULO 4 DESASTRES NATURAIS

Bloqueio atmosférico provoca enchentes no Estado de Santa Catarina(SC)

Figura 2.1. Baía de Todos os Santos (Grupo de Recomposição Ambiental/ Gérmen).

Fusos Horários do Brasil

Este caderno, com dezesseis páginas numeradas sequencialmente, contém dez questões de Física. Não abra o caderno antes de receber autorização.

Sol. O Balanço de Energia do Planeta

Tsunamis INTERNATIONAL CENTRE FOR COASTAL ECOHYDROLOGY. Oficina da Prevenção das Catástrofes Naturais Departamento Educacional do ICCE

Exercícios Tipos de Chuvas e Circulação Atmosférica

15 O sistema solar e seus planetas

Instituto de Pesquisas Hidráulicas. IPH - UFRGS, Porto Alegre, RS, Brasil. Av. Bento Gonçalves 9500, , Porto Alegre, RS, Brasil

(QRV3LFD]]LR NÃO HÁ PERMISSÃO DE USO PARCIAL OU TOTAL DESTE MATERIAL PARA OUTRAS FINALIDADES. NASA

Ecologia Geral CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

C E E A A E C B C C

A Terra gira... Nesta aula vamos aprender um pouco mais. sobre o movimento que a Terra realiza em torno do seu eixo: o movimento de

Os Grandes Biomas Terrestres. PROF Thiago Rocha

Transcrição:

OS VENTOS, AS ONDAS E AS MARÉS COMO AGENTES GEOLÓGICOS DE SUPERFÍCIE MODELADORES DAS FAIXAS LITORÂNEAS 1 Origens dos Agentes Geológicos ARTIGO 9 Pelo Geólogo Josué Barroso Inicialmente, como base para o entendimento dos efeitos que modelam as faixas litorâneas, constituídas por praias, procura-se apresentar uma descrição dos agentes geológicos de superfície intervenientes no processo. Quando as ondas eletromagnéticas do Sol alcançam a atmosfera terrestre, aproximadamente 40% da energia correspondente é refletida para o espaço, sem qualquer mudança. Dos 60% restantes, uma parcela de, aproximadamente, 20% é absorvida pela atmosfera, aquecendo-a. O restante final (40%) é absorvido pelos oceanos e pelos continentes. A parcela da energia absorvida pelos oceanos aquece a água, produzindo evaporação, vapor d água, chuvas, neves e todas as demais formas de precipitação. A parte absorvida pelos solos e rochas também causam aquecimento e, conseqüentemente o ar, podendo produzir correntes de convecção originadoras de ventos que, soprando sobre os oceanos, produzem ondas. Assim os maiores agentes de transporte de sedimentos, atuantes sobre a superfície da Terra, têm como fonte primária a energia solar. As marés refletem as ações combinadas de atração gravitacional entre a Terra e a Lua e, complementarmente, o Sol. As energias cinéticas da Terra e da Lua também participam do processo de formação das marés movimentando-a pelos oceanos como consequência da rotação da Terra em torno do seu eixo e do movimento orbital da Lua em torno da Terra. O equilíbrio dessas forças, cujo centro de massa situa-se no interior da Terra, a uma distância de 1/4 de seu raio, impede a aproximação Terra x Lua e, a medida que a Terra gira, provoca protuberâncias nas massas oceânicas em movimento contínuo, assim estabelecendo o ciclo das marés.

A força centrífuga produzida pela rotação da Terra distribui-se homogeneamente por toda ela, enquanto a força gravitacional é maior para os pontos mais próximos da Lua. Sendo assim, na face da Terra voltada para a Lua é produzido um alto de maré dominado pela força gravitacional, enquanto na face oposta o alto de maré produzido é dominado pela força centrífuga. Sabe-se que a Lua tem duas passagens, a cada 24h50m sobre um determinado meridiano terrestre, daí resulta que, aproximadamente, a cada 8 horas, num ponto fixo da Terra, são observados um pico de maré alta e um pico de maré baixa. De forma mais exata, os 4 picos, até aqui referidos, são observados em dias sucessivos com uma defasagem de 50 minutos. Em virtude da proximidade, a Lua exerce o dobro da força gravitacional exercida pelo Sol, mas a conjugação das forças gravitacionais da Lua e do Sol responde por variações significativas na amplitude das marés. Durante um mês, as variações no alinhamento do Sol e da Lua produzem marés de sizígia (Lua Nova e Lua Cheia), quando se verifica o alinhamento do sistema, enquanto que as marés de quadratura (Quarto Minguante e Quarto Crescente) são presentes quando o sistema se encontra em oposição (Figura 1). Em relação às marés de quadratura, as marés de sizígia são cerca de 20% mais altas, na maré alta, e 20% mais baixas, na maré baixa. Ciclos completos de marés de sizigia e de quadratura, duas de cada, repetem-se em intervalos de 29,5 dias Em função de variações ditadas pela latitude, os regimes de marés são classificados em 3 tipos: micromarés marés de sizígia menores que 2 metros (litorais do sul e do sudeste); mesomarés marés de sizígia entre 2 e 4 metros (litoral leste e parte do litoral do nordeste) e macromarés- marés de sizígia maiores que 4 metros (parte do litoral nordeste e litoral norte). Acrescente-se que as marés podem sofrer variações de escalas de tempo diferentes, com destaque para as mudanças de intensidade e direção dos ventos, fruto das variações de pressões atmosféricas, próprias da passagem de frentes frias Tais variações podem alcançar até 2 metros na Região Sudeste.

Figura 1 Ciclos das marés: efeitos conjugados das atrações gravitacionais da Lua e do Sol e da rotação da Terra. Fonte: Souza et al (2005) 2 Praias As praias são constituídas de depósitos de sedimentos inconsolidados, formados na interface entre o continente e o mar e que se mostram em permanente mutação, geométrica e topográfica, como conseqüência de processos associados a ondas, marés, ventos e correntes derivadas. Os conjuntos praiais da Região Oceânica exibem faixas emersas morfologicamente planas e com grandes estoques de areia em suas partes

submersas. Conforme Souza et al (2005), cerca de 2/3 da população mundial habita as regiões costeiras, o que corresponde a menos de 15% da superfície terrestre. Tal concentração populacional, por si só, traduz a importância que essas regiões encerram. Considerando a ausência de padronização da nomenclatura dos conjuntos praiais, apresenta-se abaixo um perfil normal à linha de costa, com suas ondulações e faixas características, conforme Muhe (2008) e Souza et al (2005) - Face da praia: faixa emersa na maré baixa e submersa na maré alta. - Pós praia: faixa só invadida por ondas de ressacas ou por marés excepcionalmente altas. - Ante praia: faixa que se estende desde o limite inferior da face da praia até onde as ondas normais não afetam mais a superfície de fundo, o que corresponde a profundidades variáveis de 10 a 20 metros. - Zona de surfe e arrebentação: faixa que se estende desde a primeira até a última linha de quebra das ondas. - Bermas: terraços formados na pós praia, acima do limite da maré alta (face da praia). Como conseqüência de variações de energia das ondas, mais de uma berma podem ser formadas. Ondas de baixa energia tendem ao modelamento da face da praia, enquanto as ondas de ressacas avançam o processo erosivo, aplainam a superfície e formam berma na pós praia, (V. Foto 1) onde a energia é dissipada, e, no recuo, transportam e depositam sedimentos na plataforma submersa. É um processo cíclico que, por vezes, forma bancos longitudinais afogados (barras). Figura 2 Nomenclatura de um perfil de praia. Fonte:Muhe (2008)

Foto 1 Processo erosivo, na Praia de Piratininga, com formação de berma e afloramento de blocos de rocha, deixados quando da realização de obras passadas. Tais blocos permanecem cobertos de areia durante longos períodos de tempo, só aflorando quando da ocorrência de ressacas. A dinâmica das ondas, somada à variação das marés, constituem processo cujo entendimento é altamente importante seja bem analisado, com a realização de perfis transversais periódicos, tendo em vista as intervenções provenientes de projetos urbanísticos na orla das praias. As praias da Região Oceânica ressaltam essa importância. 3 A origem dos cordões litorâneos arenosos da Região Oceânica Na formação dos cordões litorâneos arenosos da Região Oceânica, a concepção mais recente aponta para uma origem por afogamento de praias e dunas costeiras durante os eventos de subida do nível do mar (Muhe, 2008). Vejam o Artigo 8. Tal concepção é baseada nas ocorrências de alinhamentos submersos de arenitos de praia (beach rocks), fronteiriços às praias do Estado do Rio de Janeiro, o que atesta a posição de antigas linhas de costa, assim sugerindo que os cordões litorâneos desse trecho migraram para as posições atuais, juntamente com a elevação do nível do mar, como mostra a Figura 3. Esta

concepção decorre do conhecimento de que os arenitos de praia (beach rocks) são formados por cimentação por CaCO 3 (carbonato de cálcio), dando coesão e resistência à erosão aos bancos arenosos e, por conseqüência, possibilitando manterem-se na posição atual. Uma vez deslocado, o cordão arenoso, posicionado entre o mar e a planície costeira interior, sofreu a ação de uma nova elevação do nível do mar, originadora das lagunas de Itaipu e Piratininga. Figura 3 Migração de ilhas barreiras como resultado de transgressão do mar. Fonte: Souza et al (2005) 4 Bibliografia - Muhe, D. (2008) Geomorfologia Costeira, in Geomorfologia-Uma Atualização de Bases e Conceitos 8ª Ed. - Cap.6 pp.253/308 Ed.Bertrand Brasil Rio de Janeiro - Silva, C.G.;Patchineelam, S.M.;Baptista Neto, J.A.e Ponzi,V.R.A. (2005)Ambientes de Sedimentação Costeira e Processos Morfodinâmicos

Atuantes na Linha de Costa, in Introdução à Geologia Marinha Cap.8 pp175/218 Ed. Interciência Rio de Janeiro