Museu, Migrações e Identidades

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Transcrição:

Relato de Evento: Seminário Internacional Museu, Migrações e Identidades Revista Rosa dos Ventos Turismo e Hospitalidade 7(1) 168-172, jan-mar, 2015 O(s) Autor(es) 2015 ISSN: 2178-9061 Associada ao: Programa de Mestrado e Doutorado em Turismo e Hospitalidade Hospedada em: http://ucs.br/revistarosadosventos Ana Paula Garcia Spolon 1 FICHA TÉCNICA Título: Seminário Internacional Museu, Migrações e Identidades Organização: Governo do Estado de São Paulo / Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo / Museu da Imigração e Consulado Geral dos Estados Unidos da América em São Paulo Data: 26 a 28 março 2015 Local: Museu da Imigração O Seminário Internacional Museus, Migrações e Identidades, realizado entre os dias 26 e 28 do mês de março de 2015, foi organizado pelo Governo do Estado de São Paulo, Consulado Geral dos Estados Unidos da América em São Paulo, Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo e Museu da Imigração (MI), com o objetivo de discutir temas relacionados a fluxos migratórios e sua relação com o mundo contemporâneo. O evento gratuito contou com apoio de instituições como o Consulado Geral da Argentina no Brasil e o British Council. Centrado nos conceitos de migrações e identidades, em associação com a realidade de centros museológicos que direta ou indiretamente trabalham o tema dos deslocamentos humanos, o evento contou 1 Ana Paula Garcia Spolon Doutora. Estágio Pós-Doutoral em Hospitalidade, na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo e em Geografia, Análise Territorial e Estudos Turísticos, na Universitat Rovira i Virgili (Tarragona, Espanha). Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP). Líder do Grupo de Pesquisa Hospitalidade em Contextos Contemporâneos (CNPq/IFSP). E-mail: anapaulaspolon@gmail.com

Ana Paula Garcia Spolon 169 com a presença de delegados brasileiros e estrangeiros, estes baseados nos Estados Unidos, Reino Unido, Argentina e Uruguai. Nosso interesse de participação decorre da natureza das pesquisas desenvolvidas no âmbito do Grupo de Pesquisa Hospitalidade em Contextos Contemporâneos, credenciado junto ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e vinculado ao Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo (IFSP), que envolvem, entre outros temas, estudos sobre o deslocamento humano e o processo social de acolhimento de estrangeiros, a prática da hospitalidade em consonância com os direitos humanos e a dimensão ética da hospitalidade. Neste sentido, havia a expectativa de que os temas do turismo e da hospitalidade fossem abordados, o que efetivamente se deu na fala de diversos delegados e participantes. As comunicações evidenciaram que os temas das migrações e identidades vêm sendo tratados sob novas perspectivas, em decorrência da própria globalização e como consequência da complexidade do mundo contemporâneo. Da mesma forma, a forma de inserção desses assuntos no âmbito da museologia vem sendo revista e repensada por profissionais vinculados a inúmeras áreas do conhecimento. O seminário esteve estruturado em quatro seções temáticas, além da Mesa de Abertura e de uma visita não monitorada às dependências do Museu da Imigração esta realizada no final da manhã do primeiro dia. Das seções temáticas participaram 24 delegados, distribuídos nos papeis de pesquisadores e representantes institucionais. As discussões orientadas durante os três dias do evento possibilitaram um aprendizado profícuo e a expansão e fortalecimento de uma rede de pesquisadores cujos interesses de pesquisa envolvem, em alguma medida, os temas do seminário. Representantes institucionais abriram o evento, entre os quais o da Secretaria Estadual de Cultura de São Paulo, do Museu da Imigração, do Consulado Geral dos Estados Unidos da América em São Paulo e do Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), além do fotógrafo responsável pela exposição Retratos Imigrantes, João Kulcsár. À abertura do evento seguiu-se uma visita livre pelo espaço da exposição de longa duração Migrar: experiências, memórias e identidades, montada com o objetivo precípuo de trazer à público parte dos resultados do esforço de preservação e pesquisa do Museu da Imigração, no que concerne ao processo migratório, este percebido como um fenômeno permanente. A primeira seção formal do evento distribuiu-se na tarde do dia 26 e na manhã e parte da tarde do dia 27 e constituiu-se de quatro mesas, seguidas de debates. A primeira mesa foi dedicada ao tema Hospedarias musealizadas e contou com representantes do Centro de Memória da Imigração da Ilha das Flores (UERJ, Rio de Janeiro), da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP, São Paulo) e do Ellis Island Immigration Museum (Nova York). Representando a Ellis Island, Diana Pardue abordou a história do centro de imigrantes, o primeiro instalado nos Estados Unidos e considerado referência mundial do conceito de hospedarias musealizadas. Entre as características do espaço, cite-se a disponibilização de audioguias em nove idiomas, para atender aos mais quatro milhões de visitantes anuais. Uma das colocações mais desafiadoras, feita pela palestrante, foi a importância (e a necessidade) de nos reconhecermos como sujeitos, no movimento geral das migrações contemporâneas, colocando-nos em dimensão de proximidade em relação a problemas que comumente tratamos como exteriores e distantes. Representando a Ilha das Flores (UERJ), o Prof. Dr. Luís Resnik contou a história da ilha e do fluxo migratório a ela dirigido, apresentando-a como um lugar de estada, mais do que de passagem, para imigrantes, migrantes, refugiados, flagelados, presidiários e revoltosos. O

170 Relato de evento - Seminário Internacional Museu, Migrações e Identidades professor ainda destacou a condição da ilha como Base Militar ativa, o que determina o fluxo diário dos componentes do Corpo de Fuzileiros Navais, além de servidores da Marina. A Ilha das Flores, enquanto espaço musealizado, funciona em parceria entre a Marinha do Brasil e a UERJ, na modalidade de projeto de pesquisa e extensão. O terceiro representante veio da UNIFESP. O Prof. Dr. Odair Paiva, do Departamento de História, falou sobre a tarefa recente de reposicionamento da antiga Hospedaria dos Imigrantes do Brás como um espaço musealizado, dedicado à imigração e não ao imigrante, como anteriormente. O pesquisador resgatou a história do lugar e os desafios de reestruturá-lo como espaço musealizado e de construir uma nova forma de discurso expositivo, inserindo o espaço no circuito cultural da cidade de São Paulo. Destacou, ainda, o fato de este processo ainda estar em andamento e de constituir um importante e interessante objeto de reflexão para diversos atores sociais. A segunda mesa foi dedicada ao tema das Diásporas e fluxos migratórios e contou com a presença de Maria Cristina de Oliveira Bruno, Ana Lúcia Lopes e Roberta Sundfeld, representando respectivamente o Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (USP), o Museu Afro-Brasil e o Museu Judaico (a ser inaugurado em 2016), todos em São Paulo. Diferentes identidades e diversidade cultural foram os motes da discussão, no contexto do desconforto e dos conflitos provocados por ou decorrentes dos deslocamentos humanos. Destaca-se o debate em torno de conceitos como exclusão, preconceito, desconhecimento e crise de identidade, os grandes desafios das instituições museológicas dedicadas a etnias e identidades específicas. O primeiro dia do evento foi encerrado pela diretora do MI, Marília Bonas, que reiterou a importância de as diferenças culturais serem respeitadas e valorizadas, em prol da construção de uma sociedade multicultural que esteja organizada com base no princípio da igualdade. Dando sequência ao evento, o segundo dia dividiu-se em dois módulos de debates. O primeiro deles foi conduzido ao redor do tema Museus, identidades e comunidades e contou com a participação de Dilney Cunha (diretor no Museu Nacional de Imigração e Colonização de Joinville), Sidney Tartaruga (representando o Museu da Favela, do Rio de Janeiro) e Julia Cort (representante do Horniman Museum and Gardens, localizado na região sul de Londres). Mais antigo museu brasileiro dedicado à temática da imigração, o Museu Nacional de Imigração e Colonização de Joinville passa por uma fase de mudanças, na qual o maior desafio é tornar-se mais acessível a outras categorias de imigrantes, diferentes das que originalmente chegaram à cidade. Adaptação ao mundo contemporâneo, inserindo o tema da imigração, também é o desafio do Horniman Museum and Gardens, que surgiu como o espaço de uma coleção particular para se tornar versátil e inclusivo, com atenção para reflexões sobre direitos de refugiados. Sidney Tartaruga apresentou o contexto do Museu da Favela, localizado na junção das comunidades do Cantagalo e Pavão-Pavãozinho, no Rio de Janeiro, onde vivem muitos migrantes e imigrantes. Para ele, a favela é um lugar de encontros e de sociabilidade, embora não seja um lugar reconhecido como parte da cidade. O assunto do quarto módulo temático foram os Museus de imigração na América Latina, com os testemunhos de Marcelo Carlos Huernos (Museo Nacional de la Inmigración, Buenos Aires MUNTREF), Irene Cabrera (Museo de las Migraciones, Montevideo) e Marília Bonas (MI). Os relatos dos três participantes da mesa convergem em diversos pontos, entre os quais estão os desafios da associação entre os espaços museológicos e as populações das cidades onde os mesmos estejam instalados, estas hoje compostas de um amálgama cultural inegável. Outro desafio apresentado pelas instituições é a integração das experiências contemporâneas de imigração com as representações históricas de movimentos migratórios, na direção da construção de lugares de memória coletiva. Neste sentido, Marcelo Huernos relatou as dificuldades e perspectivas para a implantação do que se pretende que seja um centro

Ana Paula Garcia Spolon 171 contemporâneo para a diversidade cultural, mais do que um museu carregado de memórias. O MUNTREF carrega uma proposta ousada e criativa, de contextualização do fenômeno da mobilidade humana por meio de sua representação em quatro núcleos temáticos que relatam as etapas da viagem, a chegada, a inserção e o legado e memória da imigração. Irene Cabrera apresentou a proposta e os desafios do Museo Nacional de la Inmigración de Buenos Aires, localizado na cidade velha, em uma área de museus em cuja proximidade estão as antigas muralhas da cidade. Junto ao museu está o Complexo Cultural Muralla Abierta, que preserva o trecho original mais extenso da muralha e que interage com o espaço museográfico. A configuração física do Museu, que o torna interessante e diferenciado, dificulta também sua manutenção e preservação. No que diz respeito à temática das migrações, esta foi incorporada carregando a proposta de inserção cultural da população do entorno, composta por muitos migrantes. A história e perspectivas do Museu da Imigração foram apresentadas por Marília Bonas, que complementou a fala de Odair Paiva, apresentando e discutindo as dificuldades, percalços e frustrações associadas ao projeto de reestruturação e de posicionamento conceitual do MI, que historicamente funcionou como lugar de passagem, refúgio e acolhimento. Das mais importantes mudanças experimentadas pela instituição, está a transformação da própria temática, que se desloca do sujeito imigrante para o tema das migrações enquanto um fenômeno social global complexo, em contínuo desenvolvimento. Marília comentou também as dificuldades de formação, organização, manutenção e disposição de acervo, a interação com o Arsenal da Esperança e a intenção de se constituir um museu vivo, cuja estrutura vai sendo dada continuamente, em função das reconfigurações dos próprios fluxos migratórios. Ao final do segundo dia do evento, iniciou-se a segunda seção formal, com apresentações de painéis de pesquisadores que se dedicam ao tema da imigração. Adriana Marcolini apresentou (por Skype, desde Gênova, na Itália) sua pesquisa sobre a Rede Europeia de Museus das Imigrações, apontando a existência de oito instituições museológicas no continente europeu, nas quais o tema das migrações é parcial ou integralmente abordado. O principal questionamento da pesquisadora é sobre a razão pela qual somente na atualidade museus de imigração vêm sendo montados na Europa, um continente tão acostumado com fluxos migratórios. Mariana Várzea falou sobre a construção e história do Museu do Ingá, em Niterói/RJ, que já funcionou como residência oficial e centro de produção artística e que, agora, passa a ser reorganizado como um museu dedicado aos migrantes que chegam ao Estado do Rio de Janeiro, ao redor da ideia de identidade fluminense. Alline dos Santos e Ana Paula Delegario apresentaram os resultados de sua pesquisa sobre a imigração africana para a cidade de São Paulo e sobre a rotina dos africanos na metrópole, discutindo as dificuldades de natureza linguística, a burocracia na prestação de serviços públicos e as expectativas em relação ao processo de acolhimento. As pesquisadoras destacam que, no processo de atendimento ao imigrante africano, o discurso constitucional não condiz com a realidade e não se dá a efetivação das leis democráticas, o que as leva a questionar a existência de uma política de acolhimento ao imigrante que possa ser considerada pública. O último painel foi apresentado por Juliana Monteiro e Tatiana Chang Waltman e fez referência à dinâmica dos fluxos migratórios pela ótica dos direitos humanos, destacando a condição de dificuldade das instituições museológicas dedicadas à imigração o MI entre elas - de constituir não espaços datados, mas espaços de encontros, reconhecimento e discussão sobre a experiência de migrar. O início da noite de sexta feira foi dedicado à abertura da exposição Retratos Imigrantes, montada no MI em parceria com o Ellis Island Immigration Museum. No sábado houve dois workshops. O primeiro foi sobre Fotografia e imigração, sob a

172 Relato de evento - Seminário Internacional Museu, Migrações e Identidades responsabilidade do curador da exposição Retratos Imigrantes, o fotógrafo João Kulcsár. A segunda, aplicada por Marília Bonas e Mariana Esteves Martins, do MI, tratou do tema Curadoria colaborativa. Recebido: 11 abr 2015 Avaliado e revisado pelo Editor: 11 abr 2015 Aceito: 11 abri 2015