PARECER R. Co. 52/2005 DSJ-CT



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Transcrição:

PARECER R. Co. 52/2005 DSJ-CT - Apresentação de impugnação através de telecópia. Rejeição da impugnação. Aumento de capital por incorporação de suprimentos. Exigência de Relatório de Revisor Oficial de Contas elaborado nos termos do artigo 28.º do Código das Sociedades Comerciais. Recorrente: S.A. Recorrida: Conservatória do Registo Comercial de Sumário: A sociedade S.A. representada pelo Senhor Advogado Dr. solicitou na Conservatória do Registo Comercial de, pela apresentação de 12 de Agosto de 2005, o registo do aumento de capital e alteração do seu contrato de sociedade. O processo foi instruído com uma certidão de escritura pública, lavrada em 8 de Julho de 2005, perante a Notária e com um texto do articulado contratual completo e actualizado. Por despacho de 1 de Setembro a senhora Conservadora qualifica o registo como provisório por dúvidas pelas seguintes razões: a) A escritura pública de aumento de capital por conversão de suprimentos não foi instruída com relatório elaborado por revisor oficial de contas nem esse relatório foi junto ao pedido de registo para efeitos do estipulado nos artigos 89.º, 28.º e 29.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC); b) O pacto social não prevê a existência de suprimentos; c) Do texto completo do contrato alterado resulta que o artigo 4.º dos estatutos contém dois números enquanto que da alteração cujo registo se peticiona resulta que esse artigo é composto apenas por um só corpo. Na reclamação interposta por telecópia e a que foi atribuída a apresentação 4, de 7 de Outubro, o interessado alega não ser necessário a elaboração de relatório de revisor oficial de contas por não se estar em presença de uma efectiva entrada em espécie. Assim é quando se pretende realizar capital com créditos provenientes de entrada em dinheiro, conforme consta da directriz de Revisão/Auditoria 841, de Dezembro de 2001, emitida pela Ordem dos Revisores Oficiais de Contas. Sobre a ausência de previsão contratual de suprimentos entende que essa omissão não impede que por via de alteração contratual ou por via de deliberação votada pelos sócios que assumam essa vinculação possa ocorrer a realização de suprimentos (artigo 244.º, nºs 1 e 2 do CSC). Além destas possibilidades, entende que a qualquer altura pode ser celebrado um contrato de suprimento entre o sócio e a sociedade, independentemente de previsão no contrato constitutivo ou de deliberação social nesse sentido (artigo 243, n.º 3, do CSC). Sobre o teor do artigo 4.º do contrato junta uma cópia da escritura pública celebrada no Centro de Formalidades das Empresas de Setúbal, em 3 de Fevereiro de 2000, acto que alterou esse artigo 4.º, dotando-o de dois números relativos o primeiro ao capital social e o segundo à exigibilidade de prestações suplementares. Com base nesse documento conclui que a escritura apresentada se encontra bem executada. O despacho de sustentação e a petição de recurso hierárquico recebida em 11 de Novembro que damos por integralmente reproduzidos sustentam os entendimentos sumariamente definidos. Em 16 de Novembro o processo é remetido à Direcção-Geral com a informação de que não foi efectuado qualquer preparo e ainda que a reclamação assim como o recurso hierárquico foram efectuados por telecópia não tendo sido apresentados os respectivos originais. Em 19 de Dezembro a senhora conservadora dá notícia de ter sido efectuado o preparo sem fazer qualquer referência aos documentos originais. O processo é o próprio, as partes são legítimas, a recorrente está devidamente representada e o recurso é tempestivo. Porém, a utilização indevida de equipamento privado de telecópia para apresentação de petição de reclamação e de recurso hierárquico remetido por advogado é pressuposto 1

processual que inviabiliza o conhecimento do mérito do recurso. Vejamos com mais pormenor esta questão prejudicial. O artigo 45.º do Código do Registo Comercial, em vigor à data da interposição da impugnação, permitia que a apresentação dos requerimentos para registo fosse efectuada pessoalmente, pelo correio ou através de telecópia remetida por notário no exercício das suas competências. Além destas situações, era e é ainda possível a utilização de equipamento de telecópia pelos Centros de Formalidades de Empresas, especificamente pelo Gabinete de Apoio ao Registo Comercial, ao abrigo do disposto no artigo 4.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 78-A/98, de 31.03. Antes, porém, já o inovador Decreto-Lei n.º 54/90, de 13.02, tinha permitido a transmissão de documentos por telecópia entre os serviços dos registos e do notariado e também que a transmissão pudesse ocorrer dos operadores que prestam serviço público português interno ou consular para os serviços de registos e do notariado. Observados determinados requisitos e procedimentos, era reconhecido aos documentos assim transmitidos a força probatória das certidões. Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 28/92, de 27 de Fevereiro, veio permitir a utilização de equipamentos privados de advogados e solicitadores na transmissão de documentos para a prática de alguns actos processuais junto de serviços judiciais, conquanto constassem de listas oficiais elaboradas e divulgadas pelas entidades previstas nos números 2 e 3 do art. 20.º deste diploma. Esta possibilidade cingiu-se, portanto, aos serviços judiciais. O aludido DL n.º 54/90, foi substituído pelo Decreto-Lei n.º 461/99, de 05.11, diploma que veio redefinir o regime de transmissão e recepção de documentos por telecópia nos serviços dos registos e do notariado e este por sua vez pelo Decreto-Lei n.º 66/2005, de 15.03. No âmbito dos dois primeiros diplomas a utilização de equipamentos de telecópia privados para envio de petições de impugnação foi objecto de apreciação em diversos processos deste Conselho 1 e especificamente no âmbito do DL n.º 461/99 foi firmada e divulgada a seguinte orientação: «A apresentação por telecópia das petições de recursos hierárquico, através de equipamento privado, deve ser rejeitada, tendo em conta o disposto no Decreto-Lei n.º 461/99, de 5/11 em conjugação com o artigo 66.º do Código do Registo Predial, e o respectivo despacho deverá ser comunicado de imediato ao interessado, pelo referido meio, para o número indicado no documento recebido, e confirmado seguidamente pelo correio.». O contexto normativo em que esta orientação foi firmada mudou e à data da interposição da reclamação estava já publicado o Decreto-Lei n.º 66/2005, de 15 de Março, que procedeu a uma nova regulamentação do regime de transmissão e recepção por telecópia e por via electrónica pelos serviços registrais, cartórios notariais e outros serviços, bem como a recepção pelas mesmas vias por advogados e solicitadores de documentos com valor de certidão respeitantes aos arquivos dos serviços registrais e cartórios notariais ou destinados à instrução de processos de actos e processos dos registos e do notariado ou a arquivo nos mesmos serviços (Cfr. art. 1.º). Pela definição do objecto da regulamentação, confirmada na previsão dos seus diversos normativos, percebe-se que este novo regime não alterou a resposta ao problema da utilização de equipamentos privados de telecópia de advogados e solicitadores senão no que respeita a certidões. Mesmo para quem pudesse ser tentado em sede interpretativa a alargar o âmbito de aplicação do diploma por forma a estender o seu regime à situação em apreço, a verdade é que a falta de regulamentação do diploma, designadamente das acções que se encontram descritas no art. 9.º, sempre comprometeria a vigência deste diploma. Regressemos, pois, ao âmbito do Decreto-Lei n.º 461/99 cujo regime se nos afigura estar em vigor. Aos senhores advogados e solicitadores não se assegura o direito de apresentação de uma impugnação de actos de registo com a utilização dos seus equipamentos privados de telecópia, razão que deveria ter determinado a rejeição da apresentação dos requerimentos da reclamação e do recurso. O 1 Cfr. Pareceres emitidos nos processos nºs 21/80 R.P.4, R.P. 126//98 DSJ-CT (BRN n.º 3/99), R.P. 73/99 DSJ-CT (BRN nº 10/99), R.P. 198/2000 DSJ-CT (BRN n.º 3/2001), R.P. 357/2003 DSJ-CT (BRN nº 10/2004) e orientação parcialmente transcrita (BRN nº 10/2000). 2

incumprimento da orientação divulgada e, portanto, a ausência de despacho de rejeição e das comunicações a que nela se aludem obviamente que não vinculam a entidade ad quem que conserva no âmbito das suas competências o dever de confirmar os pressupostos processuais de cuja verificação depende a apreciação e decisão do mérito do recurso hierárquico. Portanto, uma vez que a apresentação do requerimento de interposição de recurso hierárquico através de equipamento privado de telecópia de advogado ou solicitadores não goza de valor e na esteira da doutrina firmada no parecer emitido no P.º R.P. 357/2003 DSJ-CT, alicerçada no disposto no artigo 4.º, n.º 5, do Decreto-Lei n.º 28/92, de 27 de Fevereiro, segundo o qual não aproveita à parte o acto praticado por telecópia, não pode o presente recurso hierárquico deixar de ser indeferido liminarmente. Não obstante o indeferimento que se propõe, atento à importância da questão principal e à conveniência em uniformizar procedimentos nas conservatórias do registo comercial passaremos a apreciar o mérito das dúvidas apostas ao registo solicitado. 2.1 No presente recurso hierárquico importaria decidir se um aumento de capital realizado por conversão suprimentos exigiria expressa previsão contratual e ainda se seria necessário apresentar relatório de revisor oficial de contas, elaborado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 28.º do CSC. Com efeito, tratando-se de um aumento de capital social realizado por meio da conversão de empréstimo à sociedade realizado em dinheiro suscita-se o problema de saber se para esse efeito tal empréstimo é o mesmo que dinheiro ou, pelo contrário, se deve tomado por bem em espécie o que vale por dizer coisa diversa de dinheiro. Neste caso importa que o bem deva ser objecto de descrição, identificação de titularidade, avaliação e declaração de revisor oficial de contas de que o valor encontrado atinge ou não o valor atribuído ao sócio que efectua a entrada correspondente. O contrato de suprimento está previsto como contrato típico e nominado nos artigos 243.º a 245.º do CSC e é definido como contrato pelo qual o sócio empresta à sociedade dinheiro ou outra coisa fungível, ficando aquela obrigada a restituir outro tanto do mesmo género e qualidade, ou pelo qual o sócio convenciona com a sociedade o diferimento do vencimento de créditos seus sobre ela, desde que, em qualquer dos casos, o crédito fique tendo carácter de permanência. Não se trata de uma contrato de mútuo mas de um contrato especial que partilha algumas características com o contrato de mútuo 2. É um contrato que nasce entre a sociedade e um sócio e que visa um fim social na medida em que os fundos postos à disposição da sociedade desempenham função semelhante à do capital social. Estas prestações constituem débitos da sociedade cujo credor é, em princípio, um sócio 3. O contrato de suprimento comporta duas modalidades: empréstimo em dinheiro ou outra coisa fungível e diferimento do vencimento de créditos do sócio conquanto em qualquer dos casos o crédito tenha carácter de permanência. A obrigação de efectuar suprimentos pode resultar do contrato de sociedade, de deliberação dos sócios ou de contrato entre o sócio e a administração da sociedade cfr. art. 244.º 1, 2 e 3 do CSC. Quando esta obrigação seja estipulada no contrato deve ainda fixar-se os elementos essenciais da obrigação (v.g. os sócios vinculados, o montante, a duração, a modalidade, e eventualmente a remuneração do mútuo), conforme decorre do disposto no artigo 209.º 4. A obrigação de efectuar suprimentos pode ter, portanto, várias fontes. A construção legislativa que consta do artigo 244.º admite que a obrigação de prestar suprimentos não resulte do contrato nem dependa de deliberação dos sócios ou dos accionistas, mas de acordo 2 Vide Acórdão do STJ, Processo 03A526, publicado no sítio http://www.dgsi.pt/jstj.nsj. 3 V. Alexandre Mota Pinto, in Do contrato de Suprimento, pág. 20 e seguintes sobre os suprimentos enquanto manifestação de subcapitalização nominal das sociedades e pág. 289 e seguintes sobre os sujeitos do contrato. 4 Aplicar-se-á em alternativa o artigo 287.º do CSC específico para as sociedades anónimas pois que a recorrente é uma sociedade anónima. A doutrina tem questionado se o regime dos suprimentos previsto para as sociedades por quotas também é aplicável a sociedades anónimas. A opinião dominante responde afirmativamente, uns recorrendo a aplicação analógica, outros a interpretação extensiva Vide Suprimentos, Prestações Acessórias e Prestações Suplementares Notas e Questões por Rui Pinto Duarte, in Problemas do Direito das Sociedades, IDET. A questão não está em discussão neste processo, importando dizer apenas que acompanhamos a doutrina maioritária sobre a aplicabilidade do mencionado regime às sociedades anónimas e por analogia. 3

contratual (proposta e aceitação) a estabelecer entre administração e sócio ou accionista, não exigindo a lei que esse acordo revista qualquer forma especial, conforme resulta do n.º 6 do artigo 243.º. Portanto, não se afigura fundada na lei a exigência da recorrida que faz depender o registo definitivo do aumento de capital social por conversão de suprimentos de uma previsão estatutária expressa no contrato que permita essa forma de financiamento da sociedade ou de uma previsão estatutária que a faça depender o suprimento de uma deliberação social. Diferentemente se passa com as prestações suplementares em que a lei é expressa ao exigir a necessidade do contrato especificar os elementos essenciais da obrigação bem como a natureza onerosa ou gratuita das prestações, ficando a depender de deliberação social a sua exigibilidade cf. art. 287.º e 211.º, n.º 1 e 2 do CSC. Mesmo assim, teríamos de discutir o regime de invalidade do acto de autorização de realização de prestações suplementares sem previsão contratual expressa. 5 2.2 A segunda questão que se suscita sobre suprimentos exigibilidade de relatório elaborado nos termos e para efeitos do disposto no artigo 28.º do CSC - foi já objecto de apreciação por este Conselho no Proc. nº 64/93 R.P. 4, para cuja fundamentação remetemos integralmente e no qual se firmaram as seguintes conclusões: 1) No caso de aumento de capital em que as entradas são realizadas em bens diferentes de dinheiro, deve ser elaborado um relatório por revisor oficial de contas sem interesses na sociedade. 2) Quaisquer suprimentos, sejam ou não em dinheiro, feitos pelos sócios à sociedade, constituem créditos destes sobre aquela. 3) Sendo o aumento de capital realizado através de tais créditos que não são, portanto, o mesmo que dinheiro é, consequentemente, necessário juntar o relatório do revisor de contas, sem o que não pode ser feito o registo definitivo do mencionado aumento de capital. Afigura-se-nos que deve ser mantida a orientação firmada neste processo e pelos fundamentos aí expressos que se mantém actuais. Essencialmente entende-se que o artigo 28.º do CSC aplica-se a entradas com bens diferentes de dinheiro e dinheiro para este efeito equivale a numerário ou possibilidade de conversão em numerário (cheque) 6. Os suprimentos têm a natureza de créditos do sócio sobre a sociedade e um crédito é coisa diversa de dinheiro. Como créditos podem valer menos, podem valer o mesmo ou podem valer mais do que o valor que representam, em função de circunstâncias variáveis. O artigo 28.º visa proteger interesses de sócios e terceiros, contém comandos de interesse público e por isso é de cumprimento obrigatório. Pouco mais poderemos nós acrescentar. Com efeito, do conjunto de normas jurídicas que constam do CSC disciplinadoras das diversas funções do capital social resulta bem evidenciada a grande preocupação do legislador em garantir a existência e consistência do capital social ao longo da vida societária. Princípios regulamentadores do regime do capital social como o da determinação, unidade, publicidade, estabilidade, exacta formação, intangibilidade e efectividade 7 espelham uma densidade e uma importância invulgares no que se refere a este elemento essencial dos contratos de sociedades de capitais. 5 Sobre o assunto ver obra e autor citados na nota anterior, página 277, que sustenta a validade de acordo entre todos os sócios e entende ser apenas anulável a deliberação social que obrigue à realização de prestações suplementares. 6 Prof. Pinto Furtado, in Curso de Direito das Sociedades Almedina, 3ª edição, pág. 92 escreve o seguinte: Entrada diferente de dinheiro - portanto, uma entrada em espécie é aquela que consiste em tudo o que não seja numerário (notas ou moedas com curso legal) ou não possa ser directa ou imediatamente convertível em dinheiro. Um cheque deverá, pois, constituir uma contribuição em dinheiro. Um crédito, mesmo que seja sobre a própria sociedade, ou uma participação social constituem entrada em espécie. (o itálico é do autor). 7 Vide Paulo Tarso Domingues, em Do Capital Social, Boletim da Faculdade de Direito, Universidade de Coimbra, Coimbra Editora e em Garantias da Consistência do Património Social, publicado em Problemas do Direito das Sociedades, pág. 497 e seguintes. 4

A preocupação em garantir a exacta formação do capital social na fase inicial não se compreenderia se acaso não persistisse a preocupação em manter o mesmo nível de exigência ao longo da vida social. Tem pois plena justificação a aplicação do disposto no artigo 28.º do CSC às entradas nos aumentos de capital, por força de remissão expressa constante do art.89.º, n.º 1. Sempre que a entrada seja com bens diferentes de dinheiro - e seguindo de perto o que escreveu o Professor Pinto Furtado, bens diferentes de dinheiro são todos aqueles que não possam ser directa ou imediatamente convertíveis em dinheiro - deve a mesma ser objecto de relatório elaborado por revisor oficial de contas. Obviamente que se a operação consistir em aumento de capital com entrada de dinheiro recebido da sociedade a título de restituição do suprimento, não estaremos perante um aumento por conversão desse suprimento mas por entrada de dinheiro. Até mesmo as modificações legislativas mais recentes sobre o regime das entradas em dinheiro, em particular as que alteraram os artigos 202.º, n.º 4 e 277.º, n.º 4 e os regimes especiais instituídos pelos Decretos-Lei n.º 111/2005, de 8 de Julho (constituição imediata de sociedades) e 125/2006, de 29 de Junho (constituição on-line de sociedades), não modificaram substancialmente o regime jurídico das entradas em espécie, tendo procedido apenas a uma facilitação do regime de prova da existência do capital social realizado em dinheiro. No que respeita às entradas in natura, o regime jurídico tem-se mantido intacto. Dissemos já que o suprimento pode ter por objecto dinheiro ou outra coisa fungível ou pode consistir em convenção que permita o diferimento do vencimento de créditos do sócio ou accionista sobre a sociedade. A desnecessidade de relatório de ROC, cingida evidentemente à hipótese do suprimento ter sido realizado com dinheiro como vem sustentado na Directriz de Revisão a que atrás se fez referência, e provavelmente cingida a sócio ou accionista, assenta no pressuposto de se tratar de uma simples operação financeira. A verdade é que, conforme vimos, o suprimento pode consistir em contrato de diferimento do vencimento de um crédito ou o seu autor ser um terceiro adquirente de crédito de suprimentos em resultado de cessão de créditos. Nestas situações não estamos perante simples operações de tesouraria e é evidente que os interesses em presença não se circunscrevem aos sócios. Com estas considerações queremos significar que a lei não autoriza a realização de qualquer distinção em função da modalidade ou dos sujeitos do aumento do capital. Sobre o assunto escreveu o Mestre Paulo de Tarso Domingues 8 : Nada parece impedir ( ) que um sócio realize a sua entrada (v.g., num aumento de capital) com o crédito de que seja titular sobre a própria sociedade. Esta entrada não ficará, porém, sujeita ao regime da compensação, atenta a proibição legal, mas ao regime das entradas in natura, devendo, por isso, aquele crédito ser sujeito a uma avaliação por parte de um ROC: é que como já acima se disse, o valor real e económico do crédito pode não corresponder ao seu valor nominal. O autor reforça a conclusão com a justificação do sócio ver a sua participação devidamente avaliada por um perito independente, os outros sócios reforçarem a sua convicção relativamente à justeza relativa e absoluta do montante reforçado e os terceiros credores ficarem mais protegidos. Desaparece uma dívida da sociedade do mesmo passo que o capital sai reforçado. O suprimento pode ser remunerado ou não. O suprimento pode ter ou não prazo de reembolso. No tratamento contabilístico o suprimento inscreve-se como passivo 9 por se tratar de capital alheio. O suprimento é, assim um crédito de que é credor, em princípio, o próprio sócio ou accionista e devedor a sociedade e cuja caracterização reside essencialmente no regime de restituição fixado nos termos do artigo 245.º. Com isto quer-se significar que o suprimento, por ser um crédito, pode ter valor superior ao valor da entrada em aumento de capital conforme permite o artigo 25.º. Sendo o seu valor for superior, o excesso deverá ser tratado como reserva legal por força do artigo 295.º, n.º 2, alínea a), do CSC. Também por isto se justifica a necessidade de exacta determinação do seu valor por via de avaliação de perito independente. 8 In Garantias pág. 511. 9 Cfr. Rui Pinto Duarte, ob. cit., pág. 265. e Alexandre Mota Pinto, ob. cit. pág. 368. 5

O suprimento utilizado em aumento de capital social, efectuado em dinheiro ou outra coisa fungível ou que tivesse resultado de convenção de diferimento do vencimento de créditos sobre a sociedade, deve ser objecto de relatório de revisor oficial de contas elaborado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 28.º e 89.º, n.º 1, do CSC, uma vez que na data da deliberação do aumento o suprimento é já um crédito sobre a sociedade que representa uma entrada em bem diferente de dinheiro. 2.3 Apreciemos agora o terceiro motivo que o impediu o registo definitivo. Em face dos registos anteriores e dos documentos depositados no registo, concluiu a senhora conservadora que o artigo 4.º do contrato, não tendo sido alterado pela escritura que lhe foi apresentada para o registo, deveria ter um teor material diferente (corpo único) daquele que consta do texto que lhe é oferecido e no qual o artigo 4.º surge com dois números. Obviamente que daqui não se retira que a escritura pública esteja errada nem isso é dito pela recorrida. O que há - e isso o próprio recorrente confirma - é uma desconformidade entre os documentos apresentados a registo e os arquivados, na medida em que por lapso não foi registada uma alteração ao contrato de sociedade, titulada por escritura pública celebrada em 3 de Fevereiro de 2000. Confirma-se, portanto, a bondade do motivo invocado. A desconformidade entre os registos efectuados e documentos depositados com o texto completo do contrato alterado na sua redacção actualizada apresentado em cumprimento do disposto no artigo 59.º, n.º 3, do CSC (na redacção anterior à introduzida pelo Decreto-Lei n.º 76-A/2006), impede a execução como definitivo do registo de alteração do contrato de sociedade. No entanto, a junção de certidão dessa escritura pública no processo de impugnação não tem o alcance de ultrapassar o motivo invocado uma vez que tratando-se de uma outra alteração ao contrato de sociedade e portanto de um facto autónomo sujeito a registo, deve ser cumprida a tramitação processual própria necessária para se alcançar tal resultado. De resto, tratando-se de uma alteração contratual titulada previamente à que ora está em discussão e que a condiciona pelo motivo invocado, importa que do registo conste isso mesmo para significar a dependência lógica e temporal dessa alteração contratual. 3. Finalmente devemos dar notícia que do título não resulta ter sido emitida declaração pelo administrador, sob sua responsabilidade, de que as entradas estão realizadas, exigência que decorre do artigo 90.º, n.º 2, do CSC então em vigor (cf. actual artigo 88.º, n.º 1, do mesmo diploma). Para o fim visado pelo legislador não se mostra suficiente a declaração de que não são exigidas pela lei, pela deliberação ou pelo contrato de sociedade a realização de outras entradas conforme consta da escritura, sendo necessário ainda declaração de teor positivo de quais as entradas realizadas. No entanto, tem-se por bastante declaração de que o capital está inteiramente liberado se for essa a situação 10. Naturalmente que esta declaração responsabiliza o declarante não só sobre a existência dos direitos de crédito como também sobre o valor de tais direitos. O registo é que não poderá ser lavrado como definitivo sem que o disposto em tal normativo se mostre cumprido. 4 Em síntese do exposto, é entendimento deste Conselho que o recurso hierárquico deve ser liminarmente indeferido. Sem prejuízo do indeferimento e relativamente às questões de mérito que se suscitam no presente processo podem firmar-se as seguintes conclusões: I O Decreto-Lei n.º 66/2005, de 15.03, não regula a apresentação de requerimentos de interposição de recursos hierárquicos através de equipamentos privados de telecópia de advogados e solicitadores pelo que devem continuar a ser rejeitadas tais apresentações. II - Não se afigura fundada na lei a exigência do conservador que faz depender o registo do aumento de capital social por conversão de suprimentos de uma previsão estatutária expressa no contrato social que permita essa forma de financiamento ou da existência de uma deliberação social, igualmente expressa em previsão contratual, que permita a conversão de suprimentos em aumento de capital. 10 V. Prof. Raul Ventura, Alterações do Contrato de Sociedade, Almedina, pág. 142. 6

III O suprimento utilizado em aumento de capital social, efectuado em dinheiro ou outra coisa fungível ou que tivesse resultado de convenção de diferimento do vencimento de créditos sobre a sociedade, deve ser objecto de relatório de revisor oficial de contas elaborado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 28.º e 89.º, n.º 1, do CSC, uma vez que na data da deliberação do aumento o suprimento é já um crédito sobre a sociedade que representa uma entrada em bem diferente de dinheiro. IV O registo definitivo de alteração parcial de contrato de sociedade exige o depósito do texto completo do contrato alterado, com redacção actualizada que se conforme ou compatibilize com registos anteriores de alterações contratuais e documentos depositados que lhes serviram de base. Declaração de voto De todas as posições assumidas no douto parecer, apenas a relativa à questão de saber se nos encontramos perante «nova entrada em espécie» me suscita algumas reservas. A recorrente invoca a Directriz de Revisão/Auditoria 841, de Dezembro de 2001, para justificar que a situação não está abrangida pelo art. 28º do CSC. Também nós invocámos tal Directriz no Pº R. Co. 106/2002 DSJ-CT, in BRN nº 3/2003, págs. 35 e segs., a propósito do aumento de capital por conversão de prestações suplementares. Reconhecendo embora, tal como ali fizemos, a delicadeza da questão, parece-me que aquela Directriz (que, ao que julgamos saber, permanecerá em vigor) não distingue entre suprimentos que tiveram dinheiro por objecto - e prestações suplementares, ao afastar ambas as situações da abrangência do art. 28º do CSC. Ora, se seguimos tal Directriz para o caso das prestações suplementares, não vejo razões para a rejeitar no caso dos suprimentos (que tiveram dinheiro por objecto). Inclino-me, portanto, para a tese de que não nos encontramos perante «nova entrada em espécie». No limite, exigiria, ainda no âmbito da citada Directriz, declaração comprovativa de que a situação dos autos não está abrangida pelo art. 28º do CSC. Este parecer foi homologado por despacho do senhor presidente de 06/08/2007. 7