ANÁLISE DE FALHA DE UMA MÁQUINA DE ENSAIO

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Transcrição:

ANÁLISE DE FALHA DE UMA MÁQUINA DE ENSAIO Failure Analysis of a compression testing machine André Rocha Pimenta a,* Franklin Delano Cavalcante Leitão b Rodrigo M. Silva b Marília Garcia Diniz b a Centro Federal de Educação Tecnológica de Química de Nilópolis, Unidade descentralizada de Ensino de Paracambi, Paracambi, Brasil. b Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Pós-Graduação em Engenharia Mecânica, Rio de Janeiro, Brasil. RESUMO O presente trabalho tem como objetivo avaliar os motivos que ocasionaram a falha de um parafuso em uma máquina de ensaio de compressão e, após compreensão do problema, sugerir procedimentos que evitem a ocorrência de falhas futuras. Para a análise de fratura, utilizou-se microscopia eletrônica de varredura, energy dispersive spectroscopy e microscopia óptica. O mecanismo de fratura encontrado foi o de ruptura por dimples; os resultados da análise química do material permitiram concluir que se tratava de um aço baixo carbono sem elementos de liga; a microestrutura do material era formada de ferrita e perlita. Conclui-se que o motivo da fratura foi uma sobrecarga ocorrida durante a operação. Palavras-chave: análise de falha; fractografia; parafuso. ABSTRACT The aim of this study was to evaluate the reasons that had led failure of a screw of a compression testing machine, and after understanding the problem, suggest procedures to prevent future failure occurrences. Scanning electron microscopy, energy dispersive spectroscopy and optical microscopy were used to the fracture analysis. The fracture mode found was the dimple rupture. The results of chemistry analysis had allowed concluding that the material was a low-carbon steel without alloy elements. The material microstructure were made of ferrite and pearlite. An overload occurred during the work and it was the responsible of the fracture. Keywords: failure analysis; fractography; screw.

INTRODUÇÃO A falha em equipamentos de engenharia é quase sempre um evento indesejável, podendo acarretar vários problemas, tais como: colocar vidas humanas em risco, causar perdas econômicas e ocasionar a indisponibilidade de produtos ou serviços. Embora as causas de falhas e o comportamento dos materiais possam ser conhecidos, sua prevenção é uma condição difícil de ser garantida (CALLISTER, 2002). Segundo o Metals Handbook (1986), as falhas dos materiais podem ser atribuídas a diferentes fatores: utilização de material inadequado, defeitos oriundos do processo de fabricação, erros de projeto ou de montagem, manutenção ou utilização inadequada do equipamento. A história está repleta de peças e máquinas que falharam em trabalho. Nos últimos anos, vários pesquisadores têm-se dedicado a investigar o motivo pelo qual os materiais entram em colapso e, após a compreensão da causa da fratura, sugerir correções no sentido de evitar falhas futuras. Cândido et al. (2006) relatou que para a investigação de uma falha obtenha sucesso e possa resultar na confecção de um laudo técnico sobre o ocorrido, é necessário seguir uma metodologia para a análise da falha. Essa metodologia pode ser dividida em cinco etapas: história prévia (compreensão da fabricação e da utilização do equipamento); seleção e limpeza das partes a serem analisadas; ensaios não destrutivos (análise macroscópica, ensaio de dureza e análise química); ensaios destrutivos de microscopia e mecânicos; análise de resultados, constando conclusões e recomendações. A superfície de fratura registra a história da falha. Ela contém informações sobre os efeitos do meio-ambiente, a qualidade do material e os carregamentos aos quais a peça esteve submetida. Por esta razão, a fractografia é a principal técnica utilizada para determinar-se como o material fraturou (METALS HANDBOOK 1987). O Metals Handbook (1987) descreve as duas formas de fraturas que podem ocorrer nos metais e suas ligas: transgranular e intragranular, quando a fratura ocorre através dos grãos do material e através dos contornos dos grãos, respectivamente. Ainda segundo o Metals Handbook (1987), os mecanismos de fratura podem ser divididos em quatro tipos: ruptura por dimples, clivagem, fadiga e decohesive rupture. Ruptura por dimples ocorre através do coalescimento de microvazios, os vazios são originados nas descontinuidades existentes nos materiais pela ação de uma força externa, geralmente de tração ou cisalhamento. Esse mecanismo de ruptura ocorre quando o material foi exposto a uma tensão maior que a tensão de ruptura do material e é característico de materiais dúcteis, com grande capacidade de absorver energia durante a ruptura. A aparência da fratura é de Revista Perspectivas da Ciência e Tecnologia v.1, n.1, jan-jun 2009. 42

cavidades esféricas ou alongadas, dependendo do sentido de aplicação da força. Na clivagem, a fratura ocorre pelos planos de baixo índice cristalográfico, conhecidos como planos de clivagem. A clivagem, como a ruptura por dimples, ocorre por sobrecarga, porém a clivagem é encontrada em materiais frágeis, com baixa capacidade de absorção de energia. Sua aparência é formada por regiões planas e lisas. O processo de fadiga ocorre em três estágios: nucleação da trinca, propagação da trinca e fratura catastrófica. Esse processo se dá quando a peça está submetida a esforços cíclicos e pode ocorrer em níveis de tensão abaixo do limite de escoamento do material. As fractografias de fadiga são caracterizadas pela existência de curvas de nível, que são as linhas de propagação da trinca. O mecanismo denominado decohesive rupture se dá quando não existe deformação plástica ou esta é pequena e não houve nenhum dos mecanismos de fratura anteriores. Esse tipo de fratura acontece geralmente devido a um ambiente corrosivo ou em microestruturas específicas. Como escrito por Pizzo et al. (2007), os parafusos são componentes largamente aplicados na união de componentes, principalmente quando a desmontagem posterior se faz necessária. Os parafusos também possuem a facilidade de serem facilmente substituídos em caso de falhas, porém a falha de um parafuso pode ser catastrófica, danificando várias partes do equipamento. A Figura 01 apresenta a máquina de ensaio de compressão DRWB 300 do Laboratório de Engenharia da Universidade do Estadual do Rio de Janeiro, cuja capacidade é de 300 toneladas e onde durante um ensaio ocorreu a fratura de um dos parafusos de fixação da garra. O item A apontado na Figura 01 é o parafuso de fixação da garra (item B ) que suporta o cabeçote superior da máquina (item C ). Durante a realização de um ensaio de compressão, o parafuso de fixação da garra fraturou de forma repentina, prejudicando a realização do ensaio e comprometendo a disponibilidade de máquina para execução de serviços externos e uso dos alunos até o termino de sua manutenção. A máquina de ensaio de compressão se encontra instalada no Laboratório de Construção Civil e é utilizada para ensaios de blocos de concreto e tijolos. Os blocos são colocados entre os cabeçotes superiores e inferiores e comprimidos por um sistema hidráulico. O presente trabalho tem por objetivo investigar o motivo da falha do parafuso de fixação da garra que prende o cabeçote superior de uma máquina de ensaio de compressão e após a análise, sugerir procedimentos que possam evitar falhas futuras. Revista Perspectivas da Ciência e Tecnologia v.1, n.1, jan-jun 2009. 43

B A C Figura 01 Máquina para ensaio de compressão DRWB 300 do Laboratório de Engenharia da Universidade estadual do Rio de Janeiro MATERIAIS E MÉTODO Imediatamente após a fratura do parafuso, as duas partes do componente foram acondicionadas em um recipiente, hermeticamente fechado, juntamente com sílica gel, a fim de evitar-se oxidação e preservar-se a superfície de fratura, para posterior análise. A primeira etapa da investigação foi observar a máquina de ensaio em funcionamento, determinando se algum procedimento poderia ter acarretado a falha. Na segunda etapa foi observada a peça fraturada, onde foram realizados ensaios de fractográfia, análise química e metalográfica. A superfície de fratura foi analisada em um microscópio eletrônico de varredura (MEV) marca ZEISS modelo DSM 960, operando no modo Elétrons Secundários (SE) a 20 kv e 80 µa, com o objetivo de verificar possíveis indícios que apontassem a causa da fratura. Também no MEV, foi realizada uma análise química semi-quantitativa por Energy Dispersive Spectroscopy (EDS). Segundo Goldstein et al (2003) o MEV possui excelente desempenho na obtenção de imagens de fractografia, atingindo aumentos na ordem de 10 5 X. Revista Perspectivas da Ciência e Tecnologia v.1, n.1, jan-jun 2009. 44

Para observar-se a microestrutura do material, uma amostra sofreu preparação metalográfica. Cortou-se uma amostra do parafuso próxima à região da fratura, utilizando-se um disco de corte e óleo refrigerante, para não aquecer a amostra até temperaturas muito elevadas, o que pode acarretar uma mudança microestrutural. Após o corte, a amostra foi embutida em resina de cura a frio, e posteriormente lixada com lixas n 80, 220, 360, 400 e 600, nessa ordem. Posteriormente, a amostra foi polida com alumina de 1 mícron e atacada quimicamente com Nital 2% durante 6 segundos. Esse procedimento é descrito por Mannheimer (2002) para preparação de amostras metalográficas. A amostra foi observada em um microscópio Neophot 2, com sistema de captura de imagem integrado ao computador. RESULTADOS E DISCUSSÃO Ao observar a máquina em funcionamento, notou-se que corpos de prova de blocos de concreto, preparados equivocadamente, poderiam sobrecarregar os parafusos de sustentação da garra. Quando as superfícies do corpo de prova não estão paralelas, o cabeçote superior possui um mecanismo de compensação dessa inclinação, adaptando-se ao corpo de prova. Caso o copo de prova esteja muito inclinado, o cabeçote superior pode encostar em uma das garras de fixação, empurrando-a para cima e, assim, realizando um esforço sobre o parafuso que fixa a garra. A hipótese de que o cabeçote superior empurra as garras é corroborada pelas marcas existentes na pintura da peça; estas marcas são destacadas na Figura 02. As Figuras 03 e 04 apresentam, respectivamente, a área selecionada para o ensaio de EDS o resultado da análise química realizada no MEV. Devido à ausência de registros sobre os componentes da máquina, não existe um padrão de composição química que possa ser comparado com o resultado, contudo o EDS aponta para a existência de elementos de um aço ao carbono comum sem a presença de elementos de liga. Não foi possível estabelecer-se a correspondência da análise química com um aço padronizado por normas, devido ao ensaio de EDS não fornecer os percentuais de cada elemento químico encontrado, indicando apenas a existência desses elementos. A presença de alumínio pode ser provavelmente atribuída ao processo de fabricação do aço. Segundo Souza (1989), o alumínio é muito utilizado como desoxidante para acalmar os aços de baixo carbono, tendo como principais efeitos o refinamento do grão e o aumento da tenacidade. Revista Perspectivas da Ciência e Tecnologia v.1, n.1, jan-jun 2009. 45

Figura 02 Máquina para ensaio de compressão, detalhe das marcas de atrito do cabeçote superior com as garras de fixação. Figura 03 Área selecionada para o ensaio de EDS, aumento 1500x, MEV, modo SE Revista Perspectivas da Ciência e Tecnologia v.1, n.1, jan-jun 2009. 46

Figura 04 Resultado do EDS, picos significativos de Fe, Si e Al As fractografias obtidas no MEV são apresentadas a seguir. Na Figura 05 observa-se toda a superfície de fratura do parafuso, enquanto, nas Figuras 06 e 07, utilizou-se um aumento que permitiu a visualização dos mecanismos de fratura. Figura 05 Superfície de fratura do parafuso, aumento 10x, MEV, modo SE Revista Perspectivas da Ciência e Tecnologia v.1, n.1, jan-jun 2009. 47

Figura 06 Superfície de fratura do parafuso, aumento 1200x, MEV, modo SE Figura 07 Superfície de fratura do parafuso, aumento 1200x, MEV, modo SE Revista Perspectivas da Ciência e Tecnologia v.1, n.1, jan-jun 2009. 48

Em alguns casos, uma análise macrográfica, definida por Colpaert (1974) como análise de uma superfície com aumento de até 10X, revela informações importantes, que podem levar a descobrir-se o motivo de uma fratura. Giordano et al. (2008), através de uma observação macrográfica, observou, em uma fratura de uma peça de injetora, a existência de marcas de chevron, que indicam que a peça fraturou por fadiga. Porém, a macrografia da região de fratura do parafuso ilustrada pela Figura 05 não apresenta nenhuma evidência que indique o modo de fratura. Em uma varredura por toda a área da amostra fraturada, não foram encontrados indicadores que apontassem para mecanismos de fadiga, como estrias, regiões polidas de nucleação de trincas ou marcas de chevron. A mesma ausência foi percebida em relação aos padrões de superfícies comuns à fratura frágil; não foram encontrados flats de mudanças de planos cristalinos ou por conseqüência de fratura de clivagem. Observou-se a presença de dimples esféricos e alongados em toda a superfície analisada, conforme pode ser observado na Figura 06 e na Figura 07. A presença de dimples está associada a uma fratura do tipo dúctil e a esforços de tração ou cisalhamento. Esse tipo de fratura normalmente ocorre quando o material é submetido a uma tensão acima do seu limite de resistência. Complementando, a hipótese da fratura, devido à presença de alumínio no parafuso do presente estudo, pode ser descartada, já que o mecanismo de fratura encontrado na análise de fractografia foi do tipo dúctil. A Figura 08 mostra a microestrutura do parafuso em uma região próxima à fratura, notando-se a presença de uma grande quantidade de ferrita e uma pequena quantidade de perlita. Segundo o Metals Handbook (2004), é uma estrutura característica de um aço de baixo carbono, o que reforça a teoria de que o material é um aço de baixo teor de carbono. Figura 08 Microestrutura do parafuso Revista Perspectivas da Ciência e Tecnologia v.1, n.1, jan-jun 2009. 49

Na análise em microscópio óptico, não foram encontradas quaisquer regiões com microestruturas alteradas ou qualquer indício que apontasse para a possibilidade de corrosão nos contornos de grão. CONCLUSÕES Não foram encontrados quaisquer indícios que apontassem para uma fratura de fadiga. Não se encontraram estrias de fadiga na análise de MEV e a superfície de fratura não apresentava, quando observada com lupa, as três regiões características de fratura por fadiga: nucleação da trinca, propagação da trinca e fratura catastrófica do material. Na análise da microestrutura, não se encontrou nenhuma região que tivesse sofrido processo de corrosão nos contornos de grão. Caso esse fato tivesse ocorrido, seria possível apontar a fragilização do material como possível causa da fratura. A análise química mostrou que o parafuso era fabricado em um aço carbono comum, portanto não possuía nenhum elemento químico que pudesse ter atuado como elemento fragilizador. A superfície de fratura analisada no MEV aponta para uma fratura do tipo dúctil, normalmente encontrada em corpos de ensaio de tração de materiais dúcteis. Todos os fatores anteriores, aliados à análise de funcionamento da máquina, levam a concluir-se que o parafuso fraturou por excesso de carga. Para evitar futuras sobrecargas, recomenda-se maior cuidado no preparo dos corpos de prova. Na construção dos mesmos, as faces superior e inferior devem ficar o mais paralelas possível, evitando-se que o cabeçote superior da máquina empurre as garras de fixação para cima durante a operação, o que pode acarretar a fratura do parafuso de fixação das garras. REFERÊNCIAS AZEVEDO, C. R. F.; HIPPERT Jr, E. Análise de falhas em implantes cirúrgicos no Brasil: a necessidade de uma regulamentação adequada. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 18, n. 5, p. 1347-1358, set./out. 2002. CALLISTER Jr, W. D. Ciência e engenharia dos materiais: uma introdução. de Janeiro: Livros Técnicos S.A., 2002. Rio CÂNDIDO, L. C.; GODEFROID, L. B.; MORAIS, W. A. Análise de falhas. São Paulo: Associação Brasileira de Metalurgia e Materiais, 2006. CHIAVERINI, V. Tratamento térmico das ligas metálicas. São Paulo: Associação Brasileira de Metalurgia e Materiais, 2003. Revista Perspectivas da Ciência e Tecnologia v.1, n.1, jan-jun 2009. 50

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