CARTA AOS MEMBROS DO CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, SOBRE A INDICAÇÃO DE VALENCIUS WURCH PARA A COORDENAÇÃO DE SAÚDE MENTAL DO MINISTÉRIO DA SAÚDE

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1 CARTA AOS MEMBROS DO CONSELHO NACIONAL DE SAÚDE, SOBRE A INDICAÇÃO DE VALENCIUS WURCH PARA A COORDENAÇÃO DE SAÚDE MENTAL DO MINISTÉRIO DA SAÚDE Brasília, 02 de fevereiro de 2016. Prezados conselheiros, A presente carta tem em vista fornecer subsídios à discussão a ser realizada neste Plenário, marcada para o dia 3 de fevereiro do corrente, na medida de seu convite às lideranças do movimento de reforma psiquiátrica e de luta antimanicomial, bem como das principais entidades de saúde pública e direitos humanos do pais, que têm questionado a indicação do Dr. Valencius Wurch Duarte Filho para a Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do Ministério da Saúde. Antes de tudo, manifestamos o nosso agradecimento a este Plenário, pela sensibilidade a nossas demandas e pelo firme posicionamento tomado na reunião de dezembro de 2015, expresso na Recomendação n.o 020 de 2015 ao Sr. Ministro da Saúde, Dr. Marcelo Castro, reafirmando a preocupação e o posicionamento desta planária em relação a eventuais retrocessos na atual política de saúde mental, tendo em vista indicação do Dr. Valencius para o cargo. Esta carta também tem em vista a manifestação do Sr. Ministro a este Plenário, expresso no Aviso de n.o 12 /GM/MS, bem como em artigo de autoria do Ministro sobre o assunto, publicado do jornal Folha de São Paulo, em 27/01/16. Assim, gostaríamos de fornecer subsídios a esta discussão, apresentando novos fatos e dados que sustentam nosso posicionamento e que respondam aos argumentos do Sr. Ministro. 1) Sobre as credenciais do Sr. Valencius Wurch para o cargo da Coordenação de Saúde Mental: Observamos que a atual Política Nacional de Saúde Mental figura dentre as inequívocas Políticas de Estado do país, consolidada com referência aos dispositivos da Lei Federal 10.216/2001 e a todo o arcabouço normativo e infra-legal regulamentado na cadeia de portarias do Ministério da Saúde, a exemplo das Portarias Ministeriais 3.088/2011 e 2.840/2014. Estas têm respaldo especial nas deliberações das Conferências Nacionais de Saúde e de Saúde Mental, por meio das quais a Reforma Psiquiátrica e o projeto ético-político de desinstitucionalização se firmaram com a demarcação da participação social na formulação da política com respeito à manifestação da vontade popular. É sob essa perspectiva que resgatamos o sentido da deliberação 219 da III Conferência

2 Nacional de Saúde Mental, realizada em 2001, pela qual as organizações da sociedade civil sobre a temática manifestaram por: Garantir que a escolha do coordenador de saúde mental efetuada pelo gestor observe os seguintes requisitos: (...) b) que esteja identificado com a política nacional de saúde mental; (...) (BRASIL, 2001, p.71-72, grifo nosso). Assim, apesar do reconhecimento de que a escolha das coordenações de programas seja uma prerrogativa institucional do ministro, ela deve obedecer a uma tradição já conquistada no SUS e na atual política de saúde mental, pois o SUS permanece, o ministro é sempre temporário. A recomendação destacada acima sobre a necessidade da identificação do Coordenador designado à implementação nacional das ações em saúde mental nos traz à inevitável interpelação da indicação de Valencius Wurch Duarte Filho por sua trajetória pregressa no campo da Saúde Mental no Brasil. Ao contrário de todos os Coordenadores já indicados à pasta, Valencius Wurch, não obstante os seus 33 anos de trajetória profissional na Medicina Psiquiátrica e na saúde pública, nunca teve experiência de trabalho em instituições extrahospitalares do SUS, com notável destaque à ausência em seu currículo de experiências de trabalho em equipamentos da rede substitutiva que hoje figuram como os pilares da Rede de Atenção Psicossocial. Ao contrário, teve proeminente atuação em clínicas e hospitais psiquiátricos privados, dentre os quais se destacam sua experiência de trabalho e gestão no Hospital Psiquiátrico de Paracambi (RJ) e na Casa de Saúde Dr. Eiras do mesmo município. Essa Casa carrega consigo a marca histórica 1 de ter sido o maior hospital privado psiquiátrico da América Latina, fechado em 2012, por intervenção federal, depois de graves e constantes denúncias de violações de direitos humanos cometidas contra internos, desde o início da década de 1990. Há algo importante a ser destacado acerca da experiência de gestão na Casa de Saúde Dr.Eiras, da qual Valencius foi diretor entre o ano de 1993 e 1998: neste período sua gestão se sustentou em torturas e diversas outras violações de direitos humanos, a exemplo do uso de eletrochoque, alimentação escassa e de péssima qualidade, água não potável, injetáveis de vidro não descartáveis, etc. Sob essas condições, em determinado intervalo de tempo, sabe-se que pessoas ali internadas morriam dia sim, dia não. Não à toa que durante a sua gestão na Casa de Saúde Dr. Eiras, Valencius emite críticas públicas na mídia nacional 2 ao projeto de lei Paulo Delgado. Além disso, na direção contrária da política de reforma psiquiátrica, já explícita na época, de redução no número de leitos de macrohospitais psiquiátricos, Valencius defende o aumento de leitos de 1510 para 1800 no ano de 1 Ver vídeo-depoimento de antigos pacientes da Casa de Saúde Dr. Eiras, disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=klc1hod7yns, acessado dia 15/01/16. 2 Ver matéria 1 em anexo.

3 1997 3. Assim, seu desejo de ampliação do já macro-hospital nem de longe o alinha ao projeto de Reforma Psiquiátrica e o identifica à Política Nacional de Saúde Mental. Desse modo, a experiência de atuação de Sr. Valencius em sua carreira nos remete à clínica tradicional manicomial e não às iniciativas alinhadas à atual plataforma de gestão da Política Nacional de Saúde Mental, referência internacional de atenção às pessoas com transtorno mental, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). É evidente que o cargo para o qual foi equivocadamente designado não tem origem eleitoral, tampouco função de representação política. Trata-se de um cargo eminentemente técnico que exige envergadura científica, experiência nos trâmites da atual política, conhecimento sobre gestão federal sanitária, produções acadêmicas no campo, além do reconhecimento público de uma trajetória antimanicomial. Em suma, elementos que sustentam a deliberação da Conferência acima citada e tornam evidente a inaptidão do Sr. Valencius para o cargo. Por fim, no curso de nosso trabalho de pesquisa acerca da biografia de Valencius, chamamos a atenção para a falta de transparência pública em sua trajetória acadêmica e profissional: exceto pelos registros de sua direção e atuação em instituições asilares e por suas manifestações públicas de agravo às iniciativas de desinstitucionalização, não há disponível nada mais a seu respeito 4 muito menos que lhe legitime a assumir a Coordenação Geral de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas. Se, para nós, resta a certeza de sua inaptidão para o cargo, há que se considerar flagrante mesmo para aqueles que sustentam a sua permanência, a necessidade de confirmar e conhecer melhor suas credenciais técnicas e habilidades para uma gestão à qual tenha sido designado. Assim, do exposto acima, a defesa das credenciais do seu nomeado, que faz o Ministro Marcelo Castro em seu Aviso n.o 020 ao Conselho Nacional de Saúde, com base em afirmações pessoais sem lastro, não podem ser verificadas publicamente. Além disso, o argumento levantado pelo Sr. Ministro no seu artigo na Folha de São Paulo, de que há um julgamento prematuro e ofensivo em relação ao Dr. Valencius, antes dos atos que não foram praticados, não se sustenta. A administração pública e seus critérios de transparência requerem que a escolha de gestores para cargos complexos, como a coordenação de toda a política de saúde mental no país, seja baseada em dados biográficos e curriculares objetivos e de domínio público, que demonstrem competência, experiência em gestão pública e compatibilidade ética-política com os valores, pressupostos e práticas postas em exercício pela Política de Estado em vigor. No caso de Valencius, os dados públicos existentes apontam exatamente na direção contrária. Um currículo como o dele seria 3 Ver matéria jornalística 2 em anexo. 4 Ver em anexo Currículo Lattes de Valencius Wurch Duarte Filho, extraído no dia 15/01/16.

4 rejeitado em qualquer avaliação comparativa com os currículos de muitos dos atuais gestores do campo da saúde mental, oriundos das inumeráveis coordenações municipais, estaduais e federal com ampla experiência no campo e comprovada coerência ético-política com a atual política de reforma psiquiátrica. Além disso, o exercício do cargo máximo de gestão direta da política de saúde mental no país exige reconhecimento e legitimidade perante este atual conjunto de coordenadores de saúde mental e lideranças acadêmicas do campo de todo o país. Requer também conhecimento direto e prévio dos principais gestores e lideranças do processo político de reforma psiquiátrica em curso no país. A tradição da gestão em saúde mental é feita hoje no país de forma participativa e colegiada, incluindo a consulta formal e a discussão de seus rumos no Colegiado de Coordenadores de Saúde Mental de todo o país, que se reúne regularmente. Qual é a legitimidade que o Dr. Valencius terá para exercer este cargo? 2) Sobre o suposto diálogo aberto pelo Sr. Ministro da Saúde com os atores do campo da saúde pública e da saúde mental no país: Em seu já citado artigo publicado na Folha de São Paulo, o Ministro Marcelo Castro afirma que vem mantendo o diálogo com o Conselho Nacional de Saúde e com todos os que o tem procurado, como também tem procurado interlocutores para dialogar. Aponta também a preocupação com a falta de diálogo com os manifestantes que discordam da nomeação do Valencius, e com os ocupantes de sala da Coordenação de Saúde Mental do Ministério da Saúde (ocupação pacífica realizada desde o anúncio da nomeação do Dr. Valencius), que completa hoje 51 dias, perguntando se essa ocupação se justifica, pois o diálogo foi e está aberto, e pede para contar com a confiança das pessoas até prova ao contrário. De nosso ponto de vista, cabe nos perguntar se esse diálogo foi efetivamente aberto. Logo após a nomeação do próprio ministro, em outubro de 2015, foram protocoladas no Ministério da Saúde duas cartas públicas similares dirigidas ao Ministro, assinadas pelo conjunto das 600 principais associações científicas e profissionais, entidades e serviços do campo da saúde pública e do campo da saúde mental do país, requerendo uma audiência com ele, mostrando preocupação com os rumos futuros da política de saúde mental no país e com a indicação do novo coordenador de saúde mental. Apesar dos inúmeros esforços do movimento de reforma psiquiátrica e de luta antimanicomial do país no sentido de que essa audiência fosse realizada, por meio de outros pedidos e até de audiências requeridas e realizadas por vários parlamentares federais e de gestores importantes do governo federal, reivindicando que o diálogo fosse aberto, o Ministro não permitiu

5 que o fosse. Por outro lado, neste período, a Associação Brasileira de Psiquiatria, que nos últimos 15 anos vem tomando posições públicas contra a atual política de saúde mental no país, foi devida e primeiramente recebida pelo ministro. A audiência com os representantes da 600 entidades indicadas acima foi concedida apenas para o dia 10 de dezembro de 2015, quando o Ministro simplesmente as recebeu para informar a nomeação do Dr. Valencius para o cargo, sem colocá-la em discussão. Assim, as perguntas que nos cabe fazer são as seguintes: o diálogo com o conjunto das entidades nacionais do campo foi efetivamente aberto, como afirma o Ministro? Ou, ao contrário, foi o próprio Ministro que se fechou ao diálogo desde o início deste processo? Considerações finais Assim, do exposto acima, as entidades abaixo assinadas requerem que esta carta pública seja discutida nesta Plenária do Conselho Nacional de Saúde, que seus argumentos sejam devidamente discutidos e contrapostos ao conteúdo do Aviso 12 de autoria do Sr. Ministro, já enviado a este Conselho, para que todos os seus membros possam ter pleno acesso às posições de ambos os lados do conflito hoje existente na gestão da política de saúde mental no Ministério da Saúde, e que a partir deste discernimento informado, possam tomar as devidas e cabíveis providências que considerarem necessárias. De nossa parte, consideramos que a abertura do diálogo com o Sr. Ministro sobre os futuros rumos da política de saúde mental no país só poderá ser efetivamente iniciado, pelos múltiplos argumentos colocados acima, quando a nomeação do Dr. Valencius for reconsiderada. Tal atitude será capaz de recompor as condições para um diálogo amplo e efetivo que, na verdade, em nossa opinião, não foi iniciado até o presente momento pelo Sr. Ministro da Saúde. Associação Brasileira de Redução de Danos/ABORDA Associação Brasileira de Saúde Coletiva/ABRASCO Conselho Federal de Psicologia/CFP Conselho Federal de Serviço Social/ CFESS Federal Nacional dos Psicólogos/FENAPSI Frente Antimanicomial da Paraíba Frente Estadual Antimanicomial de São Paulo/FEASP Frente Estadual em Defesa do SUS e da Reforma Psiquiátrica do Rio de Janeiro Movimento Nacional da Luta Antimanicomial/MNLA Rede Nacional Internúcleos da Luta Antimanicomial/RENILA