Separação de pessoas e bens, conversão, divórcio - pressupostos, interpretação

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Transcrição:

DIVULGAÇÃO DE PARECER DO CONSELHO CONSULTIVO N.º 18/ CC /2016 N/Referência: P.º C.C. 1/2015 STJ-CC Data de homologação: 23-03-2016 Consulente: Conservatória do Registo Civil de.. Assunto: Menores nascidos após a separação de pessoas e bens - Pedido de conversão de separação em divórcio - acordo quanto ao exercício das responsabilidades parentais- competência da Conservatória. Palavras-chave: Separação de pessoas e bens, conversão, divórcio - pressupostos, interpretação Relatório A senhora adjunta em substituição do Conservador da Conservatória do Registo Civil de. colocou à consideração superior uma questão concreta suscitada naquela conservatória que, sucintamente, se descreve de seguida. Um advogado pretendeu dar entrada, naquela conservatória, de um pedido de conversão de separação de pessoas e bens em divórcio, nos termos do artigos 1795.º- D do Código Civil e 993.º do Código de Processo Civil, com a particularidade de, no caso, haver uma criança nascida após ter sido decretada a separação, relativamente à qual pretendiam regular o exercício das responsabilidades parentais no processo, à semelhança do que sucede no divórcio por mútuo consentimento. A opinião da consulente vai no sentido de que há uma lacuna legislativa, pois na conversão da separação em divórcio ( ) em nenhum momento se refere a apresentação de outros documentos ou acordos previstos no artigo 14.º n.º 2 do Decreto-lei 272/2001, de 13 de Outubro, e 272.º do Código do Código do Registo Civil, mas havendo menores nascidos posteriormente a ter sido decretada a separação de pessoas e bens, é nosso parecer não se pode deixar de regular o exercício das responsabilidades parentais, pois os interesses desse menor ficariam desprotegidos numa situação de divórcio. Os motivos que obrigam à regulação do poder paternal no divórcio mantêm-se na íntegra no caso de conversão de separação em divórcio. No entanto, a legislação não parece ter previsto esta situação. ( ) Conclui, assim, que da leitura da alínea e) do artigo 5.º do citado Decreto-lei a conservatória não é competente para tramitar o processo, nestas circunstâncias, pelo que os requerentes deverão regular judicialmente as responsabilidades parentais e juntar a correspondente certidão ao requerimento de conversão de separação em divórcio. O STJSR pronunciou-se no sentido de que a matéria não está expressamente regulada, nem tem de estar, e considera não haver uma lacuna legislativa porque a solução pode ser encontrada na lei existente, devendo aplicar-se-lhe o disposto nos números 2 e 4 do artigo 14.º do Decreto-lei 272/2001, de 13 de outubro. Salvaguarda, porém, a hipótese prevista no n.º 1 do artigo 1975.º-D do Código Civil (pedido de conversão da separação em divórcio efetuado, apenas, por um dos cônjuges), por entender que nesta situação o requerimento deve vir acompanhado da certidão judicial que regule ou homologue o acordo das responsabilidades parentais, pois, pode acontecer não ser possível obter tal acordo. 1/5

As apontadas soluções do caso demonstram, quão difícil é fixar o sentido e alcance da lei. A interpretação legislativa é uma tarefa que não é alheia à sensibilidade do intérprete, assim, a mesma questão pode ter interpretações diferentes, mas juridicamente válidas. Como refere Germano Marques da Silva ( ) cada intérprete é portador dos seus valores e reflete-os necessariamente na interpretação das normas, mesmo se o faz sem disso ter consciência ( ) 1 Cumpre apreciar: Começamos por dizer que concordamos com a argumentação da consulente quando afirma que as razões que determinam a regulação das responsabilidades parentais na situação de divórcio não podem ser afastadas no procedimento de conversão da separação em divórcio, pois como bem refere o STJSR é o superior interesse da criança que está causa. Com efeito, o superior interesse da criança consagrado no artigo 3.º da Convenção dos Direitos da Criança, ratificada por Portugal em 1990, constitui uma verdadeira norma de interesse público que deve ser observada pelas autoridades judiciais e administrativas na tomada de quaisquer decisões que afetem as crianças, acresce que a proteção da criança é um direito fundamental consagrado no artigo 69.º da Constituição da República Portuguesa. A questão em apreciação é essencialmente interpretativa e, na interpretação da lei deve o intérprete socorrer-se não apenas do elemento literal, mas atender ao elemento sistemático e ao racional devendo presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas tendo em consideração as circunstâncias em que a lei foi elaborada, e as condições específicas do tempo em que é aplicada, a tanto nos exorta o artigo 9.º do Código Civil. Façamos uma análise sistemática dos institutos do divórcio e da separação de pessoas e bens. A matéria do divórcio e da separação de pessoas e bens - a que o legislador ainda não retirou a expressão judicial não obstante a sua desjudicialização - está contemplada no Código Civil no livro IV, capítulo XII. As normas relativas ao divórcio constam na Secção I nos artigos 1773.º a 1793.º e as atinentes à separação de pessoas e bens na Secção II artigos 1794. º a 1795.º-C, a conversão da separação em divórcio (a que abreviadamente poderemos designar conversão ou divórcio mediante conversão ) é o último dispositivo desta secção artigo 1795.º -D. Uma breve observação deste conjunto de normas permite-nos concluir que o legislador admite a rutura definitiva e imediata do vínculo conjugal, através do divórcio ou o seu afrouxamento através da separação de pessoas e bens. É notório que a separação não é benquista pelo legislador que parece prevê-la como situação transitória entre a reconciliação e o divórcio, (artigos 1795.º C e 1795.º D do Código Civil). O artigo 1795.º -D do Código Civil fixa os requisitos substantivos de admissibilidade de divórcio por conversão da separação de pessoas e bens. O Decreto-lei 272/2001, de 13 de outubro contém, também, disposições atinentes à conversão da separação de pessoas e bens em divórcio, desde logo a alínea e) do artigo 5.º que classifica este processo como um procedimento tendente à formação do acordo das partes, e ainda o artigo 11.º que sob a epígrafe Conversão da separação judicial de pessoas e bens decalca o disposto no n.º 2 do artigo 993.º do Código de Processo Civil único preceito deste código que refere o instituto. O legislador foi minucioso na regulamentação do divórcio e determinou que à separação de pessoas e bens se devem aplicar, com as devidas adaptações, as normas referentes ao divórcio - artigo 1794.º do Código Civil. Não regulou expressamente o processo de conversão da separação em divórcio. Descendo ao caso em concreto: Nascimento de uma criança após a separação de pessoas e bens sem regulação das responsabilidades parentais seus reflexos no procedimento de conversão da separação de pessoas e bens em divórcio. 1 Introdução ao Estudo do Direito, Universidade Católica Editora,3ª edição, página 272. 2/5

Duas questões assomam ao nosso espírito: a) Será que o legislador não previu o caso e pretende que a questão se solucione por recurso a duas entidades, o tribunal e a conservatória, devendo ser tramitados dois processos distintos? b) Poderão os interessados recorrer ao divórcio por mútuo consentimento, para de forma mais célere obterem a dissolução do casamento e a homologação do acordo do exercício das responsabilidades parentais? A estas questões temos de responder negativamente, pois, não cremos ter sido intenção do legislador dificultar a obtenção do divórcio mediante conversão que está legalmente concebido como uma forma simplificada de rutura conjugal. Para uma melhor interpretação da lei temos de atender à ratio legis. O escopo da desjudicialização consta do preâmbulo do Decreto-lei 272/2001, de 13 de outubro, onde podemos ler que: Colocar a justiça ao serviço da cidadania é um dos objectivos estratégicos fundamentais assumidos pelo Governo nesta área, concretizado nomeadamente na tutela do direito a uma decisão em tempo útil. Neste sentido, importa desonerar os tribunais de processos que não consubstanciem verdadeiros litígios, permitindo uma concentração de esforços naqueles que correspondem efectivamente a uma reserva de intervenção judicial. Assim, aproxima-se a regulação de determinados interesses do seu titular, privilegiando-se o acordo como forma de solução e salvaguardando-se simultaneamente o acesso à via judicial nos casos em que não seja possível obter uma composição pelas próprias partes. O diploma em análise define as linhas gerais da tramitação processual do procedimento perante o conservador, e o seu artigo 19.º ordena a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, assim aplicar-se-ão, também, os princípios estruturantes do processo civil que o conservador deve ter presente na sua atividade processual, com vista a uma decisão de mérito que produzirá os mesmos efeitos que as sentenças judicias (n.º 4 do artigo 17.º, do mencionado Decreto-lei) Em obediência aos princípios da economia processual e da adequação formal parece-nos que havendo crianças nascidas após ter sido decretada a separação de pessoas e bens pode ser decretado o divórcio por conversão, mediante procedimento a instaurar na conservatória, devendo o pedido ser instruído com acordo referente ao exercício das responsabilidades parentais. Não são os interessados obrigados a recorrer à via judicial para obter uma decisão referente às responsabilidades parentais para posteriormente poderem, por via administrativa, requerer o divórcio mediante conversão. Entendemos, também, não ser admissível o divórcio por mútuo consentimento estando os cônjuges já separados de pessoas e bens sob pena de se violar o princípio da economia processual e o da adequação formal do processo. A questão da viabilidade de requerer o divórcio estando decretada a separação de pessoas e bens era bastante controversa antes da entrada em vigor da Lei 61/2008, de 31 de outubro. Alguma jurisprudência defendia que só por via da conversão se poderia obter o divórcio, outra corrente admitia ser possível intentar ação de divórcio com fundamento em violação culposa dos deveres conjugais acolhia-se, ainda, a possibilidade de os cônjuges pedirem o divórcio por mútuo consentimento, caso a separação tivesse sido culposa, afastando assim as consequências patrimoniais na partilha por divórcio, julgamos que esta polémica perdeu interesse com o desaparecimento da culpa no divórcio. A transferência de competências para as conservatórias operada pelo Decreto-lei 272/2001, de 13 de outubro, teve na sua génese a necessidade de garantir a tutela do direito em tempo útil, bem como a necessidade de desonerar os tribunais de processos que não sejam verdadeiros litígios. A ratio legis do diploma permite-nos concluir que o acordo de exercício das responsabilidades parentais possa ser homologado no âmbito do procedimento de conversão de separação em divórcio. 3/5

Em consolidação deste nosso entendimento apelamos à letra da lei que, no n.º 5 do artigo 7.º do referido Decreto-lei, consagra o poder dever de direção do processo (também presente no artigo 6.º do Código do Processo Civil), impondo ao conservador a obrigação de providenciar pelo normal prosseguimento do procedimento sanando oficiosamente, se possível, a falta de pressupostos processuais e convidando as partes a suprir falhas e a aperfeiçoar o processo, para que possa ser proferida uma decisão justa em tempo útil. O indeferimento do processo por incompetência em razão da matéria determinaria que os interessados recorressem numa primeira fase ao Tribunal, para regular o exercício das responsabilidades parentais e posteriormente, à conservatória para obter o divórcio por conversão tornando a justiça mais lenta e burocrática. Avocando na nossa tarefa interpretativa o elemento sistemático, a ratio legis e a ocasio legis concluímos em sincronia com o parecer do STJSR que não há uma lacuna legislativa, na questão em análise, pois a tramitação processual do divórcio está prevista, no Decreto-lei 272/2001, de 13 de outubro, no Código do Registo Civil e no Código do Processo Civil, cujas normas se devem aplicar, com as devidas adaptações, à conversão da separação de pessoas e bens em divórcio que mais não é que uma forma simplificada de dissolução conjugal. A hipótese excecionada pelos STJSR de o processo entrar a requerimento de um dos cônjuges sem que esteja regulado o exercício das responsabilidades parentais, de uma criança nascida após a separação, parece-nos difícil de ocorrer e mais complexa de solucionar. Havendo filhos menores, sem regulação do exercício das responsabilidades parentais, e pretendendo um dos cônjuges requerer a conversão da separação em divórcio, julgamos que, em abono duma justiça mais célere, as partes, advogados e conservadores devem providenciar pela correta instauração e instrução do processo advertindo o interessado de que o pedido poderá não obter decisão favorável. No entanto, entrando um pedido de divórcio por conversão, nestas circunstâncias, entendemos que deve ter-se em consideração as características do processo de jurisdição voluntária e a sua natureza de procedimento tendente à obtenção do acordo das partes. Nestes processos admite-se que se convide o requerente a juntar decisão judicial da regulação das responsabilidades parentais ou acordo formulado por ambos, sob a cominação de o pedido poder ser indeferido liminarmente no termos do artigo 590.º do Código de Processo Civil, por não se verificarem os pressupostos que permitem a sua apreciação (artigo 272.º do Código de Processo de Registo Civil, 1775.º do Código Civil e 14.º do Decreto-lei 272/2001, de 13 de outubro). O princípio do contraditório, em processo civil, permite a junção de documentos desde que se respeite o princípio da igualdade processual das partes. Existindo o documento ou estando as partes disponíveis para elaborar o acordo parece-nos que deve o mesmo ser apresentado e aceite porque a sua junção não prejudica o requerido, nem o requerente. Pelo exposto, extraímos as seguintes conclusões: I. Na interpretação legislativa o intérprete deve atender ao elemento gramatical, sistemático e racional da lei, e deve presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas tendo em consideração as circunstância em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada - artigo 9.º do Código Civil. II. III. IV. No âmbito da apreciação dos processos de jurisdição voluntária o conservador deve nortear-se pelos princípios estruturantes do processo civil, nomeadamente o da economia processual, bem como o do contraditório e da igualdade das partes. O superior interesse da criança determina que antes de ser decretado o divórcio dos pais se garantam os seus direitos fundamentais tais como, o contacto com ambos os progenitores, a residência, o sustento e a educação. Tais direitos devem ser assegurados, preferencialmente, por consenso dos progenitores. O divórcio decretado por conversão da separação de pessoas e bens é um processo de jurisdição voluntária da competência das conservatórias do registo civil, previsto e tramitado no Decreto-lei 4/5

272/2001, de 13 de outubro, sendo-lhe aplicável subsidiariamente as disposições contidas no Código do Processo Civil. V. O pedido de conversão da separação de pessoas e bens em divórcio efetuado nos termos da alínea e) do n.º 5 do dito Decreto-lei. 272/2001, determina que o conservador verifique o cumprimento dos pressupostos legais do divórcio. VI. VII. VIII. Havendo crianças nascidas após ter sido decretada a separação de pessoas e bens, o pedido de conversão da separação de pessoas e bens em divórcio requerido nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-lei 272/2001 de 13 de outubro, deve ser instruído com decisão judicial atinente à regulação do exercício das responsabilidades parentais ou acordo de regulação das mesmas caso não tenham sido reguladas judicialmente, aplicando-se o disposto no n.º 2 do artigo 14.º do mesmo diploma. Sendo junto ao processo o acordo referido no número anterior o processo é enviado ao Ministério Público junto do tribunal judicial de 1.ª instância competente em razão da matéria no âmbito da circunscrição a que pertença a conservatória, para que este se pronuncie sobre o acordo nos termos do n.º 4 do artigo 14.º do referido Decreto-lei. Recebido o processo com parecer favorável do Ministério Público e estando verificados os pressupostos legais o conservador homologa o acordo das responsabilidades parentais e declara a conversão da separação em divórcio Parecer aprovado em sessão do Conselho Consultivo de 23 de março de 2016. Paula Marina Oliveira Calado Almeida Lopes, relatora, António José dos Santos Mendes, Maria de Lurdes Barata Pires de Mendes Serrano, Benilde da Conceição Alves Ferreira. Este parecer foi homologado pelo Senhor Presidente do Conselho Diretivo, em 23.03.2016. 5/5