Variabilidade da Temperatura da Superfície do Mar no Oceano Atlântico Sul Thiago Degola¹ e Tercio Ambrizzi¹ Universidade de São Paulo e-mails: thiago.degola@usp.br ; ambrizzi@model.iag.usp.br RESUMO: As interações entre o oceano-atmosfera que ocorrem no Oceano Atlântico Sul são de grande importância para o clima da América do Sul e seu estudo é fundamental para melhorarmos nossa previsão do tempo. Esse trabalho tem como objetivo determinar variações de padrões e tendências climáticas da temperatura da superfície do mar no Oceano Atlântico Sul desde o período de 1855 até 2004. Palavras chave: Temperatura da Superfície do Mar, Oceano Atlântico Sul, Variabilidade climática ABSTRACT: The interactions between the ocean-atmosphere that occur in the South Atlantic Ocean are very important for the climate of South America and their study is crucial if we intend to improve our forecasts. This study aims to determine changes in climate patterns and trends of sea surface temperature in the South Atlantic Ocean in the period of 1855 to 2004. 1. Introdução Um melhor entendimento das interações do acoplamento oceano-atmosfera é importante se desejamos melhorar nossa capacidade de previsão de tempo e clima. Particularmente, as interações que ocorrem no Oceano Atlântico Sul (OAS) ainda não são muito bem entendidas. É bem conhecido atualmente que o OAS é o local de nascimento dos ciclones, da passagem de frentes frias e de intensa atividade de bloqueios (Reboita 2008). No entanto, estudos mais detalhados ainda são necessários a fim de compreender como o OAS afeta o clima da América do Sul e particularmente o Brasil. Muitas propriedades oceânicas estão relacionadas com a variabilidade da atmosfera imediatamente acima, sugerindo que muito da variabilidade do oceano é dirigida pela atmosfera. Algum progresso tem sido atingido com relação a nossa habilidade de monitorar e compreender o Oceano Atlântico Sul, no entanto, ainda há muita coisa que descobrir (p.ex., Wainer et al., 2000 e Goni e Wainer, 2001), em particular, a sensibilidade do OAS quanto aos diferentes cenários de aquecimento global que estão sendo discutidos nos dias atuais. Como apontado por Taschetto e Wainer (2008), a discussão do impacto da Temperatura da Superfície do Mar (TSM) no Atlântico Sul sobre o clima de nosso continente ainda encontrase longe de alcançar um consenso. Por exemplo, Figueroa et al (1995) discutiram que um aquecimento na TSM do Atlântico Sul não tem nenhum efeito sobre a Zona de Convergência 1
do Atlântico Sul (ZCAS) enquanto Robertson e Mechoso (2000) mostraram evid ências observacionais de que o aquecimento (esfriamento) da TSM est á associado a eventos mais fracos (fortes) de ZCAS. Barreiro et al (2002) mostraram que o ramo oceânico da ZCAS é influenciado pela variabilidade local da TSM enquanto sua parte costeira está relacionada com a variabilidade interna da atmosfera. Mais recentemente, Chaves e Nobre (2004) notaram um resposta negativa entre a atmosfera e o oceano, sugerindo que TSMs frias ocorrem abaixo da parte oceânica da ZCAS sendo, portanto, uma resposta a forçante atmosférica. Por outro lado, os contrastes térmicos entre distintas massas de água no oceano, como ocorre na confluência das correntes Brasil-Malvinas, contribuem para gerar gradientes intensos de momento e fluxos verticais de energia entre o oceano e a atmosfera (Pezzi et al. 2004, Pezzi et al. 2005; Tokinaga et al. 2005). Sabe-se também que a ocorrência de pequenos processos turbulentos em pequena escala temporal e espacial (ordem de horas e quilômetros) pode induzir variações na evolução de processos de grande escala (ordem de milhares de quilômetros e vários dias). Os processos de grande escala têm uma influencia direta na meteorologia e vida marinha, afetando a costa e o interior do continente sul americano (Gan and Rao, 1991; Hoskins and Hodges, 2005). O Grupo de Trabalho 1 do IPCC AR4 (IPCC, 2007) indica a ocorrência inequívoca do aquecimento global e apresenta novas evidências sobre a real contribuição humana para o agravamento do efeito estufa. Considerando os aspectos discutidos acima sobre a importância das variações da TSM do oceano Atlântico Sul sobre o clima e tempo em nosso continente, uma pergunta importante que devemos fazer é: como o aquecimento global vai afetar os oceanos em cenários futuros de aumento dos gases de efeito estufa? Dessa forma, um melhor conhecimento dessas variações no passado, em tempos recentes e no futuro é importante para que possamos atribuir seus efeitos sobre o clima e mitigar seu impacto sobre a sociedade de forma geral. Esse trabalho pretende determinar as tendências climáticas do passado e presente através da análise da variabilidade da TSM sobre o oceano Atlântico Sul considerando um longo período de tempo. 2. Metodologia Neste trabalho foi usada uma série de dados obtidos junto ao NOAA ( Nacional Oceanic & Atmosferic Administration), que contém séries históricas de dados mensais de temperatura de superfície do mar desde 1855 até 2004. Para a análise desses dados, foram utilizadas técnicas estatísticas simples como distribuições amostrais, estimação de parâmetros, regressão linear e outros. 3. Resultados Analisando os dados obtidos junto ao NOAA de modo a observar a variação absoluta da temperatura da superfície do mar (TSM) em relação ao período de 1855 a 2004, foram calculadas as médias climatológicas dos períodos t e 1 t 2 (o período t 1 corresponde à média entre os anos 1855 a 1884 e t 2 corresponde a 1975 a 2004). E, para obter a variação absoluta da TSM, foi calculada t2 t1. A Fig. 1 corresponde à variação absoluta da TSM para as quatro estações do ano. 2
Figura 1 - Variação absoluta da TSM no OAS ( t2 t1) para as quatro estações. A partir da Fig. 1 percebe-se um aumento absoluto significativo ao longo das 4 estações do ano com cerca de 1ºC na região costeira do norte da Argentina e Uruguai (LAT 40S, LON 54W). Nessa região ocorre grande parte da ciclogênese do Atlântico Sul, sendo ela muito importante para o clima da América do Sul (Gan e Rao 1991; Reboita et al 2009). Tendo em vista esse aumento significativo, foi feito um estudo climatológico detalhado dessa região para o verão ao longo de toda série de dados (Fig.2). 3
2-a 2-b Figura 2 Evolução da temperatura da superfície do mar na região de LAT 40S e LON 54W no verão. 2-a) Para o período de 1860-2004. 2-b) Para o período de 1894-2004, com um filtro de Fourrier de 0,0125Hz e com um ajuste linear deste filtro. A partir da Fig.2 percebe-se que a TSM teve uma queda até o final do século XIX e, a partir desse período, teve uma tendência positiva a uma taxa de ( 1,72 0,10) C. Esse 100anos aumento de temperatura pode influenciar diretamente no número de ciclogêneses nessa região em função de um aumento na taxa de evaporação, e, dessa forma, contribui para o 4
crescimento da baroclinia, que é a fonte de energia necessária para o desenvolvimento de um ciclone extratropial. Outros estudos para confirmar que esse aumento de temperatura na superfície do mar na região LAT40S LON54W está relacionado com o aumento no número de ciclogêneses na região ainda são necessários e estão em andamento atualmente. 4. Conclusões Na região de LAT40S LON54W, entre o período de 1855-2004, houve um aumento absoluto da TSM na ordem de 1 C para todas as estações do ano. Analisando a estação de verão em particular, observou-se que a TSM sofreu uma queda entre o período de 1855-1893, e, a partir desse período, ela aumentou sistematicamente a uma taxa média de ( 1,72 0,10) C. 100anos Tendo em vista que esse aumento de TSM pode interferir na ciclogênese dessa região, outros estudos para confirmar que esse aumento significativo na temperatura da superfície do oceano pode ter contribuído para um aumentado o número de ciclogenesis nesse local ainda se fazem necessários, e o presente estudo encontra-se em andamento. 5. Agradecimentos: Este estudo teve suporte do CNPq através de bolsa de produtividade e PIBIC. 6. Referências Barreiro, M., Chang, P., and Saravanan, R. 2002: Variability of the South Atlantic Convergence Zone simulated by an atmospheric general circulation model, J. Clim., 15, 745 763. Figueroa, S.N., P. Satyamyrty, and P. L. Silva-Dias, 1995: Simulations of the Summer Circulation Over the South American Region with an ETA Coordinate Model. J. Atmos. Sci., 52, 1573-1584. Gan, M. A., and B. V., Rao, 1991: Surface cyclogenesis over South America. Mon. Wea. Rev., 119, 293-302. Goni. G. J and I. Wainer, 2001: Investigation of the Brazil Current front variability from altimeter data. J. Geophys. Res., 106, (C12), 31117 31128. Hoskins, B. J., and K. I. Hodges, 2005. A New Perspective on Sourthern Hemisphere Storm Tracks. Journal of Climate, V18, 4108-4129. IPCC, 2007: Climate Change: The Physical Science Basis. Contribution of Working Group I to the Fourth Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change [Solomon, S., D. Qin, M. MANNING, Z. Chen, M. Marquis, K.B. Averyt, M. Tignor and H.L. Miller (eds.)]. Cambridge University Press, Cambridge, United Kingdom and New York, NY, USA, 996 pp, 2007. IPCC, Climate Change 2007: Synthesis Report. 2007. 52 p. Pezzi, L. P., R. Souza, M. S. Dourado, C. A. E. Garcia, M. M. Mata, and S.-D. M. A. F., 2005: Oceanatmosphere in situ observations at the Brazil-Malvinas Confluence region. Geophysical Research Letters, 32-L22603:doi:10.1029/2005GL023866. Rayner, N.A.; Parker, D.E.; Horton, E.B.; Folland, C.K.; Alexander, L.V.; Rowell, D.P.; Kent, E.C.; Kaplan, A. 2006: UKMO - GISST/MOHMATN4/MOHSST6 - Global Ice coverage and SST (1856-2006), [Internet]. UK Meteorological Office, Date of citation. Available from http://badc.nerc.ac.uk/data/gisst/ Robertson, A. W. and C. R. Mechoso, 2000: Interannual and interdecadal variability of the South Atlantic convergence zone. Mon. Wea. Rev, 128, 2947-2957. Taschetto A., and Wainer, I., 2008: The Impact of the Subtropical South Atlantic SST on South American Precipitation. Annales Geophysicae (in revision). Tokinaga, H., Y. Tanimoto, and S.-P. Xie, 2005: SST-induced wind variations over Brazil-Malvinas confluence: Satellite and in-situ observations. J. Climate, 18, 3470 3482. 5