CALIBRAÇÃO DO MODELO DA FAO PARA SIMULAÇÃO DA PRODUTIVIDADE POTENCIAL E REAL DO MILHO SAFRINHA Kleber G. Andrioli 1, Paulo C. Sentelhas 2, Cecília M. T. Soler 3, Fábio R. Marin 4 RESUMO No Brasil, os métodos utilizados para estimativas de safras agrícolas têm se baseado unicamente em entrevistas com agentes de produção, produtores e profissionais ou agentes financeiros, o que torna tais estimativas muito subjetivas e pouco precisas. A opção para melhorar tais estimativas é por meio do uso de modelos de simulação da produtividade, denominados de modelos agrometeorológicos, os quais devem ser antecipadamente calibrados e testados para cada cultivar de uma dada cultura, em função de suas diferentes características. Com o intuito de se estimar a produtividade do milho de uma determinada região de forma mais precisa e acurada, baseada em dados meteorológicos, este trabalho teve por objetivo calibrar e testar os modelos da FAO para simular as produtividades potencial (PP), pelo método da Zona Agroecológica, e real (PR), pelo método da penalização da PP pelo déficit hídrico, para quatro cultivares de milho (C333B, AG9010, DINA CO32 e Exceler), cultivados durante a safrinha em Piracicaba, SP. Os dados das produtividades observadas em experimentos de campo foram obtidos de Soler (2004), enquanto os dados meteorológicos requeridos pelos modelos, referentes aos períodos de cultivo, foram obtidos da estação meteorológica da ESALQ/USP, a cerca de 1 km da área dos experimentos. O processo de calibração consistiu da manipulação dos coeficientes de colheita (Cc), para a estimativa da PP, e do coeficiente de sensibilidade ao déficit hídrico (Ky), para a estimativa da PR. Os resultados indicaram que os modelos da FAO estimaram tanto a PP como a PR de forma satisfatória (b = 0,994 e R 2 = 0,80). Os erros associados às estimativas de PP variaram de 1 a 8%. Já para a estimativa da PR, os erros tiveram uma maior variação, sendo da ordem de 2% para as cultivares C333B e DINA CO32, de 8% para a cultivar AG1010 e de 18% para a cultivar Exceler. ABSTRACT In Brazil, the methods used to yield prediction are based on interviews with production agents, farmers, and financial agents or professionals, which make such estimates very subjective and with few precision. The option to improve such estimates is by using yield simulation models, named agrometeorological models, which should be previously calibrated and tested for each cultivar of a given crop, based on their different characteristics. Aiming to estimate maize yield in a region with accuracy and precision, based on meteorological data, this study had as objective to calibrate and test the FAO s models to estimate the potential productivity (PP), using the Agroecological Zone method, and actual productivity (PR), using the depletion of PP by the water deficit, for four maize cultivars (C333B, AG9010, DINA CO32 e Exceler), grown during off-season in Piracicaba, SP, Brazil. The maize observed yield data were obtained from Soler (2004), while weather data during the growing season were obtained from the weather station installed at ESALQ/USP, around 1 km east of the experimental site. The calibration process was based on the manipulation of harvest index (Cc), for PP estimation, and water deficit sensitivity index (Ky), for PR estimation. The results showed that both FAO models performed quite well for estimating PP and PR (b = 0.994 e R 2 = 0.80). The errors associated with PP estimates ranged from1 to 8%. For PR estimates such errors were of 2% for C333B and DINA CO32 cultivars, 8% for AG1010 and 18% for Exceler. Palavras-chave: modelagem, produtividade, milho 1 Bolsista de Iniciação Científica MDA/EMBRAPA, aluno de graduação da ESALQ/USP, Piracicaba, SP. E-mail: kleberg_andrioli@hotmail.com. 2 Professor Associado, Departamento de Ciências Exatas, ESALQ/USP, piracicaba, SP. 3 Pós-Doutoranda, Universidade da Geórgia, Griffin, Estados Unidos. 4 Pesquisador, EMBRAPA CNPTIA, Campinas, SP>
INTRODUÇÃO O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento MAPA, através da Companhia Nacional de Abastecimento CONAB, realiza todos os anos levantamentos das safras agrícolas para quantificar e acompanhar a produção brasileira. O levantamento desses dados pelos técnicos da CONAB se realiza em suma por meio de entrevistas com produtores rurais, agrônomos e técnicos de cooperativas, Secretarias de Agricultura, órgãos de Assistência Técnica e Extensão Rural oficiais e privados e Agentes Financeiros. Esta metodologia, portanto, sempre esteve sujeita a imprecisões, mostrando-se muito subjetivas para as estimativas de produtividades agrícolas. Hoje, o Brasil carece de uma metodologia que possa anteceder de forma muito mais exata e precisa, as produtividades a serem obtidas por uma determinada área. A modelagem utilizando-se dados meteorológicos da região produtora tem se mostrado uma ótima ferramenta para a simulação das produtividades de grãos antes da colheita (Soler, 2004). Dentre os modelos disponíveis para tais simulações, os apresentados pela FAO para a estimativa da produtividade potencial, pelo Método da Zona Agroecológica, e da produtividade real, pela penalização da produtividade potencial pelo déficit hídrico ao longo do ciclo, tem se mostrado como um dos mais aplicáveis, em razão da baixa exigência em termos de dados de entrada (Doorenbos e Kassam, 1994). Considerando-se a importância da cultura do milho no Brasil e a importância de se conhecer antecipadamente sua quantidade produzida, o presente trabalho teve por objetivo calibrar e testar o modelo da FAO (Método da Zona Agroecológica) para a estimativa das produtividades potencial (irrigado) e real (sequeiro) de quatro cultivares no período da safrinha, de modo a torná-lo aplicável à previsão de safra do milho, a partir de dados meteorológicos e da cultura. MATERIAL E MÉTODOS O estudo utilizou dados de produtividade potencial (irrigado) e real (sequeiro) obtidos em experimentos de campo por Soler (2004), em Piracicaba, SP. O experimento foi realizado com quatro cultivares de milho: C333B, AG9010, DINA CO32 e Exceler, semeados na safrinha. O primeiro experimento foi realizado em 2001 com data de semeadura em 15 de março sob condições de irrigação para a obtenção da produtividade potencial (PP) das cultivares. Em 2002 foram realizados dois experimentos com data de semeadura em 18 de março, um irrigado e outro de sequeiro, este último utilizado para a obtenção da produtividade real.
Os dados meteorológicos, referentes aos períodos dos experimentos, foram obtidos junto à estação meteorológica da ESALQ/USP, em Piracicaba, SP, aproximadamente a 1 km a leste da área experimental. Foram utilizados os dados diários de temperatura média (Tmed), insolação (n), e chuva (Prec), além das variáveis: irradiância solar no topo da atmosfera (Qo) e fotoperíodo (N), dos respectivos períodos de cultivo. Os dados meteorológicos foram empregados na estimativa das produtividades potencial (PP) e real (PR) a partir dos modelos da FAO: Método da Zona Agroecológica, para estimativa da PP, e Método da Depreciação da PP pelo Déficit Hídrico, para a estimativa da PR. A descrição dos métodos é apresentada a seguir: n PP = FBi. C. C. C. C i= 1 IAF RESP C Um [ 1 Ky ( 1 Ky ( ETr ETc) )] PR = PP 1 em que: FB = fotossíntese bruta do dia i, C IAF = coeficiente para correção do índice de área foliar da cultura, C RESP = coeficiente para a correção para a respiração de manutenção da cultura, C C = correção para a parte efetivamente colhida, C Um = correção para a umidade da parte colhida, Ky = coeficiente de sensibilidade ao déficit hídrico, ETr = evapotranspiração real da cultura, ETc = evapotranspiração máxima da cultura. A ETc foi determinada pelo produto entre a evapotranspiração potencial (ETP) e o coeficiente de cultura (Kc) para cada fase fenológica da cultura do milho, enquanto que a ETR foi determinada pelo balanço hídrico da cultura (Pereira et al., 2002). O processo de calibração dos modelos consistiu da manipulação dos coeficientes de colheita (Cc), para a estimativa da PP, e do coeficiente de sensibilidade ao déficit hídrico (Ky), para a estimativa da PR. As produtividades estimadas pelos modelos foram comparadas às produtividades observadas pela análise de regressão e as diferenças percentuais entre os dados observados e estimados determinaram os erros associados aos modelos. RESULTADOS E DISCUÇÃO O processo de calibração dos modelos da FAO para a estimativa da PP resultou em diferentes coeficientes de colheita para as cultivares (Tabela 1), que variaram entre 0,33 e 0,44, estando dentro dos limites apresentados pela FAO e apresentados por Pereira et al. (2002). Já o processo de calibração para a estimativa da PR, resultou em alteração nos valores do Ky nas fases fenológicas da floração e da
frutificação, que passaram respectivamente de 1,5 e 0,5 (valores originais do modelo) para 1,2 e 0,4 (Tabela 2). Com os valores calibrados de Cc, as produtividades potenciais dos experimentos de 2001 e 2002 simuladas pelo modelo da FAO foram precisas e exatas, com erros menores que 8% em relação ao observado no campo (Tabela 3). As produtividades reais estimadas para o experimento de 2002 apresentaram diferenças da mesma ordem de magnitude, com exceção apenas da cultivar Exceler que teve um erro de 18% em relação à produtividade real observada. Tabela 1 Coeficientes de colheita (Cc) ajustados para a estimativa da produtividade potencial de cada cultivar de milho safrinha, em Piracicaba, SP. 2001/2002 Cultivar Cc C333B 0,33 AG9010 0,44 DINA CO 32 0,36 Exceler 0,42 Tabela 2 Coeficientes de sensibilidade ao déficit hídrico (Ky) utilizados para a estimativa da produtividade real do milho safrinha, em Piracicaba, SP. 2002. Fase fenológica Ky Des. vegetativo 0,4 Floração 1,2 Frutificação 0,4 Maturação 0,2 Tabela 3 Produtividade Potencial (PP) e Real (PR) da cultura do milho safrinha observadas e estimadas pelos modelos da FAO. Piracicaba, SP. 2001/2002. Variedade PP Simulad. FAO - 2001 PP Observado Campo - 2001 Dif. (%) C333B 5468 5801-6 AG9010 5357 5028 +7 DINA CO 32 5416 5684-5 Exceler 6313 5863 +8 Variedade PP Simulad. FAO - 2002 PP Observado Campo - 2002 Dif. (%) C333B 5400 5139 +5 AG9010 5265 4986 +6 DINA CO 32 5288 5047 +5 Exceler 5233 5306-1 Variedade PR Simulad. FAO - 2002 PR Observado Campo - 2002 Dif. (%) C333B 3748 3823-2 AG9010 3726 4044-8 DINA CO 32 4035 4109-2 Exceler 3993 4859-18
Analisando-se todo o conjunto de dados observados e estimados, apresentados na Figura 1, observa-se que o modelo da FAO, tanto para a estimativa de PP como da PR apresentou desempenho satisfatório, com alta exatidão (b= 0,99) e boa precisão (R 2 = 0,80), mostrando, portanto, ser uma ferramenta útil para a previsão de safras do milho safrinha milho. 7000 Prod. Estimada - FAO (kg/ha) 6000 5000 4000 3000 2000 1000 y = 0,994x R 2 = 0,80 0 0 1000 2000 3000 4000 5000 6000 7000 Prod. Observada (kg/ha) Figura 1 Relação entre as produtividades simuladas pelo modelo da FAO e observadas para a cultura do milho safrinha, em Piracicaba, SP. 2001/2002. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Doorenbos, J., Kassam, A.H. Efeito da água no rendimento das culturas. Estudos FAO Irrigação e Drenagem 33, Campinas Grande, UFPB, 1994. 306p. Pereira, A.R., Angelocci, L.R., Sentelhas, P.C. Agrometeorologia: fundamentos e aplicações práticas. Guaíba: Ed. Agropecuária, 2002. 478p. Soler, C. M. T. Uso do Modelo Ceres-Maize para Previsão de Safra de Milho Safrinha. Piracicaba, 2004. 132p. Tese (Doutorado) Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo.