A construção de escalas musicais e instrumentos musicais de baixo custo como recurso didático para o ensino de física ondulatória.

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Transcrição:

A construção de escalas musicais e instrumentos musicais de baixo custo como recurso didático para o ensino de física ondulatória. Iberê Souza Ribeiro Júnior 1, Leonardo Crochik 2 1 Cefet Sp, Licenciatura em Física, ibereviolao@hotmail.com 2 Cefet Sp, Licenciatura em Física, crochik@gmail.com Resumo O presente projeto visa explorar as potencialidades pedagógicas, no ensino de física ondulatória, de atividades ligadas à construção e afinação de instrumentos musicais e à analise do som produzido por eles. Para tal efeito, foram feitas pesquisas sobre a história da construção de escalas musicais, bem como os conceitos físicos envolvidos na determinação de uma escala agradável ao ouvido. Pesquisamos também a construção de instrumentos musicais de baixo custo com fins didáticos, sendo esses instrumentos inspirados no grupo musical Uakti, que desenvolve um trabalho de pesquisa ligado à construção de instrumentos musicais com materiais alternativos. Através da investigação das interações entre arte e ciência, procuramos com essa pesquisa contextualizar o conhecimento científico e atribuir a ele múltiplos sentidos e significados no processo de ensino-aprendizagem. Palavras Chaves: Física, música, ensino, construção de escalas musicais. Justificativa A música como forma de arte desperta, em nossa cultura, o interesse de muitos jovens e adultos. Podemos perceber esse interesse, por exemplo, observando o interesse de jovens em aprender a tocar instrumentos e a sua preocupação em explicitar seus gostos por estilos musicais, ingredientes relevantes na definição da identidade de jovens e adolescentes. Por outro lado, segundo Trentin (2003, p. 5), é grande nas escolas a porcentagem de professores que excluem tópicos relacionados ao som devido à falta de tempo ou de condições para ensiná-los. A fim de superar essa falta de condições e aproveitar a afinidade que os jovens têm com a música, pretendemos, por meio dessa pesquisa, criar recursos didáticos que possibilitem uma interface entre música e física para o ensino dos tópicos de física relacionados ao som. As relações entre física e música são muito amplas e antigas. Podemos seguramente traçar paralelos entre essas duas vertentes do conhecimento através dos estudos dos pitagóricos, que buscavam relações entre o som emitido por uma corda e o comprimento desta. Contudo, as relações entre esses dois ramos se tornam mais estreitas quando discutimos o processo de criação de escalas musicais e de construção e afinação de instrumentos musicais, pela análise das variáveis físicas relevantes envolvidas nesses processos. Sabemos que os instrumentos musicais, assim como as escalas, são frutos da pesquisa do homem, portanto fazem parte do mundo artificial, que por sua vez é

menos abstrato aos alunos. Concordamos comtrentin (2003, p.1), quando afirma que: O professor deve estar preparado para discutir os temas que surgem durante a abordagem do conteúdo; ele não pode contemplar só o conhecimento do mundo natural, é necessário também o do mundo artificial, das coisas fabricadas pelo homem Introdução As relações entre ciência e arte no que diz respeito ao ensino de ciências, especificamente tem sido objeto de estudos de alguns autores. Dentre eles podemos destacar o professor João Zanetic, que busca relações entre física e literatura, fazendo com que entenda-se a física como parte de nossa cultura, pois quando mostramos o lado cultural da ciência conseguimos abranger uma grande diversidade de alunos: Quando se comenta sobre a cultura, de um modo geral, raramente a físicacomparece de imediato na argumentação, ou outra representante das ciências naturais dá o ar de sua graça. Cultura, quando pensada 'academicamente' ou com finalidades educacionais, é quase sempre evocação de alguma obra literária, alguma grande sinfonia ou uma pintura famosa; cultura erudita, enfim. Tal cultura traz à mente um quadro de Picasso, uma sinfonia de Beethoven, um livro de Dostoyevsky, enquanto que a cultura popular faz pensar em capoeira, num samba de Noel ou num tango de Gardel. Dificilmente, porém, cultura se liga ao teorema de Godel ou as equações de Maxwell. (ZANETIC, 1989, p. 145-6) (o parágrafo deve ficar no formato justificado, apenas com um deslocamento para a direita.) Ildeu de Castro Moreira e Luisa Massarani, em artigo intitulado : (En)canto científico: temas de ciência em letras de música popular brasileira, buscam investigar como os temas de ciência e tecnologia estão presentes no imaginário de compos itores (MOREIRA, 2006, p.293), permitindo assim despertar por esse caminho também o interesse de alunos de ensino médio por esses temas. Outro trabalho, que envolve especificamente a relação entre música e física, é o proposto por Elizabeth Trentin, em sua dissertação de mestrado: Os instrumentos musicais como recurso didático no ensino de acústica. Nesse trabalho, ela defende a utilização da música como recurso didático para o ensino de física, devido aos conteúdos em comum dessas duas áreas, como a produção e as características do som, e também a motivação que a música pode gerar nas pessoas (TRENTIN, 2003, p.3). A análise do processo de construção de escalas musicais é um bom exemplo de situação que permite reconhecer as múltiplas relações entre ciência e cultura. Embora possamos analisar quantitativamente a distância entre dois intervalos musicais e reconhecer razões físicas para os valores dessas distâncias, esses intervalos variam de cultura para cultura, na medida em que cada cultura construiu historicamente as suas próprias escalas. Concordamos assim com Wisnik quando afirma que:

As escalas são paradigmas construídos artificialmente pelas culturas, e das quais se impregnam fortemente, ganhando acentos étnicos típicos. Ouvindo certos trechos melódicos, dos quais identificamos não conscientemente o modo escalar, reconhecemos freqüentemente um território, uma paisagem sonora, seja ela nordestina, eslava, japonesa, napolitana ou outra. (WISNIK, 1989, p. 71-72). Dentro dessa perspectiva, podemos discutir historicamente o processo de construção das escalas musicais, evidenciando a cultura de cada nação. Estudos concernentes à construção de escalas musicais podem seguramente nos remeter aos pitagóricos, como foi discutido anteriormente. Pitágoras realiz ou experimentos relacionados à construção e divisão da escala musical com um instrumento chamado monocórdio. Esse instrumento era constituído basicamente de uma corda apoiada sobre dois cavaletes em uma mesa, que por sua vez também possuía um cavalete móvel, cuja função era dividir a corda em frações perfeitas do comprimento original (ABDOUNUR, 2006, p.4). Pitágoras procurava relações entre o som da nota emitida pela corda quando vibrava por toda a sua extensão, e quando esta era dividida em razões de números inteiros do seu comprimento original. Através desses estudos, Pitágoras verificou que quando dividia a corda do monocórdio em 2/3 do tamanho original, ele obtinha um intervalo musical de quinta (exemplo: dó-sol). Ao dividir essa mesma corda em 3/4 do tamanho original ele obtinha o intervalo musical de quarta (exemplo: dó-fá). E quando ele dividia a corda na metade do comprimento ele obtinha o intervalo de oitava (exemplo: dó 1 -dó 2 ). Para a obtenção das demais notas Pitágoras utilizou o ciclo das quintas que consistia em encontrar as notas dó-ré -mi-fá-sol-la-si-dó, através da superposição de quintas ascendentes. A utilização do ciclo das quintas nos proporciona a seguinte ordem das notas musicais: dó-sol-ré-lá-mi-si. Como foi dito anteriormente o intervalo de quinta é obtido através da divisão da corda por 2/3, se prolongarmos esse pensamento subindo todas as quintas de maneira que os comprimentos dessas cordas fiquem todos entre 1 e 1/2, teremos as relações entre comprimentos de cordas referentes as notas dó-ré-mi-fá-sol-la-si-dó. Vale lembrar que a nota fá Pitágoras encontrou através da divisão da corda em 3/4. As relações encontradas por Pitágoras seguem na tabela abaixo: Tabela 01: Relação pitagórica entre comprimento de uma corda e a nota emitida. Notas Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si Dó Comprimentos da corda em relação à Dó 1 8/9 64/81 3/4 2/3 16/27 128/243 1/2 Vale salientar que Pitágoras chegou a esses resultados em função dos comprimentos das cordas, não em função das freqüências dessas notas. Essa associação de uma freqüência a uma nota foi introduzida por Galileu no séc XVII (ABDOUNUR, 2006, p. 29).

Após a construção da escala pitagórica tivemos várias outras tentativas de construção de uma escala musical que tivesse uma sonoridade agradável ao ouvido. Um grande passo foi dado por Gioseffo Zarlino no século XVI. Segundo Zarlino duas notas podem ser consideradas mais consonantes quanto mais harmônicos em comum elas possuírem (ABDOUNUR, 2006, p.41). 1 Zarlino sistematizou a escala buscando os intervalos através da soma de médias harmônicas e aritméticas a partir de uma nota fundamental. As relações entre os comprimentos de cordas a partir das proporções encontradas por Zarlino seguem na tabela abaixo: Tabela 02: Relação natural entre comprimento de uma corda e a nota emitida. Notas Dó Ré Mi Fá Sol Lá Si Dó Comprimentos da corda em relação à Dó 1 8/9 4/5 3/4 2/3 3/5 8/15 1/2 Outro grande método de divisão da escala foi a escala de igual temperamento. Ela recebe esse nome pois todas as notas estão igualmente distanciadas, em termos de intervalos acústicos, uma das outras. Esse sistema desenvolvido no final do século XVII e início do século XVIII, consistia na divisão da oitava musical em 12 semitons igualmente espaçados, o que possibilitava a músicos que tocassem instrumentos de tecla a execução de músicas em qualquer tonalidade. Esse sistema sem sombra de dúvida foi o método de divisão de escala que teve maior aceitação por parte dos músicos e construtores de instrumentos musicais, tanto que é utilizado até os dias de hoje. Do ponto de vista matemático, o problema consistia em achar um fator f, que após multiplicar 12 vezes, visto que temos 12 semitons, por uma freqüência f 0, atingisse a sua oitava, que corresponde à 2f 0. Ou seja f 0.f.f.f.f.f.f.f.f.f.f.f.f=2f 0? f 0.f 12 =2f 0, logo o valor de f=2 1/12. A construção de instrumentos musicais pedagógicos: Para o desenvolvimento da proposta de ensino de física ondulatória e acústica através da discussão das relações entre física e música, foram construídos, a partir do estudo da pesquisa desenvolvida pelo grupo Uakti (RIBEIRRO, 1987), com materiais de baixo custo, os seguintes instrumentos musicais pedagógicos. Planetário: Esse instrumento é construído sob uma caixa acústica de maderite de 2,5cm. As medidas da caixa são as seguintes: 120 centímetros de comprimento de comprimento, 75 centímetros de largura e 25 centímetros de altura. Este instrumento ainda possui dois orifícios para a saída de som, um deles está localizado na parte lateral e suas dimensões são as seguintes: 35 cm de comprimento e 2 cm de altura. 1 Esse conceito de harmônicos é referente a capacidade que uma pessoa com ouvido treinado tem de ouvir mais de uma nota musical a partir de um som complexo. Esse conceito, nesse momento histórico, não está portanto ainda apoiado na teoria de Fourier a respeito da série harmônica.

O segundo orifício está localizado na parte frontal e possui o formato de um círculo de 10 centímetros de diâmetro. São utilizadas 15 mangueiras cirúrgicas de látex com 9 milímetros de diâmetro e comprimento inicial de aproximadamente 20cm como cordas. Essas cordas são amarradas diretamente na madeira em um dos lados, enquanto que no outro elas são fixadas em parafusos com a cabeça aberta para que possamos controlar a tensão das cordas. Canos Acoplados: Esse instrumento é composto de canos de PVC com pedaços entre 30 e 40 milímetros de comprimento por 40 milímetros de diâmetro previamente cortados, e algumas conexões do tipo luva e cotovelo. Garrafas de vidro: Esse instrumento é feito com garrafas de vidro de 355ml (long neck). Ao preenchermos as garrafas com quantidades específicas de água podemos imitar o som de uma flauta pan. Podemos utilizar esse instrumento para mostrar as relações entre coluna de ar vibrante e nota musical emitida por esta. Conduite: Instrumento feito com tubos utilizados para passagem da rede elétrica em residências. Como este é um tubo flexível podemos girá-lo com diferentes velocidades, pois dessa maneira excitaremos os modos superiores de vibração. Pan Inclinado: Este é um instrumento de percussão temperado constituídos de 8 canos de PVC com 40 milímetros de diâmetro. Os canos têm seus comprimentos calculados com o intuito de se reproduzir uma escala diatônica temperada.

O suporte para os canos é feito com sarrafo de pinho, ele possui uma inclinação de aproximadamente 45 graus, mas é possível mexer nessa inclinação se for necessário. Proposta pedagógica: Dentre as possibilidades de utilização didática desses instrumentos musicais construídos, assim como da pesquisa realizada acerca das construções das escalas musicais, podemos destacar:oensino de ondas e acústica através da utilização dos instrumentos musicais, a questão da afinação de instrumentos musicais, história da música (através da contextualização da construção das escalas), o desenvolvimento da percepção musical e rítmica, análise espectral do som, conceitos de freqüência e período, análise gráfica do som e batimentos. Para que a aplicação desses conteúdos se concretizasse, foi elaborada uma oficina, que procura seguir em ordem linear os temas a serem abordados. A primeira atividade da oficina consiste na audição do experimento sonoro Pendulum Music de Steve Reich. Com essa audição, perguntamos aos alunos quantos instrumentos eles estão ouvindo. Sabemos que o Pendulum Music, é composto de pêndulos em cujas extremidades encontram-se microfones direcionais, e que ao passarem por um certo alto falante que emite uma onda harmônica, captam esse som. Como o sistema é composto de vários pêndulos, inicialmente em fase, os alunos tem a sensação de ouvir vários instrumentos. A resposta dessa atividade será dada posteriormente quando eles forem introduzidos a questão da formação de timbres e espectro harmônico. Na segunda atividade são utilizados os instrumentos construídos como subproduto da pesquisa. Com o planetário pede-se aos alunos que estes variem o comprimento da corda, tanto para deixá -la mais comprida quanto mais curta, os alunos devem explicar qual a sensação sonora quando eles variam os comprimentos. Aqui nesse estágio podemos desenvolver a percepção musical dos alunos em relação a sons mais agudos e mais graves, e ainda podemos explicar a fórmula de Mersene (V=?f), e relacionar as freqüências mais altas com sons mais agudos. Ainda com o planetário, podemos pedir aos alunos que variem as cordas com comprimentos específicos para que seja evidente o fenômeno de batimento, e perguntar qual é a sensação sonora. Podemos pedir que eles deixem uma corda de referência com um comprimento que seja a metade da outra, e verificar se eles entendem como sendo o mesmo som quando essas cordas são tocadas juntas (intervalo de oitava). Ainda nessa atividade podemos pedir aos alunos para juntarem diversos canos, com o instrumento canos acoplados, para ver se eles verificam que quanto maior o comprimento do cano mais grave fica o som. Podemos ainda pedir para que batam com a mão em uma das extremidades sem que esta repouse, e depois, no mesmo cano, deixando a mão repousar. Nesse caso podemos estabelecer regras com dos tubos tipo aberto-aberto e aberto-fechado. Podemos encher as garrafas de vidro com quantidades diferentes de água (as garrafas devem estar previamente coberta com papel cartolina para que os alunos

não vejam as quantidades de água), e pedir para que os alunos classifiquem as garrafas em ordem crescente de agudo para grave, e podemos perguntar qual o motivo dessa classificação. Com essa atividade, ajudamos a desenvolver a percepção musical não simultânea, e podemos verificar o que leva os alunos a classificarem fisicamente um som mais grave e mais agudo. Uma das atividades propostas consiste na audição de músicas de diferentes épocas passeando entre o canto gregoriano, barroco, música tonal, música modal, música árabe, indiana, flamenca, jazz contemporâneo e free jazz. Essa atividade tem um caráter de contextualização histórica acerca da construção das escalas musicais, mostrando como o desenvolvimento das escalas determinou a evolução da música principalmente no ocidente. Podemos ainda falar sobre os conceitos de dissonância e consonância. Para desenvolver a parte rítmica, assim como problematizar intervalos consonantes e dissonantes, podemos dividir a sala em dois grupos e pedir que estes tentem executar as relações de freqüência de quinta, oitava, quarta, semitom. Ou seja, tomando o exemplo da oitava 2/1 (em termos de freqüência), podemos pedir aos alunos que enquanto uma parte da turma bate palmas duas vezes a outra bate uma. Esse problema da dissonância ficará bem evidente quando pedirmos que eles reproduzam o intervalo de semitom (considerado muito dissonante), essa relação é dada por 16/15, esse padrão rítmico é de difícil execução, portanto podemos considerá-lo mais dissonante. Essa atividade foi inspirada pelo capítulo Introdução a Música (WISNIK, 1989, p.59-68). Outra atividade proposta consiste em pedir aos alunos que estes criem suas próprias escalas com o auxílio do planetário. Essa construção pode ser feita de duas formas diferentes: Uma delas é aleatória, eles podem mudar o comprimento das cordas sem regras, e a outra seguindo uma regra. Ao fim dessa construção podemos verificar se é possível a execução de alguma música com as escalas construídas. Podemos ainda dar um contexto histórico citando as concepções pitagóricas de que o número 10 representa a perfeição, e por isso ele acabou utilizando o a construção da sua escala baseada no ciclo das quintas, pois os intervalos utilizados por ele eram: 2/3,3/4 e 1/2. Todos eles utilizam 1,2,3,4, que somados resultam em 10. Podemos falar que Zarlino ainda tinha esse caráter místico nos números, pois ele passou a definir o número seis na formação de suas consonâncias (ABDOUNUR, 2006, p.45). Outra proposta de atividade consiste em fazer que os alunos (através do programa Praat) construam ondas harmônicas. Em seguida eles podem analisar os gráficos, freqüência e períodos. Um outro passo consiste em construir a soma de dois sons harmônicos múltiplos, para começar a falar sobre timbre e espectro harmônico. Outra atividade consiste em gravar as vozes dos alunos emitindo uma mesma sílaba em uma mesma nota. Podemos comparar as os gráficos dessas vozes, bem como medir os períodos e freqüências, e compará-los com o gráfico de algum instrumento musical emitindo essa mesma nota (através do programa Praat). Podemos perguntar aos alunos porque os gráficos desses sons são diferentes. Podemos falar sobre espectro harmônico, fazendo com que os alunos ouçam as várias vozes que compõe sua voz final, como espécie de decomposição da luz branca.

Para que os alunos possam ver o batimento, podemos pedir aos alunos para somarem duas ondas harmônicas muito próximas (através do Praat), e perguntar se eles estabelecem alguma relação naquela primeira atividade com o planetário. Para que eles efetivamente vejam o batimento, basta mostrarmos o gráfico a eles, e explicar como se constrói este gráfico. Podemos contextualizar o batimento dizendo que um músico afina seu instrumento procurando eliminar esses batimentos. Outra proposta consiste em fazer com que os alunos analisem o gráfico do intervalo de oitava, através da análise do espectro harmônico de um dos instrumentos gravados no Praat. Para isso os alunos devem gravar um som individual e em seguida dois sons oitavados simultaneamente, e verificar qual a diferença entre os espectros harmônicos dos dois sons. Para que os alunos possam ver toda essas sistematização da construção das escalas de uma forma lúdica, podemos pedir que eles achem as freqüências seguindo as relações de freqüências pitagóricas, desenvolvendo assim um pouco do lado algébrico da construção das escalas. Após esse momento podemos construir uma música com essas relações encontradas e verificar a sonoridade que essa escala proporciona. Para finalizar a atividade apresentamos novamente o Pendulum Music, e pedimos que os alunos identifiquem novamente quantos instrumentos eles ouvem. A intenção de voltar a essa atividade é para verificar se algum aluno consegue identificar esse som que eles ouvem com a soma de várias ondas harmônicas. Mesmo que ele não tenham essa habilidade, acreditamos que eles conseguirão entender que esse som é a soma de vários sons simples, que por sua vez pode confundir com o timbre de algum instrumento. Conclusão: Essa oficina elaborada procura fazer com que os alunos passem a compreender a construção das escalas musicais, sem a desvalorização do contexto histórico no qual elas estão inseridas. As atividades propostas ainda buscam o desenvolvimento da sensibilidade e escuta musical. Contudo sem esquecer-se da física presente nos mecanismos de emissão e produção do som. Realizamos uma aplicação dessa oficina para alunos do curso de Licenciatura em Física do CEFET-SP. Contudo pensamos em possíveis aplicações para públicos alvos diversos, dentre eles destacamos turmas de ensino médio, estudantes de música e pessoas que não tenham nenhum contato com essas áreas do conhecimento. Dessa maneira, essa oficina pode ser inserida também em um contexto de divulgação da ciência através da música, visto que o aprofundamento quantitativo e técnico dos termos relacionados a física devem ser abordados levando-se em conta o público alvo. Dentre as questões em aberto relevantes para serem estudadas, destacamos métodos para melhorar a ressonância do instrumento planetário, e a criação de métodos que avaliem de forma sistemática os resultados da oficina de acordo com o público alvo envolvido.

Referências Biliográficas: ABDOUNUR, João Oscar. Música e Matemática: O pensamento analógico na construção de significados. São Paulo: Escrituras Editora, 2006. 2002. Henrique, Luís L. Acústica musical. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, RIBEIRO, Artur. Uakti Um Estudo Sobre a Construção de Novos Instrumentos Musicais Acústicos. São Paulo: C/ Arte, 1987. TRENTIN, Elisabete. Os instrumentos musicais como recurso didático no ensino de acústica. Dissertação de mestrado apresentada ao IFUSP e à FEUSP. São Paulo, 2003. Orientadora: Jesuina L. de A. Pacca. WISNIK, José Miguel. Som e o sentido: uma outra história das músicas. São Paulo: Círculo do Livro, 1989. ZANETIC, João. Física também é cultura. Tese de doutorado. São Paulo: Universidade de São Paulo, 1989.