CARACTERÍSTICAS LINGUÍSTICAS E SOCIOCULTURAIS DO LÉXICO GOIANO

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Transcrição:

CARACTERÍSTICAS LINGUÍSTICAS E SOCIOCULTURAIS DO LÉXICO GOIANO Palavras-chave: Toponímia. Sociedade. Léxico. I Introdução Evanaide Alves DE SOUZA (UFG/PG) evanaideas@hotmail.com Tânia Ferreira REZENDE (UFG/PG) taferez@hotmail.com Os estudos linguísticos têm buscado relacionar linguagem e sociedade porque aquela está presente em todas as atividades desenvolvidas pela sociedade, além de ser também por meio da linguagem que a sociedade se constitui. Os estudos sobre o léxico, tradicionalmente, têm relacionado o léxico à cultura do falante, concebendo-o, mais que linguisticamente, para além de um inventário de palavras. Assim, compreendendo o léxico como um acervo de palavras de uma língua natural, por meio do qual os falantes conseguem expressar e significar sua realidade, objetivamos com este trabalho relacionar elementos linguísticos e extralinguísticos na caracterização cultural do léxico goiano, a partir de nomes de lugares (topônimos), de pessoas (antropônimos) e de elementos da fauna e da flora goianas, constantes da obra Tropas e boiadas, de Hugo de Carvalho Ramos. II Metodologia A obra Tropas e boiadas foi escolhida por retratar o cenário goiano (nomes de lugares e pessoas) com fidelidade, permitindo a correlação entre linguagem, no domínio lexical, cultura e sociedade. Dado que os contos constantes da obra foram escritos no início do século XX, as informações relativas aos nomes de lugares, de pessoas, da fauna e da flora são confrontadas com documentos oficiais, tais como os relatórios do IBGE e a historiografia de Goiás. A obra Tropas e boiadas é formada por quatorze contos, apresentados em 119 páginas. Para a sistematização da pesquisa, consideramos todos os contos, porque possibilita um corpus mais amplo que permitirá uma análise quantitativa e qualitativa eficiente. Assim, (i) fizemos um levantamento de todos os topônimos, antropônimos, nomes referentes à fauna e à flora presentes na obra; em seguida, (ii) fizemos uma análise dos tipos de sintagmas nominais (SNs) na função toponímica, encontrados na obra porque o topônimo em si é mais do que a união de palavras e o

estudo dos SNs permite ultrapassar esse conceito. A partir daí, (iii) poderemos analisar sociohistoricamente cada item lexical. Todavia, os resultados ora apresentados dizem respeito a (i) e (ii). A análise dos dados fundamenta-se nos estudos toponímicos de Dick (1990a, 1990b e 1996); nos estudos lexicais de Biderman (2001),Isquerdo (2001), Krieger (2010),Seabra (2010); nos estudos sociolinguísticos de Seabra (2004) e nos estudos do sintagma de Souza e Silva et. al. (2005), Castilho (2010), Azeredo (2010) e Dryer (2007[1985]). Esses autores foram escolhidos por possibilitarem uma análise que considera a interrelação entre língua e sociedade. III Resultados e discussões A onomástica é a ciência dedicada ao estudo dos nomes próprios. Esse fazer científico se subdivide em duas disciplinas: a Antroponímia e a Toponímia. A etimologia desses termos, que remete ao grego, indica a que tipo de estudo cada área se detém: Antroponímia, antropos (pessoa) + onoma (nome), que se dedica ao estudo dos nomes de pessoas; e Toponímia, topo (lugar) + onoma (nome) que se dedica ao estudo dos nomes de lugar, ou designativos geográficos, abrangendo os de natureza física (rios, riachos, córregos, morros, serras, montes etc.) e os de natureza antropo-cultural (aldeias, povoados, fazendas, patrimônios, distritos, cidades, bairros, jardins, conjuntos residenciais, etc.) (DICK, 1990a). O estudo da toponímia no Brasil, segundo Dick (1990b), teve como precursor no início do século XIX, Theodoro Sampaio, com O tupi na geografia nacional (1901). Seis décadas após esse primeiro estudo, surge Levy Cardoso, autor do estudo da obra Toponímia Brasílica (1961), que se dedicou a estudar a etimologia de alguns topônimos brasílicos da Amazônia, especialmente, os de origem caribe e aruaque. Desse momento em diante, surgiu diversos trabalhos da toponímia brasileira, tal como de: Carlos Drumond, com a Contribuição do Bororo à toponímia Brasílica (1965) e mais recentemente, quem vem se destacando, devido ao grande número de estudos, de orientações e de vários trabalhos sobre a toponímia no Brasil, é a professora Maria Vicentina de Paula do Amaral Dick. Nosso trabalho não comporta a apresentação de outros estudiosos que têm contribuído para o desenvolvimento da área, mas, esse breve histórico nos proporciona uma visão panorâmica dos estudos toponímicos no Brasil, que já mostram certa representatividade nos estudos linguísticos. Ainda há muito que avançar e, por isso, a proposta desse trabalho. Pesquisamos a história de Goiás para compreender a relação entre o ambiente físicosocial e as nomeações. Percebemos que o estudo dos topônimos, além de proporcionar um

resgate histórico, também possibilita uma análise linguística, que relaciona forma e função, tendo em vista que a língua é um instrumento de interação. Os elementos extralinguísticos permitem que o nome de um lugar surja e subsista e interferem, diretamente, no que designamos como sintagma nominal. Considerando a proposta de Dick (1990) e Dryer (2007[1985]), de que nos topônimos há um termo genérico (possuído) e um específico (possuidor), percebemos que os topônimos da obra analisada apresentam essas características, especialmente, porque se referem a lugares gerais que necessitavam de uma nomeação que o distinguisse e desse identidade a esse SN. Assim, os topônimos e os antropônimos exercem uma função determinada por elementos linguísticos, tais como termos genéricos e especificadores, e elementos extralinguísticos, como cultura e história. A organização sintagmática é caracterizada de uma margem esquerda, ocupada pelos Especificadores, o Núcleo, ocupado por uma classe de palavras, e a margem direita, ocupada pelos Complementadores (CASTILHO, 2010, p.57). Assim, ampliamos o esquema de Castilho da seguinte forma: Sintagma (Especificadores) + Núcleo + (Complementadores) facultativo essencial facultativo Nosso recorte é o sintagma nominal (SN) porque é a classificação em que se encaixam os elementos toponímicos. Segundo Dryer (2007[1985]), a multifuncionalidade do SN revela a própria dinamicidade do sistema linguístico que não é fechado, acabado. Dentre as muitas funções que o SN pode desempenhar, destacaremos as principais. Para ele, os SNs são divididos em três tipos, a saber: os sintagmas nominais simples, os sintagmas nominais complexos e os sintagmas nominais sem substantivos (DRYER, 2007[1985], p.151) Os topônimos, como nomes, constituem-se como SNs por excelência. Há maior recorrência de topônimos formados por substantivo ou substantivo + adjetivo, mas, ao categorizarmos ou identificarmos um lugar específico há implicações linguísticas (nome do lugar) e histórico-sociais (lugar em si). Dick (1990a, p. 10) designa a estrutura do sintagma toponímico em: acidente geográfico - termo ou elemento genérico (o que irá receber a denominação) complementado pelo termo ou elemento específico (sintagma toponímico) o que singulariza aquele acidente geográfico, constituindo dessa forma, uma relação binômica. A autora afirma, ainda, que a posição dos termos no sintagma toponímico depende da estrutura da língua. Na língua portuguesa, por exemplo, que se estrutura por justaposição, (a ordem básica do constituinte do sintagma

toponímico) costuma apresentar primeiro o termo genérico e depois o termo específico, onde ocorre uma situação de subordinação por meio de um termo determinante e outro específico; seguido ou não de um conectivo. (1) rio Araguaia (2) serra dos Anjicos Como podemos observar, os sintagmas toponímicos, em (1) e (2), tratam-se de dois substantivos, cada exemplo. No primeiro, verificamos que o substantivo rio é o elemento que recebe a denominação e o segundo substantivo é sintagma que irá particularizar o lugar. Esse fato, de acordo com Dick (1990a) ocorre, também, em línguas aglutinantes, aquelas línguas em que os dois componentes do sintagma toponímico podem unir-se em uma única palavra. Em algumas línguas indígenas, por exemplo, que possuem essa estrutura, pode ocorrer o nome geográfico atrelado ao nome específico. Nos dados encontramos: 183 topônimos, 433 antropônimos, 389 elementos da fauna, 269 elementos da flora. Topônimos de Natureza Física Sertão das Abóboras O SN Sertão das Abóboras, por exemplo, pode ser considerado um SN, que designa um lugar específico. Dada a hierarquia existente na composição das orações, elas se assemelham a uma boneca russa, em que um sintagma se constrói dentro de outro. Dryer (2007[1985]) discute os sintagmas nominais complexos nas construções genitivas com possuidores nominais, declara que na construção genitiva exprime muito mais do que somente a posse da palavra, pois este inclui a posse da propriedade. É o que ocorre com o nome Sertão das Abóboras. Nessa constituição é possível perceber um sintagma preposicionado (das Abóboras) integrado a um sintagma maior. O SP parece acumular duas funções: a de genitivo e a de especificador, de modo que das Abóboras pode ser interpretado como possuidor do sertão, portanto, genitivo e modificador do SN cabeça, numa relação de maior especificação: não é qualquer sertão, é o sertão das Abóboras. A constituição desse nome está diretamente relacionada às experiências do enunciador e a sua interação com um espaço. Nessa interação, não se pode negar também a relação com a cultura, já que os dois substantivos presentes no nome ( sertão e abóbora ) evocam elementos que existem numa dada região, sociedade ou cultura. Topônimos de Natureza Antropo-cultural

Porto do Registro O SN Porto do registro apresenta uma diferença semântica com os demais sintagmas apresentados anteriormente, já que em Porto do Registro, o SP do Registro evoca um patrimônio humano. Nessa representação, percebemos o SP integrado a um sintagma maior. A função de genitivo e a função de especificador permanecem, de forma que, do Registro pode ser interpretado numa relação de posse, mostrando a sua função genitiva, como numa relação de especificação: não é um porto qualquer, é o porto do Registro. Os SNs na função toponímica sem o uso de substantivos não foram encontrados. Isso pode ser explicado porque os SNs, segundo Azeredo (2010), remetem para conhecimentos integrantes de nossa maneira de conceber o mundo. Eles têm natureza conceitual e se constituem como uma espécie de referenciarão genérica ou específica. Portanto, os substantivos (nomes) trazem maior carga conceptual e como os topônimos são nomes de lugares, torna-se quase impossível encontrarmos um SN na função toponímica sem substantivo. IV - Considerações finais O que podemos perceber, a partir do que já foi analisado, é que a toponímia de um modo particular é um meio de investigação linguística. O topônimo em si é muito mais do que a união de palavras que usamos para identificar um determinado elemento da paisagem ele apresenta diversos fatores que mostram os valores e os conhecimentos de uma determinada sociedade. Os topônimos selecionados do livro Tropas e Boiadas, de Hugo de Carvalho Ramos, são constituídos por um SN composto por um substantivo e um SP que designa possessão, formando uma construção que Dryer (2007[1985]) denominou de construção genitiva com possuidores nominal, caracterizada como SN complexos. O primeiro nome é o substantivo cabeça, que sofre modificação do SP, este, por sua vez, modifica o primeiro termo porque é especificador. V - Referências: AZEREDO, José Carlos de. Gramática Houaiss da língua portuguesa. 3 ed. São Paulo: Publifolha, 2010. CASTILHO, Ataliba T. de. Nova Gramática do português brasileiro. São Paulo: Contexto, 2010. DICK, Maria Vicentina de Paula do Amaral. Toponímia e antroponímia no Brasil:coletânea de estudos. 2ª ed. São Paulo: FFLCH/USP, 1990a.. A motivação toponímica e a realidade brasileira. São Paulo: Arquivo do Estado, 1990b. DRYER, Matthew S. Noun phrase structure. In: SHOPEN, Timothy. Language typology and syntactic description. Vol. II complex constructions, (2007[1985]), p.151-194. RAMOS, Hugo de Carvalho. Tropas e boiadas. 4ª ed. São Paulo: Panorama, 1950.