Maria Cecília de Souza Minayo

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Transcrição:

Maria Cecília de Souza Minayo Cecilia@claves.fiocruz.br

24.800.000 pessoas idosas 13.8440 mulheres e 11.010.000 de homens Aumento do número de pessoas idosas vivendo sozinhas (mais de 7 milhões), sendo que desse conjunto, 40% são mulheres.

O Censo de 2010 confirmou que o número de mulheres idosas é superior ao de homens no País e quanto nas áreas urbanas (75 mulheres para 100 homens). A região Sul possui a maior diferença entre os sexos. Nela há 67 homens idosos para cada 100 mulheres, o que é seguido de perto pelo Sudeste (69 homens para cada 100 mulheres).

79 homens para cada 100 mulheres de 60 a 65 anos; 76 para 100 no grupo de 65 a 70 anos; 72 para 100 na faixa de 70 anos ou mais.

As mulheres idosas estão vivendo mais que os homens. Mas os papeis de gênero e as relações de poder construídas ao longo do ciclo de vida tendem a criar uma situação mais vulnerável para elas. Têm probabilidade maior de enviuvar-se e ficar em situação socioeconômica desvantajosa, pois a maioria nunca fez trabalho remunerado durante sua vida adulta. Embora vivam mais que os homens, elas vivenciam maior debilitação física antes da morte do que eles. É grande o percentual de idosas que, nessa etapa vida, assume o papel de chefes de família e de provedoras.

Penaliza muito os pobres que conjugam mais problemas de saúde e mais carências sociais. Os estudos da última (PNAD) que comparam a situação das pessoas idosas entre 1998 e 2008 mostram que diminuiu a disparidade entre idosos ricos e pobres no acesso a consultas médicas e na oferta de atenção primária. Entretanto, isso não repercutiu na na autoavaliação da saúde e da capacidade funcional por parte da população idosa nesse período.

As mulheres são as que sofrem mais dependências sociais e físicas: 20% delas vivem sob o mando de parentes, 18,5% não têm renda alguma, 17,5% não são capazes de realizar as mais simples atividades cotidianas e 8,3% não enxergam. Entre os homens é menor o percentual de idosos sem autonomia (13,3%) e desses 7,4% não enxergam.

As pesquisas gerontológicas mostram que as mulheres de idade avançada (e não os homens) estão mais expostas à pobreza, à solidão e à viuvez, tem mais problemas de saúde e menos oportunidades de contar com um companheiro em seus últimos anos de vida. Elas constituem o grupo mais vulnerável entre os pobres e entre as pessoas idosas pobres, por causa das limitações da idade, por causa das perdas e têm mais problemas de saúde e dependências.

Nunca no país houve compensação, reconhecimento ou direito à aposentadoria a mulheres cujo trabalho tenha sido primordialmente doméstico; A grande maioria dedicou toda sua vida a ser dona de casa e a cuidar dos maridos e dos filhos; Existe discriminação sexual no mercado de trabalho formal onde as mulheres (ainda hoje imagine no passado!) ganham menos e, por esse motivo, suas aposentadorias são mais baixas; Muitas não têm direito à pensão de seus maridos e vivem situação de desvantagem econômica.

Também são as idosas, em maioria, que configuram a população cativa das instituições de longa permanência (ILPI) e é dependente do poder público ou da caridade cristã. Muitas são abandonadas pelas famílias nas ILPI porque não possuem recursos financeiros, são solteiras ou viúvas e porque são mais abandonadas pelos filhos que os homens velhos.

São destituídas de suas casas, de seus pertences, das relações familiares, das amizades, da vizinhança e de suas próprias histórias, vivendo como anônimas. Sofrem despersonalização pela prática muito comum de infantilizá-las, levando-as a omitir sua voz e seus desejos e a obedecer às regras que os funcionários/as esperam que elas acatem.

A violência na família, ou a violência doméstica, inclui todas as formas de agressão ou omissão, nas quais o poder de alguém é utilizado contra a pessoas idosa, ameaçando os seus direitos, sua integridade individual e infligindo-lhe lhe sofrimento. O comportamento violento contra uma mulher idosa na família pode ter estado presente ao longo da sua história familiar ou na relação conjugal desde o seu início. Mas o comportamento violento pode ser também um resultado de novas exigências, relacionadas com a deterioração do estado de saúde ou com a idade e envolve mudanças nos papéis familiares.

Violência física - ações que causam dor física ou ferimentos. Como dar bofetadas, agredir, bater com um objeto, dar tranquilizantes ou medicamentos neurolépticos em demasia. Sinais de possível violência física SINAIS Manchas negras, marcas na pele, fraturas, arranhões, queimaduras, cabelo arrancado, queimaduras, recusa em despir-se, feridas acidentais constantes, comportamento de angústia quando alguém se aproxima.

Violência psicológica/emocional - ações que causam dor emocional, tormento ou angústia, como isolamento da família e amigos, humilhação, acusação, difamação, infantilização SINAIS A mulher idosa mostra-se emocionalmente perturbada, aparenta isolamento, recusa participar de atividades normais, tem insônia, medo das outras pessoas, fica em estado de alerta, perde o apetite, apresenta depressão não habitual.

Abuso sexual - contato e atos sexuais não consensuais. O abuso sexual ocorre, habitualmente, em circunstâncias que camuflam o caráter violento e abusivo da ação. É um mito pensar que as mulheres idosas não podem ser sexualmente abusadas. SINAIS Manchas negras em redor do peito ou na área genital, doença venérea ou infecções genitais inexplicáveis; sangramento vaginal ou anal inexplicáveis; roupa interior rasgada ou ensanguentada; comportamento ansioso quando está se despindo ou quando lhe tocam.

Violência econômica, financeira e patrimonial - retirar dinheiro ou propriedades e bens da pessoa idosas indevidamente: Familiares ou outras pessoas utilizam a pensão ou outra prestação social dela em benefício próprio, familiares que assinam ou mudam o testamento ou outros documentos legais. SINAIS Mudanças súbitas na conta ou nos procedimentos bancários, retirada de grandes somas de dinheiro; transferência de bens sem consentimento; desaparecimento de fundos ou bens valiosos. Uso indevido de cartão. Tomar o lugar da mulher idosa viúva em casa; atirá-la nalgum quartinho; mudar por conveniência da família seu lugar de moradia ou na casa.

Negligência e abandono Falhas ou recusa em prover às necessidades de uma pessoa idosa em situação de dependência como comida, alojamento, cuidados de saúde, proteção e apoio emocional. SINAIS Sinais de negligência Perda invulgar de peso, desidratação, má nutrição, escaras não tratadas, falta de higiene pessoal, falta de contato social. Abandono: deixar uma pessoa idosa sozinha no hospital (ou noutro local) por um longo período de tempo ou deixá-la em casa sem ninguém para cuidar dela. Não dar alimentação adequada, medicação necessária, deixar a pessoa suja, mal cuidada, sem tratamento e sem reabilitação quando couber.

História familiar.dependência mútua entre membros da residência Carga física, psicológica sobre os cuidadores Saúde débil, deficiência, incapacidade funcional e cognitiva podem tornar as mulheres muito exigentes com a família. Isto gera um extraordinário estresse físico e mental de quem cuida. Doenças como a demência que modificam o caráter e os hábitos. Os membros da família podem achar estas mudanças difíceis de suportar e podem surgir sentimentos de impotência, frustração e desespero. Isolamento social Dependência do álcool, outras dependências e distúrbios mentais não diagnosticados Abuso de álcool e outras drogas por familiares

Ter uma perspectiva social (de classe) na atenção à pessoa idosa Ter uma perspectiva de gênero Promover uma formação condizente com as necessidades da população idosa sob a perspectiva de gênero. Dar atenção a todas as pessoas idosas, mas, sobretudo às doentes, dependentes, que têm comorbidades e pobres.