Glauber Rocha: Uma Revolução Baiana



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Apresentam Glauber Rocha: Uma Revolução Baiana Salvador, março de 2008

e Apresentam Glauber Rocha: Uma Revolução Baiana Realização

Apresentam Glauber Rocha: Uma Revolução Baiana Salvador, março de 2008

Lateral da casa de Antônio Vicente, avô materno de Glauber Rocha, 1980-1989.

1939 FatOs pessoais Nasce no dia 14 de março, às 3h40, em Vitória da Conquista, Bahia, Glauber de Andrade Rocha, primeiro filho de Adamastor Bráulio Silva Rocha e Lúcia Mendes de Andrade Rocha. O nome Glauber, dado pela mãe, é inspirado no do cientista alemão Johann Rudolf Glauber (1603-68), que descobriu o sulfato de sódio ou sal de Glauber. É batizado na Igreja presbiteriana, tendo como padrinhos a própria mãe e o pastor. O pai, Adamastor, vinha de família católica. Lúcia e Glauber Rocha, 1939. Torna-se obrigatória a exibição de um longa-metragem brasileiro por ano em cada sala de cinema. Cria-se o DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), órgão governamental encarregado da censura. A Cinédia produz comédias musicais; Carmem Miranda lança o compositor Dorival Caymmi no filme O Que é que a Baiana Tem?. Com o crescimento da colônia nipônica, filmes japoneses são exibidos regularmente em São Paulo. Getúlio Vargas é o presidente da República desde 1934, tendo assegurado sua permanência no governo com o golpe que instaurou o Estado Novo em 1937. 1

1940/1944 1940. Em 27 de agosto, nasce Ana Marcelina de Andrade Rocha, irmã de Glauber. 1942. Em 26 de outubro, nasce a segunda irmã de Glauber, Anecyr de Andrade Rocha. O INCE (Instituto Nacional de Cinema Educativo), produz Bandeirantes de Humberto Mauro com Carmem Santos. Paulo Emilio Salles Gomes coordena o primeiro Clube de Cinema de São Paulo, na Faculdade de Filosofia. A guerra impede a importação de filme virgem. É fundada, no Rio, a Atlântida Cinematográfica. A Cinédia leva vedetes do Teatro Dulcina e Odilon para o cinema, em 24 horas de Sonho. Orson Welles filma It s all True ( É Tudo Verdade ) no Brasil. Fim da revista Cinearte, publicada desde 1916. Vinícius de Moraes, crítico de cinema, inicia a polêmica cinema mudo x falado. O Brasil declara guerra aos países do Eixo durante a II Guerra Mundial. A Atlântida produz seu primeiro longa-metragem, Moleque Tião, de José Carlos Burle, sucesso com Grande Otelo. A Cinédia lança Samba em Berlim, de Luís de Barros, sátira musical de Hitler e do nazismo. A Cinédia produz Berlim na Batucada, de Luís de Barros, com Procópio Ferreira, sátira das relações de amizade entre o Brasil e os EUA. Anecyr e Ana Marcelina, irmãs de Glauber. Glauber com suas irmãs na Praça da Piedade. 2

1945/1946 1945. Glauber, aos seis anos, viaja para o Rio de Janeiro com os pais. 1946. Alfabetizado pela mãe, Glauber entra para a escola, aos sete anos. Cursa o primário em um colégio católico em Vitória da Conquista. Morre a avó de Glauber, Dona Marcelina. A Cinédia produz O Cortiço, de Luís de Barros, adaptado de Aluísio de Azevedo, e investe em novas adaptações literárias. A dupla Oscarito e Grande Otelo estréia em Não adianta Chorar, de Watson Macedo (Atlântida). Humberto Mauro inicia a série Brasilianas no INCE com Chuá- Chuá e Casinha Pequenina. Getúlio Vargas é deposto pelo exército. O Gal. Eurico Gaspar Dutra assume a presidência da República. Glauber com sua mãe Lúcia e irmãs, Anecyr e Ana Marcelina. Glauber aos quatro anos com o pai Adamastor Rocha, no Rio de Janeiro. Torna-se obrigatória a exibição de três longas-metragens brasileiros por ano em cada sala. Jorge Amado, deputado em São Paulo, pelo Partido Comunista, propõe uma nova legislação cinematográfica. O Ébrio, de Gilda de Abreu, com Vicente Celestino, é o grande sucesso da Cinédia. É criado o Clube de Cinema da Faculdade de Filosofia do Rio de Janeiro. 3

1947/1948 1947. Glauber acompanha o pai nas viagens pelo sertão da Bahia. Pai de Glauber, Adamastor Rocha, em frente sua loja O Adamastor. 1948. A família de Glauber muda-se para Salvador. O pai abre na rua Chile, a loja O Adamastor. Engenheiro de estradas de rodagem, o pai sofre um acidente que deixa graves seqüelas. A mãe, aos 29 anos, assume os negócios e a chefia da família. A chanchada domina o cinema brasileiro com filmes populares e distribuição garantida. Carmem Santos realiza Inconfidência Mineira e a Atlântida realiza Terra Violenta, adaptação de Jorge Amado. No Rio é criado o Círculo de Estudos Cinematográficos. Surgem os cineclubes de Porto Alegre, Santos e Fortaleza. 4

1949/1950 Glauber na peça El Hijito de Oro. Glauber aos oito anos. 1949. Glauber vai para o internato do colégio presbiteriano 2 de julho, em Salvador, conhecido pela disciplina e rigor. Recebe educação religiosa e participa das festas e do coro do colégio. Escreve a peça de teatro El Hilito de Oro, encenada pelo professor Josué de Castro e protagonizada pelo próprio Glauber que faz o papel de um príncipe espanhol. 1950. Glauber pede para ser transferido do internato para o externato do Colégio 2 de Julho. Comemorações do IV centenário da fundação da cidade de Salvador. Fundação da Companhia Vera Cruz em São Paulo. A Atlântida produz Carnaval no Fogo, de Watson Macedo e Também Somos Irmãos de José Carlos Burle. Carmem Santos produz Inocência, adaptação de Taunay. O Clube de Cinema se transforma na Cinemateca do Museu de Arte Moderna de São Paulo. Inaugurada a televisão no Brasil com a primeira emissão pública, da TV Tupi, em São Paulo. A Vera Cruz produz Caiçara, de Adolfo Celi. Em Salvador, Walter da Silveira cria o Clube de Cinema da Bahia. Getúlio Vargas é eleito para um novo mandato como presidente da República. 1951. Torna-se obrigatória a exibição de um filme brasileiro a cada oito filmes estrangeiros distribuídos. A Vera Cruz produz Terra é sempre Terra e Ângela. A Cinédia lança Lucíola, baseado em José de Alencar, e Anjo do Lodo, com Virgínia Lane. Funda-se o Círculo de Estudos Cinematográficos de Minas Gerais. 5

1952/1953 Ana Lúcia Rocha, 1976. 1952. Aos treze anos, Glauber participa como crítico de cinema, do programa Cinema em Close-Up, na Rádio Sociedade da Bahia. A irmã de Glauber, Ana Marcelina, morre precocemente de leucemia. A mãe, Lúcia Rocha, monta um pensionato na rua General Labatut, 14. Nasce Ana Lúcia Mendes Rocha, irmã mais nova de Glauber. 1953. Glauber escreve ao tio, Wilson Mendes de Andrade, revelando o seu desejo de ser escritor. Lê Jorge Amado, Érico Veríssimo, clássicos da literatura juvenil e filosofia (Nietzsche e Schopenhauer). Freqüenta as matinês e lê histórias em quadrinhos. A Multifilmes é fundada em São Paulo. A Vera Cruz produz Tico-Tico no Fubá e Sai da Frente, estréia do cômico Mazzaropi. Alberto Cavalcanti dirige Simão, o Caolho, seu primeiro filme no Brasil. A Atlântida produz Carnaval Atlântida e Barnabé tu és Meu, de José Carlos Burle. Humberto Mauro filma O Canto da Saudade. Circula a revista Cinelândia. Grande seca no Nordeste. Em Salvador, o pioneiro do cinema baiano, Alexandre Robatto Filho, lança o curta-metragem Entre o mar e o Tendal documentário sobre a pesca do xaréu. A Vera Cruz produz O Cangaceiro, de Lima Barreto, Sinhá Moça, filme de época, e a comédia Uma Pulga na Balança. A Atlântida lança Uma Dupla do Barulho, de Carlos Manga, e Amei um Bicheiro de Jorge Ileli e Paulo Wanderley. A Multifilmes produz o primeiro longa-metragem em cores, Destino em Apuros. Alex Viany dirige Agulha no Palheiro e Alberto Cavalcanti propõe a criação do Instituto Nacional do Cinema (INC). 6

1954 No Colégio Central da Bahia, Glauber cursa o Clássico. Ingressa no Círculo de Estudo, Pensamento e Ação (CEPA), di- rigido pelo professor Germano Macha- do. Escreve o balé Sefanu e freqüenta ativamente o Clube de Cinema, animado pelo crítico Walter da Silveira. Suicídio do Presidente Getúlio Vargas. Falência da Vera Cruz, após a produção de Floradas na Serra, com Cacilda Becker e Jardel Filho. Alberto Cavalcanti filma O Canto do Mar e Mulher de Verdade. Alex Viany dirige Rua sem Sol e Carlos Manga faz Nem Sansão nem Dalila e Matar ou Correr. Watson Macedo lança O Petróleo é Nosso. A Revista de Cinema de Belo Horizonte vira referência nacional. 7

1955 1955. Idealizado pelo poeta Fernando Rocha Peres, é criado no Colégio Estadual da Bahia o grupo Jogralescas Teatralizações Poéticas, combinando poesia e teatro. Glauber dirige as encenações. Participam do grupo, Anecyr Rocha, Ângelo Roberto, Paulo Gil Soares, Calazans Neto, Anysius Melhor, Guerrinha, entre outros. Encenam poetas modernistas como Vinicius de Moraes, Manuel Bandeira e Carlos Drummond de Andrade. Nelson Pereira dos Santos realiza Rio, 40 Graus. A baiana Marta Rocha é recebida com festa em Salvador depois de ficar em segundo lugar no concurso de Miss Universo. Morre Carmem Miranda. Aqui e na página ao lado equipe de A Jogralesca. 8

1956 1956. Glauber, Calazans Neto, Sante Scaldaferri, Luis Paulino, Zé Telles, Fernando da Rocha Peres, Fred Castro entre outros, fundam a Cooperativa Cinematográfica Yemanjá. Como Palavra de Ordem, pixam nos muros da cidade: Você acredita em Cinema na Bahia?. A estréia do grupo Jogralescas acontece em setembro, no aniversário do Colégio Central da Bahia. Conhece Milze Maria Soares. Colabora no filme Um dia na Rampa, curta-metragem de Luiz Paulino dos Santos rodado no Mercado Modelo de Salvador. Juscelino Kubitschek é eleito Presidente da República, tendo como vice João Goulart. A cultura na Bahia ganha novo impulso com a criação da Escola de Teatro da Universidade da Bahia, dirigida por Martim Gonçalves, do Curso de Música dirigido pelo maestro Hans Koellreuter, e da Escola de Dança, dirigida por Yanka Rudzka. É criada a Cinemateca Brasileira em São Paulo. 9

1957 Helena Ignez e Solon Barreto em O Pátio. Glauber viaja para Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. Em Belo Horizonte encontra Adolfo Celli, Paulo Autran e Tonia Carrero. Visita o Centro de Estudos Cinematográficos (CEC) e entra em contato com Frederico de Moraes, Maurício Gomes Leite, Flávio Pinto Vieira, Fritz Teixeira de Salles e Geraldo Fonseca, responsáveis pelas edições da Revista de Cinema e Revista Complemento. Em Minas tenta implantar sem sucesso o seu projeto de Cinema Novo. Vai então ao Rio, buscar financiamento para uma série de filmes da Sociedade Cooperativa Yemanjá. Entre os projetos, um de sua autoria: Senhor dos Navegantes. Visita as filmagens de Rio, Zona Norte, de Nelson Pereira dos Santos onde conhece Alex Viany. Em São Paulo, inteira-se do movimento concretista. Retorna à Salvador e cursa Direito da Universidade Federal da Bahia, até o terceiro ano. Chamado por Ariovaldo Matos, participa do jornal de esquerda O Momento. Colabora nas revistas culturais Mapa e Ângulos e no semanário Sete Dias. Filma Pátio, com Solon Barreto e Helena Ignez, um filme formalista e influenciado pelo concretismo, utilizando as sobras de negativos do longa-metragem Redenção, de Roberto Pires. 10

1958 Glauber inicia sua carreira jornalística como repórter de polícia do Jornal da Bahia, onde trabalha ao lado de Inácio de Alencar, Ariovaldo Matos, Paulo Gil Soares, Fernando da Rocha Peres e Calazans Neto. Em seguida, publica artigos sobre cinema e assume a direção do Suplemento Literário. Escreve ainda na página Artes e Letras, do suplemento dominical do Diário de Notícias, de Salvador, e para o Suplemento Dominical do Jornal do Brasil (SDJB). Nessa época também se emprega como funcionário público da Prefeitura de Salvador. Glauber acompanha o diretor italiano Roberto Rossellini em pesquisa de locações em Salvador com uma câmera 16 mm (experiência narrada no filme Di ). Criação da Cinemateca do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, Nelson Pereira dos Santos filma Rio, Zona Norte. Aparece a Revista de Cultura Cinematográfica. Em São Paulo, Roberto Santos filma O Grande Momento ; Walter Hugo Khoury dirige Estranho Encontro. No Rio de Janeiro estrutura-se a Federação dos Cineclubes. 11

1959 Glauber e Helena Ignez em seu casamento. Glauber viaja à São Paulo e participa com Walter da Silveira do Congresso dos Cineclubes e da Bienal de São Paulo (Exposição Bahia no Ibirapuera organizada por Lina Bo Bardi). Mostra o copião de Pátio a Walter Hugo Khoury e conhece pessoalmente Paulo Emílio Salles Gomes, Almeida Salles, Rudá de Andrade, Jean-Claude Bernardet e Gustavo Dahl. Lança Pátio em Salvador e promove sessões no Rio. Em 30 de junho, Glauber casa-se em Salvador com Helena Ignez, colega de universidade e atriz de Pátio. Ao invés de um carro, presente dos pais pela aprovação no vestibular, Glauber compra uma câmera Arryflex 35 mm por sessenta contos com tripé e sem zoom. Após o casamento, começa em Salvador a filmagem de seu segundo curta-metragem, o inacabado, Cruz na Praça, baseado num conto de sua autoria, A Retreta na Praça, publicado no Panorama do conto baiano. Glauber Rocha com sua primeira filmadora. Fica obrigatória a exibição de filmes brasileiros 42 dias por ano. Aruanda, de Linduarte Noronha, é filmado na Paraíba e Arraial do Cabo, de Paulo César Saraceni e Mário Carneiro, no litoral do Rio. Redenção, de Roberto Pires, o primeiro longa-metragem baiano é lançado em Salvador. (o diretor inventa e usa uma lente cinemascope). Iniciam-se as filmagens de Bahia de Todos os Santos de Trigueirinho Neto, incentivadas por artigos de Glauber Rocha. Orfeu Negro, dirigido pelo francês Marcel Camus, filmado no Rio e adaptado de uma peça de Vinícius de Moraes, ganha a Palma de Ouro em Cannes e o Oscar de melhor filme estrangeiro. Criado o Museu de Arte Moderna da Bahia, sob direção de Lina Bo Bardi. Na América Latina, vitória da Revolução Cubana. 12 Luiz Carlos Maciel e Anatólio de Oliveira em A Cruz na Praça.

Glauber filmando Barravento. 1960 Nasce a primeira filha de Glauber, Paloma de Melo e Silva Rocha, em 12 de junho. Glauber trabalha como produtor executivo de A Grande Feira, longa-metragem de Roberto Pires, produzido por Rex Schindler através da Iglu Filmes, (produtora de Cinejornais) que reúne ainda Braga Neto, Oscar Santana, Helio Moreno e Waldemar Lima Lima (fotógrafo de Deus e o Diabo ). Depois de organizar a produção, Glauber refaz o roteiro e assume a direção de Barravento, aproveitando alguns diálogos e copiões filmados por Luiz Paulino dos Santos, autor do enredo original. Em carta à Paulo Emílio, Glauber conta como virou diretor inesperadamente de seu primeiro longa-metragem. Começa a corresponder-se com Alfredo Guevara, diretor do Instituto Cubano de Cinema. Joaquim Pedro de Andrade realiza o curta-metragem Couro de Gato. Carlos Coimbra lança A Morte comanda o Cangaço, investindo no filão dos filmes de cangaceiros. Nelson Pereira dos Santos vai para a Bahia rodar Vidas Secas, mas, com as chuvas filma Mandacaru Vermelho. A equipe hospeda-se na pensão Bandeira Branca de Lúcia Rocha. Inauguração de Brasília. Paloma Rocha aos quatro anos. Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir visitam a Bahia e dão conferências em Salvador. 13

1961 Glauber finaliza Barravento no Rio de Janeiro, com montagem de Nelson Pereira dos Santos. Recebe a visita na moviola da Líder, do cineasta François Truffaut, interessado em conhecer o cinema novo brasileiro. O ciclo de cinema baiano é uma realidade com Bahia de Todos os Santos, de Trigueirinho Neto, A Grande Feira, de Roberto Pires, e Barravento, de Glauber. É criado o Geicine (Grupo Executivo da Indústria Cinematográfica). Jânio Quadros deixa a presidência da República e João Goulart assume em meio à crise política. 14

1962 Glauber Rocha. Itália, 1962. Configura-se o movimento denominado Cinema Novo com a explosão da produção cinematográfica a partir do Rio de Janeiro. Cinco Vezes Favela é produzido pelo Centro Popular de Cultura (CPC) da UNE, reunindo cinco curtas de Leon Hirszman, Joaquim Pedro de Andrade, Cacá Diegues, Miguel Borges e Marcos Farias. Influenciado pela Nouvelle Vague, Ruy Guerra lança Os Cafajestes que é censurado. Primeira viagem de Glauber à Europa. Barravento recebe o Prêmio Opera Prima no Festival de Cinema de Karlovy Vary, na então Tchecoslováquia. No mesmo ano, o filme é apresentado no Festival de Sestri Levanti, Itália. Glauber participa também do Festival de Santa Margherita, na Itália. Produz o curta-metragem Imagens da Terra e do Povo, de Orlando Senna. Orlando Senna e Glauber Rocha. Em carta para Alfredo Guevara, fala pela primeira vez em realizar América Nuestra, um épico sobre a América Latina. O Pagador de Promessas, de Anselmo Duarte, ganha a Palma de Ouro em Cannes. Organiza-se o Conselho Nacional dos Cineclubes. 15

16

1963 Glauber inicia as filmagens de Deus e o Diabo na Terra do Sol no sertão da Bahia, concluídas em quatro meses. Publica Revisão Crítica do Cinema Brasileiro pela Editora Civilização Brasileira e começa a colaborar com a revista Cine Cubano. O escritor italiano Alberto Moravia escreve, no L Espresso, crítica elogiosa de Barravento. (...) um dos mais belos filmes que temos visto atualmente (...). Barravento é selecionado para o Festival de Cinema de Londres e incluído entre os dez filmes escolhidos para o Festival de Cinema de Nova York, que inaugura o Lincoln Center for the Performing Arts. O Cinema Novo ganha visibilidade com três futuros clássicos sobre o Nordeste: Vidas Secas, de Nelson Pereira dos Santos, Deus e o Diabo na Terra do Sol, de Glauber (lançado em 1964), e Os Fuzis, de Ruy Guerra. Cerca de trezentos cineclubes participam da reunião nacional em Porto Alegre. No Rio, Carlos Lacerda cria a Comissão de Ajuda à Indústria Cinematográfica (CAIC). Crise na política, com greves, manifestações públicas e comícios reivindicando reformas de base. 17

Projeto de Rogerio Duarte para o cartaz de Deus e o Diabo na Terra do Sol com arte final de Luis Carlos Maciel. Capa do livreto de divulgação feito por Calazans Neto.

Nelson Pereira dos Santos, Ruy Guerra, Joaquim Pedro de Andrade, Walter Lima Jr., Zelito Viana, Luiz Carlos Barreto, Glauber Rocha e Leon Hirszman no bar Zeppelin em Ipanema. 1964 Deus e o Diabo na Terra do Sol concorre à Palma de Ouro no Festival de Cannes. No Brasil, o Golpe de Estado instala a Ditadura Militar. Glauber vai à Europa. Exibe seu filme no México, viaja pelos Estados Unidos, vai à Nova York, Los Angeles e conhece Hollywood. Recebe o Prêmio da Crítica mexicana no Festival Internacional de Acapulco, o Grande Prêmio do Festival de Cinema Livre, na Itália, e o Náiade de Ouro do Festival Internacional de Porreta Terme. Maurício do Valle, como Antônio das Mortes, recebe o Prêmio Saci de Melhor Ator Coadjuvante dado pelo jornal O Estado de S. Paulo. Deus e o Diabo estréia em junho no circuito carioca. Devido ao sucesso de Deus e o Diabo na Terra do Sol, Barravento é lançado também no mesmo mês no Rio, sendo anunciado como um filme de violência, sexo, suspense e fetichismo, apresentando a beleza satânica de uma mulher (Luiza Maranhão), no mais excitante nu do cinema!. João Goulart é deposto pelo golpe militar. O Marechal Castelo Branco é nomeado presidente da República. É criado o SNI (Serviço Nacional de Informação). O Brasil rompe relações com Cuba. O Golpe interrompe a produção de Cabra Marcado para Morrer, de Eduardo Coutinho. São feitos os documentários Maioria Absoluta, de Leon Hirszman, Integração Racial, de Glauber Rocha dirigindo Deus e o Diabo na Terra do Sol. Paulo César Saraceni, Meninos do Tietê, de Maurício Capovilla e os filmes de ficção, Noite Vazia, de Walter Hugo Khoury, e Selva Trágica, de Roberto Farias. 19

1965 Desenho de Glauber Rocha feito na prisão. Glauber lança em janeiro o texto-manifesto A Estética da Fome, durante a Resenha do Cinema Latino Americano, em Gênova. O texto, escrito no avião entre Los Angeles e Milão, traz as bases estéticas e políticas do Cinema Novo e critica o paternalismo europeu em relação ao Terceiro Mundo. Glauber, Zelito Viana, Walter Lima Jr., Paulo César Saraceni e Raymundo Wanderley Reis criam a Mapa Filmes. Glauber co-produz Menino de Engenho, de Walter Lima Jr., protagonizado por Anecyr Rocha. Em novembro, é preso num protesto contra o regime militar em frente ao Hotel Glória, no Rio de Janeiro, durante reunião da OEA (Organização dos Estados Americanos). São presos com Glauber: Joaquim Pedro de Andrade, Mário Carneiro, Flávio Rangel, Antonio Callado, Carlos Heitor Cony, Jaime Rodrigues e Márcio Moreira Alves. A prisão tem repercussão internacional e um telegrama de protesto assinado por Alain Resnais, Truffaut, Godard, Joris Ivens e Abel Gance é enviado ao presidente Castelo Branco. No final do ano, Glauber viaja para o Amazonas, onde passa o Natal de 1965 e realiza, em Manaus e Parintins, o curta Amazonas Amazonas, seu primeiro filme colorido. A Editora Civilização Brasileira publica Deus e o Diabo na Terra do Sol, com textos e entrevistas da equipe e de diferentes autores sobre o filme. A política, o cenário urbano e o mundo rural marcam as produções do Cinema Novo. Os autores do Cinema Novo fundam a Difilm, uma cooperativa de distribuição de filmes. É criado o curso de cinema da Universidade de Brasília. Acontece o 1 Festival do Filme, no Rio, e o Festival do Curta-Metragem do Jornal do Brasil. Nos EUA, formam-se as primeiras comunidades hippies. 20

1966 Filma o documentário Maranhão 66, sobre a posse do governador do Maranhão, José Sarney. Deus e o Diabo na Terra do Sol recebe o Grande Prêmio Latino-Americano no Festival Internacional de Mar del Plata. O roteiro do filme é publicado na coleção italiana Cineforum. Deus e o Diabo na Terra do Sol é capa da revista francesa Positif n 73, que inclui o manifesto A Estética da Violência. Glauber co-produz A Grande Cidade, de Cacá Diegues. Glauber, José Sarney e equipe filmando Maranhão 66. O Cinema Novo produz O Padre e a Moça, de Joaquim Pedro de Andrade, A Grande Cidade, de Cacá Diegues, A Hora e a Vez de Augusto Matraga, de Roberto Santos, Os Subterrâneos do Futebol, de Maurício Capovilla. Leila Diniz brilha em Todas as Mulheres do Mundo, de Domingos de Oliveira. É criado o Instituto Nacional do Cinema, presidido por Flávio Tambellini. Paulo Emilio Salles Gomes e Adhemar Gonzaga publicam 70 anos de Cinema Brasileiro. 21

1967 Paulo Autran em Terra em Transe. 22 Terra em Transe é proibido em todo o território nacional, por ser considerado subversivo e ofensivo à Igreja. O filme é liberado em maio e sua exibição causa polêmica no Rio. Um histórico debate promovido no MIS (Museu de Imagem e do Som) mobiliza a classe artística e intelectuais como Helio Pellegrino que defende o filme e Fernando Gabeira que faz restrições ao personagem super-homem Paulo Martins. Exibido no Festival de Cannes, Terra em Transe ganha os Prêmios Luis Buñuel da crítica espanhola, e da FIPRESCI (Federação Internacional de Imprensa Cinematográfica). No Rio, o filme fica em cartaz durante quatro semanas em dez cinemas. Em sessão para estudantes organizada pelo Teatro Universitário de São Paulo (TUSP) o filme é interrompido por aplausos em sua exibição. De Cannes, Glauber viaja para Paris. Participa do Festival de Veneza, onde encontra Luis Buñuel. Apresenta Terra em Transe em Montreal, no Canadá, onde entrevista Jean Renoir. No Festival Internacional do Filme de Locarno, Terra em Transe recebe o Grande Prêmio e o Prêmio da Crítica. Em Havana, é considerado pela crítica cubana o melhor filme do ano. No Rio, recebe do Museu da Imagem e do Som o Prêmio Golfinho de Ouro de Melhor Filme. No Festival de Cinema de Juiz de Fora ganha quatro prêmios: Melhor Filme, Menção Honrosa de Melhor Roteiro, Melhor Ator Coadjuvante para Modesto de Sousa, Prêmio Especial para Luís Carlos Barreto, pela fotografia e produção do filme. No mesmo ano, Glauber participa como co-roteirista de Garota de Ipanema, de Leon Hirszman. Escreve os textos-manifestos: A Revolução é uma Eztetyka ; Teoria e prática do cinema latino-americano ; Revolução Cinematográfica e Tricontinental (inspirado na Conferência Tricontinental em Havana). Luiz Buñuel e Glauber em Cannes, 1967. Jean Renoir e Glauber, Montreal, 1967.

O Marechal Artur da Costa e Silva é nomeado presidente da República. Carlos Marighela vai para Cuba como representante da OLAS (Organização Latino-Americana de Solidariedade) e cria a ALN (Aliança Libertadora Nacional), organização clandestina de extrema esquerda. Morre Che Guevara, isolado na Bolívia. Régis Debray lança sua Teoria do Foco. O Rei da Vela, peça de Oswald de Andrade encenada por José Celso Martinez Corrêa e Alegria, Alegria, música de Caetano Veloso, marcam o início do Tropicalismo. Zé Celso dedica seu espetáculo à Glauber. Antonio Callado publica Quarup, romance que Glauber pretendia recriar nas telas. São lançados: Opinião Pública, documentário de Arnaldo Jabor, Garota de Ipanema, de Leon Hirszman e O Caso dos Irmãos Naves, de Luiz Sérgio Person. O moderno cinema brasileiro experimenta novos caminhos com A margem, de Ozualdo Candeias, Esta Noite Encarnarei no Teu Cadáver, de José Mojica Marins e Cara a Cara, de Júlio Bressane. Jean-Claude Bernardet publica Brasil Em Tempo de Cinema, análise sobre o Cinema Novo. Joaquim Pedro de Andrade realiza o documentário Cinema Novo para a televisão alemã, com making-off de Terra em Transe. 23

1968 O roteiro de Terra em Transe é publicado na revista L Avant-scène du Cinema e na revista alemã Film. Em março, Glauber prepara-se para filmar O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro ( Antônio das Mortes ), um sangrento western político (...) em que retomo o personagem de Antônio das Mortes, dez anos mais tarde, num sertão modernizado e ainda bárbaro. Problemas de produção atrasam as filmagens em Milagres, na Bahia. Glauber desiste de ir à Paris encontrar o produtor, Claude-Antoine, devido as manifestações de maio de 68. Enquanto aguarda as filmagens na Bahia, roda em agosto, no Rio, com uma câmera Éclair 16 mm, Câncer, um filme experimental, com situações improvisadas em torno de violência, racismo e sexualidade. Documenta com Affonso Beato, as passeatas estudantis contra a ditadura, no curta-metragem inacabado 1968. Glauber interrompe a montagem de O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro para participar da Semana do Cinema Novo em Nova York, onde encontra Elia Kazan. Assiste as filmagens de The Arrangement e tenta obter com Kazan os direitos para o cinema de Wild Palms, romance de William Faulkner. No Brasil, participa de um seminário sobre cinema e televisão na América Latina, organizado pela UNESCO, na Universidade de São Paulo. O encontro traz novamente ao Brasil, Roberto Rosselini, Edgar Morin e o cubano Alfredo Guevara. Co-produz Brasil Ano 2000, longa-metragem de Walter Lima Jr. estrelado por Anecyr Rocha, irmã de Glauber e mulher do diretor. Nas cartas, começa a falar em sair definitivamente do Brasil. Propõe a Claude-Antoine produzir uma série de televisão tendo o personagem Antônio das Mortes como protagonista. Escreve o argumento de treze episódios e a apresentação da série. Glauber concebe nesse período os mais diferentes projetos, ainda pensando em filmar alguns deles no Brasil: 24

FatOs pessoais Glauber e Roberto Rosselini. Anecyr Rocha em fotocartaz de Brasil Ano 2000. a) um musical chamado O Rei do Bicho, uma adaptação bem livre de uma comédia musical de Brecht, A ópera dos 3 vinténs, sobre a vida de um gângster. Conheço as Escolas de Samba e todos os grandes sambistas e dançarinos. Aqui, para esse gênero de filme não é preciso as coreografias de Hollywood. Nós temos tudo. b) Um roteiro de aventuras de espionagem no meio exótico da Amazônia. Estive na Amazônia e tenho um material fabuloso que poderia, REALMENTE, ser mais fascinante que James Bond (...) Não quero a direção, não quero nem assinar o roteiro. Quero vender porque tenho necessidade de dinheiro. c) Temas tirados dos romances de Miguel Angel Asturias. d) O projeto de Calígula, de Camus, para ser rodado nas ruínas de Pompéia, com o ator Jean-Pierre Léaud. e) Projeto de adaptação da peça Galileu Galilei, de Brecht, para uma época futura de polêmica sobre a conquista do espaço, um projeto que pode também interessar Orson Welles. A Passeata dos 100 Mil no Rio, mobiliza estudantes e intelectuais em protesto contra a ditadura militar. O Ato Institucional n 5 fecha o Congresso Nacional. Explodem as guerrilhas urbanas. Gilberto Gil lança o disco Tropicália e Caetano Veloso a música É proibido proibir. Cria-se o Conselho Superior de Censura. O cinema underground produz o clássico, O Bandido da Luz Vermelha, de Rogério Sganzerla, e Jardim de Guerra, de Neville d Almeida. O Cinema Novo lança Fome de Amor, de Nelson Pereira dos Santos e O Bravo Guerreiro, de Gustavo Dahl. Irrompe o cinema da Boca do Lixo paulista, com Ozualdo Candeias, Carlos Reichenbach e João Callegaro e outros autores. Manifestações estudantis resultam no Maio de 68 na França. 25

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Ao lado, Zelito Viana, Odete Lara, Glauber Rocha, Neville d Almeida, Cannes 1969. Abaixo à esquerda a revista L Avant-Scéne 1969 Glauber propõe ao produtor americano Daniel Talbot adaptar, o romance Amor de Perdição, do escritor português Camilo Castelo Branco, transformando-o numa tragédia de amor no mundo subdesenvolvido, com João Gilberto ou Baden Powell no papel principal e música de Tom Jobim. Viagem à Europa para exibir O Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro no Festival de Cannes de 1969, que concede-lhe o Prêmio de Melhor Direção, além do prêmio da FIPRESCI, o Luis Buñuel, e o Prêmio da Confederação Internacional de Cinema de Arte e Ensaio. Glauber atribui a premiação ao empenho de Luchino Visconti, presidente do júri, encantado pelo filme. Na Bélgica, o filme ganha o Primeiro Prêmio do Festival de Cinema de Plovaine. No Brasil, recebe o Troféu Coruja de Ouro e o Prêmio Adicional de Qualidade do Instituto Nacional de Cinema. A revista peruana Hablemos de Cine publica entrevista de Glauber em abril, sob o título Glauber: o Transe da América Latina. A revista francesa Cahiers du Cinéma publica entrevista de Glauber com matéria (e foto) de capa. Em Cannes, antes da premiação de O Dragão, Glauber recebe a proposta de um produtor de Barcelona, para realizar um filme de 100 mil dólares na Espanha, com total liberdade criativa. 27

1969 O filme é Cabezas Cortadas, e Glauber propõe Orson Welles no papel do ditador latino-americano que é feito por Francisco Rabal. Viaja à Paris, onde o produtor Claude-Antoine o convida para fazer um filme na África: O Leão de 7 cabeças. Embarca para Roma e depois vai ao Festival de Veneza. Ainda na Itália, é convidado para participar de Vent d Est, filme de Jean-Luc Godard e J.P Gorin. Glauber faz o papel de um cineasta revolucionário que aponta o caminho do cinema do Terceiro Mundo. Viaja para Brazzaville, no Congo, para filmar O Leão de 7 Cabeças. De lá escreve para a mãe dizendo: estou na África. Aqui não tem tanto bicho assim. Tem muito calor, é igual à Bahia, o pessoal é ótimo, o trabalho é difícil. Roda o filme em 4 semanas. No meio das filmagens o ator francês Jean-Pierre Léaud tem um ataque histérico e os congoleses acham que faz parte do filme. Em carta para o cubano Alfredo Guevara, do ICAIC, pede que mostre O Dragão a Fidel Castro. 28