O PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO AMBIENTAL NO PROCESSO DE TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO



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Transcrição:

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação em Direito O PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO AMBIENTAL NO PROCESSO DE TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO Luciana Machado Oliveira Belo Horizonte 2007

Luciana Machado Oliveira O PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO AMBIENTAL NO PROCESSO DE TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Orientador. José Adércio Leite Sampaio Belo Horizonte 2007

Luciana Machado Oliveira O princípio da participação ambiental no processo de transposição do rio são Francisco Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Direito José Adércio Leite Sampaio (Orientador) - PUC Minas José de Alfredo Baracho Júnior (Examinador) - PUC Minas Daniel Sarmento (Examinador) - PUC Rio Belo Horizonte, 16 de junho de 2007

Aos meus pais, Maria e Antônio, pois sem eles esse sonho não se realizaria.

Agradecimentos Ao meu querido orientador Professor José Adércio Leite Sampaio, pessoa pela qual tenho grandiosa admiração e respeito, por ter me conduzido a este tema. Minha eterna gratidão. Ao professor Bruno Wanderley Júnior, pelo constante apoio e pela ajuda nas orientações das monografias de direito da Puc-São Gabriel. Ao professor José Alfredo de Oliveira Baracho Júnior, pelas esplendidas aulas de direito ambiental ministradas no mestrado, durante as quais absorvi ensinamentos únicos. À minha sempre orientadora madrinha Teo, pela revisão desta dissertação e pelos comentários felizes e oportunos. Aos meus irmãos Lisley e Laser, por me incentivarem e sempre nos momentos estressantes me dizerem que eu iria conseguir. Consegui! Às minhas eternas amigas de mestrado Ana Letícia, Carlinha, Adriana e Renata, pelas dicas, pela divisão de temores e pelo ombro amigo. Valeu, viu? A meu sobrinho, Otávio, pequenino ser, que não consigo descrever, meu agradecimento por ter me visto tanto tempo trancada no escritório e entender.

O Sertão é do tamanho do mundo. Agora, por aqui, o senhor já viu: rio é só o São Francisco, o Rio do Chico. O resto pequeno é vereda. E algum ribeirão. (ROSA, João Guimarães) Quem acredita que pode realizar algo guiado exclusivamente pela razão está condenado a realizar muito raramente. (LE BOM, Gustave)

RESUMO O objetivo deste trabalho foi analisar e verificar se, no processo de licenciamento do projeto de transposição do rio São Francisco vem sendo respeitada a participação popular, um dos princípios efetivadores do Estado Democrático de Direito, com a participação do comitê da bacia hidrográfica do rio São Francisco e com as realizações regulares e obrigatórias das audiências públicas. Essa tarefa foi realizada, após se analisar o conceito de meio ambiente, discutir-se a importância da água nos tempos passados e atuais, apresentarem-se os princípios protetores do meio ambiente centrado no princípio da participação ambiental, descrever-se o processo de gestão participativa da água no Brasil e a Política Nacional de Recursos Hídricos, apresentarem-se dados sobre o Rio de integração nacional e do projeto de transposição e questionar se, realmente, a transposição vem ocorrendo com a participação popular. A conclusão foi que o Governo Federal não tem respeitado o que determina a Constituição Brasileira e as demais legislações, pois todo o processo tem-se desenvolvido sem o respeito às deliberações do Comitê da Bacia do rio São Francisco, e na inobservância da opinião da população brasileira. Ficou comprovado, também, que, até o presente momento, a participação popular no processo de transposição tem sido encarada pelo governo federal como mera formalidade e não como requisito legal e obrigatório para a efetiva concretização de um país democrático e aberto. Palavras-Chave: Meio ambiente. Recursos hídricos. Participação popular. Gestão participativa. Rio são Francisco. Transposição.

ABSTRACT This work aimed to review and check whether, during the San Francisco river transfer license process, a basic principle of the Democratic Rule-of-Law State, that is, the participation of the community, in connection with the San Francisco river hydrographic basin committee, and in the regulatory mandatory public hearings has been duly observed. This task was accomplished following a review of the concept of environment, a discussion of the importance of the water both in the past and today, a presentation of the protective principles of the environment focused on the principle of environmental participation, a description of the participative water management process in Brazil and of the National Policy of Water Resources, including data on the River for National Integration and the transfer process, and finally investigate whether such transfer has been implemented with the participation of the community. The conclusion showed that the Brazilian government is not compliant with the provisions of the Brazilian Constitution and other regulations in this respect, and the process has been developed without accounting for the deliberations of the San Francisco River Committee or the views of the Brazilian population. It has also been confirmed that, to date, the engagement of the population in the process has been viewed as mere formality and not as a legal and mandatory requirement for the effective consolidation of an openly democratic country. Key-words: Environment. Water resources. Popular participation. Management participation. São Francisco River. Transposition.

LISTA DE ABREVIATURAS E DE SIGLAS a. C- Antes de Cristo ABRH- Associação Brasileira de Recursos Hídricos ANA- Agência Nacional de Águas ANATEL- Agência Nacional de Telecomunicações ANEEL- Agência Nacional de Energia Elétrica ANP- Agência Nacional de Petróleo art.- Artigo C.F/88- Constituição Federal de 1988 CBHSF- Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco CDC- Código de Defesa do Consumidor CEMIG- Centrais Elétricas de Minas Gerais CHESF- Companhia Hidroelétrica do São Francisco CNPq- Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNRH- Conselho Nacional de Recursos Hídricos CNUMAD- Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento CODEVASF- Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba CONAMA- Conselho Nacional de Meio Ambiente d. C- Depois de Cristo DNAEE- Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica DNOS- Departamento Nacional de Obras e Saneamento ECO- Conferência Mundial para o Meio Ambiente e Desenvolvimento EIA- Estudo de Impacto Ambiental FEHIDRO - Fundo de Recursos Hídricos FHC- Fernando Henrique Cardoso Gn- Gêneses IBAMA- Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis Inc.- Inciso MINTER- Ministério do Interior MIT- Massachusetts Institute of Technology

MMA- Ministério de Meio Ambiente MME- Ministério das Minas e Energia MW- Megawatts ONU- Organização das Nações Unidas PAC- Plano de Aceleração do Crescimento PFL- Partido da Frente Liberal PGR- Procurador Geral da República PNRH- Política Nacional de Recursos Hídricos PPA- Plano Plurianual PSDB- Partido da Social Democracia Brasileira PT- Partido dos Trabalhadores RIMA- Relatório de Impacto Ambiental SEMA- Secretaria de Meio Ambiente SEPLAN- Secretaria de Planejamento da Presidência da República SISNAMA- Sistema Nacional de Meio Ambiente SNUC- Sistema Nacional de Unidade de Conservação SRH- Secretaria de Recursos Hídricos STF- Supremo Tribunal Federal T- Toneladas WCED- World Commission on Environment and Development

SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO... 13 2 MEIO AMBIENTE... 18 2.1 Conceito... 18 2.2 Meio Ambiente - Um Direito Difuso... 19 2.3 O Meio Ambiente Na Constituição Federal de 1988 - Um Direito Fundamental... 21 3 ÁGUA... 25 3.1 Origem... 25 3.2 A Água e Sua Formação... 26 3.3 Histórico... 28 3.4 Tratados e Acordos Internacionais Relativos à Água... 32 4 PRINCÍPIOS AMBIENTAIS... 39 4.1 Princípio do Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado... 40 4.1.1 Restrições advindas do princípio fundamental ao meio ambiente equilibrado. 42 4.2 Princípio do Desenvolvimento Sustentável... 44 4.3 Princípio da Prevenção... 46 4.4 Princípio da Precaução... 48 4.5 Princípio do Poluidor-Pagador... 49 4.6 Princípio da Função Socioambiental da Propriedade... 54 4.7 Princípio da Cooperação entre os Povos... 55 5 PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO... 58 5.1 O Princípio da Participação nas Legislações Brasileiras... 60 5.2 Princípio da Informação Ambiental... 64 5.3 Princípio da Educação Ambiental... 67 5.4 Audiência Pública - Efetivação do Princípio da Participação... 68 6 GESTÃO HÍDRICA... 72 6.1 Evolução da Gestão Hídrica no Brasil... 72 6.2 Política Nacional de Recursos Hídricos... 77 6.2.1 Princípios gerais... 77 6.2.2 Objetivos da lei 9.433/97... 79 6.2.3 Diretrizes gerais da lei 9.433/97... 79 6.2.4 Dos instrumentos da política nacional de recursos hídricos... 80 6.2.5 Sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos... 82 6.2.6 Conselho nacional de recursos hídricos... 82 6.2.7 Comitês de bacias... 83 6.2.7.1 Comitê da bacia hidrográfica do rio são Francisco... 86 6.3 Agência Nacional de Águas - ANA... 87

6.4 Gestão Participativa da Água... 89 7 RIO SÃO FRANCISCO... 91 7.1 Características... 91 7. 2 Importância Sócio-Econômica do Rio São Francisco... 95 7.3 O Projeto de Transposição... 99 7.4 Análise do Projeto de Transposição... 101 7.5 A Revitalização do Rio São Francisco... 105 8 TRANSPOSIÇÃO E PARTICIPAÇÃO?... 107 8.1 A Participação do Comitê da Bacia do Rio São Francisco no Processo de Transposição... 107 8.2 A Não Concretização da Participação Popular nas Audiências Públicas.. 113 9 CONCLUSÃO... 117 REFERÊNCIAS... 121

13 1 INTRODUÇÃO A preocupação pelo meio ambiente intensificou-se na década de 70 com os movimentos hippies, anti-bombas e paz e amor. Foi nessa época que as organizações ambientalistas começaram a pressionar os governos, a fim de que o meio ambiente fosse alçado à categoria de bem universal fundamental a todos. Os bens ambientais naturais compreendidos, a água, o ar, o solo, a fauna e a flora, desde os anos 80, foram legalmente protegidos pelas várias legislações infraconstitucionais brasileiras: Lei 6.938/81, Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, Lei da Ação Civil Pública, Lei 7347/85 e pela Constituição Federal de 1988, a Constituição Ambientalista. Na Constituição de 1988, o meio ambiente é considerado um bem de todos, difuso, e que tem que ser protegido pelo poder público e pela coletividade para a presente e as futuras gerações. E é com a Constituição Federal de 1988, democrática e cidadã, que se firma o princípio da participação popular, um dos princípios-alicerce da proteção ambiental, como o princípio concretizador do Estado Democrático de Direito. Um estudo criterioso desse princípio e uma análise sobre o que acontece no Brasil, hoje, relativo ao processo de transposição do rio São Francisco é que fez emergir a necessidade de uma pesquisa documental e bibliográfica que, ao seu final pretende responder se o princípio da participação vem sendo observado e respeitado no processo de licenciamento ambiental do projeto de transposição do rio São Francisco. Vários foram os questionamentos feitos a respeito do porque abordar o tema da transposição do São Francisco, rio tão distante de nós belo-horizontinos, e não optar por trabalhar a problemática do rio das Velhas. A resposta é simples. Primeiramente, cresci tendo o rio São Francisco como meio de diversão, pesca e lagoa grande para se nadar. É minha referência de infância. Desde essa época, já se podia observar que o Velho Chico não era mais o mesmo. As águas daquele imenso rio já não transbordavam mais, a seca era constante e os peixes já não eram mais numerosos e grandes. Alguma coisa estava e está acontecendo. O rio está sendo degradado pela ação do homem e em beneficio deste. E, agora, querem transpô-lo.

14 O segundo motivo para a escolha por abordar a transposição do São Francisco é que ele não é um rio distante de nós. Os problemas ambientais não atingem apenas as comunidades ribeirinhas, locais, ou regionais. A degradação de um ecossistema, de uma espécie ou de um recurso hídrico atinge a todos. E quando digo todos, quero dizer toda a população mundial. O rio São Francisco está no nosso meio ambiente e deste modo ele está em nós mesmos. As questões que envolvem o meio ambiente são transdiciplinares e interdisciplinares. Por isso, a presente dissertação se ateve a área jurídica do tema, isto é, à importância do princípio da participação ambiental e a completa efetivação desse princípio no processo de transposição. A problemática desta dissertação é pesquisar por que, no processo de transposição do rio São Francisco, o princípio da participação popular ambiental não tem sido observado, conforme determina a Constituição Federal de 1988 e as legislações ambientais. Entre as várias hipóteses levantadas, destacamos que não existe interesse do Governo Federal pela concretização de fato e de direito do princípio da participação popular no processo de transposição, uma vez que este princípio contraria os interesses econômicos dominantes que envolvem a transposição. Até o presente momento, tudo que se desenvolveu dentro do processo de transposição do Velho Chico foi realizado de forma a maquiar uma pretensa participação popular, nunca concretizada. Isso está claro diante das manifestações negativas e de repúdio ao referido projeto do governo federal. Os questionamentos levantados justificam uma pesquisa bibliográfica, pois não podemos permitir que interesses econômicos e políticos soterrem a democracia participativa no Brasil, conquistada após tantos anos de ditadura e repressão. A participação popular é um princípio fundamental constitucional e assim sendo, não deve ser tratado como mera formalidade, mero preenchimento de etapas, pois se corre o risco de se estabelecer, ainda que informalmente, a imposição da vontade de poucos sobre a vontade de muitos, caso do projeto de transposição. A quem interessa a transposição? Quem será beneficiado com o projeto? Existe, realmente, a necessidade da execução do projeto de transposição do rio São Francisco? E a revitalização do rio, não deveria ser realizada antes, de uma possível transposição? O que falta no semi-árido nordestino é água, ou é gestão de águas?

15 Em meio a tantos questionamentos, uma pergunta se destaca e exige resposta: quando a nação brasileira se dará conta da insensatez que é a condução deste processo de transposição de águas do rio São Francisco que, além de desconsiderar as sérias ameaças à sustentabilidade e ao desenvolvimento futuro da bacia do rio São Francisco, ainda é um grande desperdício de recursos públicos, um verdadeiro estelionato das águas e uma afronta à participação popular? Esta dissertação está dividida em nove capítulos. O Capítulo 1, compreende a Introdução na qual delimitamos o tema, definimos os objetivos e discorremos as razões que nos levaram à escolha do tema da transposição do Rio São Francisco e a problemática que envolve tal transposição. O segundo Capítulo trata da questão do meio ambiente como direito fundamental de terceira geração abarcado pela Constituição Federal brasileira de 1988. Destacamos que o meio ambiente é um direito difuso, pois trata de interesses ou direitos transindividuais, de natureza indivisível de que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato. Apresentamos, ainda, o conceito de meio ambiente considerado como natural, artificial, cultural e do trabalho. O terceiro Capítulo aborda a questão da importância da água, desde os tempos antigos, até os dias de hoje, pois não há como analisarmos a questão do rio São Francisco, um recurso hídrico, sem percorrermos a questão da água ao longo da história. Nesse capítulo destacamos também os tratados e acordos internacionais nos quais a água foi de alguma forma protegida e abarcada. O quarto Capítulo analisa os princípios ambientais que são o alicerce da proteção do meio ambiente, apresentando, não todos os princípios consagrados pelos doutrinadores ambientalistas, mas os relevantes para a discussão neste trabalho. O quinto Capítulo aborda, exclusivamente, o princípio da participação ambiental, por ele ser a base de todo o estudo monográfico e por ser o efetivador do estado democrático e participativo. Nesse capítulo, os princípios da informação ambiental e da educação ambiental são desenvolvidos conjuntamente, uma vez que a participação popular se efetiva não apenas com a devida informação, mas também com a educação ambiental de toda a sociedade. A audiência pública é também abordada nesse capítulo, pois ela é um dos instrumentos estabelecidos pelas leis

16 ambientais que confirmam a participação democrática no processo decisório dos/nos assuntos que envolvem os interesses de toda a coletividade. O sexto Capítulo apresenta o modelo de gestão hídrica adotado no Brasil, apoiado na Lei 9.433/97, na Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos e na Lei 9.984/2000, sendo que esta dispõe sobre a criação da Agência Nacional de Águas (ANA). Destacam-se, ainda, os princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos da política de recursos hídricos, bem como a criação do sistema nacional de gerenciamento de recursos hídricos e do conselho nacional de recursos hídricos. De grande importância para o tema central do trabalho foi a discussão sobre a criação dos comitês de bacia responsáveis pela gestão participativa da água e um outro caminho para a concretização da participação democrática, devido à sua composição. Destaca-se entre eles o Comitê da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco. O sétimo Capítulo apresenta as características do Rio São Francisco e sua importância sócio-econômica para a região e para o país, destaca a urgência de sua revitalização, e analisa o projeto de transposição. Essa análise tem por finalidade: questionar os reais objetivos do projeto, suas intenções e quem seriam seus beneficiários. A resposta a todos esses questionamentos nos conduzirá à conclusão de que, na verdade, o objetivo primário do projeto é o acesso da água ao agronegócio e servir aos interesses das multinacionais cuja real intenção é acobertar privilégios políticos e econômicos, pois os reais beneficiários não serão as populações nordestinas mais carentes. No oitavo Capítulo, questionamos se, até o presente momento, foi efetivada a participação do Comitê da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco (CBHSF) no processo de transposição, uma vez que o CBHSF é o órgão consultivo e deliberativo nas questões que envolvem o processo de licenciamento ambiental e outorga de água na bacia do rio São Francisco. O capítulo discute, ainda, se foi devidamente efetivada a participação popular de todos os envolvidos no projeto e se foram observados e respondidos os questionamentos, dúvidas, opiniões, informações e manifestações de repúdio do povo, geralmente colocados nas audiências públicas em caráter obrigatório e não como mera formalidade administrativa. No nono capítulo, apresentamos nossas conclusões sobre as reais intenções que envolvem o projeto de transposição do Velho Chico. Com isso, apontamos

17 para a confirmação da total afronta ao princípio democrático da participação popular, resguardado na lei maior do estado, a Constituição Federal, pois o Comitê da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco não tem sido respeitado como órgão deliberativo e consultivo daquela bacia; isso porque as audiências públicas não concretizaram nem garantiram, ainda, o direito de participação, resguardado em lei, para todo o povo brasileiro. Essas discussões nos levam à confirmação de que os interesses econômicos e políticos ainda se arrogam o direito de esmagar e soterrar o direito de todo um povo, impedindo, por um lado, a consolidação de um estado democrático e legítimo e, por outro, concretiza a insatisfação de toda a sociedade civil, quando esta vê frontalmente aviltados e desconsiderados os espaços democráticos e legítimos construídos e conquistados passo a passo com a dimensão de cidadania, aquela que garante ao ser humano a condição de participante do controle social e da eleição de prioridades a serem implementadas pelo governo.

18 2 MEIO AMBIENTE 2.1 Conceito A expressão meio ambiente foi, como indicam os doutrinadores, utilizada pela primeira vez pelo naturalista francês Étienne Geoffroy de Saint-Hilaire, em sua obra Études Progressives d un Naturaliste, em 1835. É um equívoco afirmar que a conceituação de meio ambiente constitui tarefa fácil pois, como expressa Milaré (2001), o meio ambiente é uma daquelas categorias cujo conteúdo é mais facilmente intuído que definível, em virtude da riqueza e da complexidade da expressão. A palavra meio pode indicar: a metade de um inteiro, um modo para se alcançar algo, ou um dado físico ou social. A palavra ambiente pode representar um espaço geográfico, físico, natural ou artificial. José Afonso da Silva (2002) entende que a expressão meio ambiente é redundante, por possuírem as duas palavras o mesmo significado. Já Milaré (2001) contradiz Da Silva, afirmando que não existe redundância, pois são dois termos que se completam, e fecha a questão alegando que a expressão meio ambiente já é consagrada na língua portuguesa, nas leis e jurisprudências de nosso país. Meio ambiente seria todo o conjunto de interações físico-químicas, naturais, artificiais e culturais que propiciam a vida em toda a sua forma. Para Silva (2002), O conceito de meio ambiente há de ser, pois, globalizante, abrangente de toda a Natureza original e artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico, turístico, paisagístico e arqueológico. (SILVA José, 2002, p. 20) Coimbra, citado por Milaré (2001), define que: Meio ambiente é o conjunto de elementos físico-químicos, ecossistemas naturais e sociais em que se insere o Homem, individual e socialmente, num processo de interação que atenda ao desenvolvimento das atividades humanas, à preservação dos recursos naturais e das características essenciais do entorno, dentro de padrões de qualidade definidos. (COIMBRA apud MILARÁ, 2001, p. 65).

19 O conceito legal de meio ambiente e, consequentemente, seu reconhecimento como bem jurídico, está disciplinado na Lei 6.938/81, Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, em seu artigo 3, I, que o definiu como: o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas. (BRASIL, 2006b, p. 851). A Constituição Federal de 1988 não conceituou o que é meio ambiente, apenas esboçou uma idéia da sua importância para as gerações presentes e futuras, em seu artigo 225. Para Machado (200, 2a), o conceito dado à expressão meio ambiente é amplo, pois, estende seu campo de atuação tornando-o mais abrangente, já que pode atingir tudo aquilo que permite, abriga e rege a vida. Devido a essa abrangência, podemos entender a existência de: meio ambiente natural, que inclui os bens naturais tais como o solo, a água, a fauna e a flora; meio ambiente artificial, que se refere ao espaço urbano construído; meio ambiente cultural, que abrange a cultura de um povo, através dos bens e valores artísticos, estéticos, turísticos, paisagísticos, históricos e arqueológicos; meio ambiente do trabalho, que se refere à qualidade de vida no ambiente de trabalho. 2.2 Meio Ambiente - Um Direito Difuso Os interesses, ou direitos, difusos são transindividuais, de natureza indivisível, dos quais sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato. Segundo Mancuso (2004), os interesses difusos apresentam um grau de coletivização ainda mais abrangente do que o interesse geral ou público, pois enquanto estes têm a balizá-los os contornos de certos valores pacificamente aceitos, os interesses difusos, ao contrário, permitem toda sorte de posicionamento. Para Baracho Júnior (2000): A configuração dos interesses difusos demonstra sua íntima relação com problemas que estão sendo enfrentados em épocas recentes, tais como as relações de consumo, a preservação do patrimônio histórico, artístico, estético, cultural e paisagístico, a preservação, recuperação e melhoria do meio ambiente.

20 E, ainda, os direitos difusos são: Uma manifestação da existência ou do alargamento de necessidades coletivas individualmente sentidas, traduzindo um dos entrosamentos específicos de Estado e sociedade; e implica formas complexas de relacionamento entre as pessoas e os grupos no âmbito da sociedade política. (MIRANDA apud BARACHO JÚNIOR, 2000, p. 249) Watanabe, citado por Mazzilli (2005, p. 51), apóia a concepção tradicional de que à idéia de interesse ou direito está sempre ligada a de respectivo titular. Entretanto, quando a relação entre as pessoas se estabelece por dados de fato, há uma indefinição do número de pessoas e entre elas inexiste uma relação-base. Têmse aí os interesses difusos. As características básicas dos interesses difusos são a: a) indeterminação dos sujeitos: pois são referíveis a um conjunto indeterminado ou dificilmente determinável de sujeitos; b) indivisibilidade do objeto: são insuscetíveis de partição em partes atribuíveis a pessoas ou grupos preestabelecidos; c) intensa conflituosidade interna: os conflitos resultantes não guardam as características básicas dos conflitos tradicionais, como Tício versus Caio ; d) intensa transição no tempo e no espaço: os interesses podem aparecer e desaparecer no tempo e, assim, devido à situação em que o interesse se encontra, poderá reaparecer e se desenvolver, até a sua completa solução. O meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito de todos que independe de raça, nacionalidade, sexo ou condição financeira, não excluindo quem quer que seja. É direito de gozo coletivo e individual ao mesmo tempo; é, portanto, um direito difuso.

2.3 O Meio Ambiente Na Constituição Federal de 1988 - Um Direito Fundamental 21 Direitos Fundamentais são aqueles que as pessoas reconhecem como direito interno, delas mesmas, mas que só será direito fundamental se essas mesmas pessoas se reconhecerem no próximo e uns nos outros; só assim serão legítimos e democráticos. Ao afirmamos tratar-se de direitos que os cidadãos precisam reconhecer uns aos outros, e não que o Estado precisa lhes atribuir, tocamos no próprio núcleo do Estado Democrático de Direito, que, ao contrário do Estado Liberal e do Estado Social, não possui uma regra pronta e acabada para a legitimidade de suas normas, mas reconhece que a democracia é não um estado, mas um processo que só ocorre pelo interpretação entre a autonomia privada e a autonomia pública que se manifesta na sociedade civil, guardiã de sua legitimidade.(galuppo, 2003, p. 237) Sampaio (2004) afirma que os direitos ou liberdades de primeira geração têm sua origem nos séculos XVIII e XIX, séculos de separação entre Estado e Sociedade, introduzindo assim, os direitos civis e os direitos políticos. Os primeiros são aqueles que asseguram uma esfera mínima de autonomia individual, possibilitando o desenvolvimento da personalidade de cada um. Os direitos políticos estão centrados nos direitos de votar e ser votado, de postular um emprego público, de ser jurado ou testemunha, soldado e até contribuinte. Os direitos de segunda geração são os direitos sociais, econômicos e culturais, tendo o seu surgimento apoiado na Constituição Francesa de 1791 e 1848 e na Constituição Brasileira de 1824. Os direitos sociais são aqueles que conferem ao cidadão o direito à participação na vida da sociedade, à educação, à infância, à maternidade, à família. Os direitos econômicos compreendem garantir um nível mínimo de vida, o direito ao trabalho, a um salário digno, à previdência, ao vestuário e à moradia. Os direitos culturais são o incentivo e a preservação das formas de reprodução cultural das comunidades. Os direitos de terceira geração, segundo Sampaio, são conhecidos, também, como direito dos povos, direitos de solidariedade, de cooperação e de fraternidade.

A fraternidade embandeirada pela nova geração inspirou adicionalmente a idéia de que somos todos habitantes de um mesmo frágil mundo, a exigir um concerto universal, com vistas a manter as condições de habitabilidade planetária para as presentes e futuras gerações (SAMPAIO, 2004, p. 294). 22 Apresenta-se aí, o direito ao desenvolvimento sustentável, ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e a proteção à saúde, tornando acessíveis os remédios aos doentes. O direito à integridade do meio ambiente - típico direito de terceira geração - constitui prerrogativa jurídica de titularidade coletiva, refletindo, dentro do processo de afirmação dos direitos humanos, a expressão significativa de um poder atribuído, não ao indivíduo identificado em sua singularidade, mas, num sentido verdadeiramente mais abrangente, à própria coletividade social. Enquanto os direitos de primeira geração (direitos civis e políticos) - que compreendem as liberdades clássicas, negativas ou formais -realçam o princípio da liberdade e os direitos de segunda geração (direitos econômicos, sociais e culturais) - que se identificam com as liberdades positivas, reais ou concretas - acentuam o princípio da igualdade, os direitos de terceira geração, que materializam poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais, consagram o princípio da solidariedade e constituem um momento importante no processo de desenvolvimento, expansão e reconhecimento dos direitos humanos, caracterizados, enquanto valores fundamentais indisponíveis, pela nota de uma essencial inexauribilidade. (MATO GROSSO DO SUL, STF. Ap. Rel. Min. Celso de Mello, 1995). Meio ambiente - Direito à preservação de sua integridade (CF, art. 225) - Prerrogativa qualificada por seu caráter de metaindividualidade - Direito de terceira geração (ou de novíssima dimensão), que consagra o postulado da solidariedade - Necessidade de impedir que a transgressão a esse direito faça irromper, no seio da coletividade, conflitos intergeneracionais Os direitos básicos da pessoa humana e as sucessivas gerações (fases ou dimensões) de direitos (RTJ 164/158, 160-161) - A questão da precedência do direito à preservação do meio ambiente: uma limitação constitucional explícita à atividade econômica (CF, art. 170, VI) - Decisão não referendada - conseqüente indeferimento do pedido de medida cautelar. A preservação da integridade do meio ambiente: expressão constitucional de um direito fundamental que assiste à generalidade das pessoas. (SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ADI 3.540-MC, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 03 fev.2006). Os direitos de quarta geração, segundo Sampaio (2004), estão em fase de definição e ainda não são consenso entre os estudiosos. Para Bonavides, citado por Sampaio (2004), são os direitos de efetiva participação cidadã, ampliando, assim, as fronteiras democráticas e levando a um processo de efetiva participação dos povos nas tomadas de decisão, conduzindo à democratização da sociedade. A Constituição Federal, no artigo 225, caput, estabeleceu um verdadeiro direito fundamental da pessoa humana, pois o direito ao ambiente ecologicamente