Análise das tensões residuais em anéis para rolamentos do aço ABNT 52100 através do método do furo cego



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ISSN 1808-7310 Análise das tensões residuais em anéis para rolamentos do aço ABNT 5100 através do método do furo cego Carlos Otávio Damas Martins M. Sc. Eng. Laboratório de Metalurgia Física (LAMEF), Programa de Pós-graduação em Engenharia de Minas, Metalúrgica e de Materiais (PPGEM), UFRGS Av. Osvaldo Aranha, 99, s. 610 Porto Alegre, RS, Brasil CEP 90035-190 cmartins@demet.ufrgs.br Alexandre da Silva Rocha Prof. Dr. Eng. Laboratório de Transformação Mecânica, Departamento de Metalurgia, UFRGS Av. Bento Gonçalves, 9500, Agronomia Porto Alegre, RS, Brasil CEP 91501-970 alexandre.rocha@ufrgs.br Telmo Roberto Strohaecker Prof. Dr. Eng, Laboratório de Metalurgia Física (LAMEF), Programa de Pós-graduação em Engenharia de Minas, Metalúrgica e de Materiais (PPGEM), UFRGS telmo@demet.ufrgs.br Thomas K. Hirsch Priv.-Doz. Dr.-Ing. Hábil. chefe do Grupo de Física Analítica do Stiftung Institut für Wekstofftechnik Badgasteiner Str. 38359, Bremen, Alemanha hirsch@iwt-bremen.de Resumo As tensões residuais podem atuar beneficamente ou prejudicialmente no desempenho dos componentes mecânicos. Estas tensões também representam um dos principais potenciais para o aparecimento de distorções e mudanças dimensionais em componentes mecânicos durante o processo de manufatura. Por estes motivos são de grande importância a medida e o controle destas tensões. Neste trabalho, foram realizadas análises da variação das tensões residuais em anéis para rolamentos do aço ABNT 5100. Anéis retirados de três diferentes etapas do processo de fabricação (a saber, conformação, usinagem e têmpera) foram analisados através do método do furo cego para a determinação das tensões residuais. A partir dos valores de deformações obtidos, foram calculadas às tensões residuais nas direções axial e tangencial para cada componente a partir da superfície até uma profundidade de 1 mm. Os resultados mostram a variação das tensões residuais Abstract The Residual stresses can have benefical or detrimental behavior in the performance of the mechanical components. These stresses also represent one of the main potential causes for the appearance of distortions and dimensional changes in mechanical components during the manufacture process. For these reasons it is very important to measure and control the residual stress distribution in mechanical parts. In the present work, the analysis of the residual stress depth variation in some ball bearings steel rings were done by the Blind Hole Drilling Method. Rings in the forjed, machined and quenched state were analyzed for the residual stress determination. From the relived strain values, the residual stresses were calculated in the axial and tangential directions for each component from the surface until a depth of 1 mm. The results show the variation of the residual stresses in the component during the manufacture process. These data give an indication of how to proceed for improving and controlling the process, in order to contain the consequent 39

no componente devido a cada etapa do processo de manufatura, dando indícios de como proceder para um melhor controle e otimização do processo de fabricação a fim de conter as conseqüentes variações dimensionais do componente. dimensional variations of the component. Palavras-chave: anéis para rolamentos, tensões residuais, método do furo cego. Key words: ball bearing rings, residual stresses, blind hole drilling method. 1. Introdução Tensões residuais são as tensões elásticas presentes em um corpo (estrutura ou componente mecânico) na ausência de carregamentos externos e/ou gradientes de temperatura (Lu, 1996). As tensões residuais macroscópicas estão em equilíbrio para o corpo como um todo (Grant, 00; Kockelmann, 1993). Estas têm suas principais causas nos processos de manufatura. Na prática não existe corpo livre de tensões residuais, sendo que estas tensões podem ter um efeito benéfico ou prejudicial ao desempenho do componente frente aos esforços mecânicos, térmicos ou químicos. Devido a sua importância o controle e a medida das tensões residuais em componentes e estruturas mecânicas é continuamente alvo de intensivos estudos (Kockelmann, 1993; Micro Measurements, 1993; Lu, 1996; Hauk, 1997; Grant, 00). Um importante aspecto pode ser a associação das tensões residuais à ocorrência de distorções nos componentes mecânicos. O exemplo mais típico é a distorção que aparece após a têmpera de uma peça de aço, a qual precisa ser removida por retificação agregando a cada ano enormes custos à produção de componentes metálicos em todo o mundo. Estudos recentes vêm mostrando que essa distorção encontra suas causas não só nos procedimentos de têmpera, mas em todo o processo produtivo do componente (Hoffmann, 00). As tensões residuais são acumuladas no componente como conseqüência dos processos de fabricação. Estas tensões representam um risco (em potencial) de distorção, pois quando liberadas por processos termomecânicos, durante as próximas etapas do processo de manufatura, levam a mudanças de forma e dimensão do componente. Este potencial de distorção, não só representado pelas tensões residuais, mas também pela microestrura, distribuição de inclusões, textura, geometria, apenas citando os principais fatores, é modificado e transferido durante as etapas de fabricação (Lu, 1996; Hauk, 1997; Grant, 00; Boag, 00). Este trabalho apresenta um esforço no sentido de desenvolver técnicas versáteis e acuradas de determinar o estado de tensões residuais existente em um componente resultante de diferentes etapas de manufatura. Atualmente, existem muitos métodos para a medida e determinação das tensões residuais. Alguns são baseados na medida da deformação aliviada, devido à remoção localizada de material (métodos destrutivos). Outros são baseados na interação entre o campo de tensões residuais e as propriedades físicas do material (métodos não destrutivos) (Lu, 1996; Hauk, 1997). No presente trabalho, as análises de tensões residuais foram realizadas através do Método do Furo Cego. O Método do Furo Cego é um método semidestrutivo (sempre que o volume de material removido não for considerado prejudicial ao desempenho do componente ou puder ser reparado) baseado na medida da deformação aliviada, causada pela introdução de um pequeno furo cego na superfície do componente. 40

Geralmente, este furo é usinado através de pequenos incrementos e a deformação aliviada é medida em três direções por um extensômetro de resistência elétrica especial (ERE) (Lu, 1996; Hauk, 1997; Grant, 00). Como as tensões residuais não são completamente aliviadas na região do furo, não é possível calculá-las através da lei de Hooke. Assim o método exige uma etapa de calibração experimental ou computacional (Kockelmann, 1993). Para o cálculo das tensões residuais é necessário medir-se as deformações em três direções diferentes e conhecidas, atuando no mesmo plano. Assim, pode ser provado analiticamente que as tensões residuais principais apresentam a relação com a deformação radial medida nos três extensômetros descrita pela equação 1 (Lu, 1996; Hauk, 1997; Grant, 00): σ max σ min = ε 3 ε 1 ( ε 3 ε 1 ) + ( ε 3 ± 4 A 4 B + ε 1 ε ) [1] Onde σ max e σ min são as tensões residuais principais máximas e mínimas atuando num plano paralelo a superfície, ε 1, ε, ε 3 são as deformações aliviadas medidas nos ERE s 1,, 3, respectivamente e constantes de calibração. Os valores numéricos para as constantes de calibração _ A e usado, das propriedades do material e do raio e da profundidade do furo. _ A e _ B são _ B dependem da geometria do extensômetro A partir da equação 1 e da distribuição das tensões residuais no componente vários procedimentos podem ser adotados para o cálculo das tensões residuais. As principais diferenças entre os métodos de cálculo são as hipóteses consideradas para a distribuição de tensões residuais no componente e o procedimento para o cálculo das constantes de calibração A e B (Grant, 00). Um dos métodos mais sensíveis para o cálculo das tensões residuais em componentes mecânicos é o Método de Kockelmann (Kockelmann, 1993). Neste método, A calibração é efetuada uma vez através da usinagem de um pequeno furo em um corpo de prova, contendo um estado conhecido de tensões residuais não uniformes, sujeito ao carregamento uniaxial. As deformações na direção de carregamento (ε x ) e na direção perpendicular (ε y ) são registradas a cada passo [Kockelmann, 1993; Synt technology, 00]. A partir destas medidas e com auxílio do círculo de Mohr de tensões, pode-se provar que a relação entre as tensões residuais principais e as tensões residuais atuando na direção de cada ERE é dada pela Equação : σ ( ξ) σ ( ξ) + σ ( ξ) 1 max a b = ± ( σ ( ξ) σ ( ξ)) ( σ ( ξ) σ ( ξ)) σmin( ξ) a b + c b [] 41

O ângulo principal, que indica a direção da tensão residual principal máxima, é obtido a partir da Equação 3: β ( ξ ) 1 σ b( ξ ) σ a( ξ ) σ c( ξ ) arctan σ ( ξ ) σ ( ξ ) = [3] a c Onde ξ é um valor adimensional igual ao quociente da profundidade do incremento pelo diâmetro final do furo. O Método de Kockelmann apresenta resultados tão consistentes quanto os resultados obtidos através do cálculo das tensões residuais não uniformes realizado com o Método da Integral (método mais utilizado mundialmente), apresentando como vantagem adicional, uma sensibilidade menor aos erros de instrumentação e medidas de deformação. Isso ocorre por que é impossível simular numericamente todas as condições do ensaio e dos materiais. Deste modo a calibração experimental apresenta maior representatividade na determinação do perfil de tensões residuais presente nos componentes mecânicos (Kockelmann, 1993; Grant, 00). O presente trabalho visa à análise da distribuição de tensões residuais com a profundidade para amostras de anéis para rolamentos do aço ABNT 5100, decorrentes de diferentes etapas do processo de manufatura. Para tal, foram ensaiados anéis nos estados: forjado, usinado e temperado. Foram realizadas medidas das tensões residuais através do Método do Furo Cego. Onde as tensões residuais foram calculadas através do Método de Kockelmann, destinado para o cálculo das tensões residuais que apresentam variação não uniformemente distribuída com a profundidade.. Procedimento experimental.1. Material e etapas de fabricação As amostras analisadas foram selecionadas de três etapas diferentes do processo de manufatura de anéis para rolamentos do aço ABNT 5100. A tabela 1 apresenta a composição química dos aços utilizados neste trabalho. Tabela 1: Composição química dos aços ABNT 5100. Elemento C Si Mn P S Cr Ni Cu Percentual (%) 0,966 0,36 0,468 0,008 0,005 1,580 0,107 0,110 O processo de manufatura destes anéis consiste nos seguintes passos: 1) Parte-se de um cilindro esferoidizado o qual é forjado, puncionado, cortado e laminado em temperaturas entre 1050 e 1150 C (processo de conformação). Após esta etapa, os anéis são esferoidizados em temperaturas entre 700 e 800 C (por cerca de oito horas) e resfriados lentamente. Após o resfriamento, os anéis são jateados com areia visando à remoção de carepa e melhoria das condições superficiais. Nesta etapa, os anéis possuem um diâmetro externo de 150 mm, espessura de 0 mm e largura de 6 mm. 4

) Na usinagem da superfície externa do anel, este é fixado pela sua superfície interna por um sistema de sujeição que exerce pressão em três regiões distanciadas a 10 graus, gerando desta forma deformações plásticas e tensões residuais não uniformes. A usinagem é efetuada em pequenos passes, a uma velocidade de rotação da peça de 300 m/min com um avanço de corte de 1 mm/h. No final deste processo, os anéis possuem um diâmetro externo de 145mm, espessura de 1 mm e largura de 6 mm e estão prontos para serem temperados. 3) A têmpera se caracteriza pelo aquecimento do aço a 850 C, onde este é mantido por 5 minutos, seguido do resfriamento rápido em óleo. Após a têmpera os anéis podem ser revenidos para o alivio de tensões. Neste trabalho o estado de tensões residuais após revenimento não foi abordado. Durante este processo, parte-se de uma microestrutura ferrítica contendo carbetos esferoidizados, com um limite de escoamento de 500MPa e uma dureza superficial aproximada de 0 Rockwell C, para uma microestrutura martensítica, com um limite de escoamento de 033 MPa e uma dureza aproximada de 64 Rockwell C (para o anel temperado, ainda não revenido)... Procedimentos para a avaliação das tensões residuais As medidas pelo método do furo cego foram realizadas com auxilio do equipamento MTS 3000 da HBM (figura 1), onde furos de mm de profundidade foram usinados em diferentes posições angulares da superfície externa dos anéis para rolamentos. Os furos foram usinados em 35 passes distribuídos polinomialmente de modo a se obter um número maior de medidas próximas à superfície. Os resultados são apresentados para as direções as direções axial e tangencial, seguindo a convenção descrita pela figura. Figura 1: Visualização da montagem do equipamento para a medida das tensões residuais nos anéis para rolamentos através do método do furo cego. 43

Figura : Disposição da roseta extensométrica e direções nos anéis para rolamentos. Os demais parâmetros relevantes destas medidas foram: velocidade de avanço da broca (0,07 mm/min), tipo de extensômetro utilizado (MM EA 0,6RE 10), diâmetro médio do furo (~1,9 mm), diâmetro da broca (1,8 mm), tempo de medida (1 hora por furo), sistema de usinagem do furo (turbina de alta velocidade). 3. Resultados As figuras 3 e 4 apresentam os resultados da determinação da variação das tensões residuais pelo método do furo cego, calculadas pelo método de Kockelmann, para as direções axial e tangencial nas diferentes etapas do processo de manufatura dos anéis de rolamentos do aço ABNT 5100. Percebe-se que as tensões residuais variam de compressivas a trativas ao longo do processo de manufatura. A distribuição destas tensões para o anel conformado é devida, predominantemente, à deformação plástica da região superficial causada pelo processo de forjamento. As tensões residuais originadas durante o processo de usinagem são decorrentes da deformação plástica e do aquecimento da superfície durante este processo. Para o material no estado temperado, a origem das tensões residuais é, principalmente, devido às transformações metalúrgicas, que são acompanhadas por uma mudança na estrutura cristalina do material. Figura 3: Resultados obtidos através do método do furo cego para as tensões residuais calculadas através do método de Kockelmann na direção axial. 44

Figura 4: Resultados obtidos através do método do furo cego para as tensões residuais calculadas através do método de Kockelmann na direção tangencial. A figura 5 apresenta a variação da direção principal máxima, a partir do ERE 1. Figura 5: Direções principais máximas obtidas através do método do furo cego. 4. Discussões Um alívio significativo das tensões residuais geradas na conformação é esperado do processo de esferoidização. O posterior processo de jateamento deforma as camadas superficiais plasticamente, contribuindo para o desenvolvimento de um estado de tensões residuais compressivas nesta região, o que pode ser visto nas figuras 3 e 4. As tensões residuais de maior magnitude estão localizadas na superfície da peça, por ser esta a região que sofre maior plastificação durante o processo. As Tensões residuais resultantes da usinagem têm origem na complexa interação entre as deformações plásticas e as taxas de transferência de calor na superfície. Enquanto a deformação plástica (encruamento) tende a gerar tensões compressivas, o calor tende a gerar tensões trativas nas camadas superficiais. As regiões mais internas sofrerão maior encruamento em comparação à superfície, de forma que tipicamente um mínimo nas tensões é observado a 0,1mm abaixo da superfície (figuras 3 e 4). A máxima tensão residual trativa na direção tangencial (figura 3) é devido à ação combinada do processo de fixação da peça, da remoção de material e do aquecimento da superfície durante o processo de usinagem. Contudo, percebese que estas tensões trativas distribuem-se apenas em baixas profundidades. 45

A austenitização (na temperatura de têmpera, 850 C) relaxa totalmente as tensões residuais no componente, causando mudanças dimensionais no anel. Devido ao resfriamento rápido e as transformações de fase, novas tensões são geradas na peça durante este processo. A distribuição de tensões residuais predominantemente trativas (figuras 3 e 4) é decorrente deste processo de transformação de fase. Contudo percebe-se que estas tensões são inferiores a 10% do limite de escoamento do material no estado endurecido. A direção axial, figura 3, foi a que apresentou variação mais acentuada nos resultados obtidos. As tensões residuais de maior magnitude estão localizadas na superfície, para o anel conformado, e nas regiões subsuperficiais (aproximadamente 0,1 mm) para os anéis usinado e temperado. Devido ao principio de equilíbrio, tensões levemente trativas, compressivas ou nulas poderão ser observadas no núcleo da peça para contrapor as tensões na região próxima da superfície. A figura 5 mostra a variação da direção principal em função do processo de manufatura dos anéis para rolamento em um ângulo no sentido anti-horário a partir do ERE1. Percebe-se que as tensões residuais principais variam em direção durante este processo. No primeiro estágio, as tensões residuais máximas estão próximas a 45, mostrando a grande homogeneidade da distribuição durante o processo de conformação. Na usinagem as tensões residuais mínimas seguem a direção de usinagem, ou seja, próximas à direção tangencial. E na têmpera estas tensões apresentam-se mais próximas à direção axial, principalmente devido à expansão da estrutura durante a transformação martensítica. Durante o processo de manufatura destes anéis para rolamento pode-se afirmar que a velocidade de impacto no processo de jateamento, a velocidade de avanço durante o processo de usinagem e a velocidade de resfriamento durante o processo de têmpera são fundamentais para a distribuição de tensões residuais e para a ocorrência de mudanças dimensionais nos componentes mecânicos. O baixo controle das tensões residuais durante o processo de manufatura pode resultar na ocorrência de distorções e nucleação de defeitos no componente, fazendo necessário à introdução de mais uma etapa no processo ou levar ao descarte da peça, o que por sua vez, encarece o custo final do componente. 5. Conclusões Através de um estudo preliminar sobre as características do processo foi possível prever as variações de tensões residuais nos componentes, as quais foram, posteriormente, melhores determinadas através do método do furo cego; Os resultados apresentados mostram que a distribuição de tensões residuais varia de compressiva a trativa ao longo do processo, sendo a direção axial a que apresenta variação mais pronunciada; A presença de tensões residuais trativas na superfície dos anéis usinados é causada pelo aquecimento da peça durante a usinagem, porém esta se restringe apenas a baixas profundidades; É difícil predizer, apenas com os resultados obtidos da análise das tensões residuais, se os componentes sofrerão distorções nas etapas finais do processo, contudo, pode-se afirmar que a taxa 46

de redução no processo de forjamento, a velocidade de avanço durante o processo de usinagem e a velocidade de resfriamento durante o processo de têmpera são fundamentais para a distribuição de tensões residuais e para a ocorrência de distorções na peça; Os baixos valores encontrados para a distribuição de tensões residuais apontam para um processo bem controlado onde a presença de defeitos, decorrentes das variações dimensionais, é pouco provável. 6. Agradecimentos Os autores gostariam de agradecer ao apoio da DFG e do DAAD (Alemanha) e da Capes e do CNPq (Brasil). 7. Referências BOAG, J.M.; FLAMAN, M.T. e HERRING, J.A. 00. Handbook of Residual Stress and Deformation. ASM, p. 1-6. GRANT, P.V. et al. 00. Measurement Good Practice Guide No. 53. UK, National Physical Laboratory, 53 p. HAUK, V. 1997. Structural and Residual Stress Analysis by Non-destructive Methods. Elsevier, 654 p. HOFFMANN, F.; KEßLER, O.; LUBBEN, Th. e MAYR, P. 00. Distortion Engineering -Verzugsbeherrschung in der Fertigung. HTM, 57(3):13-17. KOCKELMANN, H. e SCHWARZ, T. 1993. Die Bohrlochmethode ein für viele Anwendungsbereiche optimales Verfahrenzur experimentellen Ermittlung von Eigenspannungen. MTB von HBM, 9():33 38. LU, J. 1996. Handbook of Measurement of Residual Stresses. SEM Inc., 54 p. MICRO MEASUREMENTS. 1993. Tech Note TN 503 4. 15 p. SYNT TECHNOLOGY. 00. Manual do Equipamento MTS 3000. Italia, 48 p. 47