PARASITOSES EM PEQUENOS ANIMAIS DA COMUNIDADE DO MATADOURO: DIAGNÓSTICO, TRATAMENTO E CONSCIENTIZAÇÃO Priscilla Helena Aniboleti Machado 1; Daniela Fernandes Stelzer 1 ; Raphaela Cricco Guidi 2 ; Glaydston Cancella Corrêa 2 ; Adriana Jardim de Almeida 3 ; Ana Bárbara Freitas Rodrigues 4 ; João Carlos de Aquino Almeida 5 1 Estudante do Curso de Graduação em Medicina Veterinária, LCCA, CCTA, UENF. priscilla.uenf@gmail.com; dani.auer@hotmail.com 2 Bolsista Universidade Aberta, Laboratório de Clínica e Cirurgia Animal (LCCA), Centro de Ciências e Tecnologias Agropecuárias (CCTA), Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF). rcgcricco@yahoo.com.br, glaydstoncancella@hotmail.com 3 Professora do Departamento de Terapêutica / Saúde no Ecossistema, LCCA, CCTA, UENF. jardim@uenf.br 4 Professora do Departamento de Anatomia dos Animais Domésticos, LMPA, CCTA, UENF. zana@uenf.br 5 Professor do Departamento de Fisiologia e Bioquímica de Microorganismos, LFBM, CBB, UENF. jalmeida@gmail.com RESUMO O objetivo deste projeto é o diagnóstico e tratamento das principais parasitoses circulantes em cães e gatos criados na comunidade do matadouro, com ênfase nas principais verminoses e hemoparasitoses de interesse em saúde pública, assim como o tratamento dos animais positivos, gratuitamente. Adicionalmente, busca-se a conscientização da população local quanto à necessidade de medidas profiláticas para que haja a redução da contaminação humana por estes agentes. Foram visitadas 33 famílias, com o total de 80 animais, sendo 75 da espécie canina e cinco da espécie felina. Das 119 amostras, 39 são de fezes e 80 de ponta de orelha. As amostras de sangue periférico foram distendidas em lâminas de vidro, sendo empregada a técnica de coloração em Panótico. A terapia utilizada, nos animais positivos para Rickettisiales, foi Oxitetraciclina LA, 20 mg/kg, intramuscular, a cada 48 horas durante 7 dias e Dipropionato de Imidocarb, 5 mg/kg, subcutâneo, para animais positivos para Babesia spp.todos animais atendidos foram tratados para a prevenção de infestações por ectoparasitos através da administração tópica de Fipronil a 1%. Nas amostras de fezes foram empregadas as técnicas de Willis e de Ziehl-Neelsen modificadas, visando a observação dos parasitas. Do total de 39 amostras fecais, apresentaram-se 11 negativos e 28 positivos, dentre os quais seis para Trichuris spp., 13 para Ancylostoma spp., seis para Ancylostoma spp. e Trichuris spp., duas para Ancylostoma spp. e Toxocara spp., uma para Toxocara spp. Até o momento dos 79 animais analisados, 10 foram positivos para hemoparasitas, e 28 para helmintos. PALAVRAS-CHAVES: Hemoparasitas; Helmintos; Canina; Felina. 1
INTRODUÇÃO A convivência com animais domésticos resulta em significantes benefícios para a sociedade, no entanto, os mesmos podem constituir importante fonte de infecção humana, determinando doenças genericamente denominadas zoonoses. Dentre os agentes capazes de causar enfermidades gastrointestinais estão os pertencentes ao Gênero Cryptosporidium. Parasitos deste Gênero são capazes de infectar pessoas de todas as idades, apesar da doença ser mais comum e severa em crianças (QUIGLEY, 2001). Outras zoonoses são comuns na região, como a ancilostomose, causada pelo helminto Ancylostoma sp. A doença manifesta-se quando as larvas infectantes penetram pela epiderme e vagueiam no tecido subcutâneo, provocando erupções serpiginosas, pruriginosas, distribuídas principalmente nas regiões do corpo que entram em maior contato com o solo: pés, pernas, nádegas, mãos e antebraços e, mais raramente, boca, lábios e palato (NEVES, 2005). Com relação às hemoparasitoses, pode-se dizer que, as mais freqüentes em caninos na região Norte Fluminense, são causadas por bactérias e protozoários intracelulares. Dentre estes microorganismos, a Ehrlichia spp., um organismo riquetsial, foi observada em material analisado proveniente de aproximadamente 14% dos cães de diferentes raças, idades e sexo, domiciliados em Campos dos Goytacazes, RJ (ALBERNAZ et al., 2007). Esta doença é considerada zoonose e sua sintomatologia clínica inclui febre, depressão, cefaléia, calafrios, podendo levar à insuficiência renal, hepato e esplenomegalias na doença avançada (OCCI, 2001; MURRAY et al., 1990). A transmissão ocorre após a inoculação dérmica dos parasitos por carrapatos infectados, podendo atingir diversas espécies de animais domésticos. Este trabalho de pesquisa teve como objetivo o diagnóstico de parasitoses circulantes nos animais domésticos da Comunidade do Matadouro, realização de medidas profiláticas e tratamento dos mesmos. Além destas metas, o trabalho de conscientização da população local quanto à necessidade de medidas profiláticas e curativas e o estímulo da prática diária de cuidados higiênico-sanitário e ambiental são praticados constantemente. METODOLOGIA Foram visitadas 33 famílias da Comunidade Matadouro, onde foi esclarecido o objetivo do projeto. Os animais foram avaliados clinicamente e foram feitas coletas de amostras de sangue periférico (extremidade de orelha), sendo distendidas em lâminas de vidro. As amostras foram identificadas individualmente e levadas ao Laboratório de Clínica e Cirurgia Animal, onde foi realizada a coloração em Panótico rápido. Após a coloração, realizou-se a leitura em microscópio óptico para a observação de hemoparasitas no aumento de 100 vezes. Nos animais positivos para Rickettsiales, foi utilizada a medicação a base de Oxitetraciclina LA na dosagem de 20 mg/kg, intramuscular, a cada 48 horas durante 7 dias. Para os animais positivos para Babesia spp utilizou-se o Dipropionato de Imidocarb na dosagem de 5 mg/kg, subcutâneo. Para o material fecal foi empregada a técnica de Willis para identificação dos parasitas gastrointestinais, e a técnica de Ziehl-Neelsen modificada para a observação de oocistos de Cryptosporidium spp. Nos animais positivos para verminoses gatrointestinais foram utilizados vermcidas a base de Praziquantel (50mg), Pamoato de pirantel (144mg) e Febantel (150mg) em dose única. Todos os animais foram tratados de forma profilática com a administração tópica de Fipronil a 1% para o controle da infestação por ectoparasitas, principalmente carrapatos. Os proprietários de animais positivos foram instruídos com relação ao tratamento e prevenção de recidivas. 2
As palestras educativas que são realizadas na Comunidade do Matadouro têm os objetivos de esclarecer o assunto e instruí-los sobre as principais medidas profiláticas e de cuidados básicos com animais domésticos. RESULTADOS E DISCUSSÃO Foram cadastradas 33 famílias da comunidade Matadouro, em Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro, do mês de Abril a Agosto de 2012. Foram coletadas 119 amostras, sendo 80 amostras de sangue periférico (Tabela 1) e 39 de material fecal (Tabela 2). No momento das coletas, todos os animais apresentavam-se assintomáticos. Tabela 1: Resultados das análises laboratoriais para pesquisa de hemocitozoários em caninos e felinos em Campos dos Goytacazes, RJ Espécie Macho Fêmea Pesquisa de Hemocitozoários Positivo Negativo Total Canina 38 37 10 65 75 Felino 01 04-05 05 Total 39 41 10 (12.5%) 70 (87,5%) 80 Das 80 amostras coletadas de sangue periférico em ponta de orelha para pesquisa de hemocitozoários, 12,5% animais estavam positivos, sendo três (3,75%) para Rickettisiales e sete (8,75%) para Babesia spp. Através da análise da Tabela 1, observa-se que a porcentagem de animais positivos em nosso trabalho, de 12,5%, foi inferior a encontrada por Sales et al. (2008), de 15,7% nos animais dessa mesma comunidade e foi superior ao encontrado por Mariano et al. (2009), de 10,9% e por Almeida et al. (2010), de 9,7%. Os resultados encontrados se aproximam dos obtidos em um estudo realizado por Albernaz et al. (2007), na mesma comunidade onde se obteve cerca de 13,89% de cães positivos. O aumento da porcentagem de cães positivos para o ano de 2012 na Comunidade do Matadouro pode ser justificado pelo fato de que duas ninhadas de caninos, sendo criados no mesmo ambiente, e com alto índice de infestação por carrapatos, apresentaram 50% de positividade para hemoparasitos, sendo que dos 12 filhotes, seis foram considerados positivos em lâminas. O método de diagnóstico por esfregaço sanguíneo é específico, e muito utilizado devido ao seu baixo custo, porém pouco sensível (DELL PORTO et al., 1993), sendo então, indicado para o diagnóstico na fase aguda da infecção, podendo apresentar falsos negativos na fase de baixa parasitemia, o que não descarta uma possível infecção (PASSOS et al., 2005). Na prática, o esfregaço sanguíneo deve ser associado às alterações sanguíneas, para um melhor diagnóstico. A sorologia tem um importante papel nas fases subclínica e crônica da doença (NAKAGHI, 2008), com as técnicas de Imunofluorescência Indireta, Western Immunoblot (MATTHEWMAN, 1993), dot -blot ELISA (ANDEREG; PASSOS, 1999); Reação em Cadeia da Polimerase e isolamento e cultivo da E. canis de sangue e tecidos (IQBAL; RIKIHISA, 1994) são exemplos de outras técnicas que possibilitam um diagnóstico mais preciso e sensível, por outro lado não são realizados como rotina de diagnóstico devido ao alto custo. Tabela 2: Resultados das análises parasitológicas de fezes em caninos em Campos dos Goytacazes, RJ Espécie Macho Fêmea Parasitológico de fezes Positivo Negativo Total Canina 21 18 28 11 39 Total 21 18 28 (71,8%) 11 (28,2%) 39 3
Das 39 amostras de fezes coletadas 71,8%, estavam positivas para parasitas gastrointestinais, resultado superior ao encontrado em um estudo de HUBER et al., (2005) realizado no Rio de Janeiro, de 50,6%. Foram encontrados ovos dos seguintes parasitas, Ancylostoma spp., Toxocara spp., e Trichuris vulpis. Das 28 amostras positivas oito (28,6%) apresentavam infecções associadas, sendo que seis (75%) apresentavam associação do Ancylostoma spp. com Trichuris vulpis, e duas (25%) estavam positivas para Ancylostoma spp. e Toxocara spp. Estes números foram inferiores aos resultados encontrados por Ederli, (2006) em cães domiciliados na região de Campos dos Goytacazes. Outro estudo realizado em Campos dos Goytacazes com 68 cães domiciliados em 2008, obteve resultado positivo para Ancylostoma spp, em 44,12% das amostras (MIRANDA, et al.; 2008), sendo superior ao encontrado nesse estudo, de 42,86%. Estes dados são de extrema importância em Saúde Pública, já que estes parasitos são os agentes causadores de patologias como a Larva Migrans Cutânea (LMC) e a Larva Migrans Visceral (LMV) em humanos (SANTARÉM et al., 2004). A LMC é uma dermatite provocada pela migração de larvas de nematóides em um hospedeiro não habitual. No homem, essa afecção geralmente é causada por larvas de ancilostomídeos de cães e gatos, como Ancylostoma caninum, A. braziliense e A. tubaeforme (SANTARÉM et al., 2004). CONCLUSÃO Este estudo demonstra o alto índice de animais infectados por endoparasitas na Comunidade estudada, principalmente por Ancylostoma spp. É possível inferir também que os hemoparasitas continuam sendo prevalentes Comunidade do Matadouro, e que o diagnóstico com o posterior tratamento desses animais em conjunto com o trabalho de conscientização, quanto à prevenção da doença constituem extrema importância para a redução do mesmo. AGRADECIMENTO Agradecemos ao Setor de Patologia Clínica LCCA/CCTA/UENF, sob a orientação do professor Antônio Peixoto Albernaz, à Pró-Reitoria de Extensão, e aos membros da Comunidade do Matadouro pela colaboração com a equipe responsável pelo Projeto. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALBERNAZ, A. P., MIRANDA, B. J. F., JUNIOR, M. A. O., MACHADO, A. J., FAJARDO, V, H. Erliquiose canina em campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro, Brasil. Ciência Animal brasileira, v.8, n.4, out/dez., 799-806 p., 2007. ALMEIDA, J.A., ALBERNAZ, A.P., PIMENTEL, F.F., STELZER, D.F. Hemoparasitoses em pequenos animais: um projeto social como estratégia profilática. VIII Workshop de Extensão da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro, 2010. ANDEREG, P. I.; PASSOS, L. M. F. Erliquiose canina revisão. Clínica Veterinária, n. 19, p. 31-38, 1999. DELL'PORTO, A.; OLIVEIRA, M. R. ; MIGUEL, O. Babesia canis in stray dogs of São Paulo. Comparative studie between the clinical and hematological aspects and the indirect fluorescent antibody test. Revista Brasileira de Parasitologia Veterinária, São Paulo, v. 2, n. 1, p. 37-40, 1993. EDERLI, B.B., Fatores de Risco associado a infecção por Cryptosporidium sp em Cães Domiciliados na Cidade de Campos dos Goytacazes Estado Rio de Janeiro. Tese (Doutorado em Saúde Animal), Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro UENF RJ, 2006,115p. 4
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