Pessoas Politicamente Expostas e os novos mecanismos legais de controle preventivo da lavagem de capitais utilizados pelas CVM e SPC



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Transcrição:

Pessoas Politicamente Expostas e os novos mecanismos legais de controle preventivo da lavagem de capitais utilizados pelas CVM e SPC Professor Doutor Marco Antônio de Barros i Professor da Faculdade de Direito - UPM Sumário: 1 - Uma década de vigência da Lei de Lavagem de Capitais. 2 - Novas instruções da CVM e da SPC. 3 - Pessoa Politicamente Exposta. 4 - Quem deve fiscalizar. 5 - Rigorosa supervisão das operações realizadas por PPE. 6 - Financiamento ao terrorismo. 7 - Tentando simplificar. 8 - Compliance e as pessoas potencialmente suspeitas. Palavras-chave: CVM; SPC; BACEN; pessoas politicamente expostas; lavagem de capitais; mercado de capitais. 1. Uma década de vigência da Lei de Lavagem de Capitais A Lei de Lavagem de Capitais (9.613, de 03.03.1998) acaba de completar 10 anos de plena vigência. Durante a primeira década de sua existência foi possível notar que os dispositivos penais, processuais, civis e administrativos nela previstos, ao menos sob o aspecto formal, foram constantemente utilizados por autoridades incumbidas de realizar investigações e de apurar os fatos em juízo, tudo no exercício da persecução penal que busca combater esse novo modelo de criminalidade mundial. É certo que os ilícitos de lavagem de capitais se tornaram mais atrativos para os criminosos a partir das facilidades 1

proporcionadas pelo evento da globalização. Sobretudo em razão do rápido e incontrolável acesso à moderna tecnologia eletrônica, com a qual se interage no espaço virtual em que são obtidas ou transmitidas informações em tempo real, muitas vezes sem deixar pistas dos caminhos percorridos. Essa realidade se transformou em preocupação mundial, especialmente para os governos das nações mais ricas do planeta, a ponto de configurar um dos objetos jurídicos de maior atenção para o chamado Direito Penal Econômico, ramo da ciência penal que se encontra em evidente estágio de fortalecimento nacional e internacional. Trata-se assim de fenômeno que se confirma na medida em que grande parte dos Estados recorre à criação de semelhantes normas internas de caráter punitivo para enfrentar os lavadores. Nota-se que há uma crescente aproximação textual das normas internacionais no campo repressivo. Além disto, a Lei de Lavagem de Capitais, no âmbito interno, continua a sua trajetória produtora de reflexos paralelos, que se somam à lenta, silenciosa e abrangente difusão de sua vertente normativa multidisciplinar. Sobretudo no campo das medidas preventivas, notadamente em áreas vinculadas ao domínio do poder econômico, incorpora-se, a cada ano, um novo conjunto de normas baixadas por meio de portarias, circulares, instruções etc., expedidas por órgãos reguladores incumbidos de fiscalizar a legalidade e o regular funcionamento das operações realizadas pelos entes que compõem os sistemas econômico e financeiro em atividade no País. 2

2. Novas instruções da CVM e da SPC Nesse sentido, como prova inequívoca de que tais ajustes complementares continuam a ser alinhavados nos múltiplos territórios de atuação de órgãos que atualmente formam uma trincheira solidária no combate à lavagem de dinheiro, vamos aqui destacar alguns tópicos de duas recentes instruções baixadas por agências reguladoras nacionais. Uma refere-se à Instrução CVM 463, de 08 de janeiro de 2008, expedida pela Comissão de Valores Mobiliários. Dispõe sobre procedimentos a serem observados para o acompanhamento de operações realizadas por pessoas politicamente expostas. Na verdade, esta instrução modifica a redação da anterior Instrução CVM 301, de 16 de abril de 1999, ainda em vigor, a qual dispõe sobre a identificação, cadastro, registro de operações, bem como da comunicação, limites e a responsabilidade administrativa das pessoas de que tratam os incisos I e II do art. 10, combinados com os incisos I e II do art. 11, e combinados, ainda, com os arts. 12 e 13, todos da Lei 9.613/1998 (Lei de Lavagem de Capitais). Em outras palavras, a Instrução 301/99 versa sobre procedimentos de prevenção à lavagem no âmbito das operações realizadas no mercado de capitais. Cuida, a segunda, da Instrução SPC 20, de 1º de fevereiro de 2008, expedida pela Secretaria de Previdência Complementar do Ministério da Previdência Social, que revogou a Instrução SPC 18, de 09.11.2007. Por esta instrução se estabelecem as orientações e procedimentos a serem adotados pelas Entidades Fechadas de Previdência Complementar EFPC, 3

em atenção ao disposto no art. 9º da mencionada Lei 9.613/1998, bem como no acompanhamento das operações e das propostas de operações realizadas por pessoas politicamente expostas. Acrescenta-se que as duas instruções estendem a aplicação de tais orientações e procedimentos ao combate de financiamento ao terrorismo. 3. Pessoa Politicamente Exposta Os novos procedimentos de fiscalização introduzidos pelas aludidas instruções baixadas pelas CVM e SPC têm um alvo certo: a Pessoa Politicamente Exposta (PPE). Antes de mencionarmos a extraordinária dimensão que as autoridades administrativas estão atribuindo à categoria de pessoa politicamente exposta, é preciso lembrar que este não é um assunto desconhecido em matéria de combate à lavagem de capitais. De acordo com o Dec. 5.687, de 31.01.2006, o Brasil definitivamente levou avante o cumprimento e a execução da norma prevista no art. 52, da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção. Tal preceito dispõe sobre o compromisso firmado entre os Estados participantes do acordo, no sentido de se estabelecer procedimentos legais preventivos a serem cumpridos pelas pessoas jurídicas e físicas incumbidas de observar as normas de fiscalização, aplicáveis à relação de negócios e movimentações financeiras mantidas com os clientes considerados pessoas politicamente expostas. De se ressaltar que essa nova estratégia preventiva de acompanhamento das operações econômicas e financeiras realizadas por políticos e funcionários públicos de primeiro e 4

segundo escalão consiste na integração de um banco de dados. Neste são armazenadas todas as informações financeiras e fiscais, a fim de facilitar o posterior acesso ao arquivo, independentemente de prévia autorização judicial. Nisto se constituiu uma das metas fixadas em dezembro de 2005 pela ENCCLA Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro, estabelecida sob a coordenação do Gabinete de Gestão Integrada de Prevenção e Combate à Lavagem de Dinheiro GGI-LD, que é secretariado pelo Departamento de Recuperação de Ativos Ilícitos e Cooperação Jurídica Internacional DRCI do Ministério da Justiça. Desse modo, atendendo à Recomendação 6 do GAFI Group d Action Financière sur lê Blanchiment de Capitaux e às orientações emanadas do COAF Conselho de Controle de Atividades Financeiras, saiu na frente o Banco Central do Brasil BACEN, ao baixar a Circular 3.339/2006, que passou a produzir efeitos a partir de 02.07.2007, para ser cumprida pelos bancos múltiplos, bancos comerciais, caixas econômicas, cooperativas de crédito e associações de poupança e empréstimo, cujas entidades devem adotar outras providências complementares quando o cliente depositante for pessoa politicamente exposta. Sucede que as novas instruções da CVM e da SPC dão maior amplitude ao significado da expressão. De tal sorte que, para os fins das medidas de vigilância e controle preventivo da lavagem, de modo geral, considera-se pessoa politicamente exposta: aquela que desempenha ou tenha desempenhado, nos últimos cinco anos, cargos, empregos ou funções públicas relevantes, no Brasil ou em outros países, territórios e dependências estrangeiros, assim como seus representantes, 5

familiares e outras pessoas de seu relacionamento próximo (inciso I do art. 3º-B, da Instrução CVM 301/1999, com a redação dada pela Instrução CVM 463/2008; e inciso III do art. 2º da Instrução SPC 20/2008). Incluem-se no extenso rol de pessoas politicamente expostas os ocupantes de cargo, emprego ou função pública relevante exercida por chefes de Estado e de governo, políticos de alto nível, altos servidores dos poderes públicos, magistrados ou militares de alto nível, dirigentes de empresas públicas ou dirigentes de partidos políticos. Também se recomenda a fiscalização de familiares da pessoa politicamente exposta, seus parentes, na linha direta, até o primeiro grau, assim como o cônjuge, companheiro e enteado (incisos II e III do art. 3º-B, da Instrução CVM 301/1999, com a redação dada pela Instrução CVM 463/2008; e 1º do art. 2º da Instrução SPC 20/2008). Explicitando um pouco mais, a autoridade administrativa da CVM aduz que, no Brasil, são consideradas pessoas politicamente expostas: I os detentores de mandatos eletivos dos Poderes Executivo e Legislativo da União; II os ocupantes de cargo, no Poder Executivo da União, abrangendo: a) Ministro de Estado ou equiparado; b) cargo de natureza especial ou equivalente; c) presidente, vice-presidente e diretor, ou equivalentes, de autarquias, fundações públicas, empresas públicas ou sociedades de economia mista; d) membros do Conselho Nacional de Justiça, do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores; IV membros do Conselho Nacional do Ministério Público, Procurador-Geral da República, Vice- Procurador-Geral da República, Procurador-Geral do Trabalho, Procurador-Geral da Justiça Militar, Subprocuradores-Gerais da 6

República e Procuradores-Gerais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal; V membros do Tribunal de Contas da União e o Procurador-Geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União; VI Governadores de Estado e do Distrito Federal, Presidentes de Tribunal de Justiça, Assembléia Legislativa e de Câmara Distrital e os Presidentes de Tribunal e de Conselho de Contas de Estados, de Municípios e do Distrito Federal; VII Prefeitos e Presidentes de Câmara Municipal de capitais de Estados ( 2º do art. 3º-B, da Instrução CVM 301/1999, com a redação dada pela Instrução CVM 463/2008; e art. 3º da Instrução SPC 20/2008). 4. Quem deve fiscalizar Sujeitam-se às obrigações (identificação e cadastramento de clientes; registro de transações; conservação dos cadastros e registros; comunicação das operações), sob pena de sofrer pesadas sanções administrativas determinadas pelo art. 12, da Lei 9.613/1998, no espaço de atuação da CVM, os seguintes sujeitos: pessoas jurídicas que tenham, em caráter permanente ou eventual, como atividade principal ou acessória, cumulativamente ou não, a custódia, emissão, distribuição, liquidação, negociação, intermediação ou administração de títulos ou valores mobiliários, assim como as entidades administradoras de mercados de bolsa e de balcão organizado, além de outras pessoas relacionadas no art. 9º da Lei 9.613/1998, que se encontrem sob a disciplina e fiscalização exercida pela CVM (art. 2º da Instrução CVM 301/1999, com a redação dada pela Instrução CVM 463/2008). Por outro lado, idênticas obrigações se impõem às entidades fechadas de previdência complementar EFPC, ou seja, 7

às pessoas jurídicas que gerenciam recursos de clientes, participantes, beneficiários e assistidos de planos de benefícios de caráter previdenciário administrado por EFPC (art. 1º da Instrução SPC 20/2008). 5. Rigorosa supervisão das operações realizadas por PPE Recomenda-se aos sujeitos-obrigados a especial, reforçada e contínua atenção no exame e cumprimento das medidas preventivas, sobretudo no que toca às relações jurídicas mantidas com pessoa politicamente exposta, nos seguintes termos: I devem adotar medidas de controle, de acordo com procedimentos prévia e expressamente estabelecidos, que procurem confirmar as obrigações cadastrais de seus clientes, de forma a evitar o uso da conta por terceiros e identificar os beneficiários finais das operações; II identificar as pessoas consideradas politicamente expostas; III supervisionar de maneira mais rigorosa a relação de negócio mantida com pessoa politicamente exposta; IV dedicar especial atenção a propostas de início de relacionamento e a operações executadas com pessoas politicamente expostas oriundas de países com os quais o Brasil possua elevado número de transações financeiras e comerciais, fronteiras comuns ou proximidade étnica, lingüística ou política (art. 3º-A da Instrução CVM 301/1999, com a redação dada pela Instrução CVM 463/2008; e art. 8º da Instrução SPC 20/2008). Para efeito de comunicação das operações que supostamente apresentam indícios de crimes previstos na Lei de Lavagem, a instrução da CVM aponta os seguintes casos: I operações cujos valores se afigurem objetivamente incompatíveis com a ocupação profissional, os rendimentos e/ou a situação 8

patrimonial ou financeira de qualquer das partes envolvidas, tomando-se por base as informações cadastrais respectivas; II operações realizadas entre as mesmas partes ou em benefício das mesmas partes, nas quais haja seguidos ganhos ou perdas no que se refere a algum dos envolvidos; III operações que evidenciem oscilação significativa em relação ao volume e/ou freqüência de negócios de qualquer das partes envolvidas; IV operações cujos desdobramentos contemplem características que possam constituir artifício para burla da identificação dos efetivos envolvidos e/ou beneficiários respectivos; V operações cujas características e/ou desdobramentos evidenciem atuação, de forma contumaz, em nome de terceiros; VI operações que evidenciem mudança repentina e objetivamente injustificada relativamente às modalidades operacionais usualmente utilizadas pelos(s) envolvido(s); VII operações realizadas com finalidade de gerar perda ou ganho para as quais falte, objetivamente, fundamento econômico; VIII operações com a participação de pessoas naturais residentes ou entidades constituídas em países e territórios não cooperantes, nos termos das cartas circulares editadas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras COAF; IX operações liquidadas em espécie, se e quando permitido; X transferências privadas, sem motivação aparente, de recursos e de valores mobiliários; XI operações cujo grau de complexidade e risco se afigurem incompatíveis com a qualificação técnica do cliente ou de seu representante; XII depósitos ou transferências realizadas por terceiros, para a liquidação de operações de cliente, ou para prestação de garantia em operações nos mercados de liquidação futura; XIII pagamentos a terceiros, sob qualquer forma, por conta de liquidação de operações ou 9

resgates de valores depositados em garantia, registrados em nome do cliente. Reitera-se que, nos casos acima, que são considerados operações atípicas, o órgão regulador exige dos sujeitosobrigados especial atenção quando das transações participem as seguintes categorias de clientes: I investidores não-residentes, especialmente quando constituídos sob a forma de trusts e sociedades com títulos ao portador; II investidores com grandes fortunas geridas por áreas de instituições financeiras voltadas para clientes com este perfil (private banking); III pessoas politicamente expostas (art. 6º da Instrução CVM 301/1999, com a redação dada pela Instrução CVM 463/2008, combinado com o art. 11, I, da Lei 9.613/1998). De outro vértice, as entidades fechadas de previdência complementar EFPC estão obrigadas a dispensar especial atenção às operações, que segundo indicativo feito pela SPC, supostamente apresentam indícios de crimes previstos na Lei de Lavagem, a saber: I ocorrências de contribuição ao plano de benefícios, pelo participante, cujo valor se afigure objetivamente incompatível com a sua ocupação profissional ou os seus rendimentos, atentando, também, para o montante do conjunto de tais contribuições; II ocorrência de contribuições aos planos de benefícios, efetuadas por outras pessoas físicas ou jurídicas, inclusive instituidores de planos de benefícios, cujos valores, de forma isolada ou conjunta, em um mesmo mês-calendário, seja igual ou superior a R$ 10.000,00 (dez mil reais); III aumentos substanciais no valor mensal de contribuições previdenciárias, sem causa aparente; IV compra e venda de títulos ou valores mobiliários do segmento de renda fixa, realizadas sem observância 10

dos requisitos estabelecidos em Resolução de 25.09.2006, ainda que os preços praticados se afigurem vantajosos ao plano de benefícios; V compra ou venda de quaisquer ativos por valores discrepantes do preço de mercado, ainda que tais preços se afigurem vantajosos ao plano de benefícios; VI negociações com ouro; VII negociações com pagamento em espécie, a uma mesma pessoa física ou jurídica, cujo valor, isoladamente ou em conjunto com outras operações, seja superior a R$ 10.000,00 (dez mil reais), em um mesmo exercício; VIII venda de ativos com recebimento, no todo ou em parte, de recursos de origens diversas, como cheques de várias praças, bancos e emitentes, ou de diversas naturezas, como títulos e valores mobiliários, metais ou outro ativo passível de ser convertido em dinheiro (art. 10 da Instrução SPC 20/2008, combinado com o art. 11, I, da Lei 9.613/1998). 6. Financiamento ao terrorismo Também em cumprimento a compromissos internacionais assumidos pela República Federativa do Brasil, notadamente em relação à Convenção Internacional para a Supressão do Financiamento do Terrorismo, que foi adotada pela Assembléia-Geral das Nações Unidas em 09.12.1999, e promulgada em nível nacional pelo Decreto n. 5.640, de 26.12.2005, deverão ser comunicadas: as operações realizadas ou os serviços prestados, bem assim as propostas para sua realização ou prestação, qualquer que seja o valor, que possam constituir-se em sérios indícios de atos de financiamento ao terrorismo, conforme definido em mencionada Convenção, ou que possam se constituir em sérios indícios de crimes previstos nos arts. 8º e 29 11

da Lei 7.170, de 14.12.1983, que define os crimes contra a segurança nacional. Embora não exista, no ordenamento jurídico pátrio, um tipo penal específico que defina claramente o crime de terrorismo, para efeitos da instrução baixada pela CVM, considera-se operações relacionadas com o terrorismo ou seu financiamento aquelas executadas por pessoas que praticam ou planejam praticar atos terroristas, ou deles participam, ou facilitam sua prática, bem como aqueles praticados por entidades pertencentes ou controladas, direta ou indiretamente, por pessoas ou por entidades que atuem sob seu comando (art. 7º, 3º, da Instrução CVM 301/1999, com a redação dada pela Instrução CVM 463/2008; e art. 12 da Instrução SPC 20/2008, combinados com o inciso II do parágrafo único do art. 9º e com o inciso II do art. 11, da Lei 9.613/1998). 7. Tentando simplificar Não resta a menor dúvida de que o tema enfrentado nesta rápida análise é dos mais complexos, haja vista a excessiva quantidade de regras complementares, dispostas em textos administrativos que, com a devida vênia, demonstram-se carentes de boa técnica jurídica ou se apresentam repletos de termos cujos significados não são precisos. De qualquer modo, é preciso ter conhecimento de que tais regras existem e que elas produzem diversas conseqüências no campo do Direito. Tentando sintetizar e acompanhando o parecer de Emerson Siécola de Mello, gerente de compliance, assinala-se, com relação ao atual texto da Instrução CVM 301/99, que as principais alterações promovidas pela Instrução CVM 463/2008, foram as 12

seguintes: I passa a ser exigida a atualização cadastral dos clientes em período não superior a 24 (vinte e quatro) meses; II procedimentos cadastrais diferenciados foram estabelecidos para os chamados clientes de alto risco (investidores não-residentes, private banking); III determina-se a identificação e supervisão rigorosa do relacionamento mantido com pessoas politicamente expostas; IV eliminou-se o patamar de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para a comunicação de operação considerada atípica; V está prevista a manutenção de todos os cadastros, registros e demais documentos comprobatórios durante o período mínimo de 5 (cinco) anos, a partir do encerramento da conta ou conclusão da última operação realizada em nome do cliente, podendo o citado prazo ser estendido indefinidamente em caso de investigação comunicada à CVM; VI- amplia-se o rol de hipóteses de comunicação de operações atípicas, o qual passa de 6 (seis) para 13 (treze) tipologias, inclusive de operações relacionadas ao terrorismo ou seu financiamento; VII insiste-se na necessidade de se proceder o desenvolvimento e implementação de procedimentos de controle interno e programa de treinamento contínuo de funcionários, estipulando-se o prazo de 90 (noventa) dias, a contar da data de expedição da instrução, para as instituições adaptarem seus procedimentos ao novo cenário regulatório. 8. Compliance e as pessoas potencialmente suspeitas Diversas conclusões se abstraem desse novo quadro. Mas, vamos destacar apenas duas. Uma delas concerne ao fato de que as pessoas jurídicas e mesmo as pessoas físicas detentoras de significativa carteira 13

de clientes, que frequentemente operam nos setores econômico e financeiro subordinados à fiscalização do BACEN, da CVM e da SPC, devem adotar e manter políticas de procedimentos e de controles internos compatíveis com o seu porte e volume de operações. Vale dizer, os encargos de caráter preventivo atribuídos aos sujeitos-obrigados, seja pela Lei de Lavagem de Capitais, seja pela intensiva propagação de resoluções, instruções e circulares expedidas pelas autoridades administrativas, são múltiplos e onerosos. E para cumprir tais obrigações é preciso que a entidade (sujeito-obrigado) mantenha em sua estrutura um departamento ou seção especializada neste tipo de fiscalização. Sob este aspecto, é preciso reconhecer, muitas instituições bancárias, financeiras e operadoras do mercado de capitais já implementaram o sistema que foi padronizado pela cultura norte-americana, denominado compliance, termo que é originário do verbo inglês to comply, que significa cumprir, executar, satisfazer o que foi determinado. Em organizações de médio e de grande porte considerase relevante o papel desempenhado pelo gestor de compliance. É que a este profissional atribui-se, entre outras, duas funções importantes: a) cabe a ele exercer o papel de guardião da preservação da boa imagem institucional, cuja reputação não pode ser arranhada pela acusação de ser facilitadora da lavagem de capitais; b) evitar a responsabilização e conseqüente sofrimento de sanções previstas para o caso de descumprimento das normas administrativas. O outro enfoque conclusivo que extraímos deste contexto impressiona pela mudança de critérios empregados para 14

se proceder a fiscalização preventiva de ações, operações e transações realizadas em setores comerciais e financeiros, tendo em vista unicamente a qualificação específica do cliente. Com efeito, entende-se como natural a fiscalização que recai sobre operação considerada atípica (ou suspeita), ou seja, quando existam indícios de que se trata, por exemplo, de uma movimentação bancária ou financeira com aparente utilização de recursos obtidos ilicitamente. Todavia, não parece natural que os sujeitos-obrigados procedam rigorosa supervisão das operações tão somente pelo fato de o cliente ser uma pessoa politicamente exposta. Linhas acima se constatou que é surpreendentemente vasto o catalogo de autoridades, membros dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, órgãos do Ministério Público e outros funcionários públicos, políticos ou assemelhados, que pelo simples fato de ocuparem cargos e funções de expressividade, se tornam, automaticamente, pessoas politicamente expostas, portanto, potencialmente suspeitas. Sim, porque a nosso ver, a expressão pessoa politicamente exposta é substancialmente mais elegante, ou suave, e menos agressiva do que pessoa supostamente suspeita. Pode parecer que o tom da critica é agressivo, mas não é. Note-se que, neste caso, os pressupostos para o acompanhamento e fiscalização a ser levado avante pela instituição econômica ou financeira não são os da existência de indícios da ocorrência de uma operação atípica (ou suspeita), mas tão-somente a qualificação profissional do investidor. Somos francamente favoráveis a todas as medidas que fortalecem a manutenção da probidade administrativa e que 15

favorecem o combate à corrupção. Notamos, contudo, que o critério generalizado, partindo da condição profissional que o cliente possa eventualmente ostentar, não é razoável, e pode até ensejar fiscalizações desnecessárias ou no mínimo incômodas, especialmente em relação aos agentes honestos, embora estes, por serem probos, nada tenham a temer quanto ao fato de estarem sendo sigilosamente fiscalizados. De qualquer modo fica o aviso para os atuais e para os futuros ocupantes de cargos públicos e políticos acima mencionados, no sentido de que já são, ou provavelmente serão considerados como pessoas politicamente expostas, para as quais se reserva especial atenção na movimentação de seus valores e bens pessoais. i Marco Antonio de Barros é autor da obra Lavagem de capitais e obrigações civis correlatas (editora RT), professor da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e Doutor em Direito Processual Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. 16