Natureza e Cultura: Contextos e Espaços



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Transcrição:

iências Humanas E SUAS T ECC NOLOGIASS Tema Natureza e Cultura: Contextos e Espaços Ficha de Estudo 119 Tópico de estudo Impacto ambiental das atividades econômicas no Brasil Entendendo a competência Competência 6 Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço, em diferentes contextos históricos e geográficos. A competência 6 refere-se à capacidade de entender as relações dos seres humanos com o meio ambiente, auxiliando na compreensão da realidade socioambiental em que as pessoas se inserem. Para trabalhar essa competência selecionamos temas relativos à ocupação dos espaços físicos e à importância dos recursos naturais. Procure observar, no espaço em que você vive, como as tecnologias da sociedade alteram de forma positiva ou negativa o meio ambiente. Pense a respeito dessa questão e procure identificar relações entre a competência e a habilidade 29. Desvendando a habilidade Habilidade 29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas. Dominar essa habilidade designifica ser capaz de perceber como os recursos naturais constituem parte integrante do desenvolvimento sustentável. Essa habilidade implica conhecimentos sobre a atuação humana no meio ambiente e reflexões sobre as conflituosas necessidades de desenvolver e preservar, ao mesmo tempo. Situações-problema e conceitos básicos As quatro fotos a seguir evidenciam diferentes atividades econômicas e as respectivas transformações que essas atividades impõem à paisagem. As fotos retratam, respectivamente, as seguintes atividades: indústria, mineração, extrativismo e agricultura. Em função dessa diversidade poderíamos pensar que nos referimos a regiões diferentes. Na verdade estamos falando da mesma região: a Amazônia. Essa variedade reflete as diferentes estratégias de ocupação do espaço amazônico, que causam diferentes impactos sociais e ambientais.

Fonte: Google Imagens Figura 1 Paisagens amazônicas O objetivo de analisá-las, aqui, é relacionar o histórico de ocupação da Amazônia e as transformações sofridas pela paisagem ao longo desse processo, observando o jogo de interesses que envolvem o Estado brasileiro, as grandes corporações transnacionais, o setor agrícola e as populações. Avanço da Ocupação da Amazônia Desde o início do processo de colonização do Brasil até o final do século XIX, a Amazônia esteve fora dos interesses diretos de exploração. O povoamento tradicional tinha como base o extrativismo, consistindo numa ocupação rarefeita ao longo dos rios. A maior parte dos grupos indígenas esteve preservada do contato com os colonizadores devido à imensa extensão regional e à dificuldade de penetração na floresta equatorial. Na verdade, os mais numerosos grupos indígenas brasileiros que existem hoje estão na região. Entre o fim do século XIX e a segunda década do século XX, a atividade de extração do látex de seringueiras para fabricação de borracha atraiu migrantes para a Amazônia, mas, após um rápido surto de dinamismo econômico, a região voltou a ficar desarticulada do restante do país. Nos anos 1950, a região despertou a atenção das comunidades nacionais e internacionais e a área passou a ser vista como uma gigantesca região à espera de incorporação ao espaço produtivo mundial, ou seja, à Divisão Territorial e Internacional do Trabalho. Em 1966, para garantir a soberania nacional, promover o povoamento e estimular a economia regional, o governo federal criou a Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). A integração da Amazônia se deu sob o lema integrar para não entregar. As ações governamentais entre 1960 e1980, concebiam a área como fronteira: política: relativa às largas faixas pouco povoadas adjacentes aos limites do Brasil com países vizinhos, que configuravam áreas de soberania formal, mas pouco efetiva do estado brasileiro; demográfica: referente ao povoamento da região por excedentes populacionais do centro-sul e do nordeste, objetivando diminuir a pressão demográfica e os conflitos sociais nessas áreas; as rodovias de integração nacional (Belém-Brasília, Cuiabá-Santarém, Cuiabá-Porto Velho, Transamazônica e Perimetral Norte) tinham a função de orientar esse povoamento; econômica: ligada às possibilidades de expansão agropecuária, mineradora e industrial, cabendo ao governo conceder incentivos fiscais que atraíssem projetos privados nacionais e estrangeiros. A Sudam deveria viabilizar a logística necessária, conceder crédito bancário com juros baixos e benefícios fiscais, a fim de atrair empresas. A região estabelecida para ser o principal alvo de investimentos estatais e privados passou a ser designada como Amazônia Legal. O povoamento tradicional com base no extrativismo, que era caracterizada pela ocupação ribeirinha e se assentava na rede natural de rios, foi substituída por uma ocupação polarizada pelos núcleos urbanos em formação e pelos projetos florestais, agropecuários e minerais. Principais projetos para a Amazônia segundo o tipo de atividade principal que os caracterizou Agricultura Para promover o desenvolvimento de atividades agropecuárias e florestais na região, a partir dos anos 1960, o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e a Sudam coordenaram o PIN (Programa de Integração Nacional). Em meados dos anos 1970, a Sudam abandonou os pequenos projetos de colonização e passou a aprovar somente megaprojetos agropecuários e madeireiros. Sob essa política, multiplicaram-se os

latifúndios com áreas superiores a 300 mil hectares. O desmatamento e a formação de pastagens extensivas eram classificados como benfeitorias, assegurando o direito aos incentivos. Na década de 1990, assistimos à expansão da pecuária extensiva na Amazônia, em muitos casos para mascarar a improdutividade da terra. Nos anos 2000, a região viu suas árvores sendo cortadas para abrir espaço para a soja, que avança em passo acelerado sobre a floresta equatorial. Mineração Nos anos 1960 e 1970, foram descobertas grandes jazidas minerais na região. O maior destaque foi, em 1967, a identificação de extensas clareiras na floresta, na Serra dos Carajás, indicando o afloramento de reservas metálicas gigantescas. Além de imensas jazidas de ferro, manganês, ouro e cobre, em Carajás, foram encontradas enormes reservas de bauxita na Serra de Oriximiná, no Vale do Rio Trombetas. Desencadeou-se, nas décadas seguintes, um vasto programa de desenvolvimento regional. Sob o controle da então estatal Companhia Vale do Rio Doce, foi lançado o Programa Grande Carajás (PGC). A Sudam estimulou a implantação de mecanismos que viabilizassem a exploração e o beneficiamento mineral, no entorno das grandes jazidas. Criou também vias de escoamento da produção mineral, como é o caso da ferrovia que liga a Serra dos Carajás, no Pará, ao porto de Itaqui, no Maranhão, assim como fontes de produção de energia elétrica, como a usina hidrelétrica de Tucuruí. O desenvolvimento das atividades ligadas à exploração de recursos minerais, associado a grandes obras de infraestrutura, atraiu milhares de trabalhadores para região, levando à formação de novos núcleos urbanos no sudeste do Pará, norte do Tocantins e oeste do Maranhão. Além da mineração realizada em grande escala, a existência de ouro e diamantes nas margens ou no leito dos rios intensificou a atividade do garimpo na região, atraindo migrantes de todas as partes do país. Isso contribuiu para a ocorrência de impactos sociais (conflitos com os índios) e ambientais (desmatamento, contaminação com mercúrio, assoreamento etc.). O esgotamento dos garimpos ou a Fonte: Google Imagens Figura 2 Hidrelétrica de Tucuruí proibição da atividade extrativista nas áreas concedidas para grandes empresas mineradoras criou um novo problema social: milhares de antigos garimpeiros engrossaram as fileiras dos trabalhadores rurais sem terra ou migraram para as cidades da região, agravando os já imensos contrastes socioeconômicos na área. Também a descoberta do ouro de aluvião, em Roraima, provocou um intenso, mas efêmero, fluxo imigratório. A febre do garimpo foi cortada abruptamente em 1991, quando o governo federal sancionou a demarcação definitiva da reserva dos Ianomami, onde se localizavam grandes reservas de ouro. Os garimpeiros recuaram para Boa Vista, formando uma vasta e miserável periferia urbana. Atividades Urbano-Industriais Além das ações referentes às atividades de beneficiamento mineral que foram associadas ao PGC, coube à Sudam apoiar o desenvolvimento de outras atividades industriais na Amazônia. O destaque foi a implantação de um distrito industrial em plena floresta equatorial, na periferia de Manaus, cuja organização ficou sob a responsabilidade da Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa). Empresas nacionais e várias multinacionais produtoras, principalmente de bens de consumo duráveis, foram atraídas para a Zona Franca de Manaus pela política de isenção de impostos (por décadas), o que gerou milhares de empregos diretos e indiretos. Manaus agregou à sua função tradicional de porto fluvial as funções de polo industrial e comercial. No início da década de 1990, a Zona Franca gerava mais de 120 mil empregos, que provocaram um crescimento urbano explosivo da capital. A cidade aproxima-se de 1,2 milhão de habitantes e abriga praticamente metade da população do Amazonas. O esvaziamento demográfico das várzeas e a decadência da pequena agricultura ribeirinha tradicional tiveram como contrapartida o inchaço da periferia de Manaus, através da expansão acelerada dos bairros de palafitas, casas flutuantes e ocupações irregulares, o que colabora para o avanço da poluição e do desmatamento.

A Zona Franca ampliou sua influência regional com a BR-174 (Manaus a Boa Vista) na última década. A rodovia atravessa a fronteira e interliga-se à rede viária da Venezuela. O novo eixo abre mercados nesse país à produção industrial da Zona Franca e tem o potencial de ampliar os fluxos de comércio do Brasil com as economias na região do Caribe. Ao mesmo tempo, a estrada criou um novo corredor de ocupação. Ao longo de seu eixo, na porção central de Roraima e nas proximidades de Manaus, surgiram em poucos anos largas faixas de devastação. A construção da rodovia e a concomitante implantação da hidrelétrica de Balbina desfiguraram a reserva indígena Waimiri-Atroari, localizada nas proximidades, além de gerar os impactos ambientais típicos da hidroeletricidade, como o alagamento de extensas áreas de floresta e a consequente alteração dos ecossistemas locais. Ainda que permaneça como a região que possui as menores densidades demográficas do país (aproximadamente 10 hab/km 2 ), a Amazônia tem tido um rápido aumento demográfico nas últimas décadas, tendo crescido à taxa de 3% ao ano, na década de 1990, ao passo que a média nacional era de 1,6% no mesmo período. A expansão urbana é, portanto, um aspecto notável na região, cerca de 70% ao ano, indicando que, cada vez mais, a população amazônica passa a viver em cidades. Isso se deve, em grande parte, ao fracasso dos projetos agropecuários, principalmente os de assentamento de pequenos produtores rurais. A imensa concentração fundiária e a violência no campo contribuem para impulsionar grandes contingentes de famílias em direção às cidades. A rede urbana regional tornou-se mais complexa e diferenciada. A influência vasta e difusa de Belém sobre todo o espaço amazônico diminuiu em função da emergência de Manaus como metrópole regional. Na última década, configurou-se uma situação de dupla polarização, na qual se desenham esferas de influência distintas das duas metrópoles. Contudo, o quadro urbano que predomina é o de cidades sem infraestrutura adequada, com deficientes sistemas de distribuição de água e coleta de esgoto, déficit de habitações, serviços públicos, segurança e emprego. Os grandes contrastes urbanos, encontrados em todo o país, são a principal característica das metrópoles amazônicas, o que conduz a problemas sociais e ambientais. Impactos Decorrentes do Modelo de Desenvolvimento Amazônico O conjunto de políticas voltadas para a conquista da Amazônia deixou um rastro de violência e degradação ambiental. As atividades agrícolas e pastoris, juntamente com a atividade madeireira e com a expansão econômica e demográfica, geraram um forte impacto ambiental na região. Os grandes projetos agropecuários e de exploração mineral e florestal criaram extensos corredores de devastação e estimularam uma urbanização caótica. A política de desenvolvimento regional valorizou a acumulação de capital por meio do uso predatório dos recursos naturais. Levantamentos de campo e imagens de satélites confirmam o aumento da área desflorestada na região Amazônica, especialmente na faixa que vai do nordeste do Pará, oeste do Maranhão, norte do Tocantins e Mato Grosso, seguindo por Roraima até o Acre. É o chamado Arco de Devastação da Amazônia. Fonte: Google Imagens Figura 3 Arco de Devastação na Amazônia

O arco da devastação apresenta notáveis sobreposições com o arco de violência na Amazônia oriental e meridional. Conflitos fundiários muito sérios envolvem índios, agropecuaristas, posseiros, migrantes, garimpeiros, mineradoras etc. Na Amazônia Oriental, estruturada pelos eixos da Belém-Brasília e da Estrada de Ferro Carajás, a devastação é, sobretudo, resultado dos grandes projetos de exploração mineral, transformados em verdadeiros enclaves na floresta e indutores de um processo de urbanização caótico e desordenado em seu entorno. Na Amazônia Ocidental, a ocupação ao longo das rodovias Cuiabá-Santarém e da Cuiabá-Porto Velho, orientou a expansão da fronteira agrícola, também com resultados ambientais devastadores. Propostas Alternativas de Aproveitamento Econômico Apesar dos desacertos das políticas governamentais, há exemplos de atividades extrativas e agropecuárias no ecossistema amazônico que poderiam orientar estratégias sustentáveis. A coleta florestal, ao lado da pesca, é a mais antiga base da economia regional, fornecendo trabalho e renda para a população. Na Amazônia Ocidental, a extração do látex, da castanha-do-pará, da malva, do urucum, do guaraná, do cacau e de várias frutas silvestres como o açaí e o cupuaçu continua a ser um dos fundamentos da subsistência da população. Na década de 1980, sob a liderança de Chico Mendes, os seringueiros do Acre resistiram ao avanço das empresas madeireiras e das fazendas de gado sobre os seringais nativos e conseguiram que um decreto criasse reservas extrativistas comunitárias (Resex). O modelo acreano inspira propostas semelhantes em diversas áreas amazônicas e aponta um caminho para a reforma agrária na região. Também alternativas agropecuárias vêm sendo bem sucedidas. A juta, o guaraná, o urucum e outros produtos nativos, antes exclusivamente de coleta, passaram a ser cultivados, gerando mais empregos e renda. A criação de búfalos em Marajó contrasta com a pecuária bovina extensiva implantada de forma predatória no sul do Pará. A pecuária bufalina (que produz carne, leite e queijo) adaptou-se aos campos alagados e às várzeas inundáveis dos rios. Mais recentemente iniciou-se a exploração das grandes jazidas de gás natural e petróleo em Urucu, oeste do Amazonas. A Petrobras foi um exemplo positivo, preferindo criar instalações provisórias, de modo a impedir a reprodução da urbanização descontrolada, como ocorreu em Carajás. Os poços, em clareiras isoladas, foram construídos de maneira a causarem o menor impacto possível na floresta. Mostra-se, então, que mesmo o aproveitamento em grande escala de recursos do subsolo não precisa repetir os modelos predatórios do passado recente.