Exacta ISSN: 1678-5428 exacta@uninove.br Universidade Nove de Julho Brasil

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Exacta ISSN: 1678-5428 exacta@uninove.br Universidade Nove de Julho Brasil Silva Padilha, Giovana; Castiglioni, Gabriel Luis; Monte Alegre, Ranulfo; Basile Tambourgi, Elias Avaliação de diferentes íons na atividade da lípase de Pseudomonas cepacia Exacta, vol. 7, núm. 2, 2009, pp. 181-186 Universidade Nove de Julho São Paulo, Brasil Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=81015222005 Como citar este artigo Número completo Mais artigos Home da revista no Redalyc Sistema de Informação Científica Rede de Revistas Científicas da América Latina, Caribe, Espanha e Portugal Projeto acadêmico sem fins lucrativos desenvolvido no âmbito da iniciativa Acesso Aberto

Artigos Avaliação de diferentes íons na atividade da lípase de Pseudomonas cepacia Evaluation of different ions in the activity lipase from Pseudomonas cepacia Giovana Silva Padilha Depto. de Engenharia de Sistemas Gabriel Luis Castiglioni Depto. de Engenharia de Alimentos. Ranulfo Monte Alegre Depto. de Engenharia de Alimentos. Elias Basile Tambourgi Depto. de Engenharia de Sistemas eliastam@feq.unicamp.br Este trabalho apresentou as propriedades da lípase produzida pela cepa de Pseudomonas cepacia, sua atividade e estabilidade na presença de diferentes íons a fim de auxiliar nos processos de produção de biodiesel. Após 96 horas de fermentação a enzima bruta foi analisada usando azeite de oliva como substrato. Íons como I 1- estimularam a atividade enzimática em 40% em relação à enzima controle, o Mn 2+, Co 2+, e Ca 2+ mantiveram a atividade da enzima, no entanto na presença dos íons Fe 2+, Hg 2+ e Al 3 + houve um efeito inibitório sobre a atividade da lípase o que pode ser devido à complexismo desses íons com a enzima. Palavras-chave: Enzima. Íons. Lípase. Pseudomonas cepacia. This work showed the properties of lipase produced by strain from Pseudomonas cepacia, its activity and stability in the presence of different ions due to assist in process of biodiesel. After 96 hours of fermentation the crude enzyme was analyzed using olive oil as substrate. Ions as I 1- stimulated enzyme activity by 40% compared to the control, the Mn 2 +, Co 2 +, Ca 2 + and maintained the activity of the enzyme, however the presence of ions Fe 2 +, Hg 2 + and Al 3+ had an inhibitory effect on the activity of lipase. This may be due to complexation of these ions with the enzyme. Key words: Enzyme. Ions. Lipase. Pseudomonas cepacia. 181

1 Introdução As lípases (triglicerol acil-hidrolases E.C. 3.1.1.3) são enzimas que atuam sobre a ligação éster de vários compostos, sendo os acilgliceróis seus melhores substratos. Essas enzimas são encontradas em diferentes organismos incluindo animais, plantas, fungos e bactérias. Do ponto de vista econômico e industrial, as lípases de fontes microbianas, obtidas de meios fermentativos são preferíveis em relação às fontes animais e vegetais, por sua relativa facilidade de produção e maior fonte de micro-organismos capazes de sintetizá-las (BORGSTRÖM e BROCKMAN, 1984; HASAN et al., 2006). Dentre os micro-organismos produtores de lípase, destacam-se as os fungos dos gêneros Rhizopus, Aspergillus Penicicillium e Mucor, bactérias do gênero Pseudomonas e leveduras do gênero Cândida (KORDEL et al., 1991). Em geral, as lípases podem ter massa molecular variando entre 20 a 75 kda, atividade em ph entre 4 a 9, são estáveis em soluções aquosas neutras à temperatura ambiente apresentando, em sua maioria, uma atividade ótima na faixa de temperatura entre 30 e 40 C. Contudo, sua termoestabilidade varia consideravelmente em função da origem, sendo as lípases microbianas as que possuem maior estabilidade térmica (VULFSON, 1994). Em virtude da versatilidade de suas propriedades como atuação enzimática, especificidade pelo substrato e produção em escalas maiores (HASAN et al., 2006), as lípases obtidas de micro-organismos vêm sido aplicadas nos diferentes segmentos industriais e biotecnológicos. Embora ainda hoje a maior aplicação industrial destas enzimas é na formulação de detergentes (KIRK et al., 2002), indústria de laticínios, setores têxteis, áreas farmacêuticas e médicas também utilizam a lípase de forma promissora (HASAN et al., 2006; JAEGER et al., 1999). Nos dias de hoje existe um interesse mundial crescente pela conservação dos recursos energéticos naturais não renováveis, pelo desenvolvimento de recursos energéticos alternativos e pela reciclagem de rejeitos. Os rejeitos de óleos comestíveis usados em fritura representam sério problema ambiental em virtude de seu descarte ser diretamente no esgoto doméstico, causando grandes problemas de poluição. Uma maneira efetiva de reciclar os rejeitos de óleos usados em residências, restaurantes e indústrias é a sua utilização para produção de biodiesel sintetizado pela transesterificação direta de óleos vegetais e gordura animal, quando os triglicerídeos reagem com metanol na presença de um catalisador químico ou biológico. A utilização de lípase como catalisador biológico para produção do biodiesel apresenta um grande potencial em relação aos métodos químicos, uma vez que nenhuma operação complexa é necessária para recuperação do glicerol ou para eliminação de catalisador e sal. A partir disso, tem-se um crescente avanço nos meios científico, econômico e industrial em relação à aplicação de lípases em processos biotecnológicos para a modificação de óleos e gorduras. Oliveira e colaboradores (2004) ao utilizarem lípases imobilizadas como catalisadores obtiveram conversões de 100% em ésteres, mostrando potencialidade de utilização do óleo de mamona na produção do biodiesel. Em outro trabalho, Du e colaboradores (2007), a partir de óleo renovável usando lípase com catalisador, obtiveram 94% de rendimento em biodiesel. E Faccio (2004) estudou a produção de biodiesel a partir da modificação dos óleos de mamona, usando a lípase como catalisador biológico. A partir desse contexto, estudos de caracterização enzimática da lípase de Pseudomonas cepacia para posterior aplicação na transformação de óleos e gordura foram realizados (PADILHA et al., 2007). Embora essas enzimas vêm sendo estudadas há alguns anos, pouco ou quase nenhum 182

Artigos trabalho em relação às propriedades físico- químicas desse micro-organismo produtor da lípase são encontradas na literatura. Como se sabe, existem diversos fatores que influem na atividade enzimática, tais como ph, temperatura, concentração do substrato, presença e concentração de íons. Existem diversos íons que podem atuar como ativador das enzimas e outros como inibidor. O efeito inibitório dos íons na β-frutofuranosidade foi estudado por Oliveira (1997), íons como I -1 inativaram quase que totalmente a enzima, enquanto o Ca 2+, K +, Co 2+, e Al 3+ estimularam a atividade enzimática. Em 2003, Pastore verificou o efeito dos íons nas lipases de Rhizopus sp onde íons Ca 2+ aumentaram significativamente a atividade hidrolítica do extrato enzimático, a partir disso, neste trabalho, foram avaliadas a atividade e estabilidade da lípase de Pseudomonas cepacia na presença de íons como parte dos estudos de caracterização. 2 Material e métodos 2.1 Material Micro-organismo: foi utilizada a cepa de Pseudomona cepacia, obtida da Fundação André Tosello, mantido em tubos de ensaio a 4 C, no ágar nutriente. Equipamentos: para garantir condições estéreis de crescimento dos micro-organismos, dos meios sólidos de propagação, do inóculo e de produção, utilizou-se a autoclave a 121 C durante 15min. O agitador orbital utilizado para a análise lipolítica e caracterização enzimática foi o TE-421 da Tecnal e para produção enzimática usou-se o reator BIOFLO III da New Brunswick Scientific. Reagentes: todos os reagentes utilizados foram de grau de pureza analítico. Foram adquiridos da Synth (Diadema-SP) a acetona, álcool etílico, fosfato monobásico de sódio, fosfato dibásico de sódio, hidróxido de sódio, assim como todos os sais usados na fermentação e determinação dos íons. A goma arábica, ágar-ágar, extrato de levedura e peptona bacteriológica foram obtidos da Oxoid (Londres, UK). Os óleos de soja (Liza) e azeite de oliva (Gallo) foram obtidos do comércio local com acidez máxima declarada pelos fabricantes de 0,3% e 0,5%, respectivamente. 2.2 Métodos Preparo do inóculo e sistema fermentativo: o inóculo foi transferido dos tubos de ensaio para Erlenmeyers de 125mL contendo extrato de levedura (3g/L), peptona (3g/L), K 2 PO 4 (4g/L) e MgSO 4 (0,2g/L) e 3% (v/v) de óleo de soja. A adaptação do micro-organismo foi realizada durante 48h a 30 C e 150 rpm. Após adaptação do micro-organismo, o inóculo foi transferido para biorreator tipo Bioflo III (com volume útil de 5000mL contendo 3000mL de meio). O ar foi fornecido por compressor, esterilizado por filtro de lã de vidro e a vazão foi controlada por meio de rotâmetros. O meio de cultivo estudado por Castiglioni e Monte Alegre (2007) apresentou as mesmas concentrações preparadas para o inóculo, porém com 6% (v/v) de óleo de soja para induzir a produção da lípase. A fermentação foi conduzida a 30ºC, ph 7,0, aeração de 1,5vvm e agitação de 150rpm durante 96h. Obtenção do extrato enzimático: após as 96h de fermentação, o meio foi coletado e centrifugado em temperatura ambiente durante 10min a 2683g. Os sobrenadantes foram utilizados como extrato enzimático, uma vez que a Pseudomonas cepacia produz lípase extracelular (KORDEL et al., 1991). Determinação da atividade lipolítica: a atividade lipolítica foi determinada segundo a metodologia descrita por Macedo e colaboradores (1997). Fez parte do meio reacional 5mL de uma emulsão de óleo de oliva e goma arábica a 7%, 2mL de tampão fosfato de sódio ph 8,0 (10mM) e 1mL de extrato enzimático. A mistura foi incubada por 183

30 minutos, 37ºC e 150rpm em agitador orbital. A reação foi interropida pela adição de 15 ml de solução acetona/etanol (1:1 em volume). Os ácidos graxos liberados durante a reação foram titulados com NaOH 0,05N, usando fenolftaleína como indicador. Um branco contendo o mesmo meio reacional que os ensaios com a enzima inativa em autoclave foi utilizado. Calculou-se a atividade enzimática segundo a equação: onde: A é a atividade lipolítica das enzimas; V a é o volume de NaOH gasto na titulação da amostra (ml); V b é o volume do NaOH gasto na titulação do branco; D é a diluição da amostra; M é a concentração da solução de NaOH, v é o volume do extrato bruto (ml) e t é o tempo de reação (min). Uma unidade de atividade de lípase foi definida como a quantidade de enzima que libera 1μmol de ácido graxo por minuto. Para estudar o efeito dos íons (Mn 2+, K 1+, Ba 2+, Fe 2+, Co 2+, Hg 2+, I 1-, Ca 2+, Cu 2+, Al 3+ ) na atividade da enzima, adicionou-se 0,3 ml de solução salina 10mM aos tubos de ensaio que continha certa quantidade de extrato bruto. Os tubos foram armazenados a 4ºC. Em um dos tubos foi mantido somente o extrato bruto e usado como controle considerando 100% de atividade. A estabilidade e a atividade enzimática residual (%), após os 30 dias de armazenagem, foram determinadas com o mesmo método título métrico descrito por Macedo e colaboradores (1997). 3 Resultados e discussões (1) Um estudo para verificar quantos dias o extrato bruto enzimático manteria sua atividade em frente da adição de diferentes íons foi realizado e os resultados são apresentados na Figura 1. Esse estudo demonstrou que íons como Fe 2+ e Hg 2+ diminuíram significativamente a atividade lipolítica, causando inativação em menos de 10 dias de armazenagem. Por outro lado, a adição dos íons Ba 2+,Ca 2+ e Mn 2+ conseguiu manter uma boa atividade enzimática durante os 30 dias, observando uma queda de atividade mais significativa a partir do 15º dia para os íons Ba 2+ e Ca 2+ e 7º dia para o Mn 2+. Esses íons mantiveram ainda grande porcentagem de atividade enzimática no 30º dia em relação ao 1º dia. O íon I 1- reduziu rapidamente sua atividade hidrolítica nos primeiros dias de armazenagem, embora após esse período tenha mantido 23% de atividade enzimática até o 30º dia. Íons como Al 3+ Co 2+, Cu 2+ e K 1+ fizeram com que a atividade lipolítica diminuísse em 75%, 40%, 45% e 50% até o 10º dia, respectivamente. Na enzima bruta também foi feito o estudo, onde se verificou queda de atividade gradativa no decorrer dos dias de armazenagem e no final do 30º dia houve queda de atividade de aproximadamente 80% em relação à armazenagem inicial. Estudos semelhantes com lípases de Pseudomonas fluorescens 2D foram realizados por Makhzoum e colaboradores (1995), os íons Co 2+ e Hg 2+ mostraram ser fortes inibidores dessa enzima, enquanto Cu 2+ e Ba 2+ causaram inibição moderada e o Fe 2+ não causou nenhum efeito sobre as lípases, o que pode ser atribuído ao complexismo desses íons com a enzima. A Tabela 1 mostra a atividade residual da lípase de Pseudomonas cepacia ao final de 30 dias de armazenagem. A atividade lipolítica teve considerável ativação (40% de aumento na atividade) do ânion I 1-. Os íons Mn 2+, Co 2+ e Ca 2+ mantiveram a estabilidade da enzima durante esse período e os íons Fe 2+, Hg 2+ e Al 3+ atuaram como inibidores, causando considerável inativação enzimática. A adição de íons às lípases de 184

Artigos os íons Co 2+ e Ba 2+ corroboraram com esses resultados e Lima e colaboradores (2004) para a lípase de Penicillium aurantiogriseum encontraram alguns resultados semelhantes aos deste trabalho, onde íons Ba 2+, Ca 2+, Co 2+, Cu 2+ e Hg 2+ mantiveram 70%, 79%, 105%, 69% e 0% da atividade residual, respectivamente. 4 Conclusões Figura 1: Efeito dos íons na atividade hidrolítica da lípase de Pseudomonas cepacia (5,0 ml de emulsão de óleo de oliva 7,5% e goma arábica 2,5% em tampão fosfato de sódio 0,1M ph 8,0 a 37ºC) Fonte: Os autores. Tabela 1: Efeito dos íons a 0,10M sobre a atividade das lípases de Pseudomonas cepacia após 30 dias de armazenagem Soluções 0,10 M Atividade residual (%) Fonte: Os autores. MnSO 4 100 KCl 60 BaCl 2 60 FeSO 4 0 CoCl 2 100 HgCl 2 0 KI 140 CaCl 2 100 CuSO 4 60 AlCl 3 0 Controle 100 Bacillus sp RSJ-1, estudados por Sharma e colaboradores (2002), mostrou que na presença de Ba 2+ a enzima manteve-se estável, por outro lado, íons como K 1+ e Co 2+ foram grandes inibidores da enzima lipolítica, no entanto Ca 2+ manteve a enzima bastante ativa (125% de aumento na atividade em relação ao controle). Nos estudos realizados por Makhzoum e colaboradores (1995), em lípases de Pseudomonas fluorescens, A atividade enzimática foi mantida nos 30 dias de armazenagem quando o extrato bruto foi incubado junto aos íons Ba 2+,I -, Ca 2+ e Mn 2+, a enzima manteve 100% ou mais de atividade enzimática, enquanto os íons Fe 2+ e Hg 2+ inativaram a enzima em menos de 10 dias. Quanto à influência dos íons na atividade da lípase, observou-se uma ativação desta na presença do íon I 1-, os íons Mn 2+, Co 2+ e Ca 2+ mantiveram a atividade, enquanto o Fe 2+, Hg 2+ e Al 3+ atuaram como inibidores, prejudicando a atividade catalítica da enzima. Referências BORGSTRÖM, B.; BROCKMAN, H. Lipases. New York: Elsevier, 1984. CASTIGLIONI, G. L.; MONTE ALEGRE, R. Produção simultânea de lípase e bioemulsificante por Pseudomona cepacia. In: 6 Simpósio Latino-Americano de Ciência de Alimentos, Campinas, 2007. DU, W.; LIU, D.; Li, L.; XU, Y.; Li, W. Processo para a produção de biodiesel a partir de óleo renovável na presença de catálise por lípase em um sistema de reação em meio orgânico. Patente nº PI0418062-3, 2007. FACCIO, C. Estudo da produção de ésteres etílicos a partir da produção da alcoólise de óleos vegetais. 2004. Dissertação (Mestrado) Faculdade de Engenharia de Alimentos, URI, Erechim, 2004. HASAN, F.; SHAH, A.A., HAMEED A. Industrial applications of microbial lipases. Enzyme and Microbial Technology, v. 39, p. 235-251, 2006. 185

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