VERIFICAÇÃO DA QUALIDADE SUPERFICIAL DA MADEIRA DE QUATROS ESPÉCIES DE Eucalyptus sp APÓS PROCESSOS DE USINAGEM Ananias Francisco Dias Júnior, graduando em Engenharia Florestal - UFRRJ; Brasil, Rodovia, BR 465 km 07, Seropédica-RJ, 23890-000. ananiasjr@ufrrj.br Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Pablo Vieira dos Santos, Vítor César Magnan Teixeira, Alexandre Monteiro de Carvalho, João Vicente de Figueiredo Latorraca 1. Introdução A madeira é um recurso natural renovável, que exige baixo consumo de energia para o seu processamento, possui propriedades tecnológicas tais como alta resistência devido à densidade, isolamento térmico/elétrico e boa trabalhabilidade, tanto manual como por máquinas. Possuem ainda propriedades organolépticas como cor, cheiro, grã, textura, brilho e desenho que são desejáveis para diversas aplicações e usos. Tais fatores fazem deste material um recurso de extrema importância tanto ambiental quanto econômica para o país. O segmento de móveis é um dos principais consumidores de peças de madeira que exigem qualidade em seus processos de usinagem. As exportações da indústria de base florestal (madeira, móveis, papel e celulose) vêm crescendo nos últimos anos, destacando-se no conjunto da economia nacional. Em 2008 as vendas externas destes segmentos chegaram a US$ 9,5 bilhões, ou seja, 7% do total exportado pelo Brasil. Mesmo sendo um gênero de crescimento rápido, a madeira de eucalipto não despertava até pouco tempo muito interesse na indústria moveleira. Afinal, sempre gerou grandes defeitos causados pela presença de tensões internas de crescimento e propriedades físicas e mecânicas heterogêneas, sendo estas características resultantes das variações em seus componentes anatômicos, tanto na direção axial quanto na radial (SILVA et al. 2005). Além dos defeitos citados, as indústrias enfrentam o preconceito dos consumidores em relação ao uso da madeira de eucalipto para produção de móveis, devido a resultados negativos encontrados pelo setor moveleiro no início do século XX (SILVA, 2003). A madeira de Eucalyptus é conhecida, de forma geral, como de difícil secagem, devido a sua estrutura anatômica desfavorável ao fluxo de líquidos. Segundo Dias Júnior et al. (2010), na definição de qualidade da madeira, a densidade é a propriedade que mais responde pela obtenção do produto final, pois agrega consigo todas as demais características físico-mecânico da madeira. A retratibilidade da madeira também é uma propriedade importante, definida como a movimentação da madeira (inchamento ou encolhimento) ocasionada pelo ganho ou perda de água após o ponto de saturação das fibras. Portando essas propriedades devem ser levadas em conta para se processar a madeira com eficiência de custo e qualidade. Quando o assunto é qualidade da madeira após processos de usinagem, sabe-se que fatores adicionais porcentagem de madeira juvenil, tipo de localização (cerne ou alburno), ângulo das microfibrilas, orientação da grã, quantidade de extrativos, teor de umidade, dentre outros, influem diretamente no valor final desta matéria-prima. Segundo Silva (2005) a usinagem da madeira está
em função de cinco componentes básicos que são: matéria-prima, relacionada com todas as propriedades intrínsecas da madeira e suas interações com o processo; máquina, relacionada com os aspectos construtivos das máquinas, incluindo os dispositivos de fixação, de condução e de exaustão de cavacos que visam à melhoria da operação de usinagem; metodologia, abrange toda a definição das escolhas das ferramentas mais adequadas para otimizar o processamento; mão-de-obra, considera o treinamento dos operadores executores das tarefas de usinagem que devem ter conhecimentos de todos os itens anteriores para poder interferir, no momento certo, caso notem alguma deficiência no processo; meio ambiente, considera-se que todas as fases de processamento devem evitar degradações do ambiente com pensamento de melhor aproveitamento da matéria-prima minimizando os resíduos e ruídos. O conceito de qualidade da usinagem é apresentado por dois grupos de pesquisadores de forma diferente. O primeiro grupo relata o conceito de qualidade apenas por meio dos valores normativos da usinagem, através do cálculo de avanço por dente (fz) ou da profundidade do arco ciclóide (t), mostrados na Figura 1 (presente no anexo), enquanto o segundo grupo leva em conta além destes já citados, a ocorrência de falhas na superfície, geradas em função da estrutura da madeira pela presença dos diferentes tipos de células, de suas diferentes dimensões e orientações. Dessa forma, é importante conhecer a melhor forma de trabalhar cada espécie, correlacionando com as suas propriedades físicas e as condições predisponentes para execução de tais operações (condições das máquinas, ferramentas de corte e capacitação dos operadores). 2. Materiais e Métodos A madeira que serviu como matéria-prima para realização deste trabalho foi coletada a partir de cinco árvores de cada espécie, totalizando 20 arvores implantadas em plantio situado no Campus Universitário da UFRuralRJ de aproximadamente vinte anos de idade. Foi selecionada a primeira tora a partir da base descartando os primeiros 20 cm a partir do chão. Após o processamento, ainda em campo, foram obtidas toras de aproximadamente 1,5 metros de comprimento e diâmetro mínimo de 30 cm. Para a realização dos ensaios de usinagem os corpos-de-prova foram obtidos através das chamadas pranchas diametrais. Confeccionaram-se pranchas de cada tora com tamanho máximo de 1,5 m de comprimento por 10 cm de largura. Essas pranchas seguiram para o Laboratório de Processamento da Madeira LPM do Departamento de Produtos Florestais da UFRuralRJ para produção dos corpos-de-prova necessários para a realização dos ensaios de usinagem. As dimensões dos corpos-de-prova possuíam dimensões de 500mm x 125 mm x 25 mm dimensões estabelecidas pelo documento normativo D 1666-87 (revisada em 1994) e pelo trabalho do IBDF/DPq - LPF (1998). A Figura 2 ilustra detalhes dos corpos-de-prova confeccionados. Para realização dos ensaios a norma estabelece que as amostras tenham umidade estável de 12%. Sendo assim, após confeccionados, os corpos-de-prova seguiram para o Laboratório de Propriedades Físicos-Mecânicos da Madeira/DPF/IF/UFRuralRJ onde permaneceram em câmara climatizada com 65% de Umidade Relativa e Temperatura de 20ºC até obterem a umidade de equilíbrio desejada. Os procedimentos adotados nos testes basearam-se também nos parâmetros estabelecidos pela norma ASTM D 1666 87, e no trabalho
realizado por MARQUES et al. (1997) do Laboratório de Produtos Florestais, do IBAMA, intitulado: Madeiras da Amazônia, características e utilização. Foram avaliados os principais defeitos e sua intensidade sobre as peças, aplicando-se um sistema de notas de 1 a 5, onde 1 significa amostra sem defeitos e as demais notas serão determinadas em função da intensidade dos mesmos, conforme a Tabela 1(anexo). Com a umidade estabilizada os corpos-de-prova voltaram para o Laboratório de Processamento da Madeira para realização dos testes. A plaina desengrossadeira usada possuía duas facas, acoplada a um avanço mecânico com quatro velocidades ajustáveis de 6; 11,6; 12,4 e 24 metros/minuto. A rotação da plaina foi de 1600 rpm, com espessura de corte de 3 mm e o ângulo de ataque de 60º. Os corpos-de-prova foram passados na plaina no sentido de concordância e discordância ao crescimento das fibras. A lixadeira usada foi a de bancada com 2,70 m entre a roda motriz e a roda guia, sobre as quais situa-se a lixa de cinta estreita de 150 mm de largura, com costado em tecido drill, camada aberta e grão 80. A face lixada por meio de pressão foi a mesma utilizada no teste de plaina. As análises quantitativas das superfícies usinadas foram feitas através da medição das rugosidades das peças com auxilio de um equipamento desenvolvido no próprio Laboratório de Processamento Mecânico, seguindo o método da agulha, mesa dendrométrica e relógio comparador. O Cut off foi de 20mm e parâmetros da rugosidade da superfície determinados foram: Ra, média aritmética dos valores absolutos dos desvios do perfil da linha média; Rz, soma da altura média dos cinco picos mais altos do perfil e a profundidade dos cinco vales mais profundos do perfil, medidos de uma linha paralela à linha média; Rt, a soma da altura do pico máximo do perfil e a profundidade do vale máximo do perfil sobre a extensão avaliada. Para os ensaios de usinagem foram utilizadas 20 amostras, sendo 10 peças lixadas e 10 peças aplainadas de cada espécie, e de cada peça foram feitas 2 medições no sentido transversal às fibras para cada sentido de usinagem da plaina (a favor ou contra). A análise estatística foi realizada com o uso do programa Assistat 7.6, e os resultados obtidos foram analisados por meio da ANOVA e Teste de Tukey, ao nível de 5% de probabilidade. 3. Resultados e discussão De modo geral, os defeitos mais observados durante as operações de usinagem (aplainamento e lixamento) foram grã arrancada, arrepiamento das fibras, grã felpuda, levantamento das fibras e grã comprimida visualizada na Figura 3. Para o teste de plaina observou-se para a maioria das espécies, que a medida que aumentou-se a velocidade de avanço, piorou a qualidade das superfícies, atribuindo a estas média de 75% de notas 3 e 4. Todas as espécies se comportaram de forma muito negativa quando o sentido de aplainamento era contra o crescimento da grã. A espécie de E. pellita apresentou um comportamento interessante diante do ensaio frente as quatros velocidades de avanço, colocando como uma excelente matéria prima para produção moveleira. Na Tabela 2, encontra-se os valores médios obtidos para as espécies no teste de lixa realizado. Para esse ensaio, as espécies demonstraram acabamento superficial excelente, com 75% das peças sem riscamento e 70 sem grã felpuda.
Além disso, a maioria obteve somente notas entre 1 e 2. Estes resultados demonstram a eficiência do equipamento e que a lixa usada é adequada para essas espécies madeireiras. A fig. 4 apresenta o perfil típico da rugosidade da superfície aplainada encontrado nos experimentos. Na Tabela 3 são apresentados os valores obtidos para Ra que é o principal parâmetro utilizado para avaliar quantitativamente os defeitos gerados em superfícies. Observa-se que o Ra aumenta significativamente a medida que aumenta também a velocidade de avanço das peças ao aplainamento. Nota-se também que os valores foram estatisticamente significativos e que apesar de oscilarem não apresentaram diferenças significativas entre si exceto para a velocidade de 24 m/ minuto. O valor médio de Rt para as espécies que sofreram aplainamento a favor da grã foi de 9,21 enquanto que o valor médio do Rt para aplainamento contra a grã foi de 44, 36, valor muito alto e que deram as peças qualidades inferiores, impossibilitando o seu uso no setor moveleiro. Palermo et all. (2010) estudando a rugosidade de superfícies de E. grandis termorretificadas encontrou Rz médio de 60,16 em aplainamento a favor em velocidade da grã muito próximo ao encontrado nesse trabalho de 78,21. 4. Conclusões e recomendações Na avaliação do comportamento da madeira das espécies de E. urophylla, C. citriodora, E. pellita e E. urograndis visando ao uso na indústria moveleira, chegou-se as seguintes conclusões: - A madeira das espécies estudadas apresentou um bom comportamento para serem utilizadas no setor moveleiro e/ou para fins de acabamento superficiais, pois apresentaram bons resultados frente aos diferentes ensaios de usinagem; - Os resultados mostraram que as espécies devem ser usinadas em velocidades menores (6; 11,6) para apresentarem melhores superfícies para fins que demandem maiores exigências em qualidades; - As espécies se saíram bem quanto ao teste de lixa, mostrando excelente acabamento isenta de imperfeições, adaptando muito bem a lixa com grã utilizada; - Apesar dos valores diferentes dos parâmetros de Rugosidade, principalmente Ra, ficou evidente que não houve diferenças estatísticas entre as velocidades de avanço e sentidos de aplainamentos, exceto para a velocidade de 24 m/minuto devendo esta ser evitada; -Recomenda-se avaliar os defeitos com menor magnitude através de imagens microscópicas (50X), pois assim pode-se descrever e suprir onde for passível de ocasionar qualidade inferiores da matéria-prima; - Sugere-se promover aplainamentos com intervalos menores(3,5,6,8,9,10,12,15,18,20,21,24,25,27 e 30); - Necessita observa-se o estado dos equipamentos utilizados como afiação das facas e brocas bem como bom funcionamento do avanço e treinamento de operadores, pois tais fatores interferem muito na qualidade final do produto.
5. Referências Bibliográficas AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND MATERIALS. ASTM D 1666-87: standard method for conducting machining tests of wood and wood base materials (reapproved 1994). Philaldelphia, 1995. p. 226-245. CARVALHO, A. M. de; SILVA, B. T. B. da; LATORRACA, J. V. de F. Avaliação da Usinagem e Caracterização das Propriedades Físicas da Madeira de Mogno Africano (Khaya ivorensis A. Chev.). Revista Cerne, Lavras, v. 16, suplemento, p. 106-114, 2010. DIAS JÚNIOR, A. F.; BARATA, G. C.; ALMEIDA, R. B.; TEIXEIRA, V. C. M.; CARVALHO, A. M. Propriedades da madeira de mogno africano (Khaya ivorensis A. Chev): Ensaios de Densidade Básica, Densidade Aparente e Cisalhamento. In: Anais do II Simpósio de Ciência e Tecnologia da Madeira do Estado do RJ, 2010. MARQUES, M.H.B., MELO, J.E. et al. Madeiras da Amazônia: características e utilização. 1997. 141p. Brasília: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos recursos Naturais renováveis. MARTINS, S. A.; FERRAZ, J. M.; DOS SANTOS, C. M. T.; DEL MENEZZI, C. H. S.; DE SOUZA, M. R. Efeito da usinagem na rugosidade da superfície da madeira de eucalyptus benthamii maiden et cambage. In: Anais do II Simpósio de Ciência e Tecnologia da Madeira do Estado do RJ, 2010. PALERMO, G.P. de M.; LATORRACA, J. V. F.; MOURA, L. F de; NOLASCO, A. M.; CARVALHO, A. M. de; GARCIA, R. A. Rugosidade superficial da madeira de eucalyptus grandis hill ex. Maiden após termorretificação. In Anais do Simpósio de Ciência e Tecnologia da Madeira do Estado do RJ, 2010. SILVA, M.N.M.; NASCIMENTO, L.F.; POLEDNA, S.C. A importância do fornecedor em segmentos de tecnologia estabilizada: uma análise da inserção do eucalipto no segmento moveleiro. In: Encontro nacional sobre gestão empresarial e meio ambiente, ENGEMA, 7.,2003, São Paulo. SILVA, J. R. M.; MARTINS, M.; OLIVEIRA, G. M. V.; BRAGA, P. P. C. Parâmetros de qualidade da usinagem para determinação dos diferentes usos da madeira de Eucaliptus. Cerne, Lavras, v. 15, p. 75-83, 2009. SIVA, J.R.M.; MUÑIZ, G.I.B; LIMA, J.T; BONDUELLE, A.F. Influência da morfologia das fibras na usinabilidade da madeira de Eucalyptus urophylla Hill ex. Maiden. Revista Árvore, Viçosa, v.29, n.3, p.479-487, 2005.
Anexos Figura 1. Valores normativos de um aplainamento, sendo fz = avanço por dente, t = profundidade do arco de ciclóide, Vc = velocidade de corte das facas e Vf = velocidade de avanço da peça de madeira. Figura 2. Esquema de retirada dos corpos-de-prova para os testes de usinagem. Grã arrancada Grã riscada Figura 3. Defeitos encontrados após o término das operações de usinagem.
Figura 4. Perfil de rugosidade de rugosidade encontrado para espécie de E. urophylla. Tabela 1. Metodologia baseada na ASMT-D 1666/87 utilizada para realização dos testes: Nota Grau Significado 1 Excelente Ausência de defeitos 2 Bom Presença de menos de 50% de defeitos 3 Regular Presença de 50% de defeitos 4 Ruim Presença de mais de 50% de defeitos 5 Muito Ruim Presença de 100% de defeitos Tabela 2. Resultados obtidos para as espécies no ensaio de lixamento: Tipo de defeito Nota Riscamento Grã felpuda 1 75% 70% 2 25% 30% 3 0% 0% 4 0% 0% 5 0% 0%
Tabela 3. Valores médios de Ra para as espécies estudadas. Espécie Ra (μm) (FG) Ra (μm) (CG) Velocidade de Avanço E. pellita 8,44 9,23 E. urograndis 7,19 11,21 E. urophylla 8,21 12,34 6m/min C. citriodora 5,76 15 Média 7,4 b 11,95 b E. pellita 6,32 17 E. urograndis 7,99 11,02 E. urophylla 7,72 10,24 11,6m/min C. citriodora 7,9 19 Média 7,5 b 14,3 b E. pellita 11,2 14,3 E. urograndis 10,15 15,2 E. urophylla 10,76 32,92 12,4m/min C. citriodora 10 13,32 Média 10,53 b 18,94 b E. pellita 9,26 88,18 E. urograndis 14,8 55,21 E. urophylla 13,7 77,1 C. citriodora 5,28 14,48 24m/min Média 10,8 b 58,7 a As médias seguidas pela mesma letra não diferem estatisticamente entre si. Foi aplicado o Teste de Tukey ao nível de 5% de probabilidade. Tabela 4. Análise de variância dos valores de Ra para as espécies estudadas. F.V. G.L. S.Q. Q. M. F Velocidades Avanço 7 8577,43 1225,34 9,402* Resíduo 24 3127,87 130,32 Total 31 1170531,626 ** significativo ao nível de 1% de probabilidade (p < 0,01); * significativo ao nível de 5% de probabilidade (0,01 =< p <0,05); ns não significativo (p >= 0,05)