PROSPECÇÃO E CAPTAÇÃO DE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS EM TERRENOS VULCÂNICOS - ARQUIPÉLAGO DA MADEIRA. Raúl António SIMÕES DUARTE



Documentos relacionados
SANEAMENTO AMBIENTAL I CAPTAÇÕES DE ÁGUA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL E ARQUITECTURA EDUARDO RIBEIRO DE SOUSA

SISTEMA AQUÍFERO: VIANA DO ALENTEJO ALVITO (A6)

SISTEMA AQUÍFERO: COVÕES (M1)

SISTEMA AQUÍFERO: CESAREDA (O24)

LAUDO GEOLÓGICO GEOTÉCNICO GUARITUBA

ASPECTOS SOBRE SISTEMAS DE DRENAGEM EM PEDREIRAS A CÉU ABERTO

ALGUMAS CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICAS DA BACIA HIDROGRÁFICA E DO PERCURSO DO RIO PINHÃO RESUMO

Problemas na Utilização da Água (poluição )

7.0 PERMEABILIDADE DOS SOLOS

SISTEMA AQUÍFERO: FIGUEIRA DA FOZ-GESTEIRA (O7)

GuiadeProjectoeObra ANEXO I- TERMINOLOGIA

ESPECIFICAÇÃO DE SERVIÇO

1 - PRÓLOGO 2 - INTRODUÇÃO 3 - METODOLOGIA

Palavras-chave: Precipitação, cratera, caldeira, alteração supergénica, impermeabilização, recarga, regulador e amortecedor hídricos.

APROVEITAMENTO HIDROELÉCTRICO DE AGILDE

Observação do Comportamento Estrutural da Barragem de Beliche após a Realização de Obras de Reabilitação

CARACTERIZAÇÃO E GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS SUBTERRÂNEOS EM PORTUGAL CONTINENTAL J.MARTINS FERREIRA (1)

Parecer sobre a Salinidade do Rio Araranguá e suas Implicações para a Cultura do Arroz Irrigado

AVALIÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DE ÁGUAS DE POÇOS NO MUNICÍPIO DE SÃO JOÃO DO RIO DO PEIXE

SISTEMAS DE TRATAMENTO DE ÁGUAS E EFLUENTES: UPGRADE DE FOSSAS SEPTICAS PARA ETAR COMPACTA

PERGUNTA 2. Figura 2. Arade Alcantarilha Quarteira. 0m 5000m 10000m

Ecologia para Aldeias de Pesquisa para a Paz

Reconhecer as diferenças

saídas de campo Outras saídas serão divulgadas em breve...

A ADEQUABILIDADE DAS PEDREIRAS PARA A INSTALAÇÃO DE ATERROS DE RESÍDUOS

9º ENTEC Encontro de Tecnologia: 23 a 28 de novembro de 2015


Eixo Temático ET Direito Ambiental OS IMPASSES DA LEGISLAÇÃO AMBIENTAL PARA ATIVIDADE OLEIRA EM IRANDUBA (AM): ENTRE A LEI E OS DANOS

A APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSERVAÇÃO DA ÁGUA EM LISBOA PELA VALORIZAÇÃO DOS EFLUENTES LÍQUIDOS DAS SUAS ETAR

Mod rev 0. Manual de Boas Práticas Ambientais. Prestadores de Serviços de Manutenção de Material Circulante

DIRETRIZES EXECUTIVAS DE SERVIÇOS

Estrutura da Terra Contributos para o seu conhecimento

GEOMORFOLOGIA E ANÁLISE DA REDE DE DRENAGEM DA FOLHA ALHANDRA, TABULEIROS LITORÂNEOS DOS ESTADOS DA PARAÍBA E PERNAMBUCO

INSTALAÇÃO DE UM NOVO SISTEMA DE DRENAGEM PLUVIAL NO VIADUTO DO LOUREIRO

Introdução ao Estudo da Corrente Eléctrica

ELEMENTOS NECESSÁRIOS À INSTRUÇÃO DO PEDIDO DE LICENÇA DE UTILIZAÇÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS DESCARGA DE ÁGUAS RESIDUAIS

GRAVIMETRIA GRAVIMETRIA. 6. Reduções gravimétricas

Tipos de Poços. escavação..

Barómetro Regional da Qualidade Avaliação da Satisfação dos Utentes dos Serviços de Saúde

CRITÉRIOS GERAIS DE PROJECTO DE ESTAÇÕES ELEVATÓRIAS PARA REGA. Aplicação à estação elevatória do Alfundão.

ESCOLA SECUNDÁRIA / 3 JOSÉ CARDOSO PIRES ST.º ANT.º CAVALEIROS - LOURES. TESTE DE AVALIAÇÃO DE GEOGRAFIA N.º 05 GEOGRAFIA A - 1º ANO (10º ano)

1. Canteiro de Obra Campo Grande 03

Aquecimento / Arrefecimento forma de climatização pela qual é possível controlar a temperatura mínima num local.

AUTORES: TELES, Maria do Socorro Lopes (1); SOUSA, Claire Anne Viana (2)

"SISTEMAS DE COTAGEM"

Sistemas de abastecimento de água na ilha da Madeira

AVALIAÇÃO DO EFEITO DO PAVIMENTO NO RUÍDO DE TRÁFEGO RODOVIÁRIO.

HIDRÁULICA APLICADA II

Colégio Salesiano Dom Bosco GEOGRAFIA Prof. Daniel Fonseca 6 ANO. Capítulo 7 Formas, Relevos e solos da Terra

Tratamento de Efluentes na Aqüicultura

CONSOLIDAÇÃO ESTRUTURAL DO CORO ALTO DA IGREJA DO PÓPULO EM BRAGA

Informação a comunicar ao público sobre estabelecimento abrangido pelo regime de prevenção de acidentes graves que envolvem substâncias perigosas

A TERRA ONTEM, HOJE E AMANHÃ

NORMA TÉCNICA MEDIÇÃO DE VAZÃO DE EFLUENTES LÍQUIDOS ESCOAMENTO LIVRE CPRH N 2.004

Análise de Percolação em Barragem de Terra Utilizando o Programa SEEP/W

Aplicação de geoprocessamento na avaliação de movimento de massa em Salvador-Ba.

PAVIMENTOS PERMEÁVEIS: VERIFICAÇÃO DAS CONDIÇÕES DE UTILIZAÇÃO. Juliane Vier Vieira 1. Cristhiane Michiko Passos Okawa 2

CAPÍTULO XX APLICAÇÃO DE TINTAS E VERNIZES SOBRE MADEIRAS

Planeta Terra Contributos para o seu conhecimento


A Geologia no litoral do Alentejo

Artigo. Condensações em Edifícios. Publicado na revista Arquitectura & Vida, nº 63, Set. 2005, pp Maio 2005 AC05103LIS/ENG

[ ] Sementeira, plantação e corte de árvores ou arbustos

Ciências Físico - Químicas. Planificação de uma Actividade Laboratorial No contexto dos Novos Programas

TRANSFORMAÇÃO DE VAGÃO TRADICIONAL DE LASTRO DE BRITA EM VAGÃO AUTOMÁTICO DE ACIONAMENTO HIDRÁULICO

Certificado Energético Edifício de Habitação IDENTIFICAÇÃO POSTAL. Morada RUA ENGENHEIRO CARLOS RODRIGUES, BLOCO N.º 4, 1º D Localidade ÁGUEDA

DELIMITAÇÃO DE VARIAÇÕES LATERAIS NUM RESERVATÓRIO ALUVIONAR COM MÉTODOS ELÉCTRICOS. Nuno ALTE DA VEIGA 1


A ETAR da Ponta. Pág. 1 de 6

TIPOLOGIA SÓCIO-ECONÓMICA DA ÁREA METROPOLITANA DE LISBOA

1 Introdução simulação numérica termoacumulação

Morfologia do Terreno

Termos de Referência do Plano de Urbanização do Vale dos Socorridos ÍNDICE

TIPOLOGIA DE RIOS EM PORTUGAL CONTINENTAL NO ÂMBITO DA IMPLEMENTAÇÃO DA DIRECTIVA QUADRO DA ÁGUA

Reabilitação de revestimentos de pisos correntes com recurso a argamassas

DECLARAÇÃO AMBIENTAL

Posição da SPEA sobre a Energia Eólica em Portugal. Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves

CAPÍTULO 1 GENERALIDADES

CAPÍTULO 4 GEOLOGIA ESTRUTURAL DA ÁREA

PPDA DA REN GASODUTOS ANÁLISE DO RELATÓRIO DE EXECUÇÃO DO ANO GÁS

À boleia: o dispositivo para peixes transporta também enguias, que crescem e se alimentam em água doce e migram para o mar para se reproduzirem.

BETUMINOSOS NO CONCELHO DE VIANA DO ALENTEJO 3.1 MEMÓRIA DESCRITIVA

Capítulo 5: Aplicações da Derivada

As áreas temáticas visadas na construção da síntese de diagnóstico apresentam-se no Quadro 2.77

3.0 Resistência ao Cisalhamento dos Solos

ESTRUTURA GEOLÓGICA E RELEVO AULA 4

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO DEPARTAMENTO DE GEOLOGIA DISCIPLINA DESENHO GEOLÓGICO PROF. GORKI MARIANO

EFEITO DA ÁGUA EM MINAS A CÉU-ABERTO

Atividade 11 - Exercícios sobre Relevo Brasileiro Cap. 03 7º ano. Atenção: Pesquise PREFERENCIALMENTE em seu Livro e complemente a pesquisa em sites.

2 INSTRUMENTAÇÃO E SEGURANÇA DE BARRAGENS

1.º PERÍODO. n.º de aulas previstas DOMÍNIOS SUBDOMÍNIOS/CONTEÚDOS OBJETIVOS. De 36 a 41

Escola Superior de Tecnologia de Setúbal. Modelação e Identificação de Sistemas. Controlo. Ângelo Carmo Luis Santos

V ESTUDO TEMPORAL DA QUALIDADE DA ÁGUA DO RIO GUAMÁ. BELÉM-PA.

Ponte rolante: como escolher

VALÊNCIAS AMBIENTAIS EM ENGENHARIA (VAE) (2ºano MEAmbi) Mestrado Integrado em Engª do Ambiente (2015/2016) Sala QA1.4

Considerações sobre a Relevância da Interação Solo-Estrutura em Recalques: Caso de um Prédio na Cidade do Recife

Até quando uma população pode crescer?

Invenções Implementadas por Computador (IIC) Patentes

Transcrição:

PROSPECÇÃO E CAPTAÇÃO DE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS EM TERRENOS VULCÂNICOS - ARQUIPÉLAGO DA MADEIRA Raúl António SIMÕES DUARTE 1 - INTRODUÇÂO Os recursos hídricos subterrâneos assumem uma elevada importância no potencial endógeno ambiental da Região Autónoma da Madeira, onde, presentemente está a ser implementado um plano de aproveitamento daqueles recursos, com o objectivo de desenvolver e melhorar o fornecimento de água potável. O conhecimento da variabilidade na distribuição das áreas onde a água se encontra disponível, ou onde poderá ser disponibilizada, poderá permitir estabelecer uma estratégia para protecção e conservação das unidades hidrogeológicas potencialmente favoráveis. A intervenção no domínio dos aquíferos subterrâneos, tornou indispensável a recolha de uma série de dados e informação de base para caracterizar a situação e poderem-se tomar as decisões julgadas mais favoráveis à obtenção de água, quer em quantidade, quer em qualidade. Procedeu-se à construção de dezenas de captações tubulares nas zonas baixas das principais linhas de água, de modo a interceptar o elevado potencial aquífero basal existente nessas áreas, instalaram-se galerias de captação de forma a penetrar no interior dos maciços vulcânicos e atingir as formações permeáveis na dependência das áreas favoráveis de recarga. Foi ainda efectuado o reforço da Estação Dessalinizadora do Porto Santo, com o recurso a captações de água salgada, instaladas nas proximidades da linha de costa. 2 - CARACTERIZAÇÃO HIDROGEOLÓGICA 2.1 - Ilha da Madeira O comportamento hidrogeológico das formações vulcânicas da ilha da Madeira, encontra-se em estreita ligação com a idade dos complexos onde estão inseridas, e consequentemente com o tipo de litologia nelas prevalecente. (1) Geólogo, INAG

Outro factor importante prende-se com a ocorrência de estruturas geotectónicas que sob a forma de fracturas ou de filões condicionam as diferentes unidades aquíferas, quer em dimensões e continuidade, quer nas condições de infiltração e permeabilidade. A percolação aquífera subterrânea torna-se por vezes de extrema complexidade, quando os factores litológicos se encontram influenciadas por perturbações estruturais, ou ocorram alterações na sequência vulcânica; há ainda a realçar que os valores de permeabilidade e porosidade não permanecem constantes ao longo da mesma escoada ou dos materiais de projecção. A variabilidade da permeabilidade e porosidade poderá estar relacionada não só com o estado de alteração e compacidade das formações, mas também com a distribuição espacial de níveis de escórias, brechas de escórias e das escoadas lávicas e, ainda com a variação granulométrica dos materiais piroclásticos. Com base nestes conceitos foram estabelecidas quatro unidades hidrogeológicas, onde se encontram implantadas numerosas captações. Na Figura 1 apresenta-se a distribuição destas unidades. Figura 1 - Recursos Hídricos Subterrâneos da Madeira 2.1.1. - Áreas Favoráveis à Infiltração Trata-se de um modo geral, de áreas aplanadas, com materiais vulcânicos de elevada permeabilidade, ocorrendo um sistema de fracturação importante muitas vezes associado à ocorrência de aparelhos vulcânicos. Outro factor característico é a elevada pluviosidade e a presença de grande concentração de humidade atmosférica, o que contribui de forma decisiva para o aumento da percolação aquífera subterrânea e a acumulação de reservas.

Maciço do Paul da Serra - Constitui uma extensa área caracterizada por escoadas de basaltos com disposição sub-horizontal, com vários níveis de escórias e raros tufos. ocorrendo superficialmente uma camada de cinzas possivelmente relacionadas com o episódio vulcânico mais recente. Nesta zona planáltica não existe uma rede hidrográfica bem definida e hierarquizada, devido à rápida infiltração da água das chuvas provocada pela elevada permeabilidade do maciço rochoso e pela topografia que não permite uma fácil escorrência superficial. Outro factor que contribui para a infiltração é a intensa fracturação predominantemente NW-SE, que desempenha um papel importante na recarga profunda. Existe um grande número de nascentes que surgem entre as 1500 e 1600 m na Bica da Cana, Juncal, encontrando-se outra série entre as 1300 e 1400 m e as mais produtivas cerca da cota dos 1000 m, estas últimas parecendo relacionadas com um nível de base conglomerático, CONDE et al (1988). Algumas galerias de captação devem a sua produtividade à recarga oriunda deste maciço, entre as quais se destacam as seguintes: A Galeria das Rabaças, atravessou inicialmente um nível de conglomerados seguido de tufos e escórias basalticas, sendo neste contacto onde apareceu a primeira zona produtiva. Esta galeria terminou em lavas basálticas, tendo atravessado uma zona intensamente fracturada aos 1850 m, de onde provêm a elevada produtividade. A Galeria do Rabaçal, implantada junto à Levada do Risco, atingiu apenas 500m, cortando escoadas lávicas intercaladas com níveis de escórias basálticas, captou um caudal de 100 l/s em ligação com diques basálticos. A Galeria da Rocha Vermelha, com orientação NE-SW, inicia-se na Ribeira da Janela, prolongando-se até à Ribeira do Seixal com uma extensão de aproximadamente 1750 m. O emboquilhamento SW atravessa rochas piroclásticas até cerca de 800 m, mostrando-se aqui praticamente improdutiva, seguindo-se basaltos e escórias cortados por diques, onde se observou o aparecimento de grande quantidade de água com elevada pressão, cerca de 200 l/s. Chão dos Balcões - João do Prado; Cedro - Pico do Areeiro Com ocorrência de lavas escoriáceas e basálticas fragmentadas em áreas relativamente aplanadas, havendo um adensamento de diques em posição favorável de conexão hidráulica entre a superfície e os complexos vulcânicos subjacentes. A Galeria dos Tornos parece estar em ligação directa com estas áreas de infiltração, aparecendo a água em compartimentos de dique com diferentes pressões hidrostáticas. Registaram-se elevados caudais entre os 960 e 1220 ; 3100 e 3150 m; 3210 e 3330 m e ainda entre os 3340 e 3600 m. Santo da Serra

As condições de infiltração estão em relação com o sistema estrutural aí instalado, pois a ocorrência de um aparelho vulcânico provavelmente correspondente a uma caldeira de subsidência, associado a diques localizados a sul e a leste, favorecem mecanismos de percolação vertical e, consequentemente, a recarga profunda dos aquíferos. Esta área parece ser responsável, em parte, pela recarga da Galeria das Fontes Vermelhas e dos furos de captação instalados nas Ribeiras de Santa Cruz e de Machico com produtividades de 65 a 100 l/s, com rebaixamentos da ordem de 1,5 a 4 m e com elevada carga piezométrica. 2.1.2 - Aquíferos Locais e Descontínuos de Elevada Produtividade As escoadas lávicas de carácter essencialmente efusivo, com níveis de escórias, brechas, basaltos fragmentados e até vacuolares, têm alta permeabilidade apresentando quase sempre elevada produtividade. Quando se situam em àreas saturadas podem considerarse como bons aquíferos. Os valores da permeabilidade são geralmente variáveis em função do grau de fracturação e da quantidade, tamanho e continuidade dos vazios existentes, podendo ocasionalmente adquirir menores valores devido à alteração do material rochoso. A ocorrência de tufos ou níveis argilosos origina aquíferos suspensos e se existem descontinuidades laterais devido à existência de diques, a água é armazenada em compartimentos ou células com pressões hidrostáticas diferentes, função das dimensões, posicionamento e localização destes aquíferos confinados. Nestes compartimentos a água poderá ainda circular através das zonas fracturadas verticais que se desenvolvem paralelamente aos diques. Quando atingem o nível de saturação, descarregam para outros compartimentos laterais ou na superfície topográfica. As manifestações deste tipo de aquífero foram observadas em várias galerias, de entre as quais se destacam como mais importantes: A Galeria do Porto Novo, em direcção ao planalto do Poiso - João do Prado, atingiu o comprimento total de cerca de 2900 m. Até aos 2640 m mostrou pequenos indices de produtividade; a partir desta extensão iniciou o atravessamento de formações do aparelho vulcânico do Meio da Serra, constituídas por basaltos escoriáceos e vários diques, com produtividade que atingiu 200 l/s. A Galeria da Levada do Seixal, com comprimento total de 1800 m, apenas mostrou produtividade na parte média do traçado, tendo a água surgido ao longo de compartimentos de diques, com caudal superior a 30 l/s. Existem um grande número de nascentes que emergem na Ribeira da Janela, na Ribeira do Seixal, na Ribeira Brava e ainda ao longo do robordo dos Planaltos Chão dos Balções, João do Prado e Santo da Serra.

2.1.3 - Aquíferos de Moderada a Elevada Produtividade, com Reservas Somente Locais De modo geral o que distingue o comportamento hidrogeológico desta mancha da anterior é um menor predomínio e espessura das camadas lávicas, as quais se apresentam intercaladas por maior número de níveis de materiais piroclásticos diminuindo-lhes o valor médio da permeabilidade. A ocorrência de aparelhos vulcânicos e a manifestação de fenómenos de vulcanismo fissural com o aparecimento de massas filoneanas, origina a existência de reservas aquíferas locais, quando as condições de recarga são favoráveis. A Galeria das Fontes Vermelhas atravessou camadas basálticas e um complexo de rochas piroclásticas até cerca dos 1100 m, cuja produtividade não ultrapassava os 20 l/s, e a partir desta extensão cortou um dique seguido de basalto escoriáceo, donde surgiu um caudal de 200 l/s. Existem ainda algumas galerias de pequena extensão nas zonas da Quinta Grande, Campanário, Calheta, Prazeres e Fagã da Ovelha, que servem de origem de abastecimento a pequenos núcleos populacionais e para rega, apresentando moderada produtividade de 3 a 10 l/s. Estes valores são devidos à ocorrência de rochas em que prevalecem níveis piroclásticos e basaltos em fase de alteração, portanto, de fraca permeabilidade. As captações tubulares instaladas nas zonas baixas das bacias hidrográficas das Ribeiras de Socorridos, Porto Novo e Santa Cruz, devem a sua exploração aquífera às reservas acumuladas no interior destas formações em locais que estruturalmente se afiguram favoráveis. Os valores de transmissividade oscilam entre 3 x 10 3 m 2 /d e 4 x 10 3 m 2 /d, podendo proporcionar caudais de 40 a 90 l/s com rebaixamentos de 1,0 a 5,0 m. De modo a preservar a qualidade química e bacteriológica dos aquiferos captados, a zona não saturada foi isolada por cimentação, impedindo-se a passagem de água oriunda da escorrência superficial. 2.1.4 - Aquíferos Pouco Produtivos ou Eventualmente de Boa Produtividade em Zonas Muito Localizadas. Foram incluídas nesta mancha as formações da primeira fase eruptiva, de constituição muito heterogénea, com materiais de natureza piroclástica e com algumas lavas basálticas quase sempre em grande estado de alteração, originado à superfície produtos essencialmente argilosos.

Os trabalhos de captação horizontal que atravessam em determinados troços esta mancha, têm-se mostrado com caudais extremamente reduzidos, muito embora a sua traçagem esteja implantada por vezes em áreas com elevados valores de precipitação. Tal facto prende-se com a fraca permeabilidade dos materiais que compõem estas formações geológicas e necessariamente com a falta de infiltração necessária a criação dum fácil fluxo de percolação. Muitas vezes, encontram-se diques ao longo do traçado das galerias aqui instaladas, no entanto, o contributo de produtividade é sempre pequeno, talvez devido a uma enorme perda de carga na percolação, resumindo-se quase sempre em pequenos pingueiros. Estão nestas condições o troço da Galeria dos Tornos na zona da Ribeira Seca, do Caldeirão Verde e Boaventura, o Túnel na Fajã do Penedo, a Galeria do Curral das Freiras e os Túneis dos Fins Múltiplas. Nas captações tubulares instaladas na Ribeira de Machico, foram encontrados valores de boa produtividade, tendo-se atravessado alguns níveis de materiais grosseiros, por vezes de aspecto escoriáceo pouco argilosos e de lava basálticas muito fracturada a partir dos - 60,0 m, originando em dois furos um nível aquífero superior à superfície topográfica e debitando naturalmente um caudal superior a 10 l/s. As condições favoráveis de produtividade e a elevada carga piezométrica encontradas nestas captações parece poderem atribuir-se a fenómenos de vulcanismo fissural de direcção NNE-SSW e ENE-WSW que condiciona a percolação de zonas periféricas a cotas mais elevadas em direcção ao vale, o que permite uma acumulação de reservas importantes. 2.2 - Ilha do Porto Santo As potencialidades dos recursos hídricos subterrâneos da Ilha do Porto Santo são muito reduzidas em virtude da constituição litológica e gemorfológica da ilha, as quais associadas às condições climáticas desfavoráveis para recarga, não permite a ocorrência de aquíferos importantes. Outro factor desfavorável é a excessiva mineralização da água, com elevados teores de Cl -, cuja origem se poderá atribuir à génese das formações vulcânicas, incorporando na sua constituição grandes quantidades de sais. Poderá haver também uma contribuição das brisas marinhas, no entanto, é notório que quanto maior for a espessura das formações calcareníticas, menor é o valor da condutividade e teor de cloretos. As formações vulcânicas apresentam uma permeabilidade diminuta pois, mesmo quando fracturadas mostram tendência para se colmatarem por efeito da argilificação. As formações sedimentares, dada a pequena e irregular espessura e a heterogeneidade litológica, não permitem a acumulação de reservas, funcionando apenas como recarga das formações subjacentes. Nalguns locais apresentam-se soltas desagregando-se com facilidade, chegando mesmo a originar vazios a que chamamos pseudo - carsificação, noutros encontram-se fortemente solidificadas com crostas duras e compactas.

A rede filoneana, compartimentando, e cortando indiscriminadamente todas as formações geológica, indica grande instabilidade vulcânica provavelmente durante o Quaternário, dando origem a descontinuidades e não permitindo a ligação hidráulica nas áreas de melhor aptidão aquífera. Da análise das condições hidrogeológicas foi possível estabelecer duas manchas distintas de acordo com a permeabilidade, representadas na Figura 2. Figura 2 - Recursos Hídricos Subterrâneos de Porto Santo 2.2.1 - Aquíferos Pouco Produtivos Englobam-se as rochas sedimentares, com realce para os calcarenitas os quais, embora não possuam qualquer armazenamento aquífero, permitem uma razoável infiltração das águas das chuvas e a sua acumulação nas rochas subjacentes. A permeabilidade com valores calculadas entre 10-6 e 10-4 m/s, LOBO FERREIRA ET AL (1981), poderá ainda ser menor nos casos em que a granulometria seja muito fina ou a cimentação mais intensa, ou quando existe intercalações argilo- -detriticas. As captações aqui instaladas obtêm os seus débitos na base dos calcarenítos, constituindo as origens de água subterrânea mais produtivas e de melhor qualidade química tais como as da Ribeira do Tanque, do Ribeiro Cochino, do Ribeiro Salgado. da Fonte da Areia, Perregil e Fonte Velha. Estas captações são essencialmente constituídas por poços designados localmente por Noras, munidas por vezes com galerias na base. Existem ainda pequenas galerias executadas para o aproveitamento e melhoria de algumas nascentes. Foram efectuada numerosas sondagens de pesquisa e eventual captação de água subterrânea, a grande maioria com resultados desfavoráveis, quer do ponto de vista

quantitativo quer qualitativo. Destas apenas uma se encontra em serviço e localizada junto ao Hotel do Porto Santo, com produtividade de 5 m 3 /h e com um teor de cerca de 1000 mg/l de cloretos. A origem de água subterrânea para abastecimento público provem essencialmente de seis núcleos de captação, com produção média diária da ordem dos 465 m 3. 2.2.2 - Aquicludo ou Região sem Água Subterrânea Apreciável Incluimos nesta mancha as formações vulcânicas quer as fracturadas que mostram tendência para se colmatarem, quer as de natureza piroclástica com comportamento que se poderão considerar como impermeáveis. Na zona sudoeste, a captação do Zimbralinho adquire especial importância devido não só ao contacto de uma brecha conglomerática com filões basálticos, como a fenómenos de transferência de água entre bacias hidrográficas, Lobo Ferreira et al (1981), ocasionados por um sistema de fracturas acompanhadas por massas filoneanas. Na zona nordeste, ocorrem algumas pequenas emergências de caracter sazonal, que funcionam como descargas de água infiltrada no topo dos maciços, mas com produtividades diminutas. Nesta mancha existem duas galerias com cerca de 500 m de extensão, uma localizada na margem direita do Ribeiro Cochino e outra, nas proximidades de Srª da Graça, mas com resultados desanimadores, pois os teores dos cloretos variam entre 3000 e 2000 mg/l e os caudais são insignificantes. 2.3 - Captação de Água Salgada Os calcarenitos embora apresentem uma porosidade e permeabilidade razoável, não parecem originar qualquer aquífero de água doce importante, na Ilha de Porto Santo. A existência de calcarenitos junto a costa meridional abaixo do nível do mar, provavelmente por efeito do basculamento da ilha para sul, permite uma infiltração da água do mar através de percursos preferenciais introduzidos pela granulometria e os espaços vazios de alguns níveis litológicos. Na Figura 3 apresenta-se um perfil geológico interpretativo.

Figura 3 - Perfil geológico interpretativo As zonas que se afiguram mais favoráveis para implantação de captações destinadas à obtenção de água salgada, deverão corresponder à foz das linhas de água com maior área de drenagem e que ao mesmo tempo apresentem uma maior superfície de planície de nível de base. Salienta-se o facto de dois furos, executados na foz da Ribeira da Ponta, junto a linha de costa, terem produzido caudais de 19 e 40 l/s com rebaixamentos máximos da ordem dos 5m. Na implantação das sondagens realizadas em 1995, atendeu-se à existência já em funcionamento da Central Dessalinizadora e de uma captação de água salgada, tentandose assim diminuir os custos de adução. Um problema que se coloca à exploração de água salgada, é a que esta, deverá estar isenta de matéria orgânica, de siltes de argilas e com teores de materiais em suspensão sobre a forma coloidal <0,5 Sdi (Silt density index), isto de modo a evitar qualquer prétratamento. Nestas condições na captação de água salgada deverá ter-se especial atenção ao seguinte: Na fase de construção, à ocorrência de níveis finos argilosos quase imperceptíveis na furação, à utilização de tubos-ralos com slot apropriado e à execução de um maciço drenante com espessura e granulametria adequada. Na fase de exploração, ao regime de bombagem, que deverá ser praticamente contínuo e limitando-se o mais possível as paragens e arranques, de modo a evitar alterações na estrutura do maciço drenante.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, C.; ROMARIZ, C. e SILVA, M.O. - Hidrogeoquímica da ilha da Madeira. Revista Recursos Hídricos. - Lisboa, nº5 (3) 1984, P.33-42. BRANDÃO, José M. e Carvalho, GALOPIM, A.M. de Geologia do Arquipélago da Madeira. Lisboa: Univarsidade de Lisboa. Museu Nacional de História Natural, Mineralogia e Geologia, l99l CÂMARA, G. N. Noronha da e LOUREIRO, J.J.M. Medição de caudais na Ilha da Madeira. Revista de Geologia Aplicada e do Ambiente. - Lisboa, vol. II (1) 1988, p. 71-76. CONDE, Luís N.; RODRIGUES, A. Malho e BARATA, T. Abrunhosa, Coimbra Estudo Geológico do Paul da Serra. 1988. DOYEL, W.W. - A Program for the assessment and continued monitoring of the water resources of the Island of Madeira. U.S. Geological Survey, Water Resources Division, Office of International Hydrology, Administrative Report, 1981 DUARTE, S. e SILVA, M. - Características hidrogeológicas da galeria do Complexo Hídrico 7 de Outubro. Revista de Geologia Aplicada e do Ambiente. - Lisboa, vol. II (1) 1988, p. 24-26. DUARTE, S. e SILVA, M. - Captações de águas subterrâneas na Ribeira de Machico. Revista de Geologia Aplicada e do Ambiente. - Lisboa, vol. II (1) 1988, p. 55-62. DUARTE, S. e SILVA, M. - Condições Hidrogeológicas na Ribeira dos Socorridos. Revista de Geologia Aplicada e do Ambiente. - Lisboa, vol. II (1) 1988, p. 77-83. ESTEVES, J. Moura - Problemas estruturais da captação de águas subterrâneas do Complexo Hídrico 7 de Outubro (Fontes Vermelhas-Machico). Revista de Geologia Aplicada e do Ambiente. - Lisboa, vol. II (1) 1988, p. 34-37. FERREIRA, J. Martins - Relatório sobre as Condições Geoidrológicas da Ilha do Porto Santo. - Lisboa, 1976. FERREIRA, J. Martins - Pesquisas hidrogeológicas na Ilha da Madeira. Secretaria Regional do Equipamento Social. - Funchal, 1979. FERREIRA, J. Martins - Relatório sobre a Campanha de Pesquisas Geohidrológicas em Porto Santo: - Lisboa, 1979.

FERREIRA, J. Martins - Notas hidrogeológicas sobre algumas captações de água na Ilha da Madeira. Revista de Geologia Aplicada e do Ambiente. - Lisboa, vol. II (1) 1988, p. 84-89. FERREIRA, J. P. Lobo e outros - Estudo Global dos Recursos Hídricos da Ilha do Porto Santo. Estudo realizado para o Governo Regional da Madeira. Relatório LNEC. - Lisboa. 1981. FERREIRA, J. P. Lobo e outros - Avaliação dos recursos hídricos subterrâneos da Ilha da Madeira. Estudo realizado para o Laboratório Regional de Engenharia Civil da RAM. Relatório LNEC. - Lisboa, 1993. GAGEL, C. - Estudo sobre a Estrutura e as rochas da Madeira. Trad. do original de 1912. Centro de Estudos de Geologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. - Lisboa, 1969. GEORGE, C. Taylor - Hydrgeologic evaluation of the Cidrão Gallery. Câmara Municipal do Funchal. - Funchal, 1983. LOUREIRO. J. J. Mimoso - Monografia hidrológica da Ilha da Madeira. Revista Recursos Hídricos - Lisboa, nº.5 (2) 1984, p. 53-71. MACHADO, Manuel José S. Sousa - Balanço hídrico e clima da Ilha da Madeira. - Lisboa, Instituto Nacional Meteorologia e Geofísica. Direcção de Estudos,, 1970. PORTUGAL. MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS - Aproveitamento de água na Ilha da Madeira. Lisboa, Ministério das Obras Públicas. Comissão Administrativa dos Aproveitamentos Hidráulicos da Madeira, 1969. PORTUGAL. MINISTÉRIO DAS OBRAS PÚBLICAS - Abastecimento de água à Ilha da Madeira. Plano Geral. - Lisboa, Ministério das Obras Públicas. D.G.S.U., 1971. MORAIS, J. C. Custódio de - O Arquipélago da Madeira Revista Memórias e Notícias. - Coimbra, vol. 15, 1945, p. 3-60. NASCIMENTO, Susana Luisa Rodrigues - Estudo Hidrogeológico do Paul da Serra. Dissert. de Mestrado. Fac. de Ciências da Universidade de Lisboa. - Lisboa, 1990. PARADELA, Pedro Lopes - Hidrogeologia Geral das Ilhas Adjacentes. Comunic. Serv. Geol. Port. - Lisboa, nº. 66,1980, p. 241-256. PESSOA, F. - Esquema de um Ordenamento para Ilha de Porto Santo. Revista Estudo e Informação. - Lisboa, nº.231, 1967. PLANO DE FOMENTO DO PORTO SANTO - Abastecimento de Água a Pé do Pico e Casinhas, 1974.

RIBEIRO, A. e outros - Introduction à la Geologie Génerale du Portugal. Serv. Geol. Port. Lisboa. Lisboa, 1979. SILVA, M. Oliveira da - Hidrogeologia da Ilha da Madeira. Revista de Geologia Aplicada e do Ambiente. - Lisboa, vol. II (1), 1988, p. 96-102. TEIXEIRA, C. - Introdução à geologia de Portugal. Instituto Nacional de Investigação Científica. - Lisboa, 1980. ZBYSZEWSKY, G. - Carta Geológica de Portugal. Escala 1:50.000. Notícia Explicativa das Folhas A e B da Ilha da Madeira. Srv. Geol. Port. - Lisboa, 1975.