CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA DE MATERIAL DE DRAGAGEM DO CANAL DE ACESSO AO PORTO DO RIO GRANDE

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Transcrição:

CARACTERIZAÇÃO GEOTÉCNICA DE MATERIAL DE DRAGAGEM DO CANAL DE ACESSO AO PORTO DO RIO GRANDE Arielle Lisboa Machado Acadêmica do curso de Engenharia Civil Empresarial, Universidade Federal do Rio Grande - FURG arielle.machado@hotmail.com Cezar Augusto Burkert Bastos Professor dos cursos de Engenharia Civil, Universidade Federal do Rio Grande - FURG cezarbastos@furg.br Diego de Freitas Fagundes Professor dos cursos de Engenharia Civil, Universidade Federal do Rio Grande - FURG dffagundes@gmail.com Resumo. O presente artigo trata da caracterização geotécnica, por meio de ensaios de granulometria e limites de Atterberg realizada com material de dragagem recentemente extraído do canal de acesso do Porto de Rio Grande, numa grande operação de dragagem iniciada em outubro de 2018, que visa retirar 3,5 milhões de metros cúbicos de sedimentos do canal, viabilizando a navegação de maior calado neste que vem a ser o 2º maior porto marítimo de nosso país. A influência do uso de água mar nos ensaios de caracterização geotécnica convencional (análise granulométrica conjunta e limites de Atterberg) é discutida. Seguindo a referência normativa (uso de água destilada nos ensaios) o material de dragagem é uma areia siltosa de alta plasticidade e também alta atividade coloidal e ensaiado com água do mar é uma argila siltosa ou silte argiloso de alta plasticidade e baixa atividade coloidal. A classificação SUCS varia de CH para solo ensaio com água destilada para OH quando ensaiado com água do mar. Conclui-se que os resultados dos ensaios caracterização são fortemente influenciados pela natureza do fluído empregado. Palavras-chave: Material de dragagem. Caracterização Geotécnica. Porto do Rio Grande. 1. INTRODUÇÃO O processo de caracterização e classificação do solo é fundamental para se inferir sobre seu comportamento, sendo indispensável para obras de engenharia, principalmente quando aplicado à construção de aterros, camadas de pavimentação e sujeito ao acréscimo de tensões devido a cargas externas. No que tange a obras costeiras e portuárias, o material oriundo de dragagens é por vezes o principal material geotécnico envolvido e assim, entender a natureza e o comportamento destes solos é fundamental para o planejamento de operações de dragagem, forma de transporte e disposição final do rejeito. Com o avanço das obras portuárias, sejam de acostagem, atracação, proteção, circulação,

ganhos sobre o mar, ou em locais próximos a presença de água doce ou salgada é primordial o conhecimento cada vez mais preciso do comportamento do material de dragagem para o projeto e execução de obras de engenharia com maior segurança e confiabilidade. Dependendo do meio dragado, o fluido intersticial detém salinidade, cujo efeito repercute na caracterização geotécnica convencional. Esse fator não costuma ser levado em consideração na hora de se estimar propriedades do material através dos ensaios geotécnicos de caracterização. A salinidade interfere principalmente nos solos argilosos, onde a alteração do ph do material influencia diversas propriedades do mesmo, e.g., viscosidade, resistência não drenada, limites de consistência, permeabilidade, entre outros (NAEIMI e JAHANFAR, 2011, LOCAT e DEMERS, 1988, HAJELA e BATHNAGAR, 1972). Fagundes et al. (2018), no estudo sobre influência da salinidade nos limites de consistência e na distribuição granulométrica de amostras de solos artificiais a base de caulim e bentonita, mostra que os limite de plasticidade não apresentaram variações significativas para o aumento da concentração salina. Por outro lado, o limite de liquidez e o índice de plasticidade têm uma redução proporcional ao aumento da salinidade. O presente artigo trata-se de um estudo de caso onde foi realizada a caracterização geotécnica do material oriundo da dragagem do canal de acesso do Porto de Rio Grande, analisando a influência, nos resultados obtidos, da salinidade da água empregada nos ensaios. O material de dragagem do canal de acesso ao Porto do Rio Grande foi estudado por Dias e Kerstner (2003). Os autores construíram bacias de disposição em área do Superporto do Rio Grande para armazenar rejeitos de dragagem bombeados para o local. O volume total lançado foi de 29.050 m 3. Os ensaios de caracterização determinaram que o solo formado nas bacias é classificado como uma argila siltosa. A investigação descrita no presente artigo constitui parte de estudo em andamento, que tem como objetivo determinar as propriedades geotécnicas do material proveniente de dragagens quando consolidado. Dragagens estas que estão sendo realizadas no canal de acesso do Porto do Rio Grande desde outubro de 2018 e que deve totalizar a remoção de 3,5 milhões de metros cúbicos de sedimentos. Espera-se com o estudo melhor conhecer o material de dragagem sob a ótica da Engenharia Geotécnica, com sua caracterização física e determinação das propriedades (resistência ao cisalhamento, velocidade de adensamento, deformabilidade, dentre outros). Essas informações são relevantes quando de uma alternativa por sítios de despejo continentais e seu posterior uso na Engenharia Civil. 2. MATERIAIS E MÉTODOS A caracterização do material foi realizada com base na sua distribuição granulométrica, por meio de uma sequencia de procedimentos normatizados, somada às propriedades de plasticidade do material obtidas através dos ensaios de limites de Atterberg. O material de dragagem utilizado na pesquisa foi retirado em estado fluido (lama) do interior da draga que atualmente opera no canal de acesso. O mesmo foi seco e submetido aos ensaios de análise granulométrica conjunta (peneiramento e sedimentação) e limites de Atterberg. Para a realização dos ensaios, foram separadas duas amostras: a primeira amostra para ensaios com água destilada e a segunda para ensaios com a água do mar, que acompanha o material na amostragem.

A Figura 1 ilustra o material de dragagem tão logo sua chegada ao Laboratório de Geotecnia e Concreto da FURG. água e o peso dos sólidos. Em solos argilosos moles ou lamosos pode-se ter teor de umidade superior a 100% (CAPUTO, 1977). 2.2. Análise granulométrica. Figura 1. Amostra de material proveniente da dragagem do canal de acesso do Porto do Rio Grande 2.1. Determinação do peso específico dos grãos Para obter o peso especifico real dos grãos (ɣs) foi realizado o ensaio de picnômetro conforme NBR 6458/16 (ABNT, 2016a). Uma amostra de 100g de solo foi previamente seca em estufa a 60ºC e submersa a imersão em água destilada por 24 horas. Após, a amostra foi agitada no dispersor por 15 minutos e colocada na bomba de vácuo por 30 min. O peso específico real dos grãos é função da composição mineralógica do solo, tendendo a decrescer com a presença de matéria orgânica. Para solos os valores variam normalmente entre 25 e 28 kn/m³, tendo como referência o valor do quartzo de 26,5 kn/m³. Não foram ainda realizados ensaios de determinação de matéria orgânica, mas devido sua origem e ao despejo de esgoto urbano e industrial sem tratamento onde se dá o acesso ao Porto de Rio Grande, pode-se esperar que o valor do peso específico dos grãos da amostra seja baixo. O teor de umidade da amostra foi obtido através do método da estufa. Duas amostras fluidas foram homogeneizadas e secas em estufa a 60ºC. O teor de umidade é definido como a relação percentual entre o peso da A principal informação para a caracterização de um solo é sua distribuição granulométrica, representada pela sua curva granulométrica, que consiste na representação gráfica da distribuição porcentual dos diferentes tamanhos de grãos presentes em uma amostra representativa. A análise granulométrica de solos foi executada conforme prevê a NBR 7181/16 (ABNT, 2016b). A norma traz a sequência de procedimentos para obter a distribuição granulométrica do solo. Compreende nos ensaios de peneiramento e sedimentação. O peneiramento resume-se na agitação do material em uma série de peneiras padronizadas por esta norma e são divididos em duas etapas: peneiramento fino e peneiramento grosso. Como o material em questão não possui pedregulhos (100% passante na peneira 10 malha 2 mm) não foi realizado o peneiramento grosso. A sedimentação permite obter a distribuição granulométrica onde já não se existe malhas de peneiras capazes de definir a distribuição do tamanho de grão. Ela baseia-se na Lei de Stokes e relaciona o diâmetro equivalente das partículas com a velocidade de sedimentação das mesmas em um meio líquido de viscosidade e peso específico conhecido (PINTO, 2006). Para a sedimentação foram usados 120 g de solo seco, previamente submerso em 125 g de solução defloculante de hexametafosfato de sódio e deixado em repouso por 24 horas. A solução defloculante atua na separação das partículas mais finas para sedimentação. Devido a esta atuação dispersora, se utiliza da mesma amostra após sedimentação no peneiramento fino.

A Figura 2 ilustra os ensaios de sedimentação e peneiramento fino. com a palma da mão sobre uma placa de vidro fosco (Fig. 4). a) b) Figura 2. a) Ensaios de sedimentação em andamento; b) Série padrão de peneiras para o ensaio de peneiramento fino Figura 3. Aparelho de Casagrande utilizan do no ensaio de limite de liquidez 2.3. Ensaios de limites de Atterberg. Os limites de Atterberg permitem determinar a consistência do solo quando submetido a variação de umidade. Consistem nos teores de umidade limites entre os estados sólido, semi-sólido, plástico e liquido. Para solos finos, os limites de Atterberg são importantes, pois somente a granulometria é insuficiente para caracterizar adequadamente o material (PINTO, 2006). Para realização dos ensaios descritos a seguir, a amostra de lama utilizada foi primeiramente homogeneizada e seca em estufa a 60ºC, posteriormente destorroada. O limite de liquidez (LL) corresponde ao teor de umidade limite entre o estado físico líquido e o estado físico plástico. O limite de liquidez foi determinado pelo método do Aparelho de Casagrande (Fig. 3), descrito pela NBR 6459/16 (ABNT, 2016c). O limite de plasticidade condiz com o teor de umidade limite entre o estado físico plástico e o semi-sólido e é determinado pela NBR 7180/16 (ABNT, 2016d). O ensaio consiste em se alcançar o estado plástico possível para moldagem de cilindros de solo, rolinhos de 10 cm de comprimento e 3 mm de diâmetro, Figura 4. Aparatos para o ensaio de limite de plasticidade Os ensaios dos limites de Atterberg foram realizados de duas formas, empregando água destilada como preconiza as normas da ABNT e com água do mar obtida na amostragem do material de dragagem. 3. RESULTADOS 3.1. Índices físicos do material O teor de umidade médio obtido através do método da estufa com amostras da lama homogeneizadas e saturadas foi de 292,8%. O ensaio de picnômetro resultou no peso específico real dos grãos (ɣs) de 24,5 kn/m³. O baixo valor é justificado pela presumida presença de matéria orgânica na amostra,

também denunciada pela coloração escura do material (Fig. 1). 3.2. Análise granulométrica A distribuição granulométrica do material após os processos de sedimentação e peneiramento fino resultaram na sua curva granulométrica, que nos permite identificar as frações granulométricas que compõe o material. A Figura 5 ilustra as curvas granulométricas das amostras ensaiadas com água destilada e água do mar. 100 % 90 p a s s a n t e 80 70 60 50 40 30 20 10 sedimentação água destilada sedimentação água do mar 0 0,001 0,01 0,1 1 10 Diâmetro dos grãos em mm Figura 5. Curvas granulométricas obtidas com sedimentações realizadas com água destilada e água do mar As Tabelas 1 e 2 apresentam as frações granulométricas (segundo escala ABNT atual), conforme ensaios com água destilada e água do mar, respectivamente. Tabela 1. Frações granulométricas a partir de ensaio com água destilada Frações granulométricas ensaio com água destilada Pedregulho (ø > 2,0mm) 0,0% Areia Grossa (0,6 < ø < 1,0% 2,0mm) Areia Média (0,2 < ø < 0,6mm) 7,0% Areia Fina (0,06 < ø < 0,2mm) 32,0% Silte (0,002 < ø < 0,06mm) 33,0% Argila (ø < 0,002mm) 27,0% Tabela 2. Frações granulométricas a partir de ensaio com água do mar Frações granulométricas ensaio com água do mar Pedregulho (ø > 2,0mm) 0,0% Areia Grossa (0,6 < ø < 2,0mm) 2,0% Areia Média (0,2 < ø < 0,6mm) 10,1% Areia Fina (0,06 < ø < 0,2mm) 8,9% Silte (0,002 < ø < 0,06mm) 40,0% Argila (ø < 0,002mm) 39,0% Observam-se diferenças significativas nas curvas granulométricas dos materiais e no quantitativo das frações granulométricas. O material ensaiado com água destilada seria classificado texturalmente como uma areia siltosa e já, quando ensaiado com água mar, seria caracterizado como silte argiloso ou argila siltosa (diferença mínima entre frações). 3.3. Limites de Atterberg Os resultados dos limites de Atterberg e índice de plasticidade (IP) das amostras ensaiadas com água destilada e com água do mar são apresentados nas Tabelas 3 e 4. A Figura 6 ilustra os gráficos do teor de umidade x número de golpes (log) utilizados na definição de LL para os dois ensaios. Tabela 3. Limites de Atterberg e índice de plasticidade a partir de ensaio com água destilada Limites de Atterberg e índice de plasticidade ensaio com água destilada LL (%) 64% LP (%) 25% IP (%) 39% Obs: IP = LL-LP Tabela 4. Limites de Atterberg e índice de plasticidade a partir de ensaio com água do mar Limites de Atterberg e índice de plasticidade ensaio com água do mar LL (%) 59% LP (%) 34% IP (%) 25%

Obs: IP = LL-LP número de golpes 100 água destilada água do mar 10 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 teor de umidade (%) Figura 6. Gráfico do teor de umidade x número de golpes - ensaios com água destilada e água do mar Apesar de serem caracterizados como altamente plásticos (IP > 15%) em ambas as condições de ensaio, os resultados mostram diferenças significativas nos limites de Atterberg e no índice de plasticidade do material de dragagem conforme o fluído utilizado nos ensaios. Na Figura 5 observa-se que a taxa de variação do número de golpes com o teor de umidade (inclinação da reta de ajuste), chamada de índice de fluxo, também varia conforme o fluído empregado. Combinando resultados da análise granulométrica (teor de argila) e do índice de plasticidade é possível avaliar a atividade coloidal do material para ambos os conjuntos de dados. O índice de atividade coloidal (Ia) é definido pela razão entre o índice de plasticidade e o teor de argila. Com o material ensaiado com água destilada tem-se um Ia de 1,44, caracterizando o material como ativo (indicativo da presença predominante de argilominerais 2:1 como esmectitas). Já com dados do material ensaiado com água do mar tem-se Ia igual a 0,64, caracterizando o mesmo como inativo (indicativo da presença predominante de argilominerais 1:1 como caulinitas). 3.4. Classificação geotécnica Sistema Unificado de Classificação de Solos (SUCS) A classificação geotécnica pelo Sistema Unificado de Classificação dos Solos (SUCS) é derivado do Sistema de Classificação de Solos para Aeroportos, proposto por Arthur Casagrande, em 1948 Com base na distribuição granulométrica das amostras ensaiadas com água destilada e com água do mar e seus respectivos resultados quanto ao limite de liquidez e índice de plasticidade, foi obtida a classificação SUCS das mesmas. A amostra ensaiada com água destilada teve sua classificação como uma argila muito plástica (CH), já a amostra ensaiada com água do mar teve sua classificação como solo orgânico de alta plasticidade (OH). O material ensaiado com água destilada apresenta-se acima da linha A, enquanto ensaiado com água do mar mostra abaixo da mesma. O fato indica que o presumido caráter orgânico do sedimento só é identificado pelo Sistema Unificado quando os ensaios de limites de Atterberg são conduzidos com água do mar. 4. CONCLUSÕES A caracterização geotécnica, por meio de análise granulométrica e limites de Atterberg, realizada com material de dragagem recentemente extraído do canal de acesso do Porte de Rio Grande, mostra diferença significativa nos resultados dos ensaios quando as amostras são ensaiadas com água destilada e com água do mar. Seguindo a referência normativa (uso de água destilada nos ensaios) o material de dragagem é uma areia siltosa, o mesmo material ensaiado com água do mar foi classificado como silte argiloso ou argila siltosa. Com relação ao limite de liquidez e ao índice de plasticidade nota-se uma redução em

seus valores quando do uso da água do mar. No índice de plasticidade essa redução é próxima aos 50%. Porém o mesmo não acontece com o limite de plasticidade que tem o seu valor cerca de 10% mais elevado quando ensaiado com água do mar. Pelo Sistema Unificado (SUCS), a classificação do material difere, revelando uma argila de alta plasticidade pela amostra ensaiada pelo método convencional, e um solo orgânico de alta plasticidade pela amostra ensaiada com água do mar. A diferença se dá pela posição em relação à linha A do Gráfico de Plasticidade de Casagrande se modifica. Com o presente estudo conclui-se que os resultados dos ensaios caracterização são fortemente influenciados pela natureza do fluído empregado e de grande relevância quando se deseja inferir sobre seu comportamento. Agradecimentos Os autores agradecem ao Porto do Rio Grande, através do engenheiro Domingos Sávio G. Novo, pelo incentivo e apoio na coleta do material da dragagem necessário. Pelas mesmas razões, os autores também agradecem aos engenheiros Celso Pedreira e Luciano Lopes da Silva do Laboratório de Geotecnia e Concreto da FURG. 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. Grãos de pedregulho retidos na peneira de abertura 4,8 mm - Determinação da massa específica, da massa específica aparente e da absorção de água: NBR 6458. Rio de Janeiro. 10p. 2016a. ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas. Solo Análise granulométrica: NBR 7181. Rio de Janeiro. 12p. 2016b. ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas. Solo Determinação do limite de liquidez: NBR 6459. Rio de Janeiro, 5p. 2016c. ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas. Solo Determinação do limite de plasticidade: NBR 7180. Rio de Janeiro. 3p. 2016d. CAPUTO, H. P. Mecânica dos solos e suas aplicações. vol. 2. São Paulo, SP, 3ª edição revista e ampliada, Editora LTC, 456 p.1977. DIAS, C. R. R.; KERSTNER, V. W. T.. Bacias de despejos de dragagens em Rio Grande: estudo das propriedades geotécnicas e geoquímicas da lama. In: II SEMINÁRIO DE ENGENHARIA GEOTÉCNICA FURG GeoRS 2003. Anais... Rio Grande/RS. pp. 90-106. 2003. FAGUNDES, D. F.; REMDE, M. Z.; FALCÃO, P. R.; ROCHA, F. Influência da salinidade nas propriedades físicas e limites de consistência de amostras de solos artificiais. In: XIX CONGRESSO BRASILEIRO DE MECÂNICA DOS SOLOS E ENGENHARIA GEOTÉCNICA - COBRAMSEG 2018. Anais... Salvador/BA. IN CD. 2018. HAJELA, R. B.; BHATNAGAR, J. M. Applications of rheological measurements to determine liquid limit of soils. Soil Science. U.S.A. vol.114(2), p.122-130. 1972. LOCAT, J.; DEMERS, D. Viscosity, yield stress, remolded strength, and liquidity index relationship for sensitive clays. Canadian Geotechnical Journal. Canadá, vol. 25, p. 799-806. 1988. NAEINI, S. A., JAHANFAR, M. A. Effect of Salt Solution and Plasticity Index on undrain Shear Strength of Clays. World Academy os Science, Engineering and Technology International Journal of Materials and Metallurgical Engineering. vol. 5, n.1. 2011.

PINTO, C. S. Curso básico de Mecânica dos Solos em 16 aulas. São Paulo: Oficina de Textos, 356p. 2006