figura prestações sociais por indivíduo em ppc, 2011

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Em primeiro lugar, o peso crescente das pensões de velhice que em 2011 ultrapassam já o valor médio da EU. Em segundo lugar, o peso relativamente pequeno das componentes mais diretamente vocacionado para a redução direta da pobreza, tais como as prestações familiares (família/crianças, habitação) e as destinadas à exclusão social. Por último, e como consequência dos dois pontos anteriores, a menor importância das medidas baseadas em condição de recursos, e que em 2011 regrediram face à sua importância relativa em 2009. A similitude evidenciada no quadro anterior é, contudo, mais aparente do que real na medida em que os valores estão expressos em proporção do PIB e não traduzem efetivamente a importância relativa destas transferências nos orçamentos familiares. figura 7.17. prestações sociais por indivíduo em ppc, 2011 \ Fonte: Eurostat A Figura 7.17 compara o valor das transferências sociais por habitante para os diferentes países da UE expressos em Paridades de Poder de Compra (PPC) em 2011. As transferências sociais em Portugal representam 2/3 do valor médio da EU, sendo o nosso país aquele que tem o valor mais baixo da UE15 (pré-alargamento aos países do leste da Europa). A eficácia redistributiva das prestações sociais tem sido objeto de ampla discussão em Portugal, por exemplo em Gouveia (2011), Alves (2012), e Rodrigues e Andrade (2014b). Um debate sério do seu impacto não pode deixar de ter em conta quer a sua fraca dimensão no nosso país relativamente à média na União Europeia, como demonstrado acima nos Quadro 7.7 e Figura 7.17, quer a sua natureza predominantemente contributiva como se pode constatar a partir da Figura 7.18. Esta Figura 240

analisa a distribuição das transferências sociais ao longo da escala de rendimento, através da sua repartição por quintis da distribuição do rendimento disponível por adulto equivalente em 2011. figura 7.18. distribuição das prestações sociais por quintis do rendimento equivalente, 2011 Fonte: INE, EU-SILC 2012. Cerca de 40% das prestações sociais é canalizado para o 5.º quintil, isto é, para os 20% da população de maior nível de rendimento. Por outro lado, os 20% mais pobres recebem somente cerca de 10,4% do montante total despendido em prestações sociais. A explicação deste resultado aparentemente contraditório prende-se com o já discutido elevado peso das pensões no total das transferências, aliado à sua natureza predominantemente contributiva. As famílias mais pobres (as pertencentes aos dois primeiros decis da distribuição) recebiam em 2011 uma transferência média correspondente a cerca de 50% da transferência média nacional. No extremo oposto da distribuição do rendimento, as famílias mais ricas (dois decis mais altos) recebiam uma transferência média correspondente a cerca de 194% da média nacional. Portugal surge assim como um dos países onde a distribuição das transferências sociais é menos pro-poor. É obvio que o elevado peso das pensões no conjunto das transferências do Estado (cerca de 88% em 2011) e a sua natureza fortemente contributiva explicam em grande parte este valor elevado das transferências médias para os 20% mais ricos, mas o que é também posto em evidência é o fraco peso das restantes transferências que são aquelas que têm maior incidência nos quintis mais baixos. Utilizando os dados do EU-SILC 2012, o Quadro 7.8 apresenta a distribuição do valor bruto das diferentes transferências sociais para os cinco quintis da distribuição do rendimento por adulto equivalente. 241

quadro 7.8. distribuição das prestações sociais por quintis do rendimento equivalente, 2011 (%) Fonte: INE, EU-SILC 2012 A natureza predominantemente contributiva das pensões é claramente visível no primeiro painel do quadro anterior: o 5.º quintil recebe cerca de 40% do total das prestações sociais (47.5% considerando exclusivamente as pensões de velhice) versus 10.4% e 7.7%, respetivamente, recebidos pelo 1.º quintil 10. Torna-se assim evidente que as pensões dificilmente podem desempenhar de forma eficiente um papel redistributivo significativo, tanto mais quando não foi esse o fim para que foram criadas. O subsídio de desemprego distribui-se de forma relativamente uniforme, mas com particular incidência nos três quintis centrais da distribuição do rendimento. As restantes prestações sociais têm uma natureza mais fortemente redistributiva dado que incluem uma forte componente de prestações baseadas em condição de recursos. Isso é particularmente notório no caso dos apoios às famílias/ crianças e exclusão social. Esta última categoria, onde o CSI e o RSI ocupam um lugar predominante, é fortemente progressiva com o primeiro quintil a auferir dois terços do total da prestação. A Figura 7.19 ilustra precisamente esta diferenciação na natureza progressiva/regressiva dos três tipos de prestações sociais considerados no Quadro 7.8.. 242

figura 7.19. distribuição das prestações sociais por quintis do rendimento equivalente, 2011 Fonte: INE, EU-SILC 2012 Os resultados anteriores não podem deixar de questionar a natureza do nosso Estado Social e colocar uma questão que certamente ganhará relevância acrescida no futuro: a da desigualdade intergeracional que lhe está subjacente e de qual o papel que o Estado pode desempenhar nesse contexto. Uma outra forma de analisar a eficácia das prestações sociais é a de observar o seu impacto na redução das desigualdades. Alves (2012) analisa o efeito redistributivo das prestações sociais excluindo pensões nos diferentes países da União Europeia em 2010 utilizando dois indicadores. O indicador de progressividade de Kakwani (1977) é uma medida da eficiência das prestações sociais na redução da desigualdade: quanto maior o seu valor em termos absolutos, maior é o nível de eficiência verificado. O segundo indicador, efeito redistributivo total, dá a redução no índice de Gini resultante da introdução das prestações sociais excluindo pensões. O Quadro 7.9 apresenta os seus principais resultados. 243

quadro 7.9. efeito redistributivo das prestações sociais excluindo pensões, ue, 2010 Fonte: Alves (2012) A principal conclusão do quadro anterior é a de que, apesar do baixo nível relativo de prestações sociais no nosso país, o seu nível de progressividade é o segundo mais elevado e o seu efeito redistributivo é claramente significativo. Alves (2012) analisa de forma similar o impacto redistributivos dos impostos e das contribuições para a segurança social da responsabilidade dos trabalhadores. O Quadro 7.10 apresenta os mesmos indicadores para os impostos diretos. 244

quadro 7.10. efeito redistributivo dos impostos diretos, ue, 2010 Fonte: Alves (2012) Também aqui Portugal apresenta indicadores de eficácia e de progressividade/ eficiência claramente superiores ao da generalidade dos países da União Europeia. A análise do impacto conjunto das transferências sociais e dos impostos sobre o nível de desigualdade constitui uma outra forma de observar a eficácia e a eficiência redistributiva das políticas públicas. O Quadro 7.11, extraído de Rodrigues e Andrade (2014b), mostra o impacto das pensões, restantes transferências sociais e impostos diretos sobre o nível de desigualdade medido pelo índice de Gini ao longo do período 2006-2010. 245

quadro 7.11. eficácia e eficiência das transferências sociais e impostos diretos, 2006-2010 Fonte: Rodrigues e Andrade (2014b) Nota: Níveis de desigualdade medidos pelo índice de concentração de Gini assumindo em todas as distribuições a ordenação dos indivíduos de acordo com o rendimento disponível por adulto equivalente. Vide Rodrigues e Andrade (2014b) para uma discussão pormenorizada da metodologia. O primeiro painel do quadro anterior expõe a alteração sucessiva na desigualdade ocorrida ao longo do processo de passagem da distribuição do rendimento gerado no mercado para o rendimento disponível e que assim permite avaliar a eficácia redistributiva das prestações sociais e dos impostos permitindo, assim, avaliar a eficácia redistributiva das prestações sociais e dos impostos. A eficácia das pensões e das restantes transferências sociais é comparável, tendo aumentado até 2009 e decrescido em 2010. Como seria de esperar, os impostos são claramente o instrumento redistributivo mais eficaz na redução das desigualdades, mantendo-se o seu nível de eficácia praticamente inalterado ao longo do período em análise. Em termos de eficiência, as transferências sociais excluindo pensões são notoriamente o instrumento com maior eficiência. Todos os níveis de eficiência sobem entre 2006 e 2009, mas essa tendência inverte-se em 2010, isto é no ano em que se iniciaram as políticas de austeridade. 246

A Figura 7.20 sintetiza os efeitos das várias políticas redistributivas na diminuição da desigualdade medida pelo índice de Gini. Tomando como exemplo o ano de 2009, o conjunto dos três instrumentos permitiram uma redução do índice de Gini em 9,8 p.p. Nessa redução, 3,9 foram por via dos impostos, 3,0 através das várias prestações sociais que não pensões e os restantes 2.9 devido ao efeito das pensões. Saliente-se, uma vez mais, a redução ainda que ligeira da eficácia redistributiva das prestações sociais em 2010. figura 7.20. impacto das pensões, outras prestações sociais e impostos diretos na redução da desigualdade, 2006-2010 Fonte: Rodrigues e Andrade (2014b) É de realçar a diminuição da eficácia das prestações sociais excluindo pensões no decorrer da presente crise evidente no Quadro 7.11 acima. Tal facto resulta da significativa contenção das transferências sociais e, em particular, das vocacionadas para o combate à pobreza e à exclusão social, que tem sido um dos eixos fundamentais da política económica seguida no nosso país desde 2010. O Quadro 7.12 permite analisar a evolução das principais prestações sociais ao longo dos últimos anos 11. 247

quadro 7.12. evolução das prestações sociais, 2006-2010 Fonte: IGFSS (2014) Nota: Valores a preços correntes, em milhões de euros No período 2010-2013 o conjunto das prestações sociais teve um crescimento nominal de cerca de 5%. No entanto, este valor agregado esconde uma evolução muito diferenciada das suas várias componentes: as pensões registaram um acréscimo de 9% e o subsídio de desemprego, como consequência do aumento de desemprego já observado, registou um aumento superior a 22%. Este crescimento é particularmente significativo por ocorrer num período em que se verificaram cortes substanciais nos valores das pensões e também a alteração das regras de cálculo dos montantes e prazo de concessão dos subsídios de desemprego e social de desemprego, alterações essas que penalizaram os respetivos beneficiários. Situação oposta acorreu com as prestações mais vocacionadas para o apoio direto às famílias e ao combate à pobreza e à exclusão social no mesmo período. A prestação do RSI registou em termos nominais uma diminuição próxima de 40% e o abono de família de 32%. O CSI subiu ligeiramente em 2010, mas diminuiu cerca de 2,3% nos três anos subsequentes. A Figura 7.21 ilustra a evolução real dos montantes de algumas componentes das prestações sociais e ilustra a dicotomia já referida no seu comportamento evolutivo 12. 248

figura 7.21. evolução real das prestações sociais Fonte: IGFSS (2014) Nota: valores a preços de 2006, em milhões de euros O enfraquecimento da eficácia redistributiva de algumas prestações sociais durante o período de ajustamento e o recuo na sua capacidade de atenuar situações de pobreza pode ser ilustrado com o exemplo do RSI. Apesar de vários estudos (como Rodrigues, 2004, 2009, por exemplo) terem demonstrado a eficácia do RSI na redução da intensidade da pobreza e marginalmente na diminuição da desigualdade familiar, esta medida tem sido criticada com base fundamentalmente em dois argumentos: a possibilidade de ela gerar subsidiodependência e a existência de fraudes na sua concessão. 249

Um dos elementos que mais contribuiu para a crítica ao programa foi a limitada concretização dos programas de inclusão que deveriam constituir um dos pilares base da medida. Apesar destas limitações, o programa revelou ao longo dos anos da sua vigência ser uma medida de último recurso fundamental no atenuar de situações de pobreza extrema, como demonstrado nos estudos já referidos. A introdução de novas regras de elegibilidade e a redução dos montantes atribuídos em 2010 e 2012 reduziram fortemente a sua eficácia e o número de seus beneficiários, mas sem que isso se traduzisse em acréscimos de eficiência significativos. O principal resultado dessas alterações foi, de facto, a drástica redução do número de beneficiários, que passou de cerca de 400 mil em janeiro de 2010 para menos de 220 mil em julho de 2014. No entanto, esta diminuição do número de beneficiários nas estatísticas oficiais subavalia o seu número potencial, na medida em que o agravamento da situação social e o acréscimo do número de indivíduos em condição de pobreza e exclusão social como consequência da crise atual teria certamente levado ao aumento da procura de apoio do RSI caso as suas regras não tivessem sido alteradas. Rodrigues (2012, 2013) analisa os impactos redistributivos das alterações efetuadas ao RSI e que se podem resumir no Quadro 7.13 para o caso de referência de um casal com dois filhos dependentes. quadro 7.13. alteração das regras de elegibilidade do rsi Fonte: Rodrigues (2013) Nota: Exemplo para casal com dois filhos dependentes A alteração das regras de elegibilidade traduz-se numa redução do limiar de elegibilidade em cerca de 30%. Inicialmente o valor do RSI correspondia a 64% do limiar de pobreza, mas após a implementação das alterações tornou-se inferior a 50% desse valor. A consequência direta é a exclusão de um número muito significativo de anteriores beneficiários e a redução dos montantes recebidos por aqueles que permanecem na medida. Utilizando um modelo de microssimulação dos benefícios sociais e os microdados do EU-SILC para Portugal é possível estimar o impacto da alteração das 250

regras de funcionamento do RSI nos principais indicadores de pobreza e de desigualdade, o que é sintetizado no Quadro 7.14. quadro 7.14. alteração da eficácia redistributiva do rsi Fonte: Rodrigues (2013) Nota: Simulação para 2008, utilizando diferentes regras de funcionamento do Programa As alterações introduzidas reduziram o papel equalizador do RSI, nomeadamente na parte inferior da distribuição, como se vê pelo aumentar da distância entre os rendimentos dos decis mais elevados e mais baixos medida pelos rácios S80/S20 e S90/S10, e reduziram significativamente o seu contributo para a redução da intensidade da pobreza em Portugal. O estudo referido possibilita ainda averiguar quais os tipos de beneficiários mais severamente atingidos pela alteração das regras do RSI, como sumariado no Quadro 7.15 por tipo de família. As famílias alargadas com crianças são claramente das mais afetadas pelas alterações introduzidas no RSI. No extremo oposto, os beneficiários que residem em famílias unipessoais não são praticamente atingidos pelas transformações ocorridas na medida. 251

quadro 7.15. taxa de participação no rsi por tipo de família (em %) Fonte: Rodrigues (2013) Rodrigues (2013) confronta os ganhos de eficiência induzidos pelas alterações no RSI com a sua perda de eficácia no combate às situações de pobreza extrema. A eficiência na redução da pobreza, calculada pela proporção das transferências do programa que efetivamente contribuem para reduzir o défice de recursos da população pobre, passa de 96,5% para praticamente 100%. No entanto, a eficácia do RSI, calculada pela redução desse mesmo défice de recursos 13, diminui de 27,3% para 9%. É claramente questionável que os ligeiros ganhos de eficiência obtidos com as alterações legais no RSI possam justificar a perda de eficiência que induzem na redução da intensidade da pobreza. Como o Quadro 7.11 acima mostra, os impostos diretos são o instrumento redistributivo mais eficaz na redução das desigualdades. As alterações introduzidas no sistema fiscal como resposta à crise traduziram-se num significativo aumento da carga fiscal em Portugal que é visível na Figura 7.22: entre 2009 e 2013, a carga fiscal aumentou de 31,0% do PIB para 34,9% enquanto a receita dos impostos diretos subia cerca de 29%. 252

figura 7.22. evolução da receita fiscal (em milhões de euros) e da carga fiscal (em % do pib) Fonte: INE, Estatísticas das Receitas Fiscais 1995-2013 Este aumento da carga fiscal resultou de um conjunto de medidas que afetaram em momentos diferentes os impostos diretos, indiretos e as contribuições para a segurança social (CSS). Do lado dos impostos indiretos, a taxa máxima do IVA passou de 20% em 2009 para 23% em 2011 e em 2012 procedeu-se à alteração da classificação de bens antes sujeitos às taxas reduzida e intermédia. Por exemplo, vários bens alimentares transformados e os eventos culturais que eram antes ta- 253

xados à taxa mínima passaram para a taxa normal do IVA, enquanto os serviços de restauração e similares passaram da taxa intermédia para a taxa normal. Nos impostos diretos, as taxas do IRS subiram em 2010, 2011 e 2013.Em 2013 o IRS sofreu profundas alterações: número de escalões reduzido de 8 para 5, novo e significativo aumento das taxas marginais do IRS e redução muito significativa das deduções, nomeadamente as referentes à saúde e à educação. Em 2013, à semelhança do que já acontecera em 2011, verificou-se ainda a aplicação de uma Sobretaxa Extraordinária de 3,5% sobre os rendimentos superiores ao salário mínimo nacional. Em 2011 e 2012 foi igualmente aplicada uma Contribuição Extraordinária de Solidariedade sobre as pensões mais elevadas. Os efeitos redistributivos destas medidas não são ainda possíveis de avaliar com pormenor, em particular os resultantes das transformações ocorridas nos escalões do IRS em 2013, dado o natural desfasamento temporal na disponibilização de dados estatísticos, mas é expectável que elas reforcem o caracter progressivo dos impostos diretos exercendo um efeito equalizador acrescido na distribuição dos rendimentos. Utilizando os dados disponíveis do EU-SILC 2012 é, porém, possível analisar as principais características redistributivas dos impostos diretos. De forma análoga ao efetuado para as prestações sociais, é possível observar a distribuição do IRS ao longo dos diferentes quintis da distribuição do rendimento por adulto equivalente, como se pode ver na Figura 7.23. figura 7.23. distribuição do irs por quintis do rendimento equivalente, 2011 Fonte: INE, EU-SILC 2012 254