ESTUDOS FEMINISTAS E RELIGIÃO: TENDÊNCIAS E DEBATES - VOLUME 2

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Transcrição:

ESTUDOS FEMINISTAS E RELIGIÃO: TENDÊNCIAS E DEBATES - VOLUME 2 Fernanda Marina Feitosa Coelho * RESENHA: SOUZA, Sandra Duarte de; SANTOS, Naira Pinheiro dos (Orgs.). Estudos feministas e religião: tendências e debates. Volume 2. Curitiba: Prisma, 2015. 259p. A publicação do segundo volume do livro Estudos feministas e religião: tendências e debates foi motivada pela relevância que as abordagens feministas e de gênero tem nos estudos de religião bem como pela dimensão que os estudos de religião assumem nos estudos feministas. Organizado pelas professoras Sandra Duarte de Souza e Naira Pinheiro dos Santos, o livro foi publicado em 2015 em continuidade ao seu primeiro número e é enriquecido pelas contribuições de autoras e autores feministas, de diversos países, que estendem proposições amplas sobre temáticas diversas, mas, que também levantam novas perguntas. Em sua primeira versão, o volume 1 é subdividido em quatro blocos principais, respectivamente, Gênero, Religião e Cultura; Gênero, Religião e Política; Gênero, Religião e Violência; e Gênero, Religião e Sexualidades. Já no segundo volume, as organizadoras optaram por encontrar uma sequência conexa entre os capítulos uma vez que as temáticas de cultura, política, violência e sexualidades perpassam toda a obra direta e indiretamente no que diz respeito à gênero e religião. A obra é composta por onze textos e abarca a colaboração de pesquisadoras e pesquisadores feministas do Brasil, dos Estados Unidos, da França e de Portugal. O primeiro texto do livro, Estudos feministas e religião: percursos e desafios, produzido por Sandra Duarte de Souza, reforça a intenção da * Mestranda do Programa de Ciências da Religião na Universidade Metodista de São Paulo, na área de Religião, Sociedade e Cultura, com pesquisa específica sobre Educação de Gênero, Política e Religião. Graduada em gestão Executivo em Gastronomia (2003-2005), possui Bacharelado em Ciências Econômicas pela Universidade Cruzeiro do Sul (2008-2011) e MBA em Controladoria e Finanças pela Universidade Cruzeiro do Sul (2012-2013). 109

obra de salientar a importância das questões de gênero nos estudos de religião no Brasil. O texto aborda diversas temáticas feministas e de religião, como a moral sexual religiosa, a violência doméstica, a concepção de família, o discurso religioso e a laicidade. Ademais, a autora desvela a evocação de pressupostos religiosos e da construção e difusão de discursos de verdade, principalmente na dimensão política, por meio da moral sexual cristã que se impõe nas práticas de parlamentares, juízes, policiais, médicos e outros e que ocasionam a invenção e reinvenção dos significados de gênero no que diz respeito às instituições religiosas, e, consequentemente, aos sujeitos religiosos. Como proposta de epistemologia descolonizadora, Teresa Martinho Toldy preconiza uma teologia feminista pós-colonial por meio do texto Passar as fronteiras : para uma teologia feminista pós-colonial em contexto português lugares de enunciação. Questionando mulheres oriundas de ex-colônias portuguesas e atualmente imigrantes em Portugal, o conteúdo estabelece a relação entre gênero, religião e colonialismo denunciando categorias dicotômicas e subalternizadoras para homens e mulheres e reconhece a validade do conceito de interseccionalidade entre categorias como gênero, etnicidade, raça, classe, sexualidade e outras como parte das teologias descolonizadas. Neste sentido, a autora analisa como as teologias feministas se desenvolveram em Portugal e reflete sobre as possibilidades de uma epistemologia do Sul, a partir das margens, por meio da apresentação e uma perspectiva cosmopolita e trans-identitária. Assim, Toldy revela uma visão crítica, realista e localizada no espaço que reconhece a premência da desclericalização, da despatriarcalização e da descolonização das teologias portuguesas. Adentrando a temática da sexualidade, Mary E. Hunt desenvolveu o texto O que sabíamos, o que sabemos e o que saberemos sobre religião e sexualidade, trabalho que reconhece uma transformação nas abordagens de gênero recentes que promoveram uma substituição dos binarismos pelo acolhimento da diversidade. Em uma análise sobre as publicações da revista Mandrágora, Hunt estabelece mudanças no pensamento sobre gênero, como a elaboração do que é chamada hoje de identidade de gênero e também do pensamento sobre a sexualidade, evidenciando seu continuum, não somente em seu período de amadurecimento, mas 110

por toda a vida. Assim, a autora reflete sobre as implicações destas mudanças na compreensão religiosa sobre sexualidade, identidade de gênero e orientação sexual e da amplitude de abordagens que tais concepções viabilizam. Por meio do reconhecimento da expansão dos estudos feministas sobre religião, Hunt estimula um aprofundamento nesta temática e encoraja uma maior aceitação da fluidez da orientação sexual e das identidades de gênero alertando para os benefícios que uma maior discussão inter-religiosa e um maior aporte de recursos que possibilitam e esclarecem tais compreensões podem trazer. No texto, O discurso católico contemporâneo sobre o gênero: uma virada neoliberal?, Maria Eleonora Sanna analisa o desenvolvimento de uma nova retórica que visa reafirmar velhos preceitos sexuais católicos sobre questões como aborto, contracepção, reprodução e sexualidades humanas. Para além dos já conhecidos dogmas impositivos e proibitivos católicos, a autora aponta a produção de discursos que legitimam a conduta heterossexual e natural. Aborda temas como direitos dos embriões, direitos das mulheres à saúde, direitos dos homens à fertilidade e verdades sobre o corpo contidas no discurso médico e utilizadas nos debates de bioética pela Igreja Católica. Rejeitando concepções biologizantes de sexualidade, Sanna encontra no discurso católico atual implicações de custos sociais, jurídicos e reprodutivos que a aceitação das teorias de gêneros trariam, acarretando assim direitos humanos que promovem a desigualdade por meio da afirmação do feminino, do masculino, de suas representações e da própria sexualidade. É ainda sobre a construção de papéis sociais, mas especificamente sob a perspectiva evangélica, que Emerson Jose Sena da Silveira escreveu A heterossexualidade, os evangélicos e o pós-tradicional: notas sobre desconstruções e ressignificações sexo-gênero. O texto entrelaça conotações de verdade na tradição, sexualidade e religião questionando a defesa da masculinidade-heterossexual e das investidas do mundo evangélico no Brasil para conquistar legitimidade, plausibilidade e manter sua hegemonia. A partir de narrativas de sua experiência pessoal de vida, e também como pesquisador no mestrado e doutorado, Silveira discute a emergência de questões sobre a moral-sexual cristã conservadora nos meios de comunicação e também no cenário político. Conclui descobrindo medidas 111

e campanhas que visam reestabelecer a matriz dominante heterossexual sobre os corpos e corporeidades por meio de campanhas nacionais e projetos de lei de moral fechada e naturalizantes. Discutindo política de maneira mais ampla, o texto Políticas de justiça de gênero, escrito por André Musskopf, utiliza as reflexões de Judith Butler para pensar não somente os pressupostos interdependentes gênero, justiça e política, mas, também para ensejar ações sobre eles. Desta maneira, o autor reflete cada um destes pressupostos com base na ferramenta metodológica clássica ver-julgar-agir. O autor nos remete à popularização de tal ferramenta por meio da Teologia da Libertação Latino-Americana como elemento esclarecedor das próprias noções de gênero, justiça e política que norteiam o texto e que, ao apresentar situações de injustiça específicas de gênero, permitem a visibilidade da opressão e realidades injustas no cotidiano. O autor nos chama, por fim, à responsabilidade de possibilitar vidas menos precárias e de apoiar políticas que cumprem esse serviço. Para entender como as relações de gênero são abordadas por instituições assistenciais evangélicas, Naira Pinheiro dos Santos desenvolveu pesquisa de campo com as instituições sociais do centro da cidade de São Paulo Missão Batista Cristolândia, Missão CENA e Rede Social do Centro no texto Gênero e situação de rua: representações sociais e práticas no contexto de instituições evangélicas de assistência social. Por articular o setor público e a sociedade civil, a autora destaca a ação local de instituições em uma perspectiva que mostra como o privado é político e como os conflitos de gênero são presentes nos trabalhos assistenciais evangélicos. Assim, a autora denota as relações entre público e privado, entre o religioso e o político, questionando a promoção de autonomia efetiva destes trabalhos e instigando a promoção de políticas públicas que visem a igualdade em um sentido integral. Em Superar as desigualdades de gênero: primeiro passo para adentrar no século XXI, Claudirene Bandini aborda a condição das mulheres nas igrejas cristãs. A autora inicia sua análise pela escassez de leitura bíblica sobre mulheres e indica uma recente visibilização das mulheres através do trabalho de pesquisador@s e teólog@s feministas. Neste sentido, Bandini discute o empoderamento de mulheres pentecostais e os desa- 112

fios presentes nestas instituições, materializações de categorias como poder simbólico, política, gênero e outras. Apesar dos reconhecidos benefícios que a religião proporciona às mulheres, a autora lembra que as disputas por poder e seus processos estão presentes até mesmo no casamento e, deste modo, sugere as ações coletivas como medida de fortalecimento das mulheres que buscam superar relações assimétricas para agir nas igrejas. Com o objetivo de interpelar a responsabilidade da tradição cristã na relação entre religião e violência doméstica, Anete Roese escreveu Culpa, autosacrifício e responsabilidade: aspectos psicossociais e religiosos da violência doméstica. A autora estabelece um cenário de violência doméstica no Brasil atual e suas raízes. Ainda, o texto relaciona, por meio da religião, a culpa atribuída à entrada da mulher no mundo e a culpa atribuída às mulheres que sofrem violência bem como dos caminhos que são atribuídos às mulheres, como o sacrifício, a doação e a passividade como forma de pagamento pelo pecado. Ela assegura que o amor como auto sacrifício leva a uma dedicação exagerada aos outros, e uma mínima atenção a si acarretando perda de saúde,da mutualidade e até depressão. Roese finaliza sua análise resgatando o feminismo descolonial que oportuniza a vida responsável e a responsabilidade diante da própria vida. O texto, Tolerância e repressão: o paradoxo da prostituição feminina, escrito por Adília Fernandes, explora a dupla função da prostituição na Idade Média, condenada como função impura e justificada como serviço público e bem comum. A autora discute a prostituição regulamentada e do mercado que se criou em torno do corpo feminino a partir do século XII até o período de industrialização, época em que se agravou a vulnerabilidade da mulher. Fernandes culmina sua análise na segunda metade do século XIX, período em que se iniciaram os debates de leis e regulamentações sobre direitos sexuais. Elaborado por Samira Adel Osman, Mulheres Muçulmanas na mídia brasileira: o fardo da pena é o último texto da obra. O texto dispõe artigos recolhidos aleatoriamente de revistas e de outras formas de comunicação no Brasil que abordam o islamismo e que tangenciam as mulheres. Neste contexto, Osman analisa expressões que são carregadas 113

de conotações negativas e frequentemente associadas ao islamismo, especificamente, o estereótipo da mulher islâmica que é submissa, vítima de violência religiosa e oprimida. Não obstante a rejeição de violência e de posturas relativistas, a autora convida à percepção de outras formas de compreensão da mulher muçulmana em contraste com a mulher ocidental que seria livre e independente. Neste sentido, cabe perceber as mesmas opressões denotadas no ocidente e a mesma possibilidade de liberdade e autonomia no oriente. O livro Estudos feministas e religião: tendências e debates - volume 2 aborda o fenômeno religioso pela perspectiva de gênero sob diversos focos e temáticas. Suas colaborações abrem espaço para discussões importantes no campo dos estudos de gênero e religião e buscam despertar novas perguntas nos leitores e leitoras provocando e estimulando a necessidade de maior atenção aos temas dispostos. Ainda, a obra desperta as particularidades contextuais e o grande número de possibilidades que a perspectiva de gênero enseja, também, aos estudos de religião, exprimindo assim, a importância da atenção a esta relação. 114