COMISSÃO DE SEGURIDADE SOCIAL E FAMÍLIA PROJETO DE LEI Nº 283/2003 VOTO EM SEPARADO DO DEPUTADO MÁRIO HERINGER PDT



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Transcrição:

COMISSÃO DE SEGURIDADE SOCIAL E FAMÍLIA PROJETO DE LEI Nº 283/2003 Dispõe sobre caso de concessão de visto permanente a estrangeiro residente no Brasil. Autor: Deputada Laura Carneiro Relator: Deputado Milton Barbosa VOTO EM SEPARADO DO DEPUTADO MÁRIO HERINGER PDT 1. Relatório Trata-se de Projeto de Lei que objetiva acrescer parágrafo ao artigo 16 da Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980, que define a situação jurídica do estrangeiro no Brasil, cria o Conselho Nacional de Imigração, e dá outras providências. A principal alteração proposta pelo Projeto de Lei em epígrafe é permitir aos estrangeiros o direito a visto permanente no Brasil conquanto mantenham sob sua responsabilidade econômica criança ou adolescente carente. Os critérios para a concessão de visto de que trata o projeto em questão são os seguintes: que a criança ou o adolescente que tenha um estrangeiro como responsável econômico possua vínculo com entidade filantrópica declarada de utilidade pública; e que a responsabilização econômica mencionada ocorra por no mínimo cinco anos antes do pedido de concessão de visto. Nesta Comissão de Seguridade Social e Família, primeira comissão desta Casa por onde tramita o PL nº 283, de 2003, o projeto mereceu parecer favorável de seu relator quanto a seu mérito social. Por divergir do voto do nobre Relator, apresentamos voto em separado, oportunidade em que expomos os fundamentos de nossa posição. 2. Voto Pretende o Projeto de Lei em exame conceder visto permanente no Brasil a estrangeiros que sejam economicamente responsáveis por crianças ou adolescentes

carentes que vivam em instituições filantrópicas declaradas como de utilidade pública. O objetivo da propositura, segundo sua autora, é o de estimular o apadrinhamento de crianças e adolescentes carentes, utilizando para isso o recurso de concessão de visto permanente a estrangeiros. A fim de prevenir-se contra a possibilidade de que as crianças e os adolescentes em questão possam vir a ser usados por aproveitadores, a autora determina que o pleiteante ao visto permanente, na condição de que trata o PL 283/03, assuma a responsabilidade econômica mencionada por no mínimo cinco anos antes do pedido de concessão de visto. Uma análise detalhada da iniciativa em tela permite-nos identificar graves impertinências jurídicas e morais, que justificam nosso voto: 1. Inadequação com o disposto na Lei nº 6.815, de 1980, que define a situação jurídica do estrangeiro no Brasil, cria o Conselho Nacional de Imigração, e dá outras providências : No Brasil, a concessão de visto permanente a estrangeiro visa primordialmente: Propiciar mão-de-obra especializada aos vários setores da economia nacional, visando à Política Nacional de Desenvolvimento em todos os seus aspectos e, em especial, ao aumento da produtividade, à assimilação de tecnologia e à captação de recursos para setores específicos (Art. 16, Parágrafo único, Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980). De modo algum, sob qualquer justificativa, pode o apadrinhamento de crianças e adolescentes em situação de carência coadunar-se aos objetivos legalmente estabelecidos para a concessão de visto permanente, a saber, o incremento de mãode-obra especializada, de produtividade, de assimilação de tecnologia, ou de captação de recursos para setores específicos. Trata-se, pois, de uma iniciativa que se sobrepõe, de modo incongruente, aos objetivos legalmente determinados para a concessão de visto permanente no Brasil. Quisesse o legislador utilizar a concessão de visto permanente para os fins de apadrinhamento social, certamente o teria explicitado no texto da lei, coisa que não o fez. Por não encontrar adequação com o objeto da Lei que trata da situação jurídica do estrangeiro no Brasil, somos contra o PL 283/03. 2. Violação dos Princípios Fundamentais da Constituição Federal

A associação entre a concessão de visto permanente para estrangeiros e o apadrinhamento de crianças e adolescentes carentes parece-nos uma iniciativa inconstitucional. Ao fazer de nossas crianças uma moeda de troca para interesses pessoais, o Projeto de Lei nº 283, de 2003, fere os seguintes princípios constitucionais: da independência nacional (Art. 3º, I, CF); da cidadania (Art. 2º, II, CF); da dignidade da pessoa humana (Art. 2º, III, CF); e da promoção do bem-estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (Art. 3º, IV, CF). Segundo o que dita nossa Carta Magna, nenhum cidadão brasileiro independentemente de sua situação social ou etária pode, sob pena de ver violados seus direitos à condição cidadã, à dignidade humana e a tratamento igualitário e sem discriminação, ser transformado em objeto mediador de transações de quaisquer naturezas. Ao determinar que os cidadãos brasileiros menores de 18 anos que se encontram em condição de carência econômica sirvam de instrumento para que estrangeiros obtenham um benefício diplomático no Brasil, o Projeto de Lei em epígrafe incorre em desrespeito aos três direitos constitucionais acima mencionados. Por outro lado, o princípio da independência nacional nas relações internacionais, expresso no inciso I, do artigo 4º da Constituição Federal, vê-se comprometido quando da transferência de responsabilidade social estatal constitucional (arts. 5º e 6º CF) a terceiros particularmente, a estrangeiros dentro do território nacional, em troca de concessões diplomáticas. Não é papel de uma nação que tem estampados nas páginas de sua constituição os fundamentos da soberania e da independência nacionais relegar seus filhos à condição de mercadorias em um comércio internacional de vistos, além de delegar a estrangeiros a garantia de seguridade social que cabe, exclusivamente, ao Estado e à sociedade brasileira. Por entendermos que fere a Constituição Federal em seus Princípios Fundamentais, somos contra o PL 283/03. 3. Desrespeito na Lei nº 8.069, 13 de julho de 1990, que Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. O Estatuto da Criança e do Adolescente determina:

Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais (Art. 5º, Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990). Entendemos que condicionar a concessão de visto para estrangeiros ao apadrinhamento de crianças e adolescentes carentes é submeter esses a uma situação de exploração de sua dupla condição de infantes e pobres. O disposto no Projeto de Lei que aqui apreciamos submete as crianças pobres a uma arriscada situação de dependência econômica que se pode estender a outros âmbitos de dependência, conforme o tipo de relação que venha a se consolidar entre o padrinho e o apadrinhado diante de pessoas estranhas, para as quais não há qualquer requisito legal de comprovação de idoneidade, a não ser a condição de apadrinhamento pelo prazo mínimo de cinco anos, condição essa que não constitui, de modo algum, prova de idoneidade ética ou moral. Entendemos que as determinações contidas no Projeto de Lei nº 283, de 2003, abrem um perigoso precedente para o surgimento de uma verdadeira indústria de exploração de crianças e adolescentes para os fins de obtenção de vistos permanentes no Brasil. O caso dos Estados Unidos parece exemplar nesse sentido. Naquele país existe uma já consagrada indústria de casamento fraudulento constituída por pessoas que comercializam registros matrimoniais decorrente da permissão legal para a concessão de visto permanente a estrangeiros que sejam casados com cidadãos estadunidenses. O mesmo, acreditamos, poderá vir a ocorrer no Brasil caso o apadrinhamento de crianças passe a ser condição para a obtenção de permanência legalizada para estrangeiros no país. Vale dizer que o chamado apadrinhamento prática característica das relações patriarcais e dos Estados patrimoniais, ambos dissonantes com as relações burocráticas e com o Estado Moderno cria uma relação social, afetiva e parental tão ambígua e, ao mesmo tempo, tão consistente entre o padrinho e o apadrinhado que, por sua força simbólica e moral, é capaz de atribuir legitimidade social e jurídica a práticas sociais imorais ou mesmo ilegais. Ao condicionar a concessão de visto permanente à prática patriarcal do apadrinhamento infantil, o Estado brasileiro pode estar incorrendo no equívoco moral e legal de fomentar o surgimento de um mercado branco porque legitimado por uma legislação imperfeita e superficial da exploração infantil para fins ilícitos, tais como, a

adoção irregular, o tráfico internacional de órgãos, ou mesmo, o tráfico internacional de mão-de-obra escrava ou semi-escrava para o narcotráfico, a prostituição e um sem número de atividades ilegais que sobrevivem, em grande parte, da exploração de força de trabalho infantil. É moralmente inadmissível que o Estado brasileiro conceda autorização para que suas crianças venham a ser fonte de tamanha exploração e de tamanha violação de sua condição humana e seus direitos fundamentais. Por entendermos como moralmente inaceitável a abertura de brecha na legislação brasileira para a exploração comercial ilegal de nossas crianças e de nossos adolescentes, o que, ademais, viola o disposto no artigo 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente, somos contra o PL 283/03. Em virtude do exposto, votamos pela rejeição do Projeto de Lei nº 283, de 2003, e pelo parecer do nobre relator. Sala das comissões, em 01 de outubro de 2003. Deputado MÁRIO HERINGER