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Transcrição:

A crosta continental, a crosta oceânica e o manto superior Fernando Brenha Ribeiro Eder Cassola Molina (o texto a seguir está completo em conteúdo, mas na sua forma final será formatado segundo o padrão do curso de Licenciatura em Ciências da USP e serão inseridas as imagens que estão em fase final de elaboração.) No capítulo IV, quando a distribuição de velocidades das ondas sísmicas e da densidade do material que compõe o interior da Terra foi discutida, foram descritas as principais características do interior da Terra utilizando um modelo onde as propriedades físicas variavam apenas como função da distância ao centro da Terra. O modelo descreveu o interior da Terra como sendo composto, na maior parte do seu volume, pelo manto, subdividido em manto superior e manto inferior, e núcleo, dividido em núcleo externo e núcleo interno. A camada mais externa da Terra não foi incluída na discussão por dois motivos. O primeiro é que próximo ao topo do manto superior, o modelo de estrutura dependente apenas da distância ao centro começa a perder muito do seu sentido. Variações laterais na estrutura começam a ser observadas de forma clara. O segundo motivo é que civilização humana se desenvolveu sobre a crosta e as características e processos que ocorrem na crosta são os que mais nos afetam. Um pouco mais adiante no curso ficará claro que muitos desses processos não são exclusivamente crustais e envolvem parte do manto superior. A estrutura da crosta terrestre começou a ser desvendada no início do século XX, quando A. Mohorovičić identificou uma mudança brusca de

velocidades sísmica de 6,7 km/s para 8,1 km/s. Essa mudança foi posteriormente observada, de forma clara na maioria dos casos e menos evidente em algumas situações especiais, em todo o mundo. A transição de velocidade ocorre em um intervalo de profundidade muito pequeno de forma que se pode imaginar uma interface separando a camada mais externa da Terra, que passou a ser chamada de crosta, e a camada imediatamente abaixo, que é o manto. Com o avanço das observações sismológicas, uma estrutura estratificada foi proposta para a crosta exposta nos continentes. A estrutura proposta, em termos gerais, é composta por duas camadas separadas por uma transição brusca de velocidades, separando uma crosta superior, com velocidades das ondas P de 6 km/s e das ondas S de 3,6 km/s. Abaixo dessa descontinuidade, denominada de descontinuidade de Conrad, ocorre uma camada caracterizada por velocidades de ondas compressionais de 6,6 km/s e de ondas de cisalhamento de 3,7 km/s. A estrutura da crosta continental, no entanto, só pode ser descrita de forma aproximada por esse modelo. A estrutura da crosta continental é muito mais complexa e será descrita um pouco mais adiante. A crosta oceânica A estrutura da crosta oceânica até perto da metade do século XX era totalmente desconhecida. As únicas informações disponíveis sobre a crosta sob os oceanos eram a topografia e algumas informações obtidas de amostras recuperadas por dragagem. No século XIX a extensão de cabos telegráficos principalmente entre a Europa e a América do Norte requeria algum conhecimento da batimetria do oceano Atlântico. Além

disso a batimetria dos oceanos já vinha sendo, desde o século XIX, investigada pelas marinhas das principais potências da época, sobretudo a Grã Bretanha. Um dos objetivos da excursão da fragata britânica Beagle sob o comando do capitão Charles Fitz Roy, e da qual Charles Darwin participou, era um levantamento batimétrico de grande extensão. Após a II Guerra Mundial (1939-1945), a estrutura da crosta oceânica começou a ser desvendada. O sonar, desenvolvido durante a guerra, passou a ser utilizado para mapear a topografia do assoalho oceânico e, durante a década de 1950 e o início da década de 1960, foram realizados uma série de levantamentos sísmicos de refração ao longo das principais bacias e feições topográficas submarinas. Os levantamentos sísmicos de refração consistem em produzir uma onda acústica logo abaixo da superfície da água. Existem várias formas de se produzir esse sinal, a mais evidente é uma explosão. Essa onda se propaga pela lâmina de água, e parte da energia liberada penetra no assoalho oceânico e caminha nessa região na forma de ondas sísmicas. O navio que realiza o ensaio arrasta um cabo longo onde são presos sensores, conhecidos como geofones. Esses sensores captam as ondas acústicas que retornam à superfície depois de haverem se propagado pelo assoalho oceânico. Os levantamentos de sísmica de refração utilizam as ondas sísmicas que são refratadas com ângulo de incidência crítico sobre as eventuais interfaces existentes no assoalho oceânico. As ondas refratadas sob ângulo de incidência crítico se propagam ao longo da interface com a velocidade da camada abaixo da interface, gerando ondas secundárias que

chegam ao contato entre a água e o assoalho e, a partir daí se propagam como ondas acústicas até serem detectadas pelos geofones. A estrutura de parte da crosta oceânica revelada por esse método é muito simples, quando comparada à estrutura da crosta continental. Todas as bacias oceânicas, região das planícies abissais com lâmina de água entre 4,5 km e 5 km, têm essencialmente a mesma estrutura formada por três camadas, tendo o conjunto todo, espessura total entre 5 e 7 km. A primeira camada, chamada de camada 1 ou camada sedimentar é bastante delgada, com uma espessura média da ordem de 300 metros. As velocidades das ondas de compressão nessa camada variam entre 1,5 km/s e 1,8 km/s. A base da camada sedimentar é marcada por um aumento brusco na velocidade das ondas P para 5 km/s em média. Abaixo dessa interface surge uma segunda camada, chamada de camada 2 ou embasamento oceânico, que é formado essencialmente por uma camada de 1,5 km de basaltos. Nos 500 metros superiores da camada os basaltos são essencialmente rochas extrusivas 1, formando uma camada, algumas vezes chamada de camada 2A. O restante da camada é formado por uma seqüência de diques formando uma estrutura em bandas com as camadas verticais (camada 2B). 1 Rochas extrusivas são rochas ígneas cujo magma que lhes deu origem atinge a superfície no caso dos continentes ou o fundo do oceano em contato com a água no caso, por exemplo, dos basaltos oceânicos. Essas rochas são caracterizadas por um resfriamento muito rápido que dão origem a rochas com granulação muito fina e, algumas vezes, sem formação de cristais. No fundo oceânico formam estruturas que se parecem almofadas, de onde surgiu a denominação em inglês de pillow lavas. Rochas intrusivas são rochas que se resfriaram no interior da crosta, sem entrar em contato com o ar ou a água. Quanto mais profundo mais lento é o resfriamento, dando origem a rochas com granulação maior e com cristais bem formados. Os gabros, por exemplo, são rochas com composição muito semelhante ao basalto, mas resfriados as maiores profundidades.

O embasamento oceânico é separado de uma terceira camada, chamada de camada 3 ou camada oceânica, por uma interface onde a velocidade das ondas P salta para 6,5 km/s 6,7 km/s. Essa camada tem espessura de no máximo 5 km e é composta essencialmente por gabros. A base da camada oceânica é definida por uma interface onde as velocidades das ondas P passam bruscamente para 7,9 km/s 8,1 km/s. Essa interface é interpretada como sendo a descontinuidade de Mohorovičić nas bacias oceânicas. As dorsais meso-oceânicas também têm características comuns. Além da topografia elevada em relação às bacias oceânicas, com diferenças de profundidade da ordem de 3.000 metros, existe atividade vulcânica ao longo de fraturas localizadas no eixo das cadeias submersas. Edifícios vulcânicos isolados são observados em alguns pontos ao longo da dorsal que, com e exceção da Islândia no Atlântico Norte, não atingem a superfície do mar. As fraturas ao longo das dorsais não são contínuas e são divididas em segmentos não alinhados por falhas transversais ao eixo das dorsais. Essa região apresenta uma cobertura sedimentar irregular, fina e descontínua e as rochas ígneas expostas são basaltos iguais, ou muito semelhantes, aos basaltos do topo do embasamento oceânico. As velocidades das ondas de compressão variam entre 4,4 km/s a 6,9 km/s. O manto abaixo das dorsais apresenta velocidades de onda P anômalas entre 7 km/s e 8 km/s. No meio das bacias oceânicas ocorrem ilhas vulcânicas cuja formação não tem ligação com o vulcanismo das dorsais. O arquipélago do Havaí é, talvez, o exemplo mais famoso. Sob as ilhas vulcânicas, a crosta

oceânica tem espessuras variáveis entre 10 km e 20 km. A parte superior da crosta nessas regiões, correspondendo ao embasamento das bacias oceânicas, tem velocidades de ondas P entre 4,7 km/s e 5,3 km/s enquanto que a parte inferior da crosta, correspondendo à camada oceânica nas bacias, tem velocidades no intervalo entre 6,4 km/s e 7,2 km/s. O manto imediatamente abaixo da descontinuidade de Mohorovičić tem velocidade de ondas compressionais entre 7,8 km/s e 8,5 km/s. Próximo dos arcos de ilha, a estrutura da crosta passa a ser muito mais complexa com as características variando muito de local para local. Por exemplo, enquanto na parte norte da ilha de Honshu, no arquipélago japonês a espessura da crosta chega a 35 km, a espessura da crosta sob as Antilhas Menores não passa de 3 km a 4 km. A velocidade das ondas P no manto abaixo da ilha de Honshu é de 8,0 km/s e a crosta é sismicamente dividida em três camadas. A primeira bem superficial e pouco espessa, com 2km a 3 km, caracterizada por velocidade de onda P da ordem de 5,5 km/s. A segunda e a terceira camadas compõem a maior parte do volume do arco de ilha. A segunda camada, com uma espessura de um pouco menos de 20 km tem velocidade de ondas P de 6,0 km/s e a terceira camada, com perto de 15 km de espessura tem velocidades de ondas compressionais de 6,6 km/s. A velocidade das ondas P no manto imediatamente abaixo do arco das Antilhas menores é muito baixa, de 6,4 km/s, e a velocidade desse mesmo tipo de onda na crosta varia entre 2,3 km/s e 4,0 km/s. Diferenças importantes ocorrem em regiões bem próximas entre si. O arco das ilhas Kurilas é muito próximo da ilha Sacalina, no extremo oriente do território russo. Enquanto que a crosta das ilhas Kurilas do Sul

tem espessura da ordem de 15 km, a crosta na ilha Sacalina tem perto de 30 km de espessura. Enquanto que o manto imediatamente abaixo das duas regiões tem velocidades de onda P próximas, 7,5 km/s e 7,8 km/s, respectivamente, as estruturas crustais são diferentes tanto em espessura quanto no que diz respeito à velocidade das ondas tipo P. Bacias marginais são segmentos da crosta oceânica entre arcos de ilha, como, por exemplo, o mar das Filipinas ou entre um arco de ilha e o continente, como por exemplo o mar de Okhotsky, no extremo oriente do território russo. As bacias marginais têm uma estrutura semelhante às das bacias oceânicas. As espessuras, no entanto, são maiores, entre 10 km e 15 km, devido, principalmente à maior espessura da camada sedimentar. A estrutura inferida por métodos sísmicos mostra a ocorrência de duas a quatro camadas acima da camada oceânica, que tem velocidades de ondas P entre 6,6 km/s e 6,9 km/s. Por último, as bacias oceânicas internas são caracterizadas por serem, ou completamente cercadas por crosta continental, como no caso do mar Cáspio e do Mar Negro, ou parcialmente confinadas por crosta continental (Golfo do México, por exemplo). As bacias internas são caracterizadas por não apresentarem atividade sísmica e por possuírem uma camada sedimentar muito espessa, entre 10 km e 20 km. As espessuras crustais variam de local para local. No caso do Golfo do México não ultrapassa 15 km e no caso do mar Cáspio supera 45 km. De uma forma geral, a estrutura revelada por métodos sísmicos é composta por rochas com velocidades de ondas de compressão entre 2 km/s a 5 km/s, correspondendo ao pacote sedimentar depositado sobre um embasamento com velocidades de ondas P entre 6,3 km/e e 6,7 km/s.

Os sedimentos de algumas bacias internas, entre as quais despontam os exemplos citados do Mar Cáspio, do mar Negro e do Golfo do México, apresentam estruturas sedimentares complexas, com a presença de estruturas de sal 2, que são particularmente ricos em depósitos de hidrocarbonetos. Crosta continental A crosta continental é definida, do ponto de vista da propagação das ondas sísmicas, como sendo a camada mais externa e essencialmente emersa da Terra. Uma fração pequena da crosta continental é coberta por mares rasos. A espessura da crosta continental é variável, indo de 20 km a 70 km dependendo da região, e a sua base é definida pela descontinuidade de Mohorovičić. O modelo mais simples de crosta continental é composto por duas camadas separadas por uma mudança brusca de velocidades das ondas sísmicas de compressão de aproximadamente 6,2 km/s e das ondas de cisalhamento de aproximadamente 3,6 km/s. A superfície de separação entre as duas camadas é chamada de descontinuidade de Conrad e a sua profundidade é variável, embora, em média divida a crosta em duas camadas de espessura muito próximas. A camada acima da descontinuidade de Conrad é chamada de crosta superior onde prevalecem rochas, cuja composição será chamada 2 Algumas bacias sedimentares acumulam espessuras muito significativas de depósitos de sal. Esses depósitos têm inicialmente a forma de uma camada horizontal ou sub-horizontal, mas se deformam facilmente em função dos efeitos da gravidade ou da presença de esforços agindo sobre as rochas da bacia, dando origem a uma série de estruturas como diápiros, que são estruturas grosseiramente cilíndricas formadas devido ao contraste entre a densidade do sal e de sedimentos mais densos superpostos.

aqui, de forma genérica, de granítica. Para se evitar qualquer tipo de confusão, diga-se de imediato que o termo composição granítica não significa, de forma nenhuma, que a crosta superior seja formada exclusivamente por granitos. A crosta superior é formada por rochas magmáticas compostas por silicatos de alumínio e magnésio, com a presença de sílica livre (quartzo), entre as quais se encontram os diversos tipos de granito, rochas sedimentares e por rochas metamórficas formadas por modificações em estado sólido, das rochas ígneas e sedimentares. A segunda camada, chamada de crosta inferior, é caracterizada por velocidades de ondas P aproximadamente 6,6 km/s e de ondas S de 3,7 km/s, e a sua composição será aqui chamada, também de forma genérica, de composição basáltica. De novo, a crosta inferior não é formada apenas, nem mesmo principalmente, por basaltos. A crosta inferior é composta principalmente por rochas metamórficas caracterizadas por metamorfismo em condições de pressão e temperatura mais altas do que as condições que geraram as metamórficas da crosta superior. São rochas formadas por silicatos, principalmente, de ferro e magnésio, com pouca ou nenhuma sílica livre. O modelo de crosta continental formado por duas camadas, no entanto é muito simples para representar as observações geológicas e geofísicas. Levantamentos de diferentes tipos mostram que a crosta continental tem, na realidade, uma estrutura muito mais complexa, onde as variações laterais de densidade, composição e velocidade de ondas sísmicas são grandes, muitas vezes comparáveis com as varrições verticais descritas no modelo simples de duas camadas. O motivo para uma

diferença marcante entre a estrutura da crosta oceânica e da crosta continental será discutido um pouco mais adiante no curso, mas estão relacionadas às histórias geológicas muito diferentes das duas regiões. Uma descrição detalhada da crosta continental está fora do propósito deste curso. Uma descrição detalhada é, na realidade, assunto para mais de um curso de nível muito acima do elementar. O que será feito a seguir é descrever as principais unidades tectônicas que formam a crosta continental do ponto de vista das propriedades observadas pelos métodos geofísicos, principalmente, velocidades de ondas sísmicas e densidade. A espessura da crosta na maior parte dos continentes varia entre 35 km e 40 km. Afastamentos significativos desse valor ocorrem, sobretudo, sob grandes cordilheiras, como os Himalaias, os Andes e as Montanhas Rochosas, onde a espessura crustal pode atingir valores de até 60 km ou mais. Crostas delgadas com espessuras inferiores a 30 km são observadas em regiões onde a crosta parece estar submetida e a processos de estiramento 3. Do ponto de vista da estrutura revelada pela propagação de ondas sísmicas de volume, a parte superior da crosta continental é caracterizada por velocidades de ondas de compressão da ordem de 6,1 km/s, enquanto que a parte inferior é caracterizada por velocidades entre 6,5 km/s e 6,9 km/s. Apesar de haver diferenças significativas de velocidades de ondas sísmicas de em função da profundidade dentro da crosta, a 3 Existem regiões da crosta que estão submetidas a um conjunto de esforços que tende a esticar, ou usando um termo mais técnico, estirar a região. Nessas regiões se desenvolve um conjunto de falhas normais, que, embora na superfície possam ter mergulho relativamente alto, se tornam cada vez mais horizontais com a profundidade. Essas falhas, conhecidas como falhas lístricas, induzem uma grande extensão lateral com um conseqüente afinamento da crosta. Um dos exemplos mais conhecidos de regiões com crosta sob estiramento é a região de Basin and Range, nos Estados Unidos e no México.

descontinuidade de Conrad é mal definida em muitas regiões, não sendo observada em muitos perfis de refração sísmica. Em outras regiões, a descontinuidade de Conrad não tem um caráter de interface e se apresenta na forma de uma variação gradativa das velocidades das ondas. O manto imediatamente abaixo da descontinuidade de Mohorovičić é caracterizado, nas regiões de espessura de crosta entre 35 km e 40 km por velocidades de ondas P entre 8,1 km/s e 8,2 km/s. A descrição feita acima pode ser considerada como a descrição de uma crosta continental normal. Existem regiões, no entanto, onde tanto na crosta quanto no manto superior, as velocidades das ondas sísmicas se afastam muito desse padrão. Um exemplo desse tipo de região são os chamados rifts continentais. Rifts continentais são estruturas continentais formadas por processos de distensão da crosta. Do ponto de vista morfológico são formados por vales alongados, às vezes com centenas ou milhares de km de extensão, como é o caso, por exemplo, do rift do leste da África. As bordas são muito elevadas, com 1 a 3 km de desnível em relação ao vale, e definidas por falhas normais. Em alguns casos, como no leste da África, a região é afetada pela presença de vulcanismo. Os montes Kenya e Kilimanjaro são dois dos vulcões mais conhecidos da região. Abaixo do rift do leste da África a descontinuidade de Mohorovicic não é bem definida em uma faixa estreita, com 10 km ou 20 km em torno do eixo do rift. O manto imediatamente abaixo do prolongamento da descontinuidade de Mohorovicic nas regiões vizinhas ao rift (~40 km de profundidade) apresenta velocidades de ondas P de 7,3 km/s. Em

contrapartida, acima desse prolongamento, velocidades de ondas P altas para a crosta, da ordem de 7,5 km/s, são observadas. A região de estiramento crustal de Basin e Range 4 nos Estados Unidos é caracterizada por velocidades de ondas de compressão entre 7,7 km/ e 7,8 km/s são observadas junto com espessuras crustais de no máximo 35 km. Em geral, o manto sob das grandes cordilheiras apresenta velocidades de ondas sísmicas abaixo de 8 km/s. Sob as Montanhas Rochosas, por exemplo, as velocidades das ondas P variam entre 7,7 km/s e 7,9 km/s. A origem das variações das velocidades das ondas sísmicas na crosta e, principalmente, no manto superior, estão ligadas a processos tectônicos que ocorrem nos diversos ambientes. No próximo capítulo, esses processos serão descritos com algum detalhe. Em termos médios, o manto superior abaixo dos continentes é bastante distinto do manto superior abaixo dos continentes. Essas diferenças podem ser analisadas com base nas velocidades previstas pelo modelo paramétrico de Terra 5. A distribuição de velocidades de ondas P sob os continentes e sob os oceanos até a profundidade de 420 km abaixo do nível do mar mostra uma região onde as velocidades das ondas sísmicas diminuem com a profundidade. No caso do manto superior suboceânico, o decréscimo da velocidade é menor do que no manto superior subcontinental. 4 A região de Basin and Range se localiza na região oeste da América do Norte entre a Serra Nevada a oeste e o planalto do Colorado a leste. Na direção norte sul se estende, aproximadamente, desde o norte do Estado de Nevada nos Estados Unidos até a região da Serra Madre Ocidental, no México. 5 Dziewonski, A. M., Hales, A. L., Lapwood, E. R., 1975, Parametrically simple earth models consistent with geophysical data. Physics of the Earth and Planetary Interiors, 10, 12.

Além disso, sob os oceanos a zona de baixa velocidade é mais extensa do que sob os continentes e se inicia a profundidades menores. As velocidades das ondas P na zona de baixa velocidade sob os continentes são ligeiramente inferiores do que sob os oceanos. A variação das velocidades das ondas S sob os continentes e sob os oceanos mostra, no caso das ondas de cisalhamento, a queda de velocidade é nitidamente mais acentuada sob o assoalho oceânico. Para profundidades acima de 420 km, o modelo paramétrico de Terra assume uma dependência exclusivamente radial das velocidades das ondas sísmicas. As variações de velocidade descritas refletem, em parte, diferenças entre o comportamento mecânico das rochas que compõem o manto superior. No próximo capítulo, essas propriedades serão discutidas com algum detalhe.