INTRODUÇÃO: "Eu cresci assim, mal acostumado, cheio de liberdades, escolhas. Cresci num cenário tão favorável que os acontecimentos mais duradouros a que tive acesso, saltaram dos empoeirados livros de história, para as telas de um computador. Eu cresci num mundo tão cheio de informações, que tive que escolher o que eu queria ver, o que eu queria ouvir, é como se os fatos realmente relevantes do passado tivessem sido fracionados em um milhão de novas notícias, um milhão de novos caminhos para seguir. Eu cresci num mundo onde tudo acontece muito rápido, tão rápido que quando penso em pensar, já estou pensando no passado. Confesso que às vezes me assusto com tal velocidade, mas também confesso que não mais saberia viver sem ela, confesso que me adaptei, e que me prendi definitivamente a este frenesi que não sei o nome, mas que faço parte. Eu cresci na era da internet, da tecnologia e do desenvolvimento, e estou ajudando a transformar o mundo. Muito prazer, eu sou parte do futuro. Eu sou a geração Y. Toda a narrativa basear-se-á na vida do protagonista Renato, criado pelo grupo, para mostrar a evolução da tecnologia desde a década de 90 até hoje. 1
Diário da Geração Y São Paulo, 18 de Maio de 1996. Quinhentas peças estão espalhadas sobre a mesa, perdidas e aleatórias elas pareciam implorar por ordem, pelo encaixe perfeito que eu não era capaz de encontrar. Passei alguns minutos ali observando tudo, sem saber por onde começar, e perdido na minha própria falta de iniciativa, pensei em virar a mesa e derrubar tudo no chão de uma só vez, mas o que ia adiantar se eu nem mesmo tinha conseguido encaixar uma peça sequer, eu apenas espalharia o que já estava espalhado na minha mente, não dá pra recomeçar um jogo que nem tinha começado, me irritei mais ainda. Foi quando minha irmã, Carol ao passar pela sala e perceber minha irritação sugeriu: -- Por que você não olha a figura na caixa do jogo e começa pelas pontas? Claro! Como eu não tinha pensado nisso? Me senti envergonhado, como minha irmã, com 8 anos de idade, dois anos mais nova do que eu, poderia ter uma sacada que eu com 10 anos não pude pensar? Segui a sugestão da Carol, e fui me entendendo com as peças até que o sono me derrotasse. No dia seguinte, quando voltei do curso de datilografia, continuei meu jogo, mas logo enjoei daquilo. Eu nunca tive a paciência dos meus pais, sempre fui elétrico, e a Carol também, ela mexia em tudo, não podia ver um botão que já queria descobrir sua função. Meus amigos de escola eram do mesmo jeito, sempre estavam fazendo alguma coisa, quando não andavam de bicicleta, por certo estariam em cima de alguma árvore, o fato é que sempre deveríamos estar ocupados com alguma coisa, era muito chato não fazer nada. Ainda me lembro da alegria que senti quando ganhei um Super Nintendo, assim que completei 10 anos, meus amigos não me davam sossego, bastava eu sumir por alguns minutos e as vozes no portão já ecoavam: Renato! Renato! Era uma festa, e eu sentia que de algum modo a tecnologia já estava transformando o meu convívio, e maneira de enxergar as coisas. Assim como a Carol, que apesar de seus 8 anos, já sonhava com um aparelho celular. Mas, isso é uma história pra mais tarde. 2
São Paulo, 25 de Agosto de 1998. Hoje, eu resolvi fazer algo diferente, decidi que ia me aventurar usando a velha máquina de escrever do meu pai, afinal, o meu curso de datilografia deveria servir para alguma coisa. Passei algum tempo ali me divertindo e desbravando cada tecla, mas logo o tédio tomou conta de mim. Minha irmã sempre quis um celular, mas meu pai dizia que era muito caro, além do mais ele alegava que não era brinquedo para crianças. Papai tinha uma pequena fábrica de calçados, não parava em casa, apesar disso nunca foi ausente, sempre muito preocupado e cuidadoso, dava pra gente tudo o que ele não teve condições de ter. Todas as novidades, ele dava um jeito de comprar, deve ser por isso que herdamos toda essa curiosidade a respeito do que é novo. Minha irmã jogava vídeo-game com uma habilidade impressionante, tinha um raciocínio de dar inveja, aliás foi com a ajuda dela que consegui terminar o quebra-cabeça de 500 peças. Outro dia, meu pai estava tentando adicionar o número do telefone de um amigo na agenda do celular que ele havia comprado recentemente, sem sucesso, apelou pra Carol, que resolveu o problema em questão de segundos, meu pai todo orgulhoso, deu um celular pra ela. Nunca vi tanta felicidade em uma pessoa, minha irmã tinha 9 anos e já portava um celular, quem diria... Fiquei feliz com a conquista da Carol, celular é para poucos, quase ninguém tinha um, e os que tinham, em sua maioria usavam para fins de trabalho, o que não era o caso da minha irmã. Mas, voltando a falar sobre mim, não sei o que havia acontecido, mas de uns tempos pra cá passei a me interessar muito por computador, tanto que meu pai já fora convencido de que aquela aquisição contribuiria para o nosso futuro. Cada vez que eu usava o computador, eu pensava em novas idéias, sabia que ali estava meu vídeogame, um rádio, a máquina de escrever, livros, tudo em um só aparelho. E aquela versatilidade me trazia novas idéias e soluções que mudariam o rumo do mundo. Agora eu até podia fazer meus trabalhos digitados. E nos finais de semana até usar a internet discada para fazer uma pesquisa ou outra nos sites de busca. Mal sabia eu, que já fazia parte da geração da internet 1.0. 3
São Paulo, 20 de Novembro de 2002. Como o tempo passou depressa, parece mentira mas já estou com meus 15 anos e hoje, me lembrei de voltar até aqui e relatar as transformações pelo qual estamos passando. O velho celular da minha irmã nem existe mais, foi rapidamente substituído por outro mais moderno, ela também deixou de ser exclusiva, parece que as amigas dela todas também compraram um, mas isso é bom, pelo menos agora ela tem com quem falar. A internet ganhou cada vez mais espaço na minha vida. Todos os discos da minha casa, foram substituídos por cd s, assim como as fitas do vídeo cassete. É incrível o que está acontecendo, as locadoras estão todas divididas ao meio, em uma parte só as fitas, na outra os dvd s, estamos passando por um processo de transformação, junto com as fitas, também estamos aposentando os disquetes para computador, parece que o cd realmente veio pra ficar. Até o meu bom e velho vídeo-game estava ultrapassado, os novos, eram todos com jogos em cd e com o visual dos jogos mais parecido com o real. Na escola, eu já estou no ensino médio, ou colegial, como costumamos chamar, é uma fase complicada, estamos a um passo do mercado de trabalho e tudo que eu sei é que minha matéria favorita é matemática, e que gosto muito de mexer com novas tecnologias. Eu tenho muitas ideias na cabeça, várias soluções para as pessoas, que por mais pequenas que possam parecer, certamente nos ajudariam. Acho que o grande papel da tecnologia é simplificar o caminho das coisas, deixar a vida menos burocrática, diminuir o esforço para obtenção de algo, sem perder a credibilidade, este é o desafio, para criar alguma coisa que facilite nossas vidas, devemos ter a preocupação de que esta ideia transmita a segurança necessária para que a segurança ocorra. Tudo que é novo causa receio, pela falta de conhecimento acerca daquilo que estamos prestes a desvendar, o importante é o fato de que devemos sempre estar abertos a conhecer e acatar ou não uma nova tendência de acordo com nossas necessidades individuais. 4
São Paulo, 12 de Setembro de 2005. Finalmente, a faculdade chegou. Depois de 3 anos no ensino médio, e muitas dúvidas sobre o futuro, eu havia decidido estudar publicidade e propaganda, meu pai não gostava muito da ideia, preferia que eu seguisse alguma carreira tradicional como Direito ou Medicina, mas eu estava convencido sobre minha opção. Toda minha rotina na faculdade, desde as matérias em sala de aula, até o relacionamento social com os amigos envolvia tecnologia, absolutamente tudo que nos rodeava estava repleto de novidades e conceitos recém-criados. Eu era bastante observador, nos intervalos de cada aula, eu ficava examinando o comportamento das pessoas, como elas agiam em rodas de amigos, e como se comportavam durante uma aula, notava que a maioria não desgrudava do celular, o tempo todo paravam para mexer, observar uma mensagem, mesmo quando não estavam recebendo ou efetuando uma ligação, sempre havia a necessidade do contato com o aparelho, aquilo era uma espécie de refúgio. Sempre que via uma pessoa enroscada num celular, logo lembrava da Carol que desde criança já mostrava toda sua disposição e aceitação ao aparelho. Já o meu pai continuava com o velho celular dele, ele havia parado no tempo, em todos os sentidos, tanto que sua fábrica de calçados andava mal das pernas, e isso poderia custar a minha permanência na faculdade. Ele dizia que estava cada vez mais difícil competir com os grandes, e que estava perdendo muito espaço. O clima na minha casa não era dos melhores, essa crise fez com que a gente tivesse que repensar algumas coisas, ou seja, efetuar cortes, mas nada disso foi suficiente, meu pai já havia demitido funcionários, vendido carro, mas a situação era tão grave que tive que deixar a faculdade. De repente, me vi daquele jeito, sem um trabalho, sem antigos privilégios e sem a possibilidade de continuar meus estudos. Meu pai não poderia sentir-se pior, ele custava a acreditar que a concorrência fosse ser tão desleal a ponto do estabelecimento que ele ergueu em anos de trabalho beirar à falência. Este realmente é um capítulo muito triste de nossas vidas. 5
São Paulo, 14 de Janeiro de 2006. A ano virou, e mesmo com todas as dificuldades minha mãe ainda encontrava motivos para sorrir, meu pai lamentava dia e noite a situação de sua fábrica de calçados, que fornecia apenas o suficiente para dispor de nossas necessidades básicas, minha mãe que nunca foi apegada aos bens materiais e ao luxo, parecia a mais lúcida de todos nós, tinha uma paciência invejável e sempre soltava uma palavra de otimismo para o meu pai, cada vez que ele se mostrava inerte diante da situação. E quer saber, ela estava certa, a gente não podia entregar os pontos assim, foi quando me veio o desejo heróico de resgatar a honra de nossa família. Eu decidi que iria reerguer o negócio do meu pai, custe o que custar, ele sempre fez o possível para nos agradar, acho que chegou a hora de retribuir a gentileza. Pedi para ir trabalhar com ele, eu queria conhecer a empresa, saber como funcionava para ir me familiarizando ao ambiente, ele topou, aos poucos fui me envolvendo com a rotina da empresa que agonizava diante de um mercado impiedoso que a engolia aos poucos, dia após dia. Meu pai tinha uma experiência no ramo muito boa, poucos conheciam de toda a parte técnica da empresa como ele, mas pude perceber que o problema ia além, ele precisava de novos contatos, de uma identidade visual para a empresa para gerar a lembrança nos consumidores, faltava tudo o que as novas tendências de publicidade e tecnologia ofereciam, por isso a empresa não fazia mais sentido, ela parou no tempo. Decidi fazer um planejamento envolvendo tecnologias alternativas, como não tínhamos muito dinheiro para investir, as coisas teriam que acontecer numa espécie de improviso, porém deveriam acontecer de alguma forma. Eu já sabia que a internet era um grande canal para que isso pudesse acontecer, afinal com a nova tendência da internet 2.0, onde o usuário pode gerar conteúdo, criar a notícia, informação, propaganda etc, a divulgação já seria facilitada neste sentido. Mas, agora o meu grande desafio é como criar soluções em tecnologia além da web, e baseado nesta idéia, me dedicarei nos próximos dias. 6
São Paulo, 18 de Outubro de 2007. Hoje, escrevo com a felicidade da recuperação que estamos conseguindo junto à empresa, menos de um ano depois e o cenário é totalmente favorável. Como isso aconteceu? Vários fatores podem explicar, mas com certeza, isso foi possível graças a uma maneira diferente de enxergar a empresa e o mercado atual, meu pai finalmente convenceu-se de que era hora de mudar. Para começar juntei um grupo de amigos que conheciam alguma coisa sobre computador e criamos um site para a empresa, bem simples, é verdade, mas aquilo já representava uma aproximação ao consumidor, é preciso ficar claro que hoje a oferta é maior que a demanda, e que por isso devemos exceder as expectativas do consumidor em relação ao nosso produto. Foi com esse tipo de pensamento que aprendi na faculdade, mesmo em pouco tempo, que segui a reformulação da nossa empresa de calçados, sim agora eu sou parte dela. Outra idéia utilizando a tecnologia a nosso favor se deu no campo da personalização de calçados, percebemos uma tendência de exclusividade nas pessoas, muitas não gostavam de ter calçados iguais aos de outras pessoas, foi quando decidimos criar em nosso site um aplicativo, onde cada pessoas poderia montar seu calçado, escolhendo cores, estampas, etc. Com isso, além de atingir um novo público, ainda teríamos mais visitas em nosso site. O resultado foi um sucesso, meu pai logo precisou contratar novas pessoas para desempenhar essas novas funções da empresa. Através do site Youtube mundialmente conhecido, criamos uma promoção onde o participante escolheria um calçado pertencente a nossa linha, e teria a missão de divulgá-lo pelo site, o ganhador receberia um prêmio em dinheiro, além do calçado que ele ajudou a divulgar, com isso, conseguimos gerar conteúdo, e logo estávamos dentro de redes sociais com comunidades no Orkut e perfil no twitter. O resultado não poderia ter sido melhor, viramos a mesa em pouco tempo, conquistamos um novo público, mais fornecedores. E logo me apareceu novas oportunidades de emprego. As coisas passaram a funcionar novamente. 7
São Paulo, 08 de Abril de 2011. Quase três anos depois, lembrei-me de passar por estas linhas pra ilustrar a mudança ocorrida em minha vida. Depois que ajudei meu pai a reerguer sua empresa, as coisas começaram a funcionar, é estranho, mas as pessoas passam a te olhar de outra forma, com mais reconhecimento. Voltei a estudar publicidade e propaganda, estou último ano e continuo desenvolvendo projetos que ajudem a solucionar possíveis problemas. Desde criança sempre gostei de computador, e a maioria destes projetos envolvem a conversão das tecnologias, é muito legal perceber a velocidade com que as coisas estão acontecendo. O que antes parecia loucura, hoje é realidade, e é muito importante ver que as pessoas estão abertas a estas transformações. Hoje, comprei um smartphone e sempre que possível eu uso o twitter para divulgar conteúdo a respeito desses projetos. As redes sociais me conquistaram também, não me imagino longe de toda esta malha de informações. Já ia me esquecendo, consegui um emprego numa rede de bancos, e estou trabalhando com publicidade online, e maneiras que possam buscar maior interação entre o consumidor e a marca. A palavra-chave de tudo que tenho conquistado chama-se interação, acho que as coisas começaram a dar certo porque eu realmente gosto do que faço, não sinto uma necessidade de fazer algo por obrigação, eu faço porque me vejo no lugar das pessoas. E mais do que isso, a idéia de utilizar a internet além de suas funções básicas, nos rendeu um prêmio de usuário inovador, desenvolvemos a idéia dos sites de compra coletiva e o sucesso não poderia ter sido maior. Hoje, várias pessoas enxergam a internet como ela deve ser vista, não uma simples ferramenta de entretenimento ou informações, mas uma infinita rede de possibilidades que podem e devem agregar em nosso convívio social. Depois de um dia de trabalho, e de uma busca incessante de novas possibilidades para a internet, vou brincar um pouco com meu novo Ipad, o desafio de hoje é um quebra-peças. Quinhentas peças, apenas quinhentas peças, acho que desta vez vou começar pelas pontas. 8