Nome: Nº: Turma: Português 2º ano Textos base para o Arcadismo João J Mai/09 Marília de Dirceu de Tomaz Antonio Gonzaga Textos base para o Arcadismo PARTE I Lira I Eu, Marília, não sou algum vaqueiro, Que viva de guardar alheio gado; De tosco trato, d' expressões grosseiro, Dos frios gelos, e dos sóis queimado. Tenho próprio casal, e nele assisto; Dá-me vinho, legume, fruta, azeite; Das brancas ovelhinhas tiro o leite, E mais as finas lãs, de que me visto. Eu vi o meu semblante numa fonte, Dos anos inda não está cortado: Os pastores, que habitam este monte, Com tal destreza toco a sanfoninha, Que inveja até me tem o próprio Alceste: Ao som dela concerto a voz celeste; Nem canto letra, que não seja minha, Mas tendo tantos dotes da ventura, Só apreço lhes dou, gentil Pastora, Depois que teu afeto me segura, Que queres do que tenho ser senhora. É bom, minha Marília, é bom ser dono De um rebanho, que cubra monte, e prado; Porém, gentil Pastora, o teu agrado Vale mais q'um rebanho, e mais q'um trono. Os teus olhos espalham luz divina, A quem a luz do Sol em vão se atreve: Papoula, ou rosa delicada, e fina, Te cobre as faces, que são cor de neve. Os teus cabelos são uns fios d'ouro; Teu lindo corpo bálsamos vapora. Ah! Não, não fez o Céu, gentil Pastora, Para glória de Amor igual tesouro.
Leve-me a sementeira muito embora O rio sobre os campos levantado: Acabe, acabe a peste matadora, Sem deixar uma rês, o nédio gado. Já destes bens, Marília, não preciso: Nem me cega a paixão, que o mundo arrasta; Para viver feliz, Marília, basta Que os olhos movas, e me dês um riso. Irás a divertir-te na floresta, Sustentada, Marília, no meu braço; Ali descansarei a quente sesta, Dormindo um leve sono em teu regaço: Enquanto a luta jogam os Pastores, E emparelhados correm nas campinas, Toucarei teus cabelos de boninas, Nos troncos gravarei os teus louvores. Depois de nos ferir a mão da morte, Ou seja neste monte, ou noutra serra, Nossos corpos terão, terão a sorte De consumir os dois a mesma terra. Na campa, rodeada de ciprestes, Lerão estas palavras os Pastores: "Quem quiser ser feliz nos seus amores, Siga os exemplos, que nos deram estes." Sonetos Cláudio Manoel da Costa Pastores, que levais ao monte o gado, Vêde lá como andais por essa serra; Que para dar contágio a toda a terra, Basta ver se o meu rosto magoado: Eu ando (vós me vêdes) tão pesado; E a pastora infiel, que me faz guerra, É a mesma, que em seu semblante encerra A causa de um martírio tão cansado. Se a quereis conhecer, vinde comigo, Vereis a formosura, que eu adoro; Mas não; tanto não sou vosso inimigo: Deixai, não a vejais; eu vo-lo imploro; Que se seguir quiserdes, o que eu sigo, Chorareis, ó pastores, o que eu choro. IV
Sou pastor; não te nego; os meus montados São esses, que aí vês; vivo contente Ao trazer entre a relva florescente A doce companhia dos meus gados; Ali me ouvem os troncos namorados, Em que se transformou a antiga gente; Qualquer deles o seu estrago sente; Como eu sinto também os meus cuidados. Vós, ó troncos, (lhes digo) que algum dia Firmes vos contemplastes, e seguros Nos braços de uma bela companhia; Consolai-vos comigo, ó troncos duros; Que eu alegre algum tempo assim me via; E hoje os tratos de Amor choro perjuros. ARCADISMO: a palavra arcádia, que dá origem a Arcadismo, é grega e designa uma sociedade literária típica da última fase do Classicismo, cujos membros adotam nomes poéticos pastoris, em homenagem à vida simples dos pastores, em comunhão com a natureza. O Arcadismo quanto à forma vocabulário simples ; frases na ordem direta; ausência quase totral de figuras de linguagem ; manutenção de versos decassílabos, do soneto e de outrass formas clássicas O Arcadismo quanto ao conteúdo pastoralismo ; bucolismo ; fugere urbem; aurea mediocritas; elemento da cultura greco-latina ; convencionalismo amoroso ; idealização amorosa ; racionalismo ; idéias iluministas ; carpe diem Cronologia Início do Arcadismo no Brasil: 1768 publicação das Obras Poéticas de Cláudio Manuel da Costa Término: 1836 publicação de Suspiros Poéticos e Saudades, de Gonçalves Magalhães. Biografia - Tomás Antônio Gonzaga Embora português de nascimento, Tomás Antônio Gonzaga viveu no Brasil parte de sua infância. De volta a Portugal, formou-se em Coimbra, mas a partir de 1782 passou a exercer em Vila Rica o cargo de ouvidor.
Aos 40 anos de idade praticamente, Gonzaga apaixonou-se por uma adolescente de 17 Maria Dorotéia Joaquina de Seixas. A família da moça opunha-se ao namoro. Quando o poeta já vencia a resistência da família, foi preso (17898) e enviado para a ilha das Cobras, no Rio de Janeiro, como participante da Inconfidência Mineira. Os últimos dezessete anos de sua vida passou-os no degredo, em Moçambique, casado com a filha de um comerciante de escravos. Gonzaga nunca se casou com Maria Dorotéia, mas esse namoro tornou-se o primeiro mito amoroso de nossa literatura e inspirou uma de nossas mais belas obras líricas. Tomás Antônio Gonzaga (Dirceu) 1744-1810 Obras: Marília de Dirceu Cartas Chilenas (principal obra satírica do século XVIII, atribuída a Gonzaga) Duas tendências coexistem nas liras de Gonzaga: a) a contenção e o equilíbrio neoclássicos, com a utilização de todos os lugares-comuns do Arcadismo: um pastor, uma pastora, o campo, a serenidade da paisagem principal. b) o emocionalismo pré-romântico, na expressão pungente da crise amorosa e, posteriormente a prisão, da crise existencial do poeta. O sujeito lírico é o pastor Dirceu, que confessa seu amor pela pastora Marília. Eis a convenção neoclássica realizada, Mas é evidente que nos pastores se projeta o drama amoroso vivido por Gonzaga e Maria Dorotéia. A todo momento a 0emoção rompe o véu da estilização arcádica, brotando, dessa tensão, uma poesia de alta qualidade. Eu tenho um coração maior que o mundo tu, formosa Marília, bem o sabes; um coração, e basta, onde tu mesma cabes As partes da obra A obra se divide em duas partes (há uma terceira, cuja autenticidade é contestada por alguns críticos): 1ª parte: contém os poemas escritos na época anterior à prisão de Gonzaga. Nela predominam as composições convencionais: o pastor Dirceu celebra a beleza de Marília em pequenas odes anacreônticas. Em algumas liras, entretanto, as convenções mal disfarçam a confissão amorosa do amor: a ansiedade de um quarentão apaixonado por uma adolescente; a necessidade de mostrar que não é um qualquer e que merece sua amada; os projetos de uma sossegada vida futura, rodeado de filhos e bem cuidado por suas mulher etc. 2ª parte: escrita na prisão da ilha das Cobras. Os poemas exprimem a solidão de Dirceu, saudoso de Marília. Nesta segunda parte, encontramos a melhor poesia de Gonzaga. As convenções, embora ainda presentes, não sustentam o equilíbrio neoclássico. O tom confessional e o pessimismo prenunciam o emocionalismo romântico..