Avaliação das ações de controle da dengue em Santa Maria, Distrito Federal, Brasil. Artigo original



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Transcrição:

Densidade mineral óssea em fibrocísticos Artigo original Avaliação das ações de controle da dengue em Santa Maria, Distrito Federal, Brasil Evaluation of dengue control measures in Santa Maria, Distrito Federal, Brazil Sandra Duarte Nobre Mauch 1 Mhartha de Figueiredo V. da Silva 1 Jaime Miranda Parca 1 Márcia Duarte Firmino 2 Alexandre Nikolay V. R. Lemos 1 1 Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, Brasília, Brasil 2 Faculdade JK, Taguatinga, Brasil Correspondência Sandra Duarte Nobre Mauch EQ 217/218 e 417/ 418 Santa Maria, Distrito Federal, Brasil 72.547-304 sandraduarte07@yahoo.com.br Recebido em 28/março/2006 Aprovado em 5/maio/2006 Resumo Objetivo: este trabalho propõe-se, além de abordar aspectos relevantes no que se refere à doença e seu possível controle, a avaliar as ações desenvolvidas na atenção básica à saúde em Santa Maria, região administrativa do Distrito Federal, que tem apresentado resultados favoráveis com relação ao controle da dengue. Metodologia: avaliação realizada por meio de levantamento epidemiológico da doença e do levantamento do índice de infestação predial do mosquito transmissor, nos últimos anos em Santa Maria, em um contexto de desenvolvimento de ações em nível local e central visando ao controle da dengue. Conclusão: a dengue é uma doença que deve ser vista como um grave problema de saúde pública em grande parte do mundo. Diante de uma infecção para a qual ainda não foi desenvolvida uma vacina e também não há um tratamento efetivo, os esforços devem estar voltados para a prevenção por meio do combate vetorial. Essa ação enfrenta grandes dificuldades, tendo em vista que o Aedes aegypti principal vetor da doença é um mosquito com características urbanas e domiciliares e o seu combate requer mudanças nos hábitos de vida da comunidade. Palavras-chave: dengue, controle de vetores, prevenção e controle. Abstract Objective: the purpose of this paper is to approach aspects related to the illness and its possible control and to evaluate the actions developed in basic health attention in Santa Maria administrative region of the Distrito Federal which has presented positive results. Methods: the analysis was made through epidemiological survey and the index of house infestation of the vector mosquito in the last years in Santa Maria, in a context of actions in local and central level aiming the control of the disease. Conclusion: dengue fever is an illness that must be seen as a serious public health problem in great part of the world.as there is no vaccine available and no effective treatment, the efforts on prevention are made through vector Comun Ciênc Saúde. 2006;17(2): 93-100 87-92 93

Mauch SDN et al. combat. This action faces great difficulties, since the Aedes aegypit main vector of the illness is a mosquito with urban and domestic characteristics and its combat requires changes in the habits of community life. Key words: dengue, vector control, prevention & control Introdução A dengue pode ser considerada como a mais importante arbovirose que tem afetado o mundo atual, em especial os países de clima tropical. É uma doença endêmica em todos os continentes, exceto na Europa. Manifesta-se como uma doença febril aguda, tendo como agente etiológico um vírus do gênero Flavivírus, da família Flaviviridae. Atualmente são conhecidos quatro sorotipos diferentes antigenicamente: DEN-1, DEN-2, DEN-3 e DEN-4. Clinicamente a dengue pode apresentar-se na forma clássica como uma síndrome viral de evolução benigna e, na sua forma grave manifesta-se como uma doença hemorrágica, podendo evoluir para choque, com possível êxito letal. Sua transmissão faz-se pela picada do mosquito do gênero Aedes, no ciclo homem vetor homem. O período de incubação varia de 3 a 15 dias durando, em média, de 5 a 6 dias. A transmissibilidade ocorre durante o período de viremia, que se inicia um dia antes do aparecimento da febre, indo até o 6º dia da manifestação clínica da doença. 1,2,3 A suscetibilidade ao vírus da dengue é universal. Existem algumas teorias para explicar a incidência da forma grave da doença, apesar de ser um tema ainda não completamente esclarecido: a virulência da cepa do vírus infectante, o estado geral do paciente, a infecção prévia por outro sorotipo viral da doença e a associação a outros processos patológicos. Ocorre uma imunidade cruzada apenas transitória entre os diferentes sorotipos da doença, no entanto, para um mesmo sorotipo a imunidade é permanente ou pelo menos duradoura. 1,3,4 O diagnóstico precoce da dengue em geral é dificultado, devido à sua sintomatologia bastante diversificada, sendo muitas vezes confundida com outros processos infecciosos. Normalmente, quando a doença é diagnosticada, o vírus já se encontra em circulação no ambiente, atingindo diversas pessoas, o que contribui para o aparecimento de epidemias. 3 O mosquito Aedes aegypti é o principal vetor da dengue, sendo também o transmissor da forma urbana da febre amarela. Há ainda um vetor secundário Aedes albopictus que apresenta hábitos silvestres além dos urbanos e o seu comportamento não se restringe à área intradomiciliar e peridomiciliar como o Aedes aegypti. O Aedes albopictus, apesar de presente em diversas regiões do Brasil, ainda não tem participação comprovada na transmissibilidade da doença, exceto no continente asiático. 2,5,6 O Aedes aegypti é um mosquito doméstico e antropofílico, com grande capacidade de adaptação a situações ambientais desfavoráveis, inclusive a grandes períodos de seca. O período do ano relacionado às estações chuvosas e quentes favorece a reprodução dessa espécie de mosquito. Sua atividade hematofágica é diurna e ele se utiliza preferencialmente de depósitos de água limpa para realizar a oviposição. 2,3.6 É comum encontrar-se ovos e formas imaturas do mosquito pupas e larvas em locais que acumulam água como reservatórios domiciliares de água, vasos de planta, pneus e recipientes ou embalagens descartáveis que constituem lixo doméstico como potes, latas e garrafas. 7,8 Os primeiros registros de casos de dengue no Brasil ocorreram no século XIX. Durante o século XX, houve registro da doença na década de 20 e a seguir passou-se 63 anos sem que houvesse relato de casos no país. Neste período, o Aedes aegypti foi erradicado do Brasil e de outros 94 Comun Ciênc Saúde. 2006;17(2): 93-100

Ações de controle da dengue países da América. 2 No ano de 1976, o Brasil foi reinfestado pelo mosquito transmissor, aparecendo em 1982 a primeira epidemia de dengue laboratorialmente comprovada, no estado de Roraima. 1,3,9 O reaparecimento da dengue no Brasil está diretamente relacionado à sua reinfestação pelo vetor principal. Diversos fatores associam-se ao reaparecimento da doença, como o crescimento populacional, o processo de urbanização rápido e desordenado e a má-distribuição de renda. Grande parte da população que migrou para as cidades no fluxo zona rural/urbana, passou a viver em favelas ou invasões, onde não há saneamento básico e as condições de habitação são precárias. Com isto ocorreu um aumento significativo do número de criadouros potenciais do mosquito Aedes aegypti. O aumento de intensidade do tráfego aéreo e terrestre também está grandemente associado ao aparecimento e disseminação da doença, devido ao transporte do vírus no sangue de pessoas infectadas. 2,3,4,10 Nos últimos 20 anos, o método mais utilizado para o controle do Aedes aegypti foi a aplicação de inseticidas a ultrabaixo volume combate químico. Esse método apresentou um pequeno impacto no que diz respeito à circulação viral. 2 Um grave problema relacionado ao combate químico é a resistência apresentada de forma crescente pelos insetos aos larvicidas e adulticidas utilizados, em especial os organoclorados. 4 O objetivo deste estudo é avaliar as políticas de saúde que vêm sendo adotadas na Regional de Saúde de Santa Maria, em relação ao controle da dengue. Santa Maria é uma região administrativa do Distrito Federal, denominada RA XIII, inaugurada a partir de assentamentos populacionais no ano de 1990, e que conta com uma população em torno de 115.000 habitantes. O estilo de vida local é predominantemente urbano. Atualmente a cidade possui saneamento básico e coleta regular de lixo na maior parte de sua extensão. 11 Métodos Realizou-se um estudo descritivo sobre a incidência de dengue em Santa Maria, comparando-a ao Distrito Federal como um todo. Também foram levantados os índices de infestação do mosquito Aedes aegypti nessa Região Administrativa. A fonte de informação foi a Diretoria de Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (SES-DF), para dados epidemiológicos relativos à dengue no período de 2001 a 2005, quando começam a aparecer casos autóctones de dengue em Santa Maria. Além das fontes locais, o levantamento bibliográfico traz dados epidemiológicos do Brasil, relevantes para a análise comparativa. Em relação ao vetor, o levantamento dos índices de infestação refere-se ao período de 1999 a 2005 e a fonte de informação foi a Diretoria de Vigilância Ambiental da SES-DF e a Inspetoria de Saúde Ambiental de Santa Maria. Quanto às ações desenvolvidas em Santa Maria, foram revisados relatórios de atividades da Regional de Saúde referentes ao combate da doença. Resultados A evolução da autoctonia de dengue no Distrito Federal pode ser observada na Tabela 1, que traz uma breve evolução histórica de 2001 a 2005, onde se percebe um pico no ano 2002 quadro semelhante ao brasileiro e logo após, nos 2 anos seguintes, uma redução significativa. Em 2005, no entanto, aparece uma tendência ascendente do número de casos autóctones da doença, quando também começam a aparecer casos importados de outros estados brasileiros com sorotipo 3. 12 Comun Ciênc Saúde. 2006;17(2): 93-100 95

Mauch SDN et al. Tabela 1 Incidência de dengue no Distrito Federal casos autóctones, de 2001 a 2005. Ano Total de casos 2001 533 2002 1.463 2003 194 2004 53 2005 111 Fonte: SES-DF A incidência de casos de dengue em Santa Maria está apresentada na Tabela 2, onde se percebe um aumento no número de casos da doença no ano 2002, da mesma forma que ocorreu no Brasil e no DF. A partir de 2003 há uma redução bastante significativa na incidência da doença nessa Região Administrativa. 12 Tabela 2 Incidência de dengue em Santa Maria/ Distrito Federal casos autóctones, de 2001 a 2005. Ano Fonte: SES-DF Total de casos 2001 06 2002 18 2003 01 2004 00 2005 00 Com relação à infestação do mosquito Aedes aegypti em Santa Maria, observa-se na Tabela 3 o total de focos detectados em reservatórios, no período de 2003 a 2005, de acordo com o mês de ocorrência. Os principais criadouros identificados no mesmo período, levantados pela Vigilância Ambiental, foram as caixas d água, materiais descartáveis, pneus e vasos de planta. 13 Uma das principais formas de se avaliar a infestação do mosquito é o índice de infestação predial que representa o percentual de prédios encontrados com recipientes que contenham água e larvas, em relação ao número total de prédios examinados. Na Tabela 4 são apresentados esses índices em Santa Maria, no período de 1999 a 2005. 13 Quanto às atividades desenvolvidas, encontra-se relatado que diante da iminência de uma grande epidemia de dengue no DF nos anos 2002, as ações de controle foram intensificadas nos planos nacional e distrital. Além da participação nessas ações, a Regional de Santa Maria promoveu atividades em nível local, onde há possibilidade de se detectar de forma mais clara os problemas que afetam a comunidade. Neste nível, a intersetorialidade e responsabilização dos diversos setores e instituições em prol da promoção em saúde são alcançadas com maior facilidade. 14 O apoio da Administração Regional na intensificação da coleta de lixo domiciliar e em locais públicos e a priorização das ações que envolvem saneamento básico foi de fundamental importância nesse processo. Além das capacitações realizadas em nível central, os profissionais de saúde de Santa Maria foram capacitados nas próprias unidades para as ações de vigilância epidemiológica e para o atendimento e encaminhamento adequados dos casos suspeitos ou confirmados, no que diz respeito à atenção básica em saúde desenvolvida na Regional e suas referências. Tabela 3 Total de reservatórios com amostras positivas para Aedes aegypti em Santa Maria DF, 2003 a 2005. Ano Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez 2003 26 34 41 34 11 08 00 03 01 01 07 0,6 2004 19 11 16 12 09 01 00 00 00 00 03 02 2005 06 03 14 06 06 01 01 01 00 00 00 00 Fonte: Dival/Inspetoria de Saúde Ambiental Regional Santa Maria/DF 96 Comun Ciênc Saúde. 2006;17(2): 93-100

Ações de controle da dengue Tabela 4 Índice de infestação predial de mosquito Aedes aegypti por ano em Santa Maria- DF, 1999 a 2005. Ano Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez 1999 0,67 0,53 0,49 0,49 0,40 - - 00 0,04 0,08 0,17 0,64 2000 0,17 1,49 1,06 1,31 0,34 0,20 0,20 0,17 0,12 0,18 0,59-2001 0,77 0,77 0,71 0,51 0,42 00 0,28 0,01 0,06 0,12 0,26 0,45 2002 0,92 0,36 0,11 0,03 0,03 0,16 00 00 0,27 0,03 0,16 0,03 2003 0,34 0,11 0,46 0,19 0,15 0,06 00 0,01 0,01 0,01 0,04 0,03 2004 0,20 0,10 0,09 0,08 0,06 00-00 00 00 0,02 0,01 2005 0,04 0,03 0,10 0,04 0,05 0,01 00 00 00 00 00 00 Fonte: DIVAL/Inspetoria de Saúde Ambiental Regional Santa Maria/ DF. O trabalho dos agentes da vigilância ambiental tem se mostrado presente em todos os momentos, por meio de um trabalho eficaz frente à eliminação dos focos de Aedes aegypti em Santa Maria. Isso tem ocorrido em todas as estações do ano, inclusive nos meses mais secos, nos quais ainda se percebe a presença do mosquito. 13 O Dia D da Dengue, instituído pelo Ministério da Saúde, tem sido realizado desde o ano 2002, anualmente, através de um trabalho conjunto entre os agentes da vigilância ambiental e o Programa Família Saudável. Em janeiro de 2003, seguindo essa estratégia, porém de uma forma ampliada, criou-se o Dia de Alerta Contra a Dengue em Santa Maria. O objetivo foi mobilizar toda a comunidade local para a importância de sua participação no controle da dengue. Para o desenvolvimento desta ação foram utilizadas as seguintes estratégias: Identificação prévia das áreas de foco do mosquito vetor pelos agentes da vigilância ambiental; Treinamento dos agentes comunitários de saúde (ACS) do Programa Família Saudável para a identificação de criadouros; Sensibilização e treinamento das lideranças comunitárias, em parceria com a Administração Regional; Veiculação da ação nos meios de comunicação de massa; Mutirão de limpeza nas áreas públicas da cidade A ação desenvolveu-se por meio de visitas domiciliares realizadas por grupos heterogêneos, líderes comunitários, agentes da vigilância ambiental e ACS do Programa Família Saudável, divididos por quadras onde havia sido anteriormente detectada a infestação vetorial. As quadras visitadas, bem como suas proximidades foram: QR 120, QRI 30, QR 200, QR 209, QR 212, QR 304, QR 307, AC 101. Esses grupos identificaram os criadouros do mosquito Aedes aegypti nos domicílios, peridomicílios e áreas comerciais, onde buscaram conscientizar os moradores, visando a mudança de hábitos para o combate ao vetor. Os criadouros identificados foram eliminados posteriormente pelos agentes da vigilância ambiental. Discussão Desde 1986, a maior parte dos estados no Brasil tem enfrentado epidemias de dengue. Naquele ano, grandes centros urbanos como Rio de Janeiro e Fortaleza passaram por uma relevante epidemia causada pelo sorotipo DEN-1, com notificação de 93.910 casos entre 1986/1987 somente no estado do Rio de Janeiro. Em 1990, o DEN-2 foi identificado, desencadeando novas epidemias, culminando com o registro de 560 mil casos no ano de 1998, em todo o Brasil. Com a introdução do sorotipo DEN-3 em 2002, Comun Ciênc Saúde. 2006;17(2): 93-100 97

Mauch SDN et al. ocorreram mais de 794 mil casos da doença no país, apenas nesse ano, com 2.714 casos de febre hemorrágica da dengue (FHD). 9,15 O estado de Goiás área circunvizinha do Distrito Federal iniciou sua infestação por Aedes aegypti em 1986 e, a partir de 1990, essa infestação atingiu grandes áreas do Estado. 5 Somente no ano de 1997, apareceram os primeiros casos autóctones de dengue no DF, com circulação dos sorotipos 1 e 2. Tendo em vista a complexidade da doença, o controle da dengue envolve ações amplas e diferenciadas, enquanto não se dispõe de uma vacina eficaz para prevenir sua ocorrência. A vigilância epidemiológica é fundamental, uma vez que a notificação imediata e detecção precoce da doença tendem a evitar as grandes epidemias. 3 A atenção à saúde da população deve ser suficiente em todos os níveis, iniciando-se na atenção básica que realiza o trabalho preventivo e curativo da dengue, além do encaminhamento dos pacientes aos serviços de média e alta complexidade em casos de manifestação da forma grave da doença. Diante de uma epidemia, a disponibilidade de leitos de terapia intensiva suficientes é imprescindível. A capacitação dos profissionais é fundamental nesse processo, visando diminuir a transmissibilidade da doença e reduzir a letalidade pela FHD. 1 No Distrito Federal ocorreu uma redução significativa na incidência de dengue nos anos 2003 e 2004, mas percebe-se que os casos autóctones da doença continuam aparecendo e, em 2005, observou-se uma nova elevação da incidência. Em Santa Maria, após a intensificação das ações de controle da dengue no ano de 2002, ocorreu apenas 1 caso autóctone da doença em 2003. Nos anos subseqüentes não houve autoctonia, mesmo ocorrendo casos de dengue nos municípios e regiões administrativas circunvizinhas. 12 Percebese também neste período uma redução nos índices entomológicos, fundamental para o controle da doença. 13 No combate ao vetor, uma das principais ações preventivas frente à dengue, compreende a eliminação de criadouros. Para sua viabilização as estratégias utilizadas envolvem outros setores da sociedade, responsáveis pela melhoria nas condições de habitação e saneamento básico, além de uma parceria com a vigilância sanitária e o setor educacional. Segundo Tauil 3, a insuficiência de saneamento básico e a edificação de habitações precárias trazem como conseqüência o aumento dos criadouros potenciais do mosquito Aedes aegypti. Isto aparece evidenciado nos resultados favoráveis do trabalho desenvolvido em Santa Maria, visto que apesar de ser uma Região Administrativa nova, já se encontra em um processo de urbanização adiantado. O envolvimento da comunidade é de fundamental importância, tendo em vista as características domiciliares do mosquito e a necessidade de mudanças nos hábitos de vida. A informação e esclarecimento de forma geral, a utilização dos meios de comunicação de massa devem ser parte integrante das estratégias de controle da dengue, em busca de maior sensibilização dos diversos setores da sociedade para esse grave problema de saúde pública. 2,3,4 Entretanto, a forma de divulgação das informações, de acordo com estudo realizado por Lenzi e Coura 15, deve ser repensada, visto que apesar das pessoas conhecerem a doença, o controle que deveria ser exercido pela sociedade não tem sido suficiente. Diante disso, novas pesquisas de natureza qualitativa com caráter social devem ser desenvolvidas, visando a obtenção de subsídios para a melhoria dos resultados das campanhas educativas. Considerações Finais A priorização das ações de prevenção e controle da dengue, visando a promoção de mudanças nos hábitos de vida da população, no que diz respeito à manutenção do ambiente doméstico livre de Aedes aegypti, com ampla participação do Programa Saúde da Família, é a estratégia 98 Comun Ciênc Saúde. 2006;17(2): 93-100

Ações de controle da dengue fundamental do Programa Nacional de Controle da Dengue, instituído em julho de 2002 pelo Ministério da Saúde. 9 Nesse sentido, o desenvolvimento das ações de controle da dengue em Santa Maria, conta com ampla participação do Programa Família Saudável, buscando primeiramente reduzir os índices de infestação do vetor, já que esta é atualmente a principal forma de se controlar a transmissão da doença. 9 Apesar dessa situação favorável do ponto de vista epidemiológico e entomológico, as ações de controle vetorial e sensibilização dos atores sociais têm sido contínuas, levando-se em conta o constante aparecimento de casos de dengue importados de outros estados ou do próprio DF. Infere-se que o possível controle da doença se dá por meio de um conjunto de ações que vão desde saneamento básico e coleta de lixo, até o envolvimento dos profissionais de saúde e da comunidade. Entendendo-se que a promoção em saúde deve levar a mudanças no estilo de vida de uma população para a melhoria de sua qualidade de vida, é indispensável a participação dos diversos atores sociais. 3,9,16 Portanto, o processo de capacitação de uma população para atuar na melhoria de sua própria saúde em nível individual, familiar ou coletivo é fundamental na busca de soluções para os problemas que a aflige. Para isso são necessários vontade e recursos políticos, institucionais, comunitários e individuais. 9,14,17 Referências 1. Brasil. Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde. Dengue: aspectos epidemiológicos, diagnóstico e tratamento. Brasília: FNS; 2002. 2. Claro LBL, Tomassini HCB, Garcia ML. Prevenção e Controle do Dengue: uma revisão de estudos sobre conhecimentos, crenças e práticas da população. Cad Saúde Pública. Nov/ Dez 2004; 20 (6):1.447-57. 3. Tauil PL. Urbanização e ecologia do dengue. Cad Saúde Pública. 2001; 17 Suppl:99-102. 4. Tauil PL. Aspectos críticos do controle do dengue no Brasil. Cad Saúde Pública. Mai/Jun 2002;18(3):867-71. 5. Glasser CM, Gomes AC. Infestação do Estado de São Paulo por Aedes aegypti e Aedes albopictus. Rev Saúde Pública. Dez 2000; 34 (6):570-77. 6. Gomes AC, Souza JMP, Bergamaschi DP, Santos JLF, Andrade VR, Leite OF, Rangel O et al. Atividade antropofílica de Aedes aegypti e Aedes albopictus em área sob controle e vigilância. Rev Saúde Pública. Abr 2005; 39(2):206-10. 7. Forattini OP, Brito M. Reservatórios domiciliares de água e controle do Aedes aegypti. Rev Saúde Pública. Out 2003;37 (5):676-7. 8. Mortimer R. Aedes aegypti and dengue fever. Disponível em: http://www.microscopyuk.org.uk. Acessado em dez/2005. 9. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Revista Brasileira de Saúde da Família. Brasília: Ministério da Saúde, Ano V, n.7 ed. Especial, jan 2003/abr 2004. 10. Mondini A, Neto FC, Sanches MG, Lopes JCC. Análise espacial da transmissão de dengue em cidade de porte médio do interior paulista. Rev Saúde Pública. Jun 2005;39(3):444-51. 11. Governo do Distrito Federal. Administração Regional de Santa Maria RA XIII Características da Região. Disponível em: http:/ /www.santamaria.df.gov.br. Acessado em out/ 2005. 12. Governo do Distrito Federal. Secretaria de Estado de Saúde. Subsecretaria de Vigilância à Saúde. Diretoria de Vigilância Epidemiológica. Registros de incidência de dengue no Distrito Federal 2001 a 2005. Mimeo 13. Governo do Distrito Federal. Secretaria de Estado de Saúde. Subsecretaria de Vigilância à Saúde. Diretoria de Vigilância Ambiental. Índice de Infestação Predial no Distrito Federal 1999 a 2005 e Focos de Aedes aegypti em Santa Maria. Mimeo 14. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Experiências Saudáveis. Ano 1, n. 2 nov/dez 1999. 15. Lenzi MF, Coura LC. Prevenção da dengue: a informação em foco. Rev Soc Bras Medicina Tropical. Jul/Ago 2004;37 4):343-50. Comun Ciênc Saúde. 2006;17(2): 93-100 99

Mauch SDN et al. 16. Lefèvre F, Lefèvre AMC, Scandar SAS, Yassumaro S. Representações sociais sobre relações entre vasos de plantas e o vetor da dengue. Rev Saúde Pública. Jun 2004;38(3): 405-14. 17. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Município Saudável: novo conceito de gestão revoluciona a vida das comunidades. Ano 1, n. 1 ago/out 1999. Trabalho realizado pela Diretoria Regional de Saúde de Santa Maria/Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal. 100 Comun Ciênc Saúde. 2006;17(2): 93-100