Espiritualidade comprometida

Documentos relacionados
Breve Biografia e Seleção de Frases John Wesley

Estruturas teológicas e ênfases em John Wesley

QUEM NÓS SOMOS EM CRISTO? E QUEM SOMOS SEM CRISTO? TEXTO: 1 Pedro

Evangelizar é partilhar o evangelho e levar outros a aceitarem Jesus como seu Salvador pessoal, aceitá-lo como seu Senhor que logo virá; unir sua

SUMÁRIO INTRODUÇÃO. A revelação A. A revelação em geral B. A revelação geral C. A revelação especial... 30

LIÇÃO 9 A MISSÃO ENSINADORA DA IGREJA. Prof. Lucas Neto

Conselho Arquidiocesano de Pastoral

LIÇÃO 13 A EVANGELIZAÇÃO INTEGRAL NESTA ÚLTIMA HORA

DIRETRIZES CURRICULARES PARA O CURSO DE FORMAÇÃO DE EVANGELISTAS

A Declaração de Jerusalém

CHAMADOS A VIVER EM COMUNHÃO MEMBROS DE UM SÓ CORPO EM CRISTO JESUS (1COR 12,12)

AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE SÁTÃO CURRÍCULO DISCIPLINAR 3º ANO EDUCAÇÃO MORAL E RELIGIOSA CATÓLICA (EMRC) (SNEC)

FORMAÇÃO DE PREGADORES

Conferência Doutrinária, Pastoral e Teológica 20º Concílio Geral. Palavra do Bispo Roberto Alves de Souza Bispo da 4ª Região Eclesiástica

O Sr. SILAS BRASILEIRO (PMDB-MG) Senhor Presidente, Deputado Áureo Lídio, Senhoras e Senhores Deputados, Autoridades

LIÇÃO 12 A ORDEM SUPREMA DE CRISTO JESUS. Prof. Lucas Neto

LIÇÃO 2 PARA OUVIR E ANUNCIAR A PALAVRA DE DEUS. Prof. Lucas Neto

Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo 1

ADMINISTRAÇÃO [ORGANIZAÇÃO]

CONHECIMENTO ESPIRITUAL

O Espírito Santo, que o Pai nos presenteia, identifica-nos com Jesus- Caminho, abrindo-nos ao seu mistério de salvação para que sejamos filhos seus e

LIÇÃO 6 OS DISCÍPULOS SÃO COMISSIONADOS POR JESUS. Prof. Lucas Neto

Colossenses: 1: 1-12

ANIMAÇÃO BÍBLICA DA PASTORA: uma nova mentalidade

1º Período: Unidade Letiva 1 A Dignidade das Crianças

O CONCEITO DOS DONS ESPIRITUAIS

Assessoria de Educação. Pastor Joel Nascimento Congresso Renovação Ministerial Fev/2016 Avivamento Bíblico - Jaçanã

Por Assessoria de Imprensa CNPF

EM RESUMO, QUE LUZES NOS TRAZ O DOCUMENTO DE APARECIDA?

LIÇÃO 1 Por que liderança masculina? Atos 14.23; Tito 1.5-9

Conferência Doutrinária, Pastoral e Teológica 20º Concílio Geral. Palavra do Bispo Luiz Vergílio da Rosa Bispo da 2ª Região Eclesiástica

Doutrinas E Princípios A Compreender

LIÇÃO 8 BATISMO NO ESPÍRITO SANTO E DONS. Prof. Lucas Neto

Metodismo. Elizeu Gomes, M. Div. Vencedor do Prêmio Areté 2007 de Literatura pela Academia Brasileira de Editores Cristãos

LIÇÃO 7 A NECESSIDADE DO NOVO NASCIMENTO. Prof. Lucas Neto

CURSO DE FORMAÇÃO DE OBREIRO ON LINE

"Com pedras, os homens constróem catedrais; mas com gestos de amor constróem a Humanidade".

Salmo Pr. Fernando Fernandes. PIB em Penápolis. Parte 2 29/09/2010

RESUMO DO ARTIGO- SECÇÃO TEOLOGIA T. A. Nobel Seminário Teológico Nazareno, Kansas City

Aula 3. Economia e crises econômicas numa perspectiva Reformada

LIÇÃO 13 UM CHAMADO PARA EVANGELIZAR. Prof. Lucas Neto

Paróquia missionária comunidades de comunidades. Animada pela Palavra de Deus

Coleção Chamados à Vida Chamados À Vida, Chamados À Vida Em Jesus Cristo,

Dia Mundial das Missões - Coleta Nacional - 21 e 22 de outubro

ORGANIZAÇÃO E DO NAZARENO. JUNTA DE CREDENCIAIS MINISTERIAIS Novembro de 2016

Deus não nos chamou para a impureza, e sim para a santificação. (1Tessalonicenses 4:7). Verso para memorizar

AGRUPAMENTO de ESCOLAS de SANTIAGO do CACÉM Ano Letivo 2015/2016 PLANIFICAÇÃO ANUAL

dirige e enriquece com todos os seus frutos: a IGREJA

EDITAL DE CONVOCAÇÃO Exame para ingresso na Ordem Presbiteral

40 Dias de Propósitos. Detalhes de Funcionamento da Campanha Escola Bíblica 04/03/2007 Vlademir Hernandes

RESPOSTA AOS ESCRITOS DE DEIRDRE BROWER LATZ E RUBÉN FERNÁNDEZ Min-Gyoo Shin Senior Pastor, Sangamdong Church, Seoul, KOREA.

É Maria quem nos convida a refletir e guardar no coração a

"A igreja que eu quero é "

Um Reino de Sacerdotes

Ampliando nossa visão acerca do seguir a Cristo

IGREJA METODISTA DE VILA ISABEL

Ser testemunha de Jesus em fraternidade

CATECISMO do Século XXI

UMA HONRA, POIS FUI EDUCADO NA FÉ CATÓLICA, UMA FÉ QUE SE MANTÉM FORTE ATÉ HOJE EM MINHA FAMÍLIA.

A AUTORIDADE E O EVANGELHO DE PAULO

POR QUAIS MOTIVOS BÍBLICOS O ESCRITOR SAGRADO NOS EXORTA A NÃO ABANDONARMOS A ADORAÇÃO? NOSSA CONGREGAÇÃO?

Os bispos, como pastores e guias espirituais das comunidades a nós encomendadas, somos chamados a fazer da Igreja uma casa e escola de comunhão.

Conferência Doutrinária, Pastoral e Teológica 20º Concílio Geral. Palavra do Bispo Adonias Pereira do Lago Presidente do Colégio Episcopal

Curso Liderança Bíblica. Tesouro em vasos de barro (2Co 4.7)

A 2 3:18 PNEUMATOLOGIA

AULA 1. O CRISTÃO E SUA MENTE. Objetivo: Demonstrar ao aluno a necessidade de uma mente transformada para se crescer espiritualmente.

Apresentação. Estudos bíblicos doutrinários - formato 16x23.pmd 3

O Reino de Deus. Estudo Bíblico e Sistemático

Ensino de Doutrinas. São as verdades fundamentais da Bíblia apresentadas de forma sistemática. Crenças bem definidas produzem convicções bem definidas

Plano de Pastoral da Arquidiocese de São Salvador da Bahia

03 - AJA COM JUSTIÇA Sendo zeloso com boas obras para exaltar a Jesus

Capítulo XXV da Confissão de Fé de Westminster DA IGREJA

Deus Pai, criastes-nos à Vossa imagem e semelhança e chamais-nos, desde toda a eternidade, a participar da Vossa bondade! Fazei-nos viver, todos os di

A CARTA DE IDENTIDADE CARISMÁTICA DA FAMÍLIA SALESIANA DE DOM BOSCO

Dom Espiritual. Capacitaçãodivina distribuída livremente pelo. comumdo corpo de Cristo, e ainda o progresso pessoal

A dieta bíblica. Pedro replicou: De modo nenhum, Senhor! Porque jamais comi coisa alguma comum e imunda. (At 10:14)

1 Pedro 4-10 DOIS GRANDES PRIVILÉGIOS. EBD Miguel Horvath

Nova Estrutura do Curso: Avisos

DECLARAÇÃO DE FÉ das Assembleias de Deus. Igreja Evangélica Assembleia de Deus - Campinas SP

- A principal tarefa da Igreja é a evangelização, ou seja, a pregação do Evangelho a judeus e a gentios.

Aula 09. [Parêntese 3] Usos atuais da dança pela igreja

CREMOS NA NECESSIDADE DO NOVO NASCIMENTO CURSO DE FORMAÇÃO DE LÍDERANÇA IGREJA EVANGÉLICA ASSEMBLEIA DE DEUS EM MOSSORÓ

A EXPERIÊNCIA DA UNIDADE NA IGREJA PRIMITIVA

SUMÁRIO Parte I O Metodismo: origem e desenvolvimento 1. O Metodismo em Oxford O Metodismo na Geórgia O Metodismo em Londres

CURSO FORMANDO DIÁCONO

Título: QUE DENOMINAÇÃO É ESTA? Literaturas em formato digital:

O Evangelismo é a força que move a Igreja! O Discipulado, Consolida. Pág. 1

A NECESSIDADE DE ORAÇÃO DA IGREJA

DECLARAÇÃO DE FÉ das Assembleias de Deus. Igreja Evangélica Assembleia de Deus - Campinas SP

Encontros com pais e padrinhos

HAMARTIOLOGIA: DOUTRINA DO PECADO

ASSEMBLEIA GERAL DOS BISPOS

IGREJA CONSISTENTE Na Adoração Nos Grupos de Conexão Na Contribuição No Serviço Na Missão. 20.

DECLARAÇÃO DE FÉ das Assembleias de Deus. Igreja Evangélica Assembleia de Deus - Campinas SP

Prova: Ministérios Pastorais SBC 104

GRADE CURRICULAR. Nós somos parceiros do Centro de Treinamento Bíblico para Pastores e Líderes EUA (Bible Training Centre for Pastors USA).

CALVINISMO E POLÍTICA O governo como providência divina. AULA 3 A visão bíblica calvinista na política e no governo Pb José Cordeiro

Transcrição:

Espiritualidade comprometida Engaged spirituality Espiritualidad comprometida Rui de Souza Josgrilberg RESUMO Em preparação. Palavras-chave: Em preparação.. ABSTRACT In preparation. Keywords: In preparation. RESUMEN En preparación. Palabras clave: En preparación. Revista Caminhando, v. 4, n. 1 [6], p. 33-37, 2010 [2ª ed. on-line; 1ª ed. 1993] 33

[Na paginação original 50/51] As doutrinas não podem ser pensadas, num sentido wesleyano e bíblico, separadas de uma espiritualidade comprometida e da prática que elas implicam. Isso Wesley o demonstra em sua própria vida. Podemos dizer que ele teve sabedoria no sentido bíblico da palavra, e que, por isso mesmo, foi um guia espiritual autêntico para o seu tempo. Fato reconhecido não só pelos metodistas. Wesley configurou uma espiritualidade concreta e bem delineada. Sabia entender a situação, compreender as pessoas e o povo e construiu princípios equilibrados para a vida cristã sadia e, quando necessário, era muito claro em oferecer conselhos práticos diretos. Recomendava o estudo sério, as obras de piedade e as o- bras de misericórdia. Às vezes, para confrontar o(a) cristão(ã) com a sua situação humana real, recomendava: visite os presos! Visite os pobres! Ele sabia que, além do serviço cristão bíblico ao próximo, o contato com o que sofre é uma experiência da real condição humana e de nossa dependência da Graça. Com um simples conselho prático mostrava a natureza social do cristianismo, a reciprocidade de vidas, para que a santidade pessoal pudesse ser desenvolvida sem cair no erro individualista. Recomendava a assiduidade aos meios de Graça, instituídos ou prudenciais. Os meios prudenciais, para Wesley, [Na paginação original 51/52] constituíram-se numa marca metodista. Criou condições para a organização e liderança de grupos (sociedades, classes, bands e outros) e sabia acompanhar e o- rientar os líderes, evitando desequilíbrios seja em práticas, seja em doutrinas. Descobriu os ministérios necessários para a missão e o serviço cristão em seu tempo. Poucos reformadores entenderam a amplitude e desenvolveram na prática o princípio do sacerdócio universal de todos os crentes, como Wesley fez. Desenvolveu a pregação leiga (sempre de forma criteriosa) masculina e feminina (na época, uma audácia que nem mesmo Charles, seu irmão, o perdoou); desenvolveu ministérios junto aos pobres e desempregados: ministérios de educação popular com uma vasta literatura, de saúde popular (publicou livros de medicina popular, um dos quais teve vinte e oito edições durante a sua vida), de assistência aos necessitados e órfãos; incentivou a Escola Dominical e inúmeras outras formas de serviço e de convivência cristã. Tudo dentro de um princípio de conexidade de serviços. Wesley foi um gênio daquilo que ele mesmo chamou de meios prudenciais da Graça, que correspondem um pouco ao que nós chamamos, hoje, uma Igreja de dons e ministérios. Wesley foi incansável em recomendar os atos de piedade: orar, ler e estudar as escrituras, jejuar, orar em público (hoje diríamos atos devocionais em grupos a- bertos), freqüentar a Igreja. Recomendava a Ceia do Senhor pelo menos uma vez por semana. Desenvolveu um alto sentido do valor dos sacramentos na vida. Os atos de misericórdia não podiam ser isolados dos atos de piedade e os atos de piedade deviam expressar-se na prática em atos de misericórdia (atender ao necessitado, estar ao lado do marginalizado e oprimido, cumprir praticamente as or- 34 Rui de Souza JOSGRILBERG. Uma espiritualidade comprometida.

denanças bíblicas de misericórdia, como, por exemplo, em Mt 25). A visão de John Wesley incluía um dinamismo e um equilíbrio entre partes distintas da missão e da vida cristã: faça isso, mas não deixe de fazer aquilo. Assim se explicam as suas expressões típicas: santidade interior e exterior, santidade de coração e santidade de vida, vida cristã pessoal e reciprocidade cristã comunitária, santidade pessoal e santidade social. Wesley via nesse equilíbrio um remédio para os desvios mais comuns [Na paginação original 52/53] do o individualismo na vida e no testemunho, ou o quietismo, o fanatismo, o antinomianismo e o conformismo, ou ainda a fé sem obras e a vida sem frutos. A época em que surgiu o metodismo é reconhecidamente uma época de crise e de abandono do povo. Foram importantes, nesse contexto, a organização, a disciplina, o senso de testemunho comum, a solidariedade e a reciprocidade no desenvolvimento pessoal da vida cristã. A Igreja Anglicana não estava atendendo a necessidade de vida do povo. O metodismo soube oferecer, de forma sistemática, organizada e com boa liderança, condições para uma nova configuração da espiritualidade. Sobre a disciplina Wesley foi um verdadeiro líder. Não só a exigia em nível pessoal e comunitário, mas também no testemunho solidário com o corpo cristão formado pelas sociedades e a Igreja. Jamais cedeu aos oportunismos ou às novidades sem consistência com o cristianismo histórico. Foi ousado em preparar os/as obreiros/as, leigos/as para as mais diferentes tarefas, de tal sorte que quase todos os segmentos da população pudessem ser atingidos. Muito do contingente metodista vinha das minas, dos portos, das fábricas, das corporações artesãs e mesmo das universidades, das indústrias, do comércio etc. A visão dessa espiritualidade implicava que um não pode subsistir sem o apoio do outro, um não pode subsistir sem o respeito do outro, todos devem crescer dentro de um princípio de equilíbrio e de disciplina comum. Esse senso de direção foi importante para aglutinar e não dividir. Em alguns casos, Wesley demonstrou-se habilitado para a discussão com grandes opositores. Sua apologética era bem fundamentada biblicamente e, embora firme, mantinha sempre um clima de estima e respeito pelos seus opositores. Foi obrigado a polemizar com os que queriam uma mística quietista e não social (como os morávios), contra os que reduziam a participação humana a zero e proclamavam uma Graça absoluta e constrangedora (como alguns calvinistas e dissidentes), ou contra os que desenvolveram práticas fanáticas ou reduziam o cristianismo a manifestações extraordinárias (como os excessos entusiastas), ou, ainda, contra os que não tinham uma visão de progresso na vida cristã, ou negavam a santificação de coração [Na paginação original 53/54] e de vida como um processo (como os luteranos), ou os que criam na operação salvadora dos meios de Graça por si mesmos (como os católicos). O senso de direção do povo metodista permitiu um progresso do todo em um sentido de pro- Revista Caminhando, v. 4, n. 1 [6], p. 33-37, 2010 [2ª ed. on-line; 1ª ed. 1993] 35

gresso pessoal, que mantinha o equilíbrio e a eficiência de um corpo. A intenção dessa espiritualidade se caracterizava por uma consciência de mensagem e de missão. Wesley não pretendeu nunca criar uma nova seita, para somar uma a tantas outras existentes. O objetivo que deu às Sociedades Metodistas foi Não formar uma nova seita, mas (not to form a new sect, but...) reformar a nação, especialmente a Igreja, e espalhar a santidade bíblica por toda a Terra. Os alvos da vida cristã plena ou da perfeição cristã nunca foram pensados por Wesley como algo supra-humano (basta ver as advertências contra as tentações do angelicalismo ). Wesley, como diretor espiritual, tentou aproximar o ideal cristão sinceramente engajado em progredir em direção ao homem pleno, à estatura de Cristo e ao desafio de ter a mente de Cristo. Nada de perfeição angelical. Mas expressar na vida a plena comunhão com Deus, um coração limpo, uma vida pura, um inconformismo total com o pecado, um senso de arrependimento e gratidão, de tal modo que uma inquebrantável ação da Graça tivesse livre curso até que nada nos possa separar do amor de Deus. Wesley assume, com respeito à santificação e à perfeição cristã, uma posição que se distancia dos reformadores e se aproxima do catolicismo (sem se identificar com ele): trata-se de um ideal real que pode ser buscado e atingido pelo cristão, esse cooperando com os movimentos da própria graça divina, mediante o Espírito Santo. Nunca Wesley pretendeu que ele mesmo tivesse atingido a perfeição. As Regras Gerais (1) Evitar o mal. (2) Praticar o bem. (3) Usar os meios de Graça ou as ordenanças divinas são a- penas indicações práticas que mostram uma das dimensões da espiritualidade wesleyana. Wesley considerou as Regras Gerais como meios prudenciais e, portanto, variáveis e sujeitos a discussão em modificação. Era importante que todos aceitassem uma disciplina comum. No metodismo brasileiro as Regras Gerais [Na paginação original 54/55] são conhecidas, de modo geral, apenas em sua forma resumida, o que tira muito de seu conteúdo e real sentido. Necessitamos conhecê-las e discuti-las mais a fundo, para interpretá-las de forma mais adequada para nossa situação e nosso tempo. A visão da espiritualidade wesleyana abrange o ser humano total e a totalidade da vida. O material e o natural, o pessoal e o social, as condições concretas de vida como o dinheiro, a família, o trabalho, o estudo, a saúde são parte efetiva da espiritualidade. Há uma relação estrutural, indissociável entre o espírito humano e a ação do Espírito Santo, que envolve todas as esferas práticas e matérias da vida. Nenhum desses aspectos inclusive a criação como um todo escapou das observações e análises de Wesley, de tal modo que o bem estar físico e social fosse parte da saúde espiritual. Wesley compreendeu muito bem as conseqüências causadas pelo luxo, desequilíbrio e opressão social; pela escassez do alimento, exploração do trabalho e presença no mundo da forma de trabalho escravo, inadmissível para a consciência cristã e mesmo natural. 36 Rui de Souza JOSGRILBERG. Uma espiritualidade comprometida.

Os metodistas receberam de Wesley uma rica herança na qual sobressai um compromisso com a missão. O obreiro metodista não é uma força isolada. Ele existe num corpo. Por trás dele existe um movimento, uma sociedade e, hoje, uma Igreja que tem uma espiritualidade concreta e configurada com a qual todos são chamados a se comprometer. Num tempo em que se desfigura a solidariedade, a reciprocidade cristã, o testemunho comum e, a cada momento, surge uma novidade num verdadeiro processo de oferta e procura mercadológica de bens espirituais, nós somos desafiados ao bom senso de uma herança rica, estruturada, capaz de oferecer direção segura em meio a tantas formas ou práticas vazias de sentido e de conteúdo maior. Talvez possamos unir, novamente, o que há tanto tempo está desarticulado: o bom senso e a espiritualidade viva, ou, nos termos de Charles Wesley: Vamos unir estas duas coisas, há tanto tempo separadas, o conhecimento e a piedade vital. 4. Wesley ensinou a necessidade da disciplina pessoal e comunitária como parte de uma espiritualidade concreta. Como podemos entender essa disciplina em função de uma igreja missionária? [Na paginação original 56/57] [Na paginação original 55/56] Questões para reflexão 1. O que se pode entender por espiritualidade concretamente configurada? 2. Qual o papel dos meios de graça institucionais e prudenciais para a espiritualidade wesleyana? 3. Wesley desenvolveu na prática o que alguns dos reformadores pregaram na teoria: o sacerdócio universal de todos os crentes. Como ele fez isso? Revista Caminhando, v. 4, n. 1 [6], p. 33-37, 2010 [2ª ed. on-line; 1ª ed. 1993] 37