CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE CICLO V 5ª FEIRA MANHÃ BEN-HESED DOS SANTOS

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Transcrição:

CURSO DE FORMAÇÃO EM PSICANÁLISE CICLO V 5ª FEIRA MANHÃ BEN-HESED DOS SANTOS Educação do desejo ou desejo de educação? São Paulo 2017

SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO... 3 2. SOBRE O DESEJO DA PEDAGOGIA... 5 3. SOBRE O DESEJO NA PSICANÁLISE... 6 4. FREUD E A EDUCAÇÃO... 7 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS... 9 4. REFERÊNCIAS... 10

Educação do desejo ou desejo de educação? Ben-Hesed dos Santos 1. INTRODUÇÃO Educação e a Psicanálise percorrem um complexo caminho, entrelaçando seus saberes sobre o desenvolvimento do ser humano. Esse entrelaçar permitiu o levantamento de questões relacionadas ao funcionamento psíquico do ser humano, à relação de transferência aluno-professor, ao prazer em aprender (questão do desejo), à terapêutica da Educação, à linguagem etc. Assim, a Psicanálise - como corpo teórico - e a Educação - como discurso social - imbricaram-se em um processo de mudanças que afetou tanto uma quanto outra no que tange suas áreas de atuação (Ribeiro, 2006). Freud se preocupou com a educação como uma das três tarefas impossíveis, sendo as outras governar e psicanalisar. Kupfer (2005) sinaliza, porém, que impossível não quer dizer que não possa ser realizável e ressalta que Freud foi fundamental para a Educação, já que abriu caminho para a reflexão sobre o que é ensinar e o que é aprender. O trabalho da educação é algo sui generis: não deve ser confundido com a influência psicanalítica e não pode ser substituído por ela (...). A possibilidade de influência analítica repousa em precondições bastante definidas, que podem ser resumidas sob a expressão 'situação analítica'; ela exige o desenvolvimento de determinadas estruturas psíquicas e de uma atitude específica para com o analista. (Freud, 1925, p. 308) Para Freud, a educação carrega um ideal que a move; porém, acompanhada de algo que lhe impede de atingi-lo. Contudo, dizer que a educação é algo da ordem do impossível creio que seja uma arbitrariedade desnecessária, pois o conceito de civilização pressupõe um exercício educativo por parte dos seres. Creio que seja mais cuidadoso mencionar um

impossível em relação ao ideal que se quer atingir por meio da educação, o qual pressupõe um humano ideal perspectivado por métodos ideais de educação. A pedagogia buscaria fazer as pessoas atingirem uma condição onde todos os desejos pudessem confluir absolutamente. Em segundo lugar, e para tanto, presenciamos a formulação das teorias pedagógicas que idealizam um professor para efetivar tais ideais. (SILVA, 2007) Mesmo sem nos ter deixado escrito algum sobre a educação, podemos dizer que, em toda a obra de Freud, há uma preocupação constante com as questões desse campo, no sentido de que a psicanálise, nascendo de uma prática clínica, constrói um corpo teórico fundamentando uma nova concepção de mundo e de homem, como ser histórico, social e cultural, e tenta compreender como se dá inserção desse homem na cultura. Em diferentes artigos Totem e tabu (1912b), O futuro de uma ilusão (1927) e O mal-estar na civilização (1929), Freud expõe sua visão evolutiva tanto do indivíduo como da cultura, considerando o desenvolvimento do homem numa interação com o meio social. (PEDROZA, 2010) No texto de 1927, O futuro de uma ilusão, considerado como testamento pedagógico, a pressão que a sociedade exerce sobre o indivíduo desde sua infância, a partir da educação, faz com que a criança se conforme a uma realidade, que, é, de regra, a de dissimular sua investigação e seu conhecimento de tudo o que possa se relacionar à sexualidade. A finalidade da educação é a instauração do princípio de realidade, ou seja, é permitir ao indivíduo, submetido ao princípio do prazer, a passagem de pura satisfação das pulsões para um universo simbólico, que faz referência a uma lei, a lei da castração. A entrada no universo simbólico se dá pela linguagem. É pela mediação da palavra, à qual, desde sempre a criança encontra-se submetida, que é possível a simbolização das relações afetivas ARMANDO (1974, apud PEDROZA, 2010).

Outra importante contribuição da psicanálise para a educação é encontrada em autores que foram influenciados também pela releitura lacaniana da obra de Freud. MANNONI (1973 apud PEDROZA, 2010) observa que, na relação professor-aluno, é criada uma barreira entre o um professor que sabe tudo e um aluno que não sabe nada, que garante e contém um conjunto de proteções e resistências. A pedagogia funciona como um drama que repete muitas vezes situações da família. Na escola, o desejo de saber do aluno se confronta com o desejo do professor, que está ligado a um ideal pedagógico colocado por ele mesmo, desde o início, e que se interdita ao mesmo tempo em que se mostra ao aluno. ( PEDROZA, 2010) 2. SOBRE O DESEJO DA PEDAGOGIA Saviani irá responder que a educação tem por finalidade: Ordenar e sistematizar as relações homem-meio para criar as condições ótimas de desenvolvimento das novas gerações, cuja ação e participação permita a continuidade e a sobrevivência da cultura e, em última instância, do próprio homem (GONSALVES, 1971, apud SAVIANI, 1980, p. 51). Portanto, o sentido da educação, a sua finalidade, é o próprio homem, quer dizer, a sua promoção (SAVIANI, 1980, p. 51). Fonseca (1997) diz: É porque se vive um tempo em que o homem, a sociedade, a educação estão corrompidos como é o tempo de Sócrates que é preciso pensar refletidamente e antes de mais, que homem queremos ser, já que recusamos o que somos agora. A antropologia esclarecerá o ideal de homem, a educação se encarregará de o realizar ou, pelo menos, de se aproximar dessa imagem, dessa normatividade. Formar o ser humano para integrar os interesses e as demandas da sociedade em que vive, visando um aperfeiçoamento futuro do indivíduo e do grupo, assim respondendo a seguinte pergunta: que

homem a educação quer formar? Sempre lembrando no interesse em se preservar a cultura: a identidade do grupo. Para tanto, a pedagogia com pretensões científicas está para responder e solucionar questões atuais de um povo para assim melhor seguir com os projetos de humanidade. 3. SOBRE O DESEJO NA PSICANÁLISE No centro da terapia e da teoria psicanalítica encontramos o desejo escreve Lacan (1960). Esse desejo, alçado à categoria de referencial central da teoria psicanalítica, nada tem a ver com a concepção naturalista ou biológica de necessidade. A necessidade implica em satisfação; o desejo jamais é satisfeito, ele pode realizar-se em objetos, mas não se satisfaz com esses objetos. O desejo implica um desvio ou uma perversão da ordem natural, o que torna impossível sua compreensão a partir de uma redução à ordem biológica.(garcia-roza, 1996) A relação do desejo com o objeto é, na teoria psicanalítica, em tudo diferente daquela que caracteriza a relação da necessidade com o objeto numa teoria biológica. O objeto do desejo é uma falta e não algo que propiciará uma satisfação, ele é marcado por uma perversidade essencial que consiste no gozo do desejo enquanto desejo (Lacan 1958) A insatisfação do desejo decorre de uma insuficiência, de uma gaucherie que lhe seria própria, mas de uma eficiência. A estrutura do desejo implica essencialmente essa inacessibilidade do objeto e é precisamente isso que o torna indestrutível. O desejo se realiza nos objetos, mas o que os objetos assinalam é sempre uma falta. (GARCIA-ROZA, 1996)

O objeto do desejo não é uma coisa concreta que se oferece ao sujeito, ele não é da ordem das coisas, mas da ordem do simbólico. O desejo desliza por contiguidade numa série interminável na qual cada objeto funciona como significante para um significado que, ao ser atingido, transformar-se em novo significante e assim sucessivamente, numa procura que nunca terá fim porque o objeto último a ser encontrado é um objeto perdido para sempre. Toda satisfação obtida coloca imediatamente uma insatisfação que mantém o deslizamento constante do desejo nessa rede sem fim de significantes. (GARCIA-ROZA, 1996) Uma outra característica do desejo freudiano assinalada por Lacan é a de que ele escapa à síntese do Eu, O Eu não é uma realidade original, fonte substancial do desejo, mas algo que emerge a partir de um determinado momento como operador das resistências e somente podendo ser pensado por referência a um outro. O eu não pode ser pensado de forma unitária, nem tampouco pode ser identificado ao sujeito, ele é um termo verbal cujo uso é aprendido numa certa referência ao outro, escreve Lacan ( 1979ª,p.193). O Eu surge somente através da linguagem e por referência ao Tu; ele é caracterizado por um desconhecimento dos desejos do sujeito e não aquilo que se apresenta como fonte última dos desejos. (GARCIA-ROZA, 1996) 4. FREUD E A EDUCAÇÃO A posição de Freud, no ano de 1913, diante da educação comporta dois aspectos: inicialmente ele reconhece a educação como primordial para o estabelecimento da neurose, e ao mesmo tempo, confere, a ela, a possibilidade de mudar o panorama da situação diante do reconhecimento da importância da sexualidade no desenvolvimento infantil. Neste momento, ele considera que a educação pode se articular à psicanálise, lançando a educação

psicanaliticamente esclarecida, sendo esta uma educação que lê os fenômenos da sexualidade infantil e os conduz a fins adequados. É notável, que Freud fala em uma educação psicanaliticamente esclarecida, sugerindo um processo educativo que utiliza a psicanálise como ferramenta de compreensão dos fenômenos infantis, mas não aponta para uma aplicação dos preceitos teóricos na educação. (LIMA & LIMA, 2011) No ano seguinte, Freud é convidado novamente para escrever sobre educação, desta vez para a comemoração dos cinquenta anos da escola que frequentou quando criança. No texto, Algumas reflexões sobre a psicologia do escolar (1914/1976j), ele aborda a temática sob uma perspectiva completamente diferente de tudo que havia feito. O foco da análise passa da perspectiva da educação para a figura do educador, e de forma indireta ele ameniza os efeitos patológicos da educação, ao afirmar que a relação entre o professor e o aluno já é fundamentada a partir do laço entre a criança, os pais e os irmãos, antes mesmo dos seis anos, idade que as crianças costumavam ingressar na escola. (LIMA & LIMA, 2011) Alguns anos depois, Freud (1925/1976l) recebe outro convite para discorrer sobre questões relativas ao campo educacional. No Prefácio a juventude desorientada de Aichhorn, afirma que a psicanálise abandonou um pouco a preocupação com a neurose e voltou-se para as crianças, ao descobrir que a raiz da patologia está na infância. Afirma também que a criança continua a viver no adulto, no artista, entre outros. Assim, a psicanálise muda a atenção da perspectiva da infância para o infantil, os traços que habitam o inconsciente. Assegura também que a psicanálise não substitui a educação, mas encontra-se ao lado desta, quando se trata das três profissões impossíveis: educar, curar e governar. Fato que ele reafirma em Análise Terminável e Interminável (Freud, 1937/1976o). A grande contribuição que a psicanálise poderia dar à educação seria auxiliar na compreensão sobre a criança, mas nunca substituí-la. (LIMA & LIMA, 2011)

Para Freud, a educação carrega um ideal que a move; porém, acompanhada de algo que lhe impede de atingi-lo. Contudo, dizer que a educação é algo da ordem do impossível creio que seja uma arbitrariedade desnecessária, pois o conceito de civilização pressupõe um exercício educativo por parte dos seres. Creio que seja mais cuidadoso mencionar um impossível em relação ao ideal que se quer atingir por meio da educação, o qual pressupõe um humano ideal perspectivado por métodos ideais de educação. A pedagogia buscaria fazer as pessoas atingirem uma condição onde todos os desejos pudessem confluir absolutamente. Em segundo lugar, e para tanto, presenciamos a formulação das teorias pedagógicas que idealizam um professor para efetivar tais ideais. Portanto, não podemos dizer que educação não ocorre. O que está em jogo é o ideal que se faz impossível. Dessa forma, não podemos deixar de refletir sobre o livro de Catherine Millot, cujo título sugere não um mestre ou educação, impossíveis ou possíveis, mas um Freud antipedagogo, para falamos de uma pedagogia impossível enquanto agente discursivo com estreitos vínculos com o ideal de homem moderno. Por analogia, a pedagogia se compara a uma senhora que certa feita foi a Freud exigir-lhe conselhos psicanalíticos acerca da criação adequada de seu filho a fim de prevenir qualquer alteração psíquica, provavelmente em relação ao seu dever-ser. Freud respondeu-lhe que não se preocupasse; fizesse o que fizesse, o faria mal. (LIMA & LIMA, 2011) 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS Para a psicanálise, a educação deve procurar ser mais benéfica e menos traumática. Deve reprimir somente o necessário para o sujeito se defender, abrir mais espaço de escuta ao seu desejo e, assim estabelecer uma relação de transferência. Permitir que o sujeito siga

livremente o seu desejo de aprender, independente do desejo do seu professor ou do de quem esteja envolvida. Assim, o aprendizado será internalizado e reconhecido como uma parte de si. O desejo de aprender não é uma autonomia do sujeito, ou ele aparece por si mesmo ou não, mas quando o desejo surge é preciso permitir a autonomia ao sujeito para que ela busque satisfazer o desejo imanente. Aqui está um conceito de sublimação esclarecedor para os nossos propósitos de compreender a relação entre psicanálise e educação 4. REFERÊNCIAS FREUD, S. (1976l). Prefácio a Juventude desorientada, de Aichhorn. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud (Vol. 19). Rio de Janeiro: Imago. (Originalmente publicado em 1925). GARCIA-ROZA, L. A. Freud e o Inconsciente. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996. KUPFER, M. C. (2005). Freud e a educação o mestre do impossível. São Paulo: Scipione Editora. LIMA, M. S. A. & LIMA, M. C. P. Dos discursos freudianos sobre a educação: considerações acerca da inibição intelectual PEDROZA, Regina Lucia Sucupira. Psicanálise e educação: análise das práticas pedagógicas e formação do professor. Psicol. educ., São Paulo, n. 30, p. 81-96, jun. 2010. Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=s1414-69752010000100007&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 26 out. 2017. Ribeiro, M. V. M. (2006). A educação e a psicanálise: um encontro possível? Psicologia: Teoria e Prática. Brasília, 2,112-122. SILVA, R. I. da Psicanálise e educação: vias para subversão do sujeito. Inter-Ação: Rev. Fac. Educ. UFG, 32 (1): 127-157, jan./jun. 2007 SAVIANI, D. Educação: do senso comum à consciência filosófica. São Paulo: Cortez, 1980.