FIM DO MUNDO UM CRUZEIRO NO



Documentos relacionados
Exploradores da Patagônia

Setembro Abril português

A Rota de Darwin saindo de Punta Arenas

A Rota de Charles Darwin 3 e 4 noites M/N Stella Australis

Em horário oportuno traslado ao aeroporto para embarque em vôo com destino a Ushuaia (Tierra del Fuego). Chegada, recepção e traslado ao hotel.

paraíso Novo rumo no Inspiração one experience Relatos de quem tem história

Os aparelhos de GPS (Sistema de Posicionamento Global) se tornaram

Visite nossa biblioteca! Centenas de obras grátis a um clique!

Cruzeiros de Expedição

Distrito 4570 RELATÓRIO DE INTERCAMBISTA BRASILEIRO NO EXTERIOR (Outbound)

EXPANSÃO MARÍTIMA ESPANHOLA PORTUGAL ESPANHA POR QUÊ A ESPANHA DEMOROU PARA INICIAR A EXPANSÃO MARÍTIMA?

A HORA PELO MUNDO. Inicial

AS VIAGENS ESPETACULARES DE PAULO

EXPEDIÇÃO IMPÉRIO INCA 2015

o espírito dos andes

Graduados, empreendedores lançaram-se estrada fora

5 dicas para surpreender os convidados

18/11/2005. Discurso do Presidente da República

ATIVIDADE DE ESTUDOS SOCIAIS 3ª S SÉRIES A-B-C-D

Um planeta. chamado Albinum

você e eu surge a indecisão. Cada lugar e, se combinar com o estilo do carada lua de mel. Esse momento ser uma experiência inesquecível.

Terra à vista! Nesta aula, utilizaremos os mapas para situar

As Grandes navegações: a conquista da América e do Brasil. Descobrimento ou Conquista?

Para onde vou Senhor?

Os dois foram entrando e ROSE foi contando mais um pouco da história e EDUARDO anotando tudo no caderno.

Insígnia Mundial do Meio Ambiente IMMA

Água, fonte de vida. Aula 1 Água para todos. Rio 2016 Versão 1.0

BRASIL: UM PAÍS DE MUITAS ESPÉCIES

LUNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAIBA PRO - REITORIA DE GRADUAÇÃO ASSESSORIA PARA ASSUNTOS INTERNACIONAIS

Reveillon na Amazônia - Arquipélago de Anavilhanas 6 dias 27 de Dezembro de 2015 a 01 de Janeiro de 2016

DATAS COMEMORATIVAS. CHEGADA DOS PORTUGUESES AO BRASIL 22 de abril

Material: Uma copia do fundo para escrever a cartinha pra mamãe (quebragelo) Uma copia do cartão para cada criança.

Presidência da República Casa Civil Secretaria de Administração Diretoria de Gestão de Pessoas Coordenação Geral de Documentação e Informação

1. Você já havia assistido a um espetáculo de circo? Sim 25 Não 26

R010 NAT Patagônia Argentina

Atividade: Leitura e interpretação de texto. Português- 8º ano professora: Silvia Zanutto

COMO PARTICIPAR EM UMA RODADA DE NEGÓCIOS: Sugestões para as comunidades e associações

Traçando os caminhos

f r a n c i s c o d e Viver com atenção c a m i n h o Herança espiritual da Congregação das Irmãs Franciscanas de Oirschot

Missão Arronches 2012 Artigo Cluny

Reveillon na Amazônia - Arquipélago de Anavilhanas 6 dias 27 de Dezembro de 2015 a 01 de Janeiro de 2016

mundo JÁ PENSOU EM CONHECER O PLANETA A PÉ? Para Andando pelo Inspiração horizontes

Reveillon - Alter do Chão - 6 dias 27 de Dezembro de 2015 a 01 de Janeiro de 2016

CADERNO DE ATIVIDADES. História

O MENINO QUE PEDALAVA

IATE TAMARIND 7 DIAS E 6 NOITES

O céu. Aquela semana tinha sido uma trabalheira!

Mostrei minha obra-prima à gente grande, perguntando se meu desenho lhes dava medo.

Refugiados na Europa: a crise em mapas e gráficos

9ª Edição Fundo SER Social R$ ,00 Portobello Shop viajar sozinho, acompanhado ou em família

Para início de conversa 9. Família, a Cia. Ltda. 13. Urca, onde moro; Rio, onde vivo 35. Cardápio de lembranças 53

Sei... Entra, Fredo, vem tomar um copo de suco, comer um biscoito. E você também, Dinho, que está parado aí atrás do muro!

APRESENTAÇÃO. Sobre Fernando Pessoa

Meu nome é José Guilherme Monteiro Paixão. Nasci em Campos dos Goytacazes, Norte Fluminense, Estado do Rio de Janeiro, em 24 de agosto de 1957.

Receita de Viagem Com Bel Coelho

Proposta de actividades pré e pós congresso EA Lusófono

AÉREO 20/04 A 30/04/2016 PATAGÔNIA FANTÁSTICA ASSEPAN

Estudo de Caso. Cliente: Rafael Marques. Coach: Rodrigo Santiago. Duração do processo: 12 meses

Guia Prático para Encontrar o Seu.

O menino e o pássaro. Rosângela Trajano. Era uma vez um menino que criava um pássaro. Todos os dias ele colocava

A Ilha de St. Maarten

Bloco de Recuperação Paralela DISCIPLINA: Ciências

A DIVERSIDADE NA ESCOLA

Patagônia. Esse Roteirinho te leva para

Casa Templária, 9 de novembro de 2011.

Dizer que está cansado de Paris é dizer que está cansado de viver. Joanna Lemanska vel MissCoolpics & VuThéara Kham

Não é o outro que nos

Palavras do autor. Escrever para jovens é uma grande alegria e, por que não dizer, uma gostosa aventura.

Era uma vez, numa cidade muito distante, um plantador chamado Pedro. Ele

DA CONQUISTA A COLONIZAÇÃO DAS AMÉRICAS DA CONQUISTA A COLONIZAÇÃO DAS AMÉRICAS. -Atinge as Índias contornando a costa da África

Ernest Hemingway Colinas como elefantes brancos

Vamos fazer um mundo melhor?

PATAGÔNIA AUSTRAL. Ushuaia, El Calafate e El Chaltén DIA 1: BRASIL/USHUAIA 04/12 DIA 3: USHUAIA 06/12 DIA 2: USHUAIA 05/12 PROGRAMAÇÃO 10 DIAS

Sugestões de avaliação. Geografia 6 o ano Unidade 2

Relatório de Atividades do Trabalho Social Residencial Recanto dos Pássaros Limeira/SP

UNIDADE LETIVA 2 ANEXO 1

Segundo Relatório de Intercâmbio de Longa Duração

Semeadores de Esperança

Como a Copa do Mundo 2014 vai movimentar o Turismo Brasileiro

Cópia autorizada. II

Como a Copa do Mundo 2014 vai movimentar o Turismo Brasileiro

Meu olhar sobre o Peru

AÇÕES ESPECÍFICAS DO PROJETO CRUYFF COURT ERMELINO MATARAZO COM TEMA COPA DO MUNDO. 1. Copa do Mundo Cruyff Courts

Português Língua Estrangeira Teste (50 horas)

Aniversários. no CCB

P/1 Seu Ivo, eu queria que o senhor começasse falando seu nome completo, onde o senhor nasceu e a data do seu nascimento.

Colégio Senhora de Fátima

KIT CÉLULA PARA CRIANÇAS:

As fases da Lua. Depois do Sol, o astro que sempre despertou. Desenhe as fases da Lua que você conhece.

Celebre este natal e ano novo junto aos seus amigos e familiares distantes.

Prova bimestral 4 o ANO 2 o BIMESTRE

Dedico este livro a todas as MMM S* da minha vida. Eu ainda tenho a minha, e é a MMM. Amo-te Mãe!

MAS O QUE É A NATUREZA DO PLANETA TERRA?

O verdadeiro espírito de Natal!

Os encontros de Jesus. sede de Deus

Apoio: Patrocínio: Realização:

Sociedades agrárias africanas: um modelo de sucesso

COMO INVESTIR PARA GANHAR DINHEIRO

Como a Copa do Mundo vai movimentar o turismo brasileiro

5 Dicas Testadas para Você Produzir Mais na Era da Internet

Transcrição:

Da Baía Wulaia, uma impressionante visão das montanhas geladas da Patagônia. O navio aguarda a volta da expedição UM CRUZEIRO NO FIM DO MUNDO O capitão desliga os motores, o navio para. Minutos depois, os botes saem com os passageiros para o Cabo Horn, o ponto mais austral do planeta. Mais um capítulo desta aventura na Patagônia está começando TEXTO GERALDO SILVEIRA FOTOS RICAR DO ROLLO 32 Dezembro 2009 Dezembro 2009 33

112 vezes C abo Horn A primeira parte do cruzeiro, de quatro noites, de Punta Arenas a Ushuaia, na Argentina, levou apenas 54 passageiros, de 11 países. Rodrigo Fuentes, o chefe da expedição, minimizava a pequena ocupação o navio tem capacidade para 137 passageiros e procurava enfatizar o lado positivo. É um novo conceito de cruzeiro, que une aventura e cultura, e vem crescendo nos últimos dez anos. Já no segundo trecho, o número quase dobrou. Foram 92 passageiros, de 12 nações, que embarcaram em Ushuaia para fazer a rota inversa, um dia mais curta. Assim, a ocupação subiu para 70%, que tem sido a média dos últimos anos, de setembro a abril. Com dois cursos superiores de Turismo, experiência como guia de 1997 a 2005, nesse mesmo roteiro, Rodrigo é o responsável pela de tudo: cuida do embarque nos botes, de toda a segurança nas várias excursões, ministra palestras dentro e fora do navio, e é poliglota. No total, incluindo os guias, são 48 tripulantes. Esta foi a 112ª viagem do Via Australis, que fez sua estreia em janeiro de 2006. O público, majoritariamente europeu, é formado, em sua maioria por casais na faixa etária dos 45 aos 55 anos. São viajados, mas calouros nesse tipo de cruzeiro. Chegam informados sobre o roteiro, conhecem a história da região e também já leram sobre o Cabo Horn e outros pontos da viagem, conta Rodrigo. A LUZ DO SOL entrou tímida pela fresta da cortina. Aos poucos, a cabine foi se iluminando, tirando da cama o mais renitente dorminhoco. Antes das 6 e meia, todas as cortinas se abriram para um dia que se prenunciava especial. O Via Australis já estava parado, só no embalo do mar tranquilo, muito perto da Ilha Magdalena, onde se antes, em Punta Arenas, no Chile, e terminaria também ali. Com uma temperatura de 3 graus, céu azul sem nuvens, os 92 excitados passageiros tomaram os botes Z odiac e foram conduzidos para a ilha, paraíso dos pinguins magalhânicos. Era o último contato com uma paisagem, uma fauna, demorar a sair da memória. As geladas Patagônia e Terra do Fogo, com suas centenas de canais e ilhas, que formam o ponto mais austral do globo e maiores navegadores, era o sonho da maioria dos passageiros. Para muitos, a viagem de uma vida. E motivos para buscar essa terra misteriosa não faltavam, principalmente para os europeus, que vêm literalmente exclusivas, de grandes espaços e silêncios, Mas podem aproveitar também para comemorar o aniversário de meio século de vida, como a espanhola Angeles Novás; os 25 anos de casamento, como os sulafricanos Colman e Greta, ou ainda conhecer a parte extrema do próprio país, como o jovem casal chileno L uís e Karina, que mora em Punta Arenas. Viajantes ávidos por novas experiências, cultos, bem informados, de várias partes São viajantes informados, todos ávidos por novas experiências O último dia, na Ilha Magdalena (acima ), foi perfeito. Ao lado, a Baía Ainsworth, com suas águas e plantas exclusivas e a preguiçosa colônia de elefantes-marinhos. Abaixo, passageiro admira as belas paisagens patagônicas do mundo, não deixaram, em momento algum, que o barco se transformasse numa Torre de Babel, dividida em guetos. Ao contrário, foi uma harmoniosa e divertida confusão de sotaques. As mesas para as refeições tinham formações multirraciais no início, até consolidando, o que provocava novos desenhos no restaurante. Duas amigas chinesas de Hong Kong, um casal francês de Antibes e outro sul-africano, que mora em Z urique, podiam ser encontrados num bate-papo alegre. De outro lado, espanhóis e chilenos trocavam experiências durante alguns dias, para depois se espalharem por outras mesas e iniciarem novas amizades. O inglês predominava, muitas vezes enferrujado, mas o esforço para se estabelecer uma conversação foi sempre admirável. 34 Dezembro 2009 Novembro Dezembro 2009 35

Agenda cheia º dia Saída de Punta Arenas 1 às 20 horas. º dia Pela manhã, 2 desembarque na Baía Ainsworth, com vista para o Glaciar Marinelli. Depois de conhecer a colônia dos preguiçosos elefantesmarinhos. À tarde, navegação em bote, por cerca de 45 minutos, visitando a ilhota Tucker, onde existem colônias de pinguins magalhânicos e de aves nativas. º dia À tarde, desembarque 3 próximo ao Glaciar Pia. Depois de uma breve caminhada por uma encosta rochosa, uma visão panorâmica da geleira, com direito a alguns espetaculares desmoronamentos. A partir das 18h, entrada na Avenida das Geleiras, no Canal de Beagle. º dia Às 7 horas, 4 desembarque na Ilha Horn, E o melhor: a cada dia, uma descoberta. Enquanto as cordilheiras nevadas acompanhavam ininterruptamente o Via Australis, oferecendo paz e beleza, as excursões em terra eram tratadas como eventos especiais, mesmo que consistissem numa simples navegação para observar uma pequena colônia de pinguins. Foi assim na ilhota Tucker. A ansiedade para ver de perto as graciosas aves era visível nos passageiros. Mas quem imaginava aquela imensidão de animais espremidos A Marcha das Pinguins, com certeza. Havia só 4 mil na ilha, espalhados por toda a área, em bandos que não passavam de 20. Mas o espetáculo estava garantido: eles corriam, brincavam na água, escalavam rapidamente o charme. Em compensação, a visita à Ilha Horn, onde está o cabo mais famoso do mundo, arrancou suspiros. No livro de visitas do farol, parada obrigatória do passeio, a francesinha Audre Martinic anotou: U m sonho realizado. Ela e outras dezenas de visitantes. E olhe que não há praticamente Na Patagônia, manda a natureza; nós nos adaptamos A Baía Ainsworth ( acima ), perto de glaciares e da cordilheira nevada, é um posto de observação privilegiado. Ao lado, os graciosos pinguins magalhânicos da Ilha Magdalena nada a se ver na ilha, a não ser o farol, a pequena capela e o Monumento ao Albatroz, uma escultura de menos de 20 anos, que homenageia os navegadores. Entretanto, a sensação de pisar no ponto mais extremo do Hemisfério S ul, cenário de tantos atos heroicos e tragédias, obriga história, a inesperada solidão diante de uma natureza única e opressiva atingem a todos. Mesmo aqueles que parecem mais preocupados com o melhor ângulo da foto. Na véspera da ida ao cabo, nem mesmo a tripulação garantia o sucesso da empreitada. Tudo iria depender das condições climáticas, totalmente ingovernáveis na região. Mas tudo deu muito certo. S em as terríveis ventanias que assolam a ilha, o capitão Oscar S heward pôde contornar o Cabo Horn pela terceira vez na história do Via Australis, para surpresa e encanto dos viajantes, que puderam admirá-lo bem de perto das amplas janelas do navio. O chefe da expedição, Rodrigo Fuentes, chileno de 38 anos que navega na região desde os 25, numa temporada anual de oito meses, tinha a explicação na ponta da língua: Na Patagônia, manda a natureza; nós nos adaptamos. da Península Antártica. À tarde, passeio na Baía Wulaia, local onde o capitão Robert Fitzroy e Charles Darwin tiveram contato com os índios yamanas, no século 19. º dia Desembarque pela 5 primeira etapa do cruzeiro. À noite, novo grupo embarca para o roteiro de volta, de três dias. Palestra sobre o Cabo Horn fecha o dia. º dia Visita ao Cabo Horn, 6 onde há apenas um posto da Marinha, um farol, uma pequena capela e o Monumento ao Albatroz, homenagem aos navegadores que escreveram a história da região. º dia Pela manhã, palestra 7 sobre o Estreito de Magalhães. Alacalufe e parada em frente ao imponente Glaciar Piloto, com sua estranha e hipnótica cor azul. º dia Às 7h, desembarque na 8 Ilha Magdalena, onde vive uma colônia de 170 mil pinguins, além de cormorões, gaivotas, skuas, carancas e caiquenes. Retorno ao barco e chegada a Punta Arenas às 11 horas. Fim da viagem. 36 Dezembro 2009 Dezembro 2009 37

A evolução na prática 1488 O português Bartolomeu Dias contorna o Cabo da Boa Esperança, que liga o Oceano Atlântico ao Índico Cristóvão Colombo 1492 descobre a América. Dois anos depois, Portugal e Espanha assinam o Tratado de Tordesilhas, que divide entre as duas potências as terras descobertas e a descobrir. 1520 O português Fernão de Magalhães, a serviço da Coroa espanhola, descobre a passagem que liga os oceanos A O estreito ganha seu nome. O navegador morre na sequência da viagem. O corsário inglês Francis 1578 Drake navega pela Patagônia e Terra do Fogo e se aproxima do Cabo Horn, que somente seria contornado em 1616 pelo holandês Jacob le Maire. O espanhol Pedro 1579 Sarmiento Gamboa comanda expedição ao Estreito de Magalhães, mapeia a região e, em 1583, funda a colônia Rei Don Felipe, com 300 homens. Obrigado a voltar à Espanha, deixa a vila sem comida. Quando regressa, todos estão mortos. Em 1587, Thomas Cavendish passa pela região, vê as ruínas e lhe dá novo nome: Porto da Fome. O capitão inglês Robert 1828 Fitzroy captura quatro nativos na Terra do Fogo e leva-os à Inglaterra para serem educados. Em 1831, já acompanhado do naturalista Charles Darwin, retorna e devolve os nativos à terra. Sua tentativa de civilizá-los fracassou. Termina a viagem de 1836 Darwin. Foram quase cinco anos de estudos e pesquisas na América do Sul que o levariam a publicar A Origem das Espécies, em que apresenta a famosa Teoria da Evolução, base da biologia moderna. A Avenida das Geleiras encheu os olhos. A cada dez minutos, um novo glaciar Os botes se aproximam do Glaciar Pia, o primeiro a ser visitado. No mar, blocos de gelo que se desprenderam da geleira. Mais tarde, alguns deles estariam abastecendo o bar do navio, tornando os drinques ainda mais especiais S e o Cabo Horn levou a momentos de meditação, os glaciares encheram o navio de exclamações. A festa foi completa, em todos os sentidos, quando o barco entrou na Avenida das Geleiras, no Canal de Beagle. A cada dez minutos, um novo glaciar se apresentava, com tamanhos e cores diferentes, gastronômico no navio. Com exceção do Romanche, o primeiro, os demais foram batizados com nomes de países, merecendo um acompanhamento típico. Quando passou o Alemanha, salsicha e cerveja para todos; no França, champanhe e queijos; no Itália (o maior de todos, com 1200 metros de altura), vinho e pizza, e no Holanda, batata e cerveja. Felizmente parou por aí, embora o visual tenha sido o mais espetacular de todo o cruzeiro. S em programas em terra, atividades culturais no barco. Documentários eram exibidos e os guias se revezavam em região. E sempre diante de um grande e interessado público. O Cabo Horn, o Estreito de Magalhães, os pinguins, as aves bem conduzidos pela tripulação. O carancho negro, predador nativo da Patagônia e um dos personagens da palestra sobre aves, deixou as senhoras preocupadas. Expulsos dos ninhos pelos pais quando jovens, eles se reúnem em gangues e saem aprontando. No ano passado, esses delinquentes juvenis simplesmente roubavam os chapéus das mulheres. Nesse cruzeiro, porém, nenhuma queixa de assalto foi registrada. 38 Dezembro 2009 Dezembro 2009 39

Bom humor a bordo Se os europeus representam 70% da ocupação do cruzeiro, isso se deve à presença espanhola. O advogado Jose Aliste, 56 anos, por exemplo, veio de Madri com a mulher, Maité. Advogado criminalista, Aliste já visitou mais de cem países, 47 deles exclusivamente para caçar, sua grande viagens. Gosto de caça grande, como rinocerontes, elefantes, ursos. Estou sempre no Alasca e na África, explica. E garante que não sente receio algum diante de tantos animais ferozes. Mais perigosos são meus clientes colombianos e russos, diverte-se. Já para o casal Meyer, da França, nada como os grandes espaços, a presença intensa da natureza. Claude, 82 anos, e Yvette, 78, passaram 25 dias na América do Sul, visitando Machu Picchu, o Lago Titicaca e o Deserto de Atacama, antes de chegar à Patagônia. Juntos há 54 anos, os dois médicos moram em Antibes, na Côte d Azur. O cruzeiro deixou-os encantados: O barco é pequeno, perfeito para um bom convívio. As excursões foram muito bem organizadas, elogia Yvette. Já Claude gostou de outro aspecto da viagem: Nunca tinha estado em um cruzeiro com open bar, diverte-se, com um copo de pisco sour na mão. Brasileiros são raros, mas aparecem. Neste, as representantes eram mulheres. A cardiologista Maria das Graças Cavalcanti Bandeira, 57 anos, de Natal, e a amiga Mércia Bezerra, 70 anos, esteticista, de Fortaleza, escolheram a viagem para a Patagônia como prêmio de consolação. Na verdade, tínhamos planejado ir à Austrália e à Nova Zelândia, mas a demora para obtenção do visto nos fez desistir, conta. O plano B dividiu as amigas: enquanto Maria das Graças queria ir para o Deserto de Atacama, Para não ter briga viajam juntas Ao lado, Claude e Yvette. Abaixo, Aliste e Maité e as brasileiras Maria das Graças e Mércia O navio é pequeno, perfeito para uma boa convivência O navio passou bem perto do Cabo Horn (abaixo coloridas Ushuaia e Punta Arenas ( ao lado ) são os portos de partida para paisagens incríveis, como as do Glaciar Piloto, e para ver a exclusiva vegetação patagônica na Baía Ainsworth ( abaixo, ao lado ) Quem não queria palestras, tinha outras opções. Nada agitadas, é claro, para desapontamento de alguns. Bingo, trívias, cursos expressos de nós de marinheiro e vinho chileno, na última noite, a rifa da bandeira e leilão da carta de navegação utilizada na viagem. Este último evento provocou momentos de suspense e emoção. No primeiro cruzeiro, o gigante sul-africano Colman venceu a disputa e levou a prenda por 140 dólares. No segundo, combate dólar a dólar, até que ofereceu imbatíveis US $ 170. Mas para muita gente a melhor atividade como rei pela dupla Eduardo e Emílio. Vamos do freezer para o grill, brinca. 40 Dezembro 2009 Dezembro 2009 41

Muita paz e tempo total para natureza. O fim do mundo estava em nós O frio não atrapalhou. Ao contrário. O sol predominou na maior parte da viagem, deixando o cenário mais espetacular. Assim, os passageiros puderam curtir à vontade a paisagem única da Patagônia não só pelos esplêndidos e variados drinques que preparavam, mas por espantar o frio, assim que terminavam os passeios nas geleiras. Os grupos eram recebidos antes do retorno ao navio com ofertas tentadoras e irrecusáveis: uísque, chocolate quente ou ambos? C laro que as pedras de gelo vinham dos glaciares e deixavam o uísque ainda mais especial. E elas abasteciam o bar durante toda a viagem. Eduardo de chileno, de 46 anos, que fez 92 dos 112 cruzeiros, diz que serve uma média de 150 drinques por dia, sem contar os não alcoólicos. Já o chileno Emilio Velásquez, 39 anos, foi o introdutor do calafate sour no navio. O drinque é na verdade um pisco sour, a caipirinha chilena, acrescido de uma porção de xarope de calafate, a planta emblemática da região. O certo é que o amplo salão no último concentrava a vida do cruzeiro. Ponto de encontro para conversas animadas e saídas para os passeios, palco das palestras e brincadeiras, virava também sala de leitura e posto de observação daquela paisagem intrigante e esplêndida na sua monotonia. S em internet, celular, TV e rádio algo impensável nos dias de hoje, mas que não se dedicar à natureza e à introspecção. LP O 42 Dezembro 2009