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Transcrição:

Universidade Federal Rural de Pernambuco 1 SISTEMAS RESTAURADORES Prof. Romildo Nogueira 1. Mecanismos de retroalimentação (feedback) Existem nos seres vivos sistemas (sistemas de controle), nos quais o valor de uma variável (variável de controle) controla o valor de uma outra variável (variável controlada). Os sistemas de controle podem ser agrupados em duas categorias: sistemas de laço aberto e sistemas de laço fechado. No primeiro caso, a variável controlada não atua sobre a variável de controle. Nos sistemas de laço fechado a variável controlada atua sobre a variável de controle. Um exemplo de laço aberto é a manutenção de um nível estacionário numa caixa de água devido ao fluxo vindo de uma outra. Observe que o balanço (taxa de entrada taxa de saída) é nulo, e portanto, alterações na entrada ou na saída ou em ambas podem alterar a manutenção desse estado estacionário. Um exemplo de laço fechado é considerar agora que a primeira caixa tenha um flutuador que atuando sobre uma válvula possa modificar o fluxo de entrada na segunda caixa de maneira a manter o nível desta estacionário. Um tipo de sistema de controle de laço fechado é constituído por um aparato denominado de circuito de retroalimentação ou de realimentação ou ainda de feedback. Um exemplo de um sistema de feedback é aquele utilizado para fixar a voltagem através das membranas celulares (voltage - clamp). Em linhas gerais, a técnica do voltage - clamp consiste no uso de um circuito eletrônico que através de um sistema de retroalimentação (feedback) negativa mantém a voltagem da célula constante. Este circuito de retroalimentação negativa é constituído por dois eletrodos empalados na célula e conectados a amplificadores operacionais configurados de maneira a produzir a fixação de voltagem. Um desses eletrodos, usado para medir a voltagem através da membrana, é conectado a um amplificador operacional configurado como um seguidor de voltagem. A saída desse amplificador é conectada a outro amplificador, denominado de amplificador de clamp. O outro terminal do amplificador de clamp recebe um pulso de voltagem, comandado eletronicamente. Quando o valor do potencial de membrana é diferente daquele do comando de voltagem, uma corrente é produzida na saída do amplificador de clamp e fluirá através do microeletrodo de corrente que se encontra empalado na célula. Estas ações manterão constante a voltagem transmembrana. Os circuitos de retroalimentação podem produzir retroalimentação negativa ou positiva. Se diz que um circuito é de retroalimentação negativa se ao produzir-se uma modificação na variável controlada, o sistema provoca nesta uma variação em sentido contrário. No exemplo do voltage-clamp, quando o potencial da membrana é maior do que o do controle o sistema envia uma corrente através da membrana de maneira a compensar este aumento na voltagem e vice-versa. Um sistema tem retroalimentação

2 positiva se em resposta a uma variação no valor da variável controlada, o sistema produz, nesta variável, uma variação no mesmo sentido. Por exemplo, uma diminuição na temperatura corporal produz um decréscimo da taxa metabólica que, por sua vez, tende a reduzir ainda mais a temperatura corporal, fechando-se, assim o circuito de retroalimentação positiva. Um circuito de retroalimentação pode ser representado, no esquema abaixo. Neste diagrama pode-se observar que o circuito é integrado por uma variável controlada y, um controlador C, que compara sua magnitude com o valor de referência R e modifica adequadamente a variável x, chamada variável manipulada. Esta atua sobre um efetor E que recebe o sinal e determina o valor da variável y em função de x. Os circuitos de retroalimentação podem apresentar respostas do tipo tudo ou nada ou contínua. No caso da resposta tudo ou nada, o controlador só tem duas respostas possíveis : uma se a variável controlada não alcança o valor de referência e outra se o alcança ou o ultrapassa. Nos sistemas de resposta contínua, o sinal de saída do controlador é uma função contínua e que age como um seguidor da variável controlada. Assim, qualquer alteração da variável controlada pode ser compensada pontualmente pela resposta contínua do controlador. Um exemplo de um sistema de retroalimentação com resposta tudo ou nada é um aparelho de ar condicionado controlado por um termostato, pois o mesmo só dispara o equipamento no momento que a temperatura atingir um determinado valor. Como exemplo de retroalimentação com resposta contínua pode-se citar os vários sistemas que controlam a freqüência cardíaca. Nos organismos os circuitos de realimentação são muito complexos. Por exemplo, no sistema locomotor a posição de cada parte do corpo, a força, a velocidade do movimento, etc. estão controladas por uma infinidade de circuitos de retroalimentação no sistema nervoso e que, podem agir sobre essas variáveis controladas. No reflexo miotáctico, aquele no qual o quadríceps se opõe a flexão do joelho, a variável controlada y é o comprimento das fibras musculares do quadríceps os quais se alongam com a flexão do joelho. O comprimento das fibras é controlado pelos fusos neuromusculares. Estas estruturas são constituídas por fibras musculares modificadas (fibras intrafusais), as quais, ao alongar-se em paralelo com as demais fibras do músculo, enviam impulsos nervosos por vias aferentes que entram na medula espinal. O sinal de retroalimentação é constituído pelo sinal nervoso que viaja por estas vias e fazem sinapses na medula com os motoneurônios. A atividade desses neurônios que inervam as fibras musculares e cuja excitação provoca a contração do músculo, é a variável manipulada. Do exposto surge que qualquer alongamento dos quadríceps provocaria sua contração de maneira que, se unicamente este fenômeno ocorresse, uma pessoa não poderia flexionar o joelho. No entanto, isto não

3 ocorre porque as fibras eferentes provenientes dos motoneurônios podem regular a sensibilidade do fuso. Os motoneurônios e recebem mensagens de diferentes centros nervosos superiores por diversas vias eferentes da medula. Um outro exemplo de mecanismo de feedback é o controle das gonadotropinas pelo hipotálamo. Tomando-se o caso do macho, a testosterona é o sinal primário que fala ao hipotálamo acerca do status dos testículos. O nível elevado de testosterona inibe a secreção GnRH pelo hipotálamo e também reduz a resposta da pituitária ao GnRH e como conseqüência reduz os níveis de LH nos testículos e a produção da própria testosterona. Num nível baixo de testosterona ocorre o inverso. Este sistema constitui um feedback negativo. 2. Sistemas tampões Na secção anterior tratou-se do controle de algumas variáveis no organismo (níveis hormonais, respostas motoras etc.) através do mecanismo da retroalimentação e agora será analisada uma outra estratégia desenvolvida pelos organismos visando à regulação de outras variáveis (o ph, pco 2 ) que são os sistemas tampões. Tampões são soluções capazes de impedir acentuadas variações de ph num sistema aquoso. Um sistema eficiente na manutenção do ph de uma solução aos ataques de substâncias ácidas ou alcalinas é obtido através da combinação de um ácido fraco e seu sal forte (ou uma base fraca e seu sal forte). A solução de ácido acético (CH 3 COOH) e acetato de sódio (CH 3 COONa) age como um tampão, porque o ácido acético, sendo fraco, dissocia pouco, porém o acetato de sódio é totalmente dissociado. Quando um ácido forte como o ácido clorídrico (HCl) é colocado nesta solução tampão, o ácido se dissocia em H + e Cl - e os íons hidrogênio reagem com os íons acetatos e forma o CH 3 COOH que é um ácido fraco, enquanto os íons cloreto reagem com os íons sódio e forma o sal cloreto de sódio. No processo o ácido forte (HCl) é transformado num ácido fraco (CH 3 COOH) de maneira que a variação do ph da solução é mínima. Durante a titulação de um ácido com hidróxido de sódio observamos que o gráfico do ph contra equivalentes de OH - adicionados, denominado de curva de titulação, apresenta um valor de ph correspondente ao ponto médio da curva de titulação que é numericamente igual ao pk do ácido titulado e as concentrações das espécies doadoras (H A) e receptoras (A - ) de prótons, são equimolares neste ponto. Na equação de Henderson-Hasselbalch descrita abaixo se pode observar que o pk pode ser calculado em qualquer ponto da curva de titulação a partir do ph e desde que se conheça as concentrações de ácido e base neste ponto. A equação de Henderson-Hasselbalch pode ser escrita como segue: PH = pk + log ([A - ] / [H A]).

4 É interessante observar na equação de Henderson-Hasselbalch que no ponto médio da curva de titulação o ph é obrigatoriamente igual ao pk uma vez que a [A - ] = [H A]. As curvas de titulação de cada ácido apresentam uma região achatada em torno do seu ponto médio. Nessa zona o ph do sistema muda relativamente pouco quando incrementos de H + ou OH - são adicionados. Essa é a região na qual o par ácido-básico conjugado age como um tampão, ou seja, um sistema que tende a opor-se à mudança no ph quando se adiciona H + ou OH -. A capacidade tamponante é máxima exatamente no ponto médio da curva de titulação, onde o ph = pk. A capacidade tamponante se reduz à medida que o ph se afasta do ponto médio. A manutenção do ph em torno de 7 tanto no sangue como nas várias células que constituem os tecidos dos diferentes órgãos é conseguida através de estratégias desenvolvidas pelo organismo no sentido de não permitir variações do ph mesmo quando ele é agredido por substâncias ácidas ou alcalinas. Vários mecanismos são utilizados pelo organismo com o objetivo de regular o equilíbrio ácido-básico, entre os principais encontram-se: o sistema HCO 3 - CO 2, que é o mais importante sistema-tampão do organismo, é responsável por cerca de 75% da capacidade tamponante do plasma sanguíneo e por 30 % da capacidade tamponante dos glóbulos vermelhos; a hemoglobina que é responsável por 60 % da capacidade tamponante dos glóbulos vermelhos; os pulmões, que mantendo o nível de CO 2 do meio interno, tem importante papel na regulação do tampão bicarbonato- CO 2. Um outro importante órgão na regulação do equilíbrio ácido-básico são os rins, capazes de eliminar a sobrecarga de ácidos fixos do organismo através da ação do epitélio tubular renal. São vários os mecanismos que levam a eliminação de anions de ácidos fixos com a recuperação para o organismo de tampões e cátions importantes para manutenção da concentração hidrogeniônica e volume do meio interno. Entre os mais importantes podese citar: a reabsorção de bicarbonato, a formação de acidez titulável e a excreção de amônia. O sistema HCO - 3 CO 2 O CO 2 sendo o produto final do metabolismo celular, está presente em concentrações significantes em todas as células. Por esta razão o estudo da hidratação do CO 2 a ácido carbônico e por conseqüência a íons hidrogênio e bicarbonato é fundamental para compreensão do seu papel tamponante tanto no plasma sanguíneo, como nos glóbulos vermelhos e nas diferentes células do organismo. A reação de hidratação de CO 2 é a seguinte: K 1 CO 2 + H 2 O H 2 CO 3 H + + HCO 3 -. K - 1

5 Nesta reação os passos limitantes da seqüência são: a reação de hidratação do CO 2 e de desidratação do ácido carbônico. A dissociação do ácido carbônico é instantânea dentro da precisão de ocorrência do fenômeno. A descrição das características cinéticas de hidratação do CO 2 e desidratação do ácido carbônico, tem sido estudada in vitro, e fornecido meios para compreender-se o funcionamento desse sistema-tampão. A análise da cinética da reação, nos informa que a velocidade de formação de H 2 CO 3 a partir da hidratação do CO 2 (tendo em vista que a reação segue uma cinética de 1 a ordem) é dada por: - d[co 2 ] / dt = K 1 [CO 2 ] A velocidade de hidratação do ácido carbônico é dada pela seguinte expressão: - d[h 2 CO 3 ] /dt = K - 1 [H 2 CO 3 ] Com os valores de K 1 e K 1 obtidos através da análise da cinética da reação de 1 a ordem, como sendo 0.15 s -1 e 50 s -1, respectivamente, para uma temperatura de 37 o C é possível determinar a velocidade de hidratação do CO 2 como segue: - d[co 2 ] / dt = K 1. a.pco 2, onde a = 0.0301 é o coeficiente de solubilidade do CO 2 a 37 o C numa solução fisiológica e pco 2 é a pressão parcial do CO 2 a 37 o C no meio fisiológico, que é igual a 40 mmhg. Portanto, -d[co 2 ] / dt = 0,18 mm l -1 s -1, ou seja, em cada litro de solução haverá a formação de 0,18 mm de ácido carbônico por segundo nos tecidos e no sangue. Em condições de equilíbrio as velocidades de hidratação do CO 2 e de desidratação do ácido carbônico são iguais e a seguinte expressão pode ser escrita: [CO 2 ]/ [H 2 CO 3 ] = K 1 / K 1 = K eq, onde K eq é a constante de equilíbrio da reação. Desta maneira, como K 1 / K 1 [CO 2 ] será 330 vezes maior do que a concentração de [H 2 CO 3 ] na condição de equilíbrio. 330, a concentração de Uma característica da reação de hidratação do CO 2 e desidratação do ácido carbônico é que ela é catalisada pela enzima anidrase carbônica, que acelera as reações em cerca de 10.000 vezes, porém não altera a constante de equilíbrio K eq. A anidrase carbônica é inibida por drogas derivadas de sulfas, tais como a acetazolamida, benzolamida, metazolamida, diclorofenamida e etoxzolamida. Os tampões do sangue

6 Além do tampão bicarbonato o sangue apresenta tampões protéicos como a hemoglobina, devido aos grupos ácidos presentes na sua molécula- carboxila (-COOH), amino (-NH 2 ), amônio (-NH 3 ), guanidino (- NH-CNH-NH 2 ) e o grupo imidazol da histidina. Em dependência do ph do meio estes grupos podem funcionar como ânions ou cátions.em presença de ácidos os íons hidrogênio se combinam com os grupos COO - da hemoglobina, tamponando a concentração hidrogeniônica num valor abaixo daquele esperado na ausência da hemoglobina. Ao contrário em presença de uma base, os grupos NH 3 + cedem seus íons hidrogênio, os quais se combinam com as hidroxilas (OH - ) formando água, impedindo, desta forma, um aumento tão grande quanto esperado na ausência da hemoglobina. No entanto, a grande capacidade tamponante da hemoglobina se deve aos grupos imidazólicos, os quais são influenciados pelo estado do átomo de ferro contido em sua molécula. Desta forma, quando o grupo imidazol está oxidado torna-se mais ácido e portanto libera H + em solução e quando a oxihemoglobina é reduzida, modificações ocorrem na estrutura eletrônica dos átomos de ferro de maneira que o grupo imidazol e outros grupos tamponantes são influenciados por esta nova distribuição eletrônica e se tornam menos ácidos, e fixam íons hidrogênio. Esta propriedade da hemoglobina de reagir com o oxigênio para formar a oxihemoglobina, permite ao sangue arterial chegar aos tecidos com alta taxa de oxihemoglobina e baixa de dióxido de carbono devido às trocas gasosas ocorridas ao nível dos alvéolos. Nos tecidos a oxihemoglobina libera oxigênio e este libera CO 2 para o sangue. O CO 2 produzido pelos tecidos é transferido ao sangue dissolvido e ao chegar no plasma os seguintes eventos ocorrem: (1) a maior parte do CO 2 se difunde para os eritrócitos, onde vários mecanismos de tamponamento atuarão sobre eles; (2) uma pequena quantidade forma carbamino- CO 2 com as proteínas do plasma (R-NH 2 + CO 2 no plasma é hidratado (CO 2 + H 2 O R- NHCOO - + H + ); (3) o restante do CO 2 dissolvido H 2 CO 3 + + HCO 3 -. O dióxido de carbono que se difunde para dentro dos eritrócitos é transportado de três maneiras: (1) uma porção fica no eritrócito como dióxido de carbono dissolvido; (2) outra fração considerável de CO 2 se combina com a hemoglobina para formar carbamino- CO 2 ( a medida que a oxihemoglobina se desoxigena, ao transferir oxigênio para os tecidos, ela se torna capaz de combinar-se com quantidades crescentes de dióxido de carbono) e os hidrogênios liberados na formação destes compostos carbamino são tamponados dentro dos eritrócitos pela própria hemoglobina; (3) e a maior quantidade de CO 2 que entra nos eritrócitos é hidratada para formar ácido carbônico, que em seguida se ioniza formando íons hidrogênio e íons bicarbonato, os quais são removidos dos eritrócitos a medida que são formados, por intermédio da hemoglobina que tampona os íons hidrogênio e da difusão da maior parte do bicarbonato para o plasma. A hemoglobina antes de tamponar os íons hidrogênio tem um certo número de cargas negativas efetivas ao ph fisiológico. Estas cargas negativas são contrabalançadas pelas cargas positivas dos cátions que existem dentro dos eritrócitos, os quais são principalmente o sódio e o potássio. Contudo, com a

7 ionização do ácido carbônico os íons hidrogênio se combinam com a hemoglobina e a carga efetiva da hemoglobina se reduz. Os íons sódio e potássio que eram balanceados eletricamente contra os anions bicarbonatos formados na ionização do ácido carbônico, de maneira que a neutralidade elétrica é mantida. Contudo, como a concentração de bicarbonato dos eritrócitos ficou aumentada em relação ao plasma estes se difundem dos eritrócitos para o plasma. Uma vez que os íons bicarbonato estão carregados negativamente, a neutralidade elétrica dos eritrócitos e plasma será desfeita, a não ser que um número igual de íons positivos também se difundam dos eritrócitos para o plasma ou que íons negativos passem do plasma para os eritrócitos. Um trocador bicarbonato-cloreto realiza este trabalho de compensar a saída de bicarbonato para o plasma com a entrada de cloreto para os eritrócitos, pelo trabalho de um trocador bicarbonato-cloreto. Ao contrário do que ocorre nos tecidos, nos pulmões a hemoglobina oxigenar-se-á dissociando os íons H + nela ligados. Estes cátions ao reagirem com íons bicarbonato presente nos eritrócitos formarão o ácido carbônico que se desidratará num processo catalizado pela anidrase carbônica, formando CO 2 que se difundirá nos alvéolos. A redução da concentração de bicarbonato e a dissociação da hemoglobina modificarão novamente entre ânions fixos que podem difundir-se, de maneira que o bicarbonato entrará nos glóbulos a favor de seu gradiente de concentração e íons cloreto deixarão os glóbulos para manter a eletroneutralidade. Os pulmões e os rins e a regulação do equilíbrio ácido-básico Os pulmões através das trocas gasosas que ocorrem entre os alvéolos e o ar atmosférico regulam a concentração da pco 2 e po 2 no sangue arterial que se encontra em equilíbrio com o ar alveolar. Desta maneira, na hiperventilação pulmonar ocorre mistura do ar atmosférico com o ar alveolar, levando a redução da pressão parcial de CO 2 nos alvéolos, uma vez que o ar atmosférico tem baixa pco 2. Por conseguinte, a pco 2 no sangue arterial também se reduz e assim o ph sanguíneo se eleva, acarretando uma alcalose de origem respiratória. Por outro lado, a hipoventilação pulmonar acarretará uma elevação da pco 2 nos alvéolos e, portanto, no sangue arterial. A elevação da pco 2 causa uma redução do ph sanguíneo levando a uma acidose de origem respiratória. A ventilação pulmonar, por sua vez, é controlada por um sistema de feedback que identifica a pco 2 do sangue arterial, cujo aumento ou redução dessa pressão vai se refletir na concentração hidrogeniônica do líquido cerebrospinal que é pobremente tamponado. Desta maneira, se a concentração de íons hidrogênio se eleva os quimioreceptores respiratórios respondem estimulando o centro respiratório e ocasionando um aumento na ventilação alveolar e em caso contrário, reduzindo a ventilação. O metabolismo celular produz uma série de outros ácidos não voláteis (ácidos fixos), que não podem ser regulados pela ventilação pulmonar e neste caso o organismo utiliza o rim como regulador do equilíbrio

8 ácido-básico. Para isto, o rim lança mão de alguns mecanismos como a reabsorção de bicarbonato, a excreção da acidez titulável e a excreção de amônia. 3. A manutenção da homeostasia O termo homeostasia foi empregado pela primeira vez por Claude Bernard, em meados do século dezenove, para referir-se à constância relativa da composição do meio interno dos animais. Ao longo do tempo, o termo o conceito de homeostasia (como constância do meio interno), foi sendo modificado, basicamente, (a) porque em muitos casos a suposta constância do meio interno não existe, nem sequer de maneira aproximada como ocorre, por exemplo, com a concentração das gonadotropinas durante o ciclo menstrual e (b) também porque a constância do meio interno em algumas situações depende de uma infinidade de outras variáveis, como a pressão, a temperatura corporal, a posição do corpo, etc. Por este motivo, é mais adequado atualmente falar de homeostasia associando-a aos mecanismos de regulação e controle que contribuem a adequar os valores das variáveis as necessidades das circunstâncias, mantendo-as, em cada caso, dentro de limites que permitam a sobrevivência do indivíduo e da espécie. Os seres vivos não se encontram em equilíbrio com o seu meio ambiente, porém em estado estacionário. Esse estado se caracteriza por uma condição de equilíbrio aparente de uma parte do sistema, onde as variáveis de estado características (concentração, densidade, temperatura, volume, etc.), se mantêm inalteradas com o tempo às custas de outros processos. Assim, o nível da água num reservatório poderá não mudar com o tempo porque não entra nem sai água do mesmo (equilíbrio) ou porque a quantidade de água que sai é bombeada de volta (estado estacionário). As células mantêm seus gradientes eletroquímicos as custas de um processo dinâmico (estacionário), onde a degradação do gradiente eletroquímico de cada íon é compensada por transporte ativo desse íon (com consumo de ATP). Esse processo dinâmico que ocorre nos seres vivos é denominado de homeostasia. Algumas vezes são necessários sistemas sofisticados de regulação e controle, envolvendo retroalimentação e outros tipos de regulação, bastante complexos (como descritos nos tópicos 1 e 2), para a manutenção da homeostasia nos organismos. A vida se mantém devido a processos homeostásicos e não a processos envolvendo o equilíbrio das células e organismos com o meio ambiente. Equilíbrio celular (e dos organismos) significa morte da célula (se dos organismos). Viver é lutar contra a condição de equilíbrio.

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