A RELAÇÃO ENTRE CONSUMO DE LEITE DE VACA E A ACNE 1 THE RELATION OF COW MILK CONSUMPTION AND ACNE RESUMO



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A RELAÇÃO ENTRE CONSUMO DE LEITE DE VACA E A ACNE 1 THE RELATION OF COW MILK CONSUMPTION AND ACNE Gabriella Pedrotti Leite 2 Juliana Lopez de Oliveira 3 RESUMO A acne é uma doença genética, multifatorial que se caracteriza por hiperproliferação de queratinócitos, hiperprodução sebácea e colonização bacteriana. A patologia que geralmente tem início na puberdade e pode persistir até a idade adulta, é considerada andrógeno dependente uma vez que são os hormônios andrógenos que influenciam o desenvolvimento e produção da glândula sebácea. A influência da dieta na acne é um assunto controverso que dividiu a opinião de especialistas ao longo dos anos, porém recentemente algumas pesquisas identificaram uma possível relação entre dietas de alto índice glicêmico e consumo de leite e derivados com o agravamento da acne. O leite de vaca possui em sua química componentes bioidênticos, entre eles precursores andrógenos que poderiam estimular diretamente a produção sebácea, porém, a maior probabilidade é que o IGF-1 presente no leite possa desencadear o processo acneico devido a seus efeitos no organismo como hiperinsulinemia, hiperqueratinização, produção hormonal e produção sebácea. Palavras-chave: Leite. Acne. Dieta. 1 Artigo apresentado como exigência parcial para obtenção do título de especialista em Nutrição Aplicada à Estética da AVM Faculdade Integrada. 2 Pós graduanda no curso de Especialização Lato Sensu em Nutrição Aplicada à Estética da AVM Faculdade Integrada, 2014 3 Professora do curso de Especialização Lato Sensu em Nutrição Aplicada à Estética da AVM Faculdade Integrada.

2 ABSTRACT Acne is a genetic, multifactorial disease that is marked by keratinocyte hyperproliferation, sebaceous overproduction and bacterial colonization. The pathology that generally begins in puberty and may persist until adult age is considered androgen-dependent once the androgen hormones are the ones who influence development and production of sebaceous gland. The influence of diet on acne is a controversial subject that has divided the opinion of specialists over the years, however, recent researches have identified a possible relation between acne aggravation and high glycemic level and milk/dairy products consumption. Cow milk has bioidentical components in its chemistry, including androgen precursors that could directly stimulate sebaceous production, yet, most likely is that IGF-1 present in milk may initiate acne process due to its effects on the organism such as hyperinsulinemia, hyperkeratinization, hormone and sebaceous production. Key-words: Milk. Acne. Diet. INTRODUÇÃO A associação de elementos da dieta à patologias diversas vem sendo alvo de pesquisas e discussões no meio profissional, acadêmico e científico. Patologias ou desordens estéticas são reclamações comuns em consultórios médicos, estéticos ou nutricionais pois comumente afetam a estética do corpo e consequentemente a autoestima. A acne é uma patologia da pele que tem seu início na adolescência com fatores etiológicos relacionados ao início da fase pubertal, porém, pode ser marcada por manifestações exageradas além da possibilidade de persistir ou surgir na idade adulta, o que acaba gerando insatisfações estéticas. Por ser uma patologia multifatorial, a acne pode estar relacionada à diversos fatores etiopatológicos entre eles o aumento na produção de hormônios andrógenos, entretanto, estudos recentes apontam também a dieta como possível fator agravante.

3 A associação da acne à dieta vem sendo alvo de discussões e controvérsias no meio científico. Antes dos anos 60 já era comum no tratamento de acne restringir certos alimentos na dieta como carboidratos de alto índice glicêmico e gorduras. Em 1949 um estudo encontrou uma possível relação entre o consumo de leite e o agravamento da acne, porém foi considerado fraco e inconclusivo. Por volta dos anos 70, outros estudos foram publicados indicando que não havia relação entre a acne e a dieta ou o consumo de leite, porém estes estudos possuiam problemas na metodologia e também foram considerados inconclusivos. 1 Devido a esta dúvida na relação entre a acne e a dieta, fatores como desequilíbio hormonal e genética eram apontados como os principais causadores sem que fosse dada muita importância à interferência da alimentação. Nas últimas décadas, este tema ganhou maior atenção dos pesquisadores, novas pesquisas foram realizadas e novas evidências começaram a ser encontradas. Dietas de alto índice glicêmico, leite e derivados do leite são atualmente apontadas como possíveis agravantes da acne devido a mecanismos que podem alterar a produção de sebo, queratinização da pele, produção hormonal entre outros fatores que agravariam a acne. A dieta ocidental é geralmente associada ao consumo predominante (em média 50%) de alimentos de alto índice glicêmico, incluindo grãos e açúcar refinados, batatas, leite e derivados do leite. Em países com estilo de vida occidental a acne afeta entre 79 a 95% dos jovens, o que sugere a influência de fatores ambientais. 2,3 Com o objetivo de identificar a relação do consumo de leite de vaca e o aparecimento ou agravamento da acne, foi realizada uma pesquisa bibliográfica de abordagem qualitativa em artigos científicos publicados nos últimos 10 anos sobre a influência ou relação da acne e o consumo de leite. Outros objetivos deste trabalho foram revisar as causas da acne, identificar os componentes químicos do leite e verificar a existência de algum componente ou mecanismo que poderia estimular o aparecimento ou agravamento da acne. METODOLOGIA

4 Esta pesquisa foi elaborada a partir de uma pesquisa bibliográfica de abordagem qualitativa. Incialmente foi realizada uma pesquisa bibliográfica nas principais referências dermatológicas sobre o tema acne com intuito de definir a patologia e suas causas de acordo com os principais autores. Em seguida foi realizada uma pesquisa em bancos de dados online tais como Scielo, Lilacs e Wiley utilizando os seguintes parâmetros: acne e leite; acne e dieta. Após o levantamento de dados, foram selecionados apenas artigos científicos publicados nos últimos 10 anos contendo os parâmetros indicados acima. Os estudos encontrados foram então analisados e comparados entre si para identificar as relações entre o consumo de leite e derivados na dieta com a fisiopatologia da acne. A ACNE A acne é uma afecção dos folículos pilossebáceos localizados na região da face e torax que apresentam uma glândula sebácea hipertrofiada. A acne possui características hereditárias, trasmitida por genes autossômicos dominantes que podem determinar o tamanho da glândula sebácea e sua atividade bem como a queratinização folicular anômala. 4,5 Os fatores fundamentais para o desenvolvimento da acne são hipersecreção sebácea, hiperqueratose da unidade pilossebácea, colonização por Propionibacterium acnes e consequente processo inflamatório. 6 O desenvolvimento da glândula sebácea e sua consequente produção de sebo é influenciada pela ação dos hormonios andrógenos, especialmente testosterona e dehidroepiandrosterona (DHEA). 6 Os hormônios andrógenos estimulam o aumento da glândula sebácea e da produção de sebo, a proliferação de queratinócitos no ducto da glândula sebácea e no acro-infundíbulo folicular. 7 O folículo piloso e a pele apresentam receptores para hormônios andrógenos e estrógenos. A glândula sebácea possui receptores apenas para os andrógenos. Os andrógenos podem ser provenientes de fontes endógenas, produzidos pelos ovários, supra-renal e tecidos periféricos, especialmente a pele, e fontes exógenas como androgênios ou anabolizantes. 4 A ação dos andrógenos no desenvolvimento da acne pode ocorrer por aumento dos andrógenos circulantes ou pela ação periférica dos andrógenos que são transformados em dihidrotestosterona (DHT) na

5 pele pela ação da enzima 5α redutase presente na unidade pilosebácea, podendo causar uma resposta exagerada da glândula sebácea. 5,8,9 Em peles com tendência à acne o número de receptores andrógenos é maior, assim como a atividade da 5αredutase também é maior. Indivíduos com menor número de receptores andrógenos funcionais produzem menos sebo e não desenvolvem acne. 7 Na unidade pilossebácea, a testosterona atua: no crescimento e na pigmentação dos pelos terminais; produção de ácidos graxos; aumento do colágeno e facilitação na formação de culturas de microorganismos cutâneos. 4 Apesar de a acne ser uma patologia considerada andrógeno-dependente, sua ocorrência pode não estar correlacionada apenas aos níveis séricos de andrógenos. O aumento de níveis séricos do fator de crescimento insulina símile 1 (IGF-1) foram observados em homens e mulheres adultos com acne dando crédito à possibilidade da influência do hormônio do crescimento (GH), hiperinsulinemia e IGF-1 na acne. Uma correlação positiva entre a taxa de excreção de sebo facial e níveis séricos de IGF-1 foram demonstrados em pacientes com acne pós adolescência. 7 Também foram encontradas evidências de que os níveis elevados de IGF-1 em indivíduos pré-puberais, puberais, adolescentes e jovens adultos está relacionado à prevalência de acne nesta população. 10 A acne é frequentemente associada à desordens onde ocorre aumento na sinalização de fatores de crescimento e resistencia à insulina como na Síndrome dos Ovários Policísticos, Acromegalia e Síndrome de Apert. O hormônio do crescimento GH, hiperinsulinemia e IGF-1 influenciam no metabolismo de andrógenos nas gônadas e adrenal e devido à isso podem estar associados à patologia da acne. 3,7 Dietas de alto índice glicêmico possuem impacto no metabolismo de testosterona e no aumento dos níveis de IGF-1. Smith et al 7 demosntrou que uma dieta de baixo IG por 12 semanas diminuiram níveis séricos de IGF-1 e melhoraram significativamente a acne. A ocorrência de acne em síndromes associadas à resistência insulínica evidencia a relação entre o IGF-1 e a acne. 7 A ACNE E O CONSUMO DE LEITE

6 Estudos demonstraram que o consumo de leite pode exacerbar a acne pois estimula o aumento de insulina e IGF-1. Devido à semelhança de alguns de seus componentes com a biologia humana, o leite e outras substâncias químicas relacionadas à dieta podem atuar como perturbador endócrino e causar acne. Perturbadores endócrinos são substancias naturais ou sintéticas que podem alterar o sistema hormonal e a homeostase. Devido à propriedades químicas semelhantes, possuem afinidades com os receptores e enzimas envolvidas na síntese, liberação e degradação dos hormônios tornando qualquer sistema endócrino suscetível a eles, incluindo a glândula sebácea. 7 O leite é uma secreção complexa cuja função é estimular o crescimento e desenvolvimento de mamíferos recém-nascidos. O leite de vaca contém diversos componentes bioativos: precursores andrógenos como 5α-androstenediona e 5αpregnanediol, hormônios esteróides, fatores de crescimento insulina símile IGF-1 e IGF-2, prolactina, somatostatina, hormônio liberador do hormônio do crescimento (GHRF), hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH), hormônio luteinizante (LH), hormônio estimulador da tireóide (TSH) e liberador da tireotrofina, insulina, fator de crescimento epidermal (EGF), fator de crescimento neuronal (NGF), fatores de crescimento transformador (TGFs), vitamina D, transferrina, lactoferrina, diversas prostaglandinas, eritropoetina, bombesina, neurotensina, peptídeo vasoativo intestinal, diversos nucleotídeos, adenosina de monofosfato cíclico (camp), monofosfato de guanosina cíclico (GMPc), B-casomorfina e relaxina. As concentrações dessas substâncias podem variar de acordo com o periodo de gestação e lactação. 2,10 Em termos proteicos, o leite é composto por 80% de caseína e os demais 20% são proteínas do soro do leite. As proteínas do soro possuem efeito insulinotrópico enquanto a caseína possui maior efeito estimulante do IGF-1. O leite é uma fonte rica em IGF-1 (4 50 ng/ml) e IGF-2 (40 50 ng/ml) ativos mesmo após os processos de pasteurização e homogeinização que não atuam significativamente na redução de sua atividade. Permanecendo intacto, o IGF-1 passa pelo trato gastrointestinal chegando ao plasma na sua forma bioativa. O IGF-1 humano e bovino possuem moléculas idênticas e possuem o mesmo nível de afinidade com os receptores de IGF-1 (IGF1R) humanos. O consumo elevado de leite poderá aumentar os níveis de IGF-1 circulantes em 10-20% em adultos e 20-30% em crianças. 2,7,11

7 Além da associação aos hormônios andrôgenos, a acne foi recentemente associada ao IGF-1 encontrado nas proteínas do leite. 11 O IGF-1 é produzido em maior escala pelo fígado, após sinalização do hormônio do crescimento (GH) produzido e secretado na corrente sanguínea pela gândula ptuitária anterior. O IGF- 1 estimula o crescimento sistêmico do corpo e tem efeito de promover o crescimento em quase todas as células. 7 O sistema de fator de crescimento semelhante à insulina IGF inclui: IGF-1, IGF-2 e pró-insulina, três receptores de IGF: receptor de IGF-1 (IGF1-R), receptor de IGF-2 (IGF2-R), e receptor de insulina (IR) e seis proteínas de ligação de IGF (IGFBP-1 a IGFBP6). Estes desempenham diferentes papéis na proliferação celular, síntese de proteínas, homeostase de carboidratos e metabolismo ósseo. 7 Além do IGF-1, precursores andrógenos e hormônios esteróides que influenciam a comedogênese e a acne, o leite ainda é enriquecido com outras moléculas bioativas que atuam na unidade pilosebácea como glicocorticóides, fator de transformação do crescimento-β (TGF-β), peptídeos hormoniais semelhantes à tireotropina e compostos semelhantes à opiáceos. 12 O aumento dos níveis séricos de glicose, insulina e IGF-1 estão relacionados à ingestão de alimentos de alto índice glicêmico e estes níveis podem aumentar a testosterona e diminuir a globulina ligadora de hormônios sexuais (SHBG) o que aumenta a oferta de testosterona na unidade pilosebácea. 8 O leite e derivados do leite, possuem baixo índice glicêmico, o que contraria a evidência a respeito da dieta de alto índice glicêmico. Entretanto o consumo de leite e derivados da proteína do soro do leite induzem ao aumento dos níveis séricos de IGF-1 e insulina pós prandial. 3,12 Do ponto de vista endócrino, o índice glicêmico (IG) e a carga glicêmica (CG) estão relacionados a um aumento da resposta insulínica. Apesar de baixo índice e carga glicêmica, o que não deveria aumentar significativamente os níveis de insulina, o leite e derivados elevam a taxa de insulina a níveis semelhantes ao consumo de pão branco. 13 Uma situação de hiperglicemia ocorre após o consumo de alimentos de alto IG. Em resposta, o pâncreas libera grandes quantidades de insulina para diminuir os níveis de glicose no sangue rapidamente. Porém, está rápida redução nos níveis de glicose faz com que estes fiquem muito baixos desencadeando outra resposta nas glândulas adrenais que liberam andrógenos com

8 objetivo de sinalizar ao fígado para liberar glicogênio de suas reservas para normalizar os níveis séricos de glicose. 7 A hiperinsulinemia estimula a síntese de andrógenos, devido à sua influência no aumento dos níveis de IGF-1 que regulam proliferação de queratinócitos, síntese de andrógenos, e produção de sebo e diminiu as concentrações da proteína ligadora dos fatores de crescimento insulina-símiles-3 (IGF-BP3) que controla a apoptose; gerando um desequilíbrio que leva a uma hiperproliferação de queratinócitos. 12,14 Níveis elevados de IGF-1 também estão relacionados à superprodução de sebo e acne. A insulina e o IGF-1 estimulam a lipogênese nas glândulas sebáceas. Testes in vitro demonstraram que o IGF-1 aumenta a lipogênese em sebócitos de forma dose-dependente. O IGF-1 aumenta a expressão da proteína de ligação ao elemento regulatório de esterol (SREBP-1) que regula a biosíntese de lipídeos e níveis de colesterol celular nos sebócitos da glândula sebácea. 2,15,16 Na pele, o IGF-1 é sintetizado principalmente nos fibroblastos e melanócitos e possivelmente pelos queratinócitos do estrato granuloso. O receptor de IGF1R pode ser encontrado em toda a extensão das glândulas sebáceas sugerindo que o IGF-1 atue como mitógeno e morfógeno sebáceo. A insulina também atua como mitógeno quando se liga ao IGF1-R ou ao receptor de insulina-a (IR-A), para sua ação metábolica e no metabolismo da glicose ela se liga ao receptor de insulina-b (IR-B). 7 Pesquisas encontraram correlações entre níveis séricos de IGF-1 e a presença de acne em adultos. Em mulheres foi encontrada uma relação positiva entre níveis séricos de IGF-1 aumentados e número total de lesões acneicas (pápulas, pústulas e comedões); níveis séricos de DHT e sulfato de dehidroepiandrosterona (DHEA-S). Os níveis séricos de IGF-1 também estão relacionados à taxa de secreção sebácea na pele de adultos. 2 Crianças que consumiram leite por 1 mês tiveram aumento nos níveis séricos IGF-1 / IGFBP-3 e GH. 7 Em estudos com humanos, constatou-se que os níveis de IGF-1 aumentam os níveis de andrógenos, assim como os níveis de andrógenos também aumentam os níveis de IGF-1 circulantes. Um estudo demonstrou que a atividade da 5αredutase aumentou proporcionalmente após a administração de IGF-1 em fibroblastos da pele mostrando que o IGF-1 pode influenciar a regulação de andrógenos na pele além de também ativar o receptor de andrógenos. 2

9 No corpo humano, a DHT é obtida pela redução da testosterona pela enzima 5α-redutase presente na unidade pilosebácea, porém a DHT pode chegar ao receptor andrógeno sem a influência da enzima quando seus precursores já encontram-se reduzidos como ocorre com as moléculas presentes no leite: 5αandrostenediona e 5α-pregnanediol que já sofreram a ação da enzima na glândula mamária bovina. 8,10 Adebamowo et al realizou um estudo utilizando 47.355 mulheres com o objetivo de verificar possível associação entre a presença de acne na adolescência e o consumo de leite e alguns derivados. A pesquisa verificou que para as mulheres que desenvolveram acne no período, o consumo de leite e derivados era maior do que aquelas que não desenvolveram ou tiveram um quadro menos agressivo. Outros dois estudos similares foram realizados pelo mesmo grupo de pesquisadores: um utilizando uma amostra de 6000 adolescentes do sexo feminino e outro com 4273 adolescentes do sexo masculino ambos com idade entre 9 a 15 anos. Apesar das críticas às suas pesquisas com relação à idade inicial dos adolescentes que seria muito baixa para o desenvolvimento de acne e ao método de obtenção de informações relativos à dieta que seriam baseados em relatos pessoais passados, as três pesquisas estabeleceram uma relação positiva entre a presença de acne e o consumo de leite. 17,18,19 Um estudo sul coreano verificou uma relação positiva entre a ingestão de leite e sorvete com a ocorrência de acne. Os pesquisadores reportaram que os indivíduos que possuiam acne consumiam maior quantidade de leite e derivados comparado aos que não possuiam acne. Nos Estados Unidos, outro estudo envolvendo mulheres demonstrou que aquelas que consumiam dois ou mais copos de leite desnatado por dia tinham 22% mais chance de desenvolver acne severa e 44% mais chance de desenvolver acne nódulo-cística em relação àquelas que consumiam apenas um copo de leite desnatado por dia. 20 O leite desnatado, parece ainda ter um efeito mais agravante do que o leite integral como sugerem alguns estudos. Um estudo com 24 pré adolescentes de 8 anos de idade que ingeriram doses diárias de 53g de carne magra ou o equivalente em leite desnatado (1,5 litros) demosntrou que o grupo que ingeriu o leite desnatado teve um aumento significativo nos níveis de insulina e IGF-1 enquanto o grupo que ingeriu carne magra não teve aumentos similares. Tal fato sugere que o surgimento

10 ou agravamento da acne não está relacionado a quantidade de gordura no leite, o que contribui para a associação aos níveis de IGF-1. 7,12 No processamento do leite desnatado, pode ocorrer uma alteração na biodisponibilidade das moléculas bioativas ou uma interação das mesmas com proteínas de ligação sugerindo que o balanço dos constituintes hormonais do leite seja alterado. Ainda, para compensar o baixo teor de gordura e simular a consistência do leite integral são adicionadas proteínas do soro do leite, especialmente a α-lactoalbumina. 12 O IGF-1 é também um estimulante da lactogênese que é secretado no leite. Níveis aumentados de IGF-1 podem ser encontrados no leite de vacas que receberam hormônio do crescimento recombinante (hrgh) ou somatotrofina (BST) para aumentar a produção de leite. 2,10 CONCLUSÃO A relação da acne com a dieta é um tema que sempre gera discussões em meio acadêmico, científico e profissional. O fato de que determinados alimentos poderiam desencadear ou agravar um processo acneico já era defendido por vários profissionais porém com dados científicos fracos ou inconclusivos. Com o passar do tempo, a crença de que alimentos muito gordurosos poderiam estimular a produção de sebo e acne foi defendida por muitos profissionais como a principal relação entre a acne e a alimentação. Porém algumas pesquisas e autores sugeriam que esta relação não gerava tanta influência sendo o fator hormonal, por exemplo, muito mais importante. 21 Na prática clínica, muitos profissionais e pacientes reportam o agravamento da patologia após o consumo de determinados alimentos, o que sugere que a dieta poderia realmente influenciar a acne. O leite vem sendo alvo de relatos de agravamento das lesões de acne e diversas pesquisas ja foram realizadas com a tentativa de identificar esta relação. Alguns componentes do leite foram identificados como possíveis agentes agravadores. Os precursores andrógenos como 5α-androstenediona e 5αpregnanediol são apontados como estimulantes da produção sebácea, que é

11 andrógeno dependente, agindo diretamente na unidade pilosebácea estimulando a produção de sebo uma vez que não necessitam da redução enzimática pela 5αredutase, porém, alguns pesquisadores questionam a possibilidade destes não resistirem ao trato gastrointestinal não chegando intactos à corrente sanguínea. 13 Sendo assim, ainda não esta claro se são os hormônios presentes no leite que poderiam estimular a acne agindo como perturbadores endócrinos em nosso sistema ou se estes tornam-se inativos ao passarem pelas enzimas no processo digestivo. O consumo de leite e o agravamento da acne se assemelha ao que ocorre em dietas de alto IG. Apesar do baixo IG, o leite aumenta a hiperinsulinemia o que é associado a uma grande quantidade de IGF-1 em sua composição. O IGF-1 é apontado na maior parte das pesquisas como a mais provável relação entre o consumo de leite e a acne, uma vez que ele é capaz de desencadear uma resposta hormonal com liberação e regulação de andrógenos e ativação de seus receptores na pele, proliferação de queratinócitos e produção sebácea, fatores que estão diretamente relacionados às alterações que ocorrem na acne. 2,12,14,16 Outro fato que corrobora para esta afirmação é que pesquisas apontaram aumento de IGF-1 sérico em adultos com acne 2 e que, por sua vez, o consumo de leite aumenta os níveis séricos de IGF-1. 2,7,11 Outro fato interessante na relação do consumo de leite com a acne é que o leite desnatado demonstrou maior agravamento em algumas pesquisas do que o leite integral. Este fato sugere que a gordura do leite teria pouca ou nenhuma influência pois o teor de gordura no leite desnatado é menor. 12 O leite desnatado após seu processamento recebe mais proteínas do soro para ganhar consistência parecida com a do leite integral após a retirada da gordura o que poderia aumentar as concentrações hormonais ou por exemplo de IGF-1, uma vez que este está presente também na porção proteica do leite. É cada vez mais evidente que existe uma relação da acne com o consumo de leite e que o IGF-1 é o componente que melhor esclarece esta relação. Porém ainda não se tem certeza de que os níveis aumentados de IGF-1 ocorram devido à quatidade de IGF-1 presente no leite ou se o consumo de leite poderia estimular a produção endógena de IGF-1. 11 Para tal, novas pesquisas precisariam ser realizadas a fim de compreender melhor os aumentos de IGF-1 após o consumo de leite assim

12 como outros componentes que poderiam contribuir como, por exemplo, os hormônios. É importante mencionar que nenhuma destas pesquisas apontou a dieta, alimentos de alto IG, o leite ou o IGF-1 como causador determinante da acne, o que sugere que estes apenas possam agravar o quadro, e que outros fatores pré existentes como a genética e produção andrógena ainda determinem o surgimento da patologia. Sendo assim, indivíduos predispostos estariam mais suscetíveis à acne após o consumo de leite do que aqueles que por motivos genéticos não desenvolveram a patologia. REFERÊNCIAS 1. Is There a Link Between Acne and Milk Products? Summary of Evidence. Dairy Nutrition. Disponível em <http://www.dairynutrition.ca/scientific-evidence/roleson-certain-health-conditions/is-there-a-link-between-acne-and-milk-productssummary-of-evidence> Acesso em: 17 Nov. 2013. 2. MELNIK, Bodo. Milk consumption: aggravating factor of acne and promoter of chronic diseases of Western societies. Journal of the German Society of Dermatology. v. 4, 2009. 3. MELNIK, Bodo C. Effects of Milk and Other Insulinotropic Dairy Products. World Applied Sciences Journal. v. 24, n. 3, p. 403-7, ago, 2013. 4. CERQUEIRA, Ana Maria M. Acne Vulgar. In KEDE, Maria P.V.; SABATOVICH, Oleg. Dermatologia Estética 2ed. Atheneu, São Paulo, 2009. 5. SAMPAIO, Sebastião A.P.; RIVITTI, Evandro A. Dermatologia 3.ed. Artmed, São Paulo, 2007. 6. RUBIN, Jaime; VIGLIOGLIA, Pablo A. Cosmiatria III - AP Americana de Publicaciones, Espanha, 1998.

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