O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) pode modifi car a prevalência de enteroparasitoses em população de uma mesma cidade?



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Transcrição:

ARTÍCULO ORIGINAL/ARTIGO ORIGINAL O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) pode modifi car a prevalência de enteroparasitoses em população de uma mesma cidade? The Human Development Index (HDI) can modify the prevalence of intestinal parasites in population of the same city? Luciana Barros de Santana 1 Larissa Smith Barreto de Jesus 2 Ricardo Dantas Rocha 2 Flávia Costa de Oliveira 3 Angela Silva 1 1 Professora da Disciplina de Doenças Infecciosas e Parasitárias (DIP) da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Aracaju - SE - Brasil. 2 Acadêmico de Medicina da UFS, Aracaju - SE - Brasil. 3 Farmacêutica Coordenadora do Laboratório de Análises Clínicas do Hospital Universitário da UFS, Aracaju - SE - Brasil. *Local de Realização do Trabalho: HU UFS (Hospital Universitário da Universidade Federal de Sergipe) - UNIMED-SE (UNIMED - Sergipe). Rev Panam Infectol 2009;11(2):15-19. Conflicto de intereses: ninguno Recibido en 14/4/2008. Aceptado para publicación en 23/4/2009. Resumo A educação da população, relacionada às parasitoses intestinais, é importante mesmo nos grandes centros urbanos do Brasil. O objetivo foi avaliar a prevalência de enteroparasitoses em laboratórios de duas instituições (pública e privada), tanto no aspecto quantitativo quanto qualitativo, correlacionando com o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Analisaram-se 6.268 exames parasitológicos de fezes, 4.531 (72,3%) da UNIMED-SE e 1.737 (27,7%) do HU-UFS, sendo que dos da UNIMED-SE, 1.130 (24,9%) apresentaram parasitos, e do HU-UFS, 823 (47,4%). As crianças até 12 anos tiveram a maior prevalência, com 27,4%, e o parasito mais encontrado foi o A. lumbricoides. O método parasitológico de sedimentação espontânea foi o mais utilizado, com 99,7%. Percentualmente, os indivíduos atendidos no HU-UFS apresentaram maior positividade nos exames de fezes, explicando-se pelo fato de atender uma população com menores níveis socioeconômico e culturais. Diante do exposto, este trabalho analisou a relação do IDH, enfatizando as desigualdades sociais, devido aos menores cuidados com a higiene, e os fatores ambientais, com a prevalência das parasitoses. Palavras-chave: Enteropatias parasitárias, desenvolvimento humano, epidemiologia, fatores socioeconômicos. Abstract The education of the population, related to intestinal parasitic infections, it is important even in large urban centers in Brazil. The objective was to evaluate the prevalence of intestinal parasites in laboratories of two institutions (public and private), both in quantitative aspect as qualitative, correlated Human Development Index (HDI). Analyzed 6,268 examinations parasitological feces, 4,531 (72.3%) of the UNIMED-SE e 1,737 (27.7%) the HU-UFS, of the UNIMED-SE, 1,130 (24.9%) presented parasites, and the HU-UFS, 823 (47.4%). Children up to 12 years had the greatest prevalence with 27.4%, and the parasitic more found was A. lumbricoides. The 15

Rev Panam Infectol 2009;11(2):15-19. method spontaneous sedimentation parasitological was the most used, with 99.7%. The socioeconomic levels and cultural unequal can influence the intensity of exposure to environmental factors and individual, in low hygiene conditions, reflecting the value of the HDI with the prevalence of parasitic diseases. Percentage of way, the individuals treated at the HU-UFS presented higher positivity in the examinations of feces, explaining the fact that service a population with the lowest socioeconomic and cultural. In the face of the above, this work analyzes the relationship of IDH, emphasizing the social inequalities, due to the lower care with the hygiene, and environmental factors, with the prevalence of parasitic diseases. Key words: Parasitic intestinal diseases, human development, epidemiology, socioeconomic factors. Introdução Após a metade do século XX, com os avanços científico e tecnológico dos pós-guerras (I e II Guerras Mundiais), as doenças infecciosas e parasitárias foram dando vez às doenças crônico-degenerativas em praticamente todo o mundo. Entretanto, este processo não foi acompanhado pelos países em desenvolvimento. (1-5) Nestes, onde o índice de pobreza é alarmante, as parasitoses são uma importante causa de morbimortalidade, além de serem responsáveis por onerosos gastos na Saúde Pública. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), 45% dos gastos com Saúde Pública nesses países ocorrem em função de doenças associadas às baixas condições de vida, dentre elas as doenças parasitárias. (6) A educação da população, relacionada às parasitoses intestinais, é importante mesmo nos grandes centros urbanos do Brasil. Um bom exemplo é a cidade de São Paulo, considerada nos últimos 150 anos o maior centro econômico do país, e que mesmo assim entre 1984-1985 possuía aproximadamente um terço das crianças, de todos os estratos socioeconômicos, portadoras de parasitoses intestinais, sendo que 13% dessas com duas ou mais verminoses. (7,8) No Brasil, a carência de saneamento básico, de condições de higiene e de projetos educativos, em especial para a população mais pobre, leva a uma disparidade na prevalência dessas parasitoses entre as diferentes classes sociais. (9,10) Os costumes alimentares, o nível de escolaridade, a desnutrição, o acesso aos serviços de saúde e a qualidade da água que se usa também favorecem o estabelecimento dessas diferenças. (6,11-14) Em Sergipe, apesar da escassez de estudos sobre o tema, essa desigualdade persiste. Estudos feitos no ano de 2003, em Aracaju, mostraram que as crianças que frequentavam creches estavam mais suscetíveis à infestação intestinal por parasitas do que as que não as frequentavam. (15) Para isso contribuíram, além dos fatores socioeconômicos, as más condições locais de higiene, o mau treinamento dos funcionários e a maior facilidade de contato pessoal (criança-criança, criança-funcionário). (2) O presente estudo objetivou avaliar a frequência de diagnósticos de enteroparasitoses em laboratórios de duas instituições, sendo uma instituição pública (laboratório do Hospital Universitário) e uma instituição privada (laboratório da UNIMED- Sergipe). Foi avaliado tanto o aspecto quantitativo quanto o qualitativo, além de identificar os bairros do município de Aracaju com maior frequência de parasitoses intestinais e relacionar com o IDH. Material e métodos Local do estudo: O estudo teve como local o laboratório de uma instituição pública (HU-UFS - Hospital Universitário da Universidade Federal de Sergipe) e o laboratório de uma instituição privada (UNIMED-Sergipe). O laboratório do HU-UFS realiza em média 952 parasitológicos de fezes/mês e seus clientes, 60% da capital e 40% dos outros municípios do Estado, na sua totalidade são providos do SUS. Enquanto o laboratório da Unimed realiza 2.642 parasitológicos de fezes/mês e seus clientes são originados da capital em 70% e 30% do restante de outros municípios do Estado. Tipo e desenvolvimento do estudo: Aplicou-se um estudo transversal. Foram analisados todos os parasitológicos de fezes (positivos e negativos) dos clientes originários dos laboratórios HU-UFS e UNIMED-Sergipe, durante o período de outubro a dezembro de 2006. As duas instituições utilizaram os métodos parasitológicos de fezes, de acordo com a solicitação médica, de consultas prévias por diversas causas, as quais não fizeram parte das variáveis estudadas nesta pesquisa. Foram utilizados os métodos de Sedimentação Espontânea e Kato Katz. Na pesquisa, os resultados dos parasitológicos de fezes coletados três dias por semana, em três amostras, foram obtidos através de cópias impressas do plano diário informatizado dos referidos laboratórios. Após identificação dos exames positivos, preencheuse uma ficha previamente elaborada e informatizada, com as seguintes variáveis: nome, idade, procedência, endereço, bairro, mês executado, instituição, tipo de plano de saúde, método parasitológico, parasitose identificada. Os planos de saúde utilizados foram SUS (Sistema Único de Saúde) e UNIMED-Sergipe, este de forma estratificada, além de regimentado por valores pagos pelos conveniados, de acordo com sua condição socioeconômica. Atualmente na instituição UNIMED- Sergipe os planos são comercializados seguindo a classificação: Univida (abrangência nacional e com valor financeiro maior); UNIMED Cidade (abrangência 16

apenas em Sergipe e menor valor financeiro); e o Plano Empresa (destinado somente a funcionários de empresas e com o menor preço de aquisição). O primeiro subdivide-se em Especial e Básico, diferenciando-se pelo tipo de acomodação hospitalar. Após o preenchimento da ficha com os resultados dos parasitológicos de fezes realizaram-se, pelos pesquisadores, visitas aos bairros de Aracaju, com a finalidade de correlacionar a frequência de enteroparasitoses com as informações obtidas dos registros do IBGE, onde consta o IDH. Análise estatística: Os dados coletados foram armazenados em ficha informatizada, tendo como banco de dados e análise estatística o software EPIINFO for Windows versão 3.3.2. Teve como H0 a não associação entre parasitológico de fezes positivo e saneamento básico. Os testes estatísticos utilizados foram: t de Student, Qui-quadrado, Razão de Prevalência. O intervalo de confiança de 95%, tendo valor de p < 0,05, com erro tipo. Aspectos éticos: Este trabalho teve aprovação por parte das duas instituições (HU-UFS e UNIMED-Sergipe), além do Comitê de Ética Médica da Universidade Federal de Sergipe (CAAE 0060.0.107.000-06). Resultados Analisaram-se 6.268 exames parasitológicos de fezes, sendo 4.531 (72,3%) da UNIMED-Sergipe e 1.737 (27,7%) do HU-UFS. Dos exames da UNIMED, 1.130 (24,9%) tiveram presença de parasitos, enquanto nos do HU-UFS, 823 (47,4%). O método mais utilizado foi a Sedimentação Espontânea, perfazendo 99,7%; já o Kato-Katz representou apenas 0,3%. Dando continuidade à análise dos resultados, tem-se que 2.364 (37,7%) foram clientes do gênero masculino e 3.904 (62,3%) do feminino. Quanto à existência de parasitoses, o gênero feminino teve maior frequência (60,6%). Dos resultados positivos avaliados, existiram pessoas de idades variadas, entre oito meses e 95 anos ( =32; DP=32,46), sendo que a faixa etária até 12 anos obteve a maior prevalência (27,4%), tal qual apresentou a maior positividade nos exames, ou seja, 45,1% em crianças no HU-UFS e 18,6% na UNIMED-Sergipe. Os parasitos mais encontrados na UNIMED-Sergipe e no HU-UFS estão distribuídos de acordo com a tabela 1, donde se observou, posteriormente, que os exames positivos para Schistosoma mansoni (n=33) foram predominantemente de pessoas residentes em Aracaju, com n=14. No tocante à frequência de distribuição por municípios, Aracaju obteve o maior número de exames, 1.268 (73,0%) no HU-UFS e 3.641 (80,4%) na UNIMED-Sergipe (tabela 2). Tabela 1. Parasitos mais frequentes nos exames realizados no HU e na UNIMED-SE 2007 Parasito UNIMED-SE % HU % Frequência total E. nana 553 61,6 343 38,3 896 A. lumbricoides 155 54,2 131 45,8 286 E. histolytica /E.dispar 91 60,7 59 39,3 150 T. trichiura 08 7,6 97 92,4 105 G. lamblia 73 62,9 43 37,1 116 S. mansoni 14 12,5 19 87,5 33 S. stercoralis 06 1,6 13 68,4 19 Ancylostomidios 01 9,1 10 90,9 11 E. vermicularis 02 100,0 0 0 02 Total 903 715 1618 IC = 1,36 a 1,49 (95%); p = 0,00001; RR = 1,5. Tabela 2. Distribuição dos municípios que mais realizaram exames no HU e na UNIMED-SE 2007 Município HU EPF+ (n%) MUNICÍPIO UNIMED-SE EPF+ (n%) Aracaju 1268 520 (41,0%) Aracaju 3641 683 (18,7%) Itaporanga 15 08 (53,3%) N. S. Socorro 234 124 (52,9%) Laranjeiras 09 03 (33,3%) S. Cristóvão 119 52 (43,6%) Aquidabã 07 05 (71,4%) Laranjeiras 46 12 (26,0%) Tabela 3. Distribuição dos exames parasitológicos de fezes (EPF) e dos sete bairros de Aracaju com maior prevalência de positividade 2007 Bairro HU EPF+ (n%) UNIMED-SE EPF+ (n%) Grageru 05 01 (20,0%) 269 51 (18,9%) Luzia 10 05 (50,0%) 259 02 ( 0,7%) Farolândia 16 08 (50,0%) 251 14 ( 5,5%) Cidade Nova 195 84 (43,0%) 41 13 (31,7%) Centro 12 05 (41,6%) 216 45 (20,8%) Santo Antônio 101 51 (50,4%) 130 32 (24,6%) São José 05 01 (20,0%) 220 51 (23,1%) Na distribuição por bairros da capital, houve a distribuição dos exames positivos em diversos bairros, com ênfase em sete (tabela 3). Analisando a positividade dos exames parasitológicos de fezes, Aracaju, capital do Estado, apresentou o melhor Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M), com 24,6%, seguido de Laranjeiras 27,2%, São Cristóvão 43,7%, N. S. Socorro 53,0%, Itaporanga 17

Rev Panam Infectol 2009;11(2):15-19. Tabela 4. Municípios com maior frequência de positividade nos EPF relacionados com o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal Município EPF+ (n%) Índice de Educação Índice de PIB IDH-M Ranking por UF Aracaju 21203 (24,6%) 0,901 0,752 0,794 01 São Cristóvão 52 (43,7%) 0,823 0,583 0,700 02 N. S. Socorro 124 (53,0%) 0,831 0,563 0,696 03 Laranjeiras 15 (27,2%) 0,778 0,519 0,642 25 Itaporanga 15 (53,3%) 0,715 0,515 0,637 27 Aquidabã 05 (71,4%) 0,684 0,523 0,605 45 Fonte: ONU - ano 2000. 53,3% e Aquidabã 71,4%. Há uma correlação destes percentuais de forma gradativa com o IDH-M (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal), PIB (Produto Interno Bruto), Índice de Educação e a UF (Unidade Federada), desses municípios, como mostra a tabela 4. Segundo a Companhia de Saneamento de Sergipe (DESO), a taxa de ligação de água é de 90,0% e a de esgoto é de 35,0%, em Aracaju. Discussão Os resultados dos exames parasitológicos de fezes demonstraram que no HU-UFS houve um predomínio de positividade em detrimento à UNIMED-Sergipe. Isto, provavelmente, devido às diferenças no perfil dos usuários, quais sejam: condição socioeconômica, nível de orientação e saneamento básico. Entretanto, Aracaju é considerada a cidade de melhor IDH do Estado de Sergipe. (16) A análise do IDH-M, que leva em consideração a escolaridade, a expectativa de vida e a renda per capita, justifica a maior prevalência de enteroparasitoses no HU-UFS, devido a sua periférica localização, com condições de saneamento precárias e com atendimento na sua maioria de população de classe socioeconômica baixa. Como evidenciado nos resultados desta pesquisa, apesar de o município de Aracaju ser a capital do Estado e ser classificada como uma das melhores qualidades de vida do Brasil, o percentual de ligação com esgotos ainda é baixo, mostrando com isto a deficiência dos centros urbanos, em concordância com os dados encontrados por Monteiro et al. na cidade de São Paulo. (7,17) Vale destacar que houve uma maior positividade de A. lumbricoides em crianças de oito meses a 12 anos nas duas instituições. Isto se explica, principalmente, pela maior exposição a fatores ambientais, individuais e menores cuidados com a higiene. (3,11,17) Além disso, níveis socioeconômicos e culturais desiguais podem estar influenciando na intensidade da exposição, refletindo a relação do IDH com a prevalência das parasitoses. Destaca-se nesta pesquisa que o número de exames positivos para S. mansoni teve a mesma frequência nas duas instituições estudadas, independentemente do nível socioeconômico dos pacientes. Uma possível explicação para isso é a migração da população rural das áreas endêmicas para os centros urbanos e a longevidade deste verme quando não tratado. Outra observação relevante nessa pesquisa é que a maior parte dos médicos, quando da solicitação dos exames, não especifica o método parasitológico de fezes, solicitando apenas duas ou três amostras para serem examinadas. Diante do exposto, este trabalho analisou a relação do IDH, enfatizando as desigualdades sociais, devido aos menores cuidados com a higiene, e os fatores ambientais, com a prevalência das parasitoses. Agradecimentos À UNIMED Sergipe por ter disponibilizado o seu Centro Diagnóstico (Setor Laboratorial) de forma integral, para este estudo. Financiamento Não houve fonte de financiamento, tampouco conflito de interesses. Referências 1. Campelo V, Gonçalves MAG, Donadi EA. Mortalidade por doenças infecciosas e parasitárias no Município de Teresina-PI (Brasil), 1971-2000. Rev Bras Epidemiol 2005;8:31-40. 2. Carvalho TB, Carvalho LR, Mascarini LM. Occurrence of enteroparasites in day care centers in Botucatu (São Paulo State, Brazil) with emphasis on Cryptosporidium sp., Giardia duodenalis and Enterobius vermicularis. Rev Inst Med Trop S Paulo 2006;48:269-273. 3. Ludwig KM, Frei F, Alvares FF, Ribeiro-Paes JT. 18

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