Variabilidade sazonal do clima e da vegetação no bioma Cerrado: I. Abordagem diagnóstica por sensoriamento remoto



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Transcrição:

Variabilidade sazonal do clima e da vegetação no bioma Cerrado: I. Abordagem diagnóstica por sensoriamento remoto Jorge Alberto Bustamante Becerra 1, Suzana Carvalho 1, Emily Ane Dionizio da Silva 1, Iris Amati Martins 1, Celso von Randow 1 1 Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - CCST / INPE Rod. Presidente Dutra, km 40, Cachoeira Paulista, SP, email: jorge.bustamante@inpe.br, suzana.carvalho@inpe.br, emily.silva@inpe.br, iris.martins@inpe.br, celso.vonrandow@inpe.br ABSTRACT: At a global scale, precipitation is one of the best predictors of spatial distribution of the main vegetation types. At a regional scale, the influence of precipitation is less direct because of the involvement of other intervening variables. The aim of this study was to assess the seasonality of precipitation and vegetation (using the Normalized Difference Vegetation Index-NDVI and Leaf Area Index-LAI), and the relationships between these variables in two regions of the Cerrado biome (savanna), north and central, with different degrees of human disturbance, natural and modified, respectively. We also investigated the relationship of the following pair of variables: precipitation and NDVI, precipitation and LAI, and NDVI and LAI; by fitting curves to a regression model using time series from 2001 to 2009 for the three variables (precipitation, NDVI e LAI) in the two study areas. The results show significant correlation between NDVI and precipitation being higher in the modified region (R2: 0.3724) than in natural region (R2: 0.3717), partial correlation between precipitation and LAI with significant correlation only in the modified region (R2: 0.3345), and significant correlation between NDVI and LAI, which is higher in the modified (R2: 0.9288) than in natural region (R2: 0.5493).These results indicate that precipitation is one of the main variables that influence the pattern of spatio-temporal distribution of the Cerrado vegetation. However, this influence (of precipitation on vegetation) is differentiated, being more direct in areas with dominance of grassy-herbaceous and shrub layer and even wide agricultural areas with rainfall dependence (modified region) than in areas with dominance of tree layer (natural region), where the dependence of precipitation is less direct. Finally, we also analyzed the relationship between NDVI (observational data) and NPP (modeled) that will be presented in further work on "Seasonal variability of climate and vegetation in the Cerrado biome: II. Representation with the biosphere model IBIS. Palavras-chaves: Sazonalidade da precipitação, sazonalidade da vegetação (NDVI e LAI) e bioma Cerrado. 1 - INTRODUÇÃO As mudanças ambientais globais, devidas à crescente exploração dos recursos naturais e da ocupação humana podem resultar em, por exemplo, temperaturas mais elevadas, mudanças na precipitação, mudanças no aquecimento radiativo líquido e os efeitos diretos do CO2, que influenciam o estado da superfície terrestre (umidade do solo, albedo, ru gosidade, vegetação) (IPCC, 2001 ). Por sua vez, a superfície terrestre alterada pode produzir um mecanismo de feedback e alterar a atmosfera superior (precipitação, vapor d'água, nuvens). Assim, as mudanças na composição e estrutura dos ecossistemas (naturais e/ou antropizados) podem alterar não apenas o clima físico, mas também os ciclos biogeoquímicos. As mudanças na vegetação podem potencialmente modificar os climas local e regional, alterando as trocas de água e de energia entre a superfície terrestre e a atmosfera. A sazonalidade climática influencia a fenologia da vegetação (Lieth & Wihiattaker, 1975; Chapin et al., 2002; Schuur, 2003; Huxman et al., 2004) com períodos de maior

produtividade e brotação de folhas, quando são registrados maiores valores do índice de vegetação NDVI (índice de vegetação de diferença normalizada), e períodos de menor produtividade e senescência de folhas, com valores baixos de NDVI. Além da influência do clima, fatores antrópicos podem também influenciar significativamente a sazonalidade da vegetação, em escala regional. O cerrado (savana tropical) é o segundo bioma brasil eiro em extensão com alta diversidade alfa (de espécies) e beta (de paisagens). Estes atributos permitem a ocorrência de comunidades vegetais com diferences características funcionais como maior ou menor caducifólia, em função de gradientes latitudinais e longitudinais. Portanto, o Cerrado é considerado um mosaico de formações vegetais, cuja representação em modelos de superfície ainda é um desafio. A hipótese a ser testada é que as comunidades vegetais mais próximas do Equador devem apresentar sazonalidade menos marcada do que as localizadas mais ao sul do mesmo bioma. Ainda na região central do bioma acontecem intensas atividades antrópicas de uso da terra. Essas diferenças quanto à vegetação e uso da terra devem ser passíveis de ser diagnosticadas a partir de análises de dados de sensoriamento remoto. Através destas ferramentas, busca-se aprimorar o entendimento dos processos de interação e a representação destes processos em modelos da biosfera no Cerrado. O objetivo geral do trabalho, que envolve duas partes, é avaliar a sazonalidade da vegetação e do clima na região do Cerrado brasileiro, usando dados observacionais de sensoriamento remoto MODIS e estações de superfície (parte I), e posteriormente relacionar com simulações da sazonalidade da vegetação usando um modelo integrado de biosfera (parte II). O objetivo específico da parte I, aqui desenvolvido, é avaliar a sazonalidade da precipitação e da vegetação (usando o índice de vegetação de diferença normalizada-ndvi e o índice de área foliar-lai), e as relações existentes entre estas variáveis, em duas regiões, norte e central, do bioma com diferentes graus de antropização, natural e modificado, respectivamente 2 - MATERIAL E MÉTODOS A área de estudo é o bioma Cerrado que apresenta tipos fitofisionômicos diversificados em toda a sua extensão, com formações campestres bem abertas (campos limpos) até florestais (cerradões). Entre estes dois extremos são encontradas fitofisionomias intermediárias, como campos sujos, campos cerrados e cerrados sensu stricto. Foram escolhidas duas regiões de estudo localizadas no norte e centro do bioma. A primeira, chamada de região natural, com menor pressão antrópica onde as fitofisionomias que compõem a vegetação ainda se mantêm em estado natural (47.5 a 44.5LW e 06 a 10LS). A segunda, região modificada, com forte pressão antrópica, dominada por matriz agropecuária com remanescentes de vegetação natural (51 a 48.5LW e 15 a 17.5LW). Os materiais utilizados são: dados índices de vegetação-ndvi (MOD13Q1) e índice de área foliar-lai (MOD15Q) do sensor MODIS/TERRA período 2000-2009; dados de precipitação do satélite TRMM e de estações de superfície da área de estudo no mesmo período de tempo; e mapeamentos do desmatamento do cerrado elaborado pelo PROBIO. A metodologia consistiu na análise de séries temporais das variáveis ambientais diagnósticas passando inicialmente por um pré-processamento que consistiu na padronização da resolução temporal de todas as variáveis em composições de 16 dias (através de médias diárias), igual ao produto NDVI do MODIS, de forma a ter 23 composições para compor um ano. As resoluções espaciais das variáveis, de 250 m, 1000 m e 0,2 graus para NDVI, LAI e precipitação, respectivamente, foram mantidas com o intuito de não perder informação no processo de generalização de resoluções mais finas (NDVI e LAI) para a mais abrangente (precipitação).

Como a resolução espacial é específica para cada variável, duas mascaras por variável foram elaboradas, cada uma referente a uma das regiões (natural e modificada), elaborando assim um total de 6 mascaras para as 3 variáveis analisadas. Cada região de estudo é considerada uma unidade amostral e nestas unidades são aplicadas estatísticas descritivas mantendo a resolução espacial das variáveis, cada uma com tamanho amostral (N) específico. Para relacionar as variáveis envolvidas, o N é padronizado calculando um valor médio ponderado por variável para cada composição de 16 dias, previamente estabelecido, completando um ano com 23 composições. As variáveis assim organizadas são analisadas aplicando correlações e regressões para estabelecer o grau de dependência entre elas. 3 - RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 Variabilidade sazonal A Figura 1 fornece quatro resultados da sazonalidade da vegetação e da precipitação e da relação dos índices que representam a vegetação com a precipitação nas duas regiões de estudo, natural (cor verde) e modificada (cor vermelha). As Figuras 1A e 1B mostram a sazonalidade da precipitação (dividida em 23 períodos que completam um ano) típica da região do cerrado, para as duas regiões. Isto é com as duas estações, chuvosa e seca, bem definidas (representadas nas barras). A precipitação do início do ano na região modificada é maior que na natural, no entanto que no segundo semestre o comportamento e inverso. Figura 1 - Sazonalidade da vegetação em duas regiões do cerrado (Nat: natural e Mod: modificada), usando os índices NDVI e LAI, e sua respectiva precipitação (Figuras 1A e 1B, respectivamente). Influência da precipitação no NDVI e LAI (Figuras 1A e 1B, respectivamente) nas duas regiões mencionadas. O NDVI (Figura 1A) nas duas regiões mostrou sazonalidade bem definida, acompanhando a sazonalidade da precipitação, sendo mais pronunciada na região modificada do que na natural. No início do ano (estação chuvosa) a região modificada apresentou maiores valores de NDVI do que a natural, isto pode ser explicado pelo manejo de áreas de culturas

agrícolas (região modificada) que estão no máximo período de desenvolvimento, induzido por fertilizantes sintéticos entre outros, e conseqüentemente apresentam valores maiores de NDVI do que as regiões naturais. No período de estiagem, marcado pelo déficit hídrico, o comportamento é inverso, a região modificada apresenta valores menores de NDVI, devido provavelmente a retirada de grande parte da cobertura vegetal no período de colheita que intensifica a perda de folhas no período seco que é um mecanismo natural dos tipos de vegetação caducifólia. O LAI (Figura 1B) nas duas regiões apresentou tendências diferentes, isto é, a região modificada apresentou sazonalidade bem definida, o que não aconteceu com a natural que praticamente não mostrou o período de maior estresse hídrico. Ainda na comparação dos padrões apresentados pelo NDVI e LAI pode se observar que LAI e NDVI da região modificada apresentam sazonalidade definida diferentemente da comparação do LAI e NDVI da região natural onde o LAI não acompanha a tendência do NDVI, com sazonalidade definida. 3.2 Relações empíricas (NDVI x LAI x Precipitação) Os resultados da Tabela 1 mostram a matriz de correlações das variáveis observacionais (precipitação, NDVI e LAI) e as simuladas (LAI e NPP) para as duas regiões de estudo (vegetação natural e modificada). As correlações de precipitação com NDVI e com LAI foram maiores na área modificada (0.56 e 0.05) do que na natural (0.61 e 0.51), isto é explicado em parte pelo fato da área modificada apresentar maior extensão de estrato gamíneo-herbáceo, incluindo as culturas agrícolas, que têm forte relação com a precipitação, isto é, acréscimos de precipitação estão associados a acréscimos de cobertura vegetal, seja do estrato gramíneo-herbáceo seja das culturas agrícolas, de igual maneira decréscimos da precipitação estão associados a decréscimos da cobertura vegetal. Já no caso da região natural a presença de um estrato arbustivo e arbóreo maior (do que na região modificada) faz com que a cobertura vegetal seja um pouco menos sensível a precipitação. Ainda existe a participação de outras variáveis envolvidas no processo de desenvolvimento e de dinâmica sazonal que não foram incluídas nas análises deste trabalho, como o fogo que tem um papel importante, tanto em estratos fitofisionômicos gramíneo-herbáceos como nos arbustivos. A correlação de LAI e NDVI também foi maior na área modifica (0. 96) do que na natural (0. 74), indicando que a sazonalidade da vegetação é mais bem representada na área modificada. Em geral, estes resultados mostram a influência dos estratos fitofisonômicos e dos usos da terra na explicação do comportamento das variáveis bióticas (NDVI e LAI) nas duas áreas de estudo. Tabela 1 - Matriz de correlações da precipitação e dos índices de vegetação (NDVI) e área foliar (LAI). As correlações significativas (p<0.005) estão em negrito. O tamanho da amostra é N: 23 a b c d e f A Precipitação (Natural) 1.00 B Precipitação (Modificada) 0.91 1.00 C NDVI (Natural) 0.56 0.41 1.00 D NDVI (Modificada) 0.75 0.61 0.94 1.00 E LAI (Natural) 0.05-0.11 0.74 0.57 1.00 F LAI (Modificada) 0.69 0.51 0.88 0.96 0.57 1.00 4 CONCLUSÕES Era esperada uma relação direta entre a sazonalidade da precipitação e a dos índices de vegetação (NDVI) e de área foliar (LAI). No entanto foi detectada uma relação diferenciada

entre estas variáveis dependendo do tipo de região, natural ou modificada (Cerrado desmatado). A precipitação é uma das principais variáveis que influencia o padrão de distribuição espacial e temporal da vegetação no Cerrado. No entanto, esta influência (da precipitação na vegetação) é diferenciada, sendo mais direta na região modificada, com dominância de estratos fitofisionômicos gramíneo-herbáceo e arbustivo e ainda amplas áreas com culturas agrícolas dependentes de precipitação (agricultura extensiva), do que na região natural, com dominância de estrato arbóreo, onde a dependência da precipitação é menos direta. A sazonalidade da precipitação é melhor retrata com NDVI do que com LAI nas duas regiões analisadas, natural e modificada, demonstrando maior sensibilidade do NDVI a sazonalidade da precipitação na região do Cerrado. Além da precipitação outros fatores abióticos importantes como luz solar, temperatura, entre outros, interagem para influenciar mais integralmente no padrão de distribuição espacial e sazonal da vegetação na região do cerrado. A ação conjunta dessas variáveis pode ser conseguida a partir do uso do modelo integrado de biosfera (IBIS) que simula o desenvolvimento da vegetação a partir da produtividade primária liquida (NNP) da vegetação que é passível de comparação com o NDVI. Esta ultima relação será analisada no trabalho complementar Variabilidade sazonal do clima e da vegetação no bioma Cerrado: II. Representação com o modelo de biosfera IBIS. 5 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS IPCC, 2001. Climate Change 2001: Impacts, Adaptation, and Vulnerability. Contribution of Working Group II to the Third Assessment Report of the Intergovernmental Panel on Climate Change. James J. McCarthy, Osvaldo F. Canziani, Neil A. Leary, David J. Dokken, Kasey S. White (Eds) (Cambridge: Cambridge University Press). FOLEY, J. A., PRENTICE, I. C., RAMANKUTTY, N., LEVIS, S., POLLARD, D., SITCH, S., HAXELTINE, A., 1996. An integrated biosphere model of land surface processes, terrestrial carbon balance and vegetation dynamics. Global Biogeochemical Cycles, 10 (4), 603-628. KUCHARIK, C.J. FOLEY, J. A., DELIRE, C., FISHER, V. A., COE, M. T., GOWER, S. T., LENTERS, J., MOLLING, C., NORMAN, J. M., RAMANKUTTY, N. 2000. Testing the performance of a dynamic global ecosystem model: water balance, carbon balance, and vegetation structure. Global Biogeochemical Cycles, 14(3): 795-825. LIETH, H; WHITTAKER, R. H. 1975. Primary productivity of the biosphere (Berlin: Springer-Verlag). CHAPIN, F. S. III; MATSON, P.; MOONEY, H. 2002. Principles of terrestrial ecosystem ecology (New York: Springer-Verlag). SCHUUR, E.A. 2003. Productivity and global climate revisited: the sensitivity of tropical forest growth to precipitation. Ecology, 84, 165-1170. HUXMAN, T.; SMITH, M; FAY, P.A; KNAPP, A.K.; SHAW, R.; LOIK, M.E.; SMITH, S.D.; TISSUE, D.T.; ZAK, J.C.; WELTZIN, J.F.; POCKMAN, W.T.;SALA, O.E.; HADDAD, B.B.; HARTE, J.; KOCH, G.W.; SCHWINNING, S.; SMALL, E.E.; WILLIAMS, D.G. 2004. Convergence across biomes to a common rain-use efficiency. Nature, 429, 651-654.