XXI CONGRESO LATINOAMERICANO DE HIDRÁULICA SÃO PEDRO, ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL, OCTUBRE, 2004. SIMULAÇÃO DO TEMPO DE RESIDÊNCIA DA LAGOA DOS PATOS



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Transcrição:

Hidráulica AmbientalMonferrer IAHR AIPH XXI CONGRESO LATINOAMERICANO DE HIDRÁULICA SÃO PEDRO, ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL, OCTUBRE, 2004. SIMULAÇÃO DO TEMPO DE RESIDÊNCIA DA LAGOA DOS PATOS Régis S. Pereira¹; Luis Felipe H. Niencheski² ¹ Fundação Universidade Federal do Rio Grande Mestre em Eng. Oceânica. Brasil. regissp@vetorial.net ² Fundação Universidade Federal do Rio Grande. Lab Hidroquimica. Brasil. dqmhidro@furg.br RESUMO: A hidrografia da Lagoa dos Patos é controlada pelos ciclos hidrológicos do conjunto de rios e lagos que fazem parte desta bacia hidrográfica. A circulação desta lagoa é dominada pelos ventos que influenciam a dinâmica deste sistema, afetando diretamente o tempo de residência. O objetivo é simular a circulação da Lagoa dos Patos e avaliar a influência do vento no tempo de residência. A simulação hidrodinâmica foi feita utilizando o modelo Delft3D- FLOW. Os resultados da simulação demonstraram que o modelo representou bem a circulação da lagoa, já que os resultados simulados foram próximos aos valores reais. A simulação do tempo de residência indica que este depende principalmente das descargas do rio Guaíba e da ação do vento. Os resultados do tempo de residência sem a ação do vento, varia de 20 dias para períodos de altas descargas à 35 dias para períodos de baixa descargas. Quando o vento é aplicado a modelo, o tempo de residência varia de 18 dias para períodos de altas descargas e ventos de quadrante norte e 28 dias para baixas descargas e ventos de quadrante sul. Os resultados do modelo apresentaram que o modelo foi validado com uma boa representação da situação ao qual foi submetido, permitindo determinar o tempo de residência da Lagoa dos Patos, ficando entre 18 e 38 dias, dependendo da orientação e intensidade dos ventos predominantes no sistema. PALAVRAS CHAVE: Lagoa dos Patos, simulação, Delft3D. ABSTRACT: The hydrograph of the Patos Lagoon is controlled by the hydrological cycles of the set of rivers and lakes that are part of this hydrographical basin. The circulation of this lagoon is dominated by the wind that influences the dynamic of this system, affecting directly the residence time. The objective of this work is to simulate the circulation of the Patos Lagoon and evaluate the influence of the wind in the residence time. The hydrodynamics simulation was made using Delft3D-FLOW module. The results of the simulations demonstrated that the model represents well the circulation of the lagoon, since the simulated results were closed to sampling values. The simulation of residence time indicates that it depends mainly on the discharges of the Guaíba River and the wind action. The results of residence time without the wind action, varied of 20 days for periods of high discharges and 35 days for low discharges period. When the wind action is applied to model, the residence time varied from 18 days for periods of high discharges and North winds and 38 days for the low discharges under South wind effect. The results indicated that the model was validated and it represents well the situation that was submitted, allowing to determine that the residence time of Patos Lagoon is 28 days, varying between 18 and 38 days, depending on the orientation and intensity of the wind predominant in the system.

INTRODUÇÃO A avaliação do tempo de residência é de fundamental importância para o estudo dos processos químicos e biológicos que ocorrem nos corpos d água, uma vez que a determinação do tempo de residência permite conhecer a dinâmica, concentração, diluição e permanência das substâncias no sistema, tendo implicações diretas na qualidade da água (AMBROSETTI et al., 2003). Deixando de lado as relações entre nutrientes e a atividade biológica, assim como as fontes e transformações dos constituintes na água, Ambrosetti (2003) afirma que o tempo de residência é que controla a concentração e capacidade acumulativa de todas substâncias presentes no sistema. A evolução destas substâncias pode ser prevista somente pelo conhecimento do tempo de residência. Deste modo, a determinação deste tempo de um sistema como a Lagoa dos Patos é indispensável para avaliação da qualidade ambiental deste sistema, já que suas águas são utilizadas para os mais diversos usos, como por exemplo: recreação, pesca, navegação, irrigação, abastecimento, etc. (PEREIRA, 2003). Portanto, este trabalho tem como objetivo validar e aplicar um modelo hidrodinâmico, para avaliação do tempo de residência da Lagoa dos Patos. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO A Lagoa dos Patos está situada no sul do Brasil e é uma das maiores lagoas costeiras do mundo. Esta lagoa tem 250km de extensão e uma largura média de 40km. A hidrografia da Lagoa dos Patos é controlada pelos ciclos hidrológicos do conjunto de rios e lagos que fazem parte da sua bacia hidrográfica (HERZ, 1977). Cerca de 85% da água doce que chega a Lagoa dos Patos é proveniente dos rios Guaíba, Camaquã e do canal do São Gonçalo (WINDOM et al., 1999), localizados nas partes norte, central e sul da lagoa respectivamente (Figura 1). Figura 1: Localização da Lagoa dos Patos e seus principais tributários. As descargas de água doce variam consideravelmente dos meses de verão e outono para os meses de inverno e primavera. (6 a 5300 m 3 s -1 na bacia do Camaquã e 41 to 25000 m 3 s -1 na bacia hidrográfica do Guaíba) (HERZ, 1977). Em anos de maior influência do El niño, as descargas ultrapassam os seus valores médios. Em regimes de enchente, descarga do Canal do São Gonçalo é controlada por comportas que obstruem a penetração da água salgada do estuário para a Lagoa Mirim. A região da Lagoa dos Patos é influenciada por ventos NE-SW predominantemente. Ventos de nordeste (3,6 a 5,1 m s -1 ) ocorrem durante 22% do ano, enquanto que ventos de sudoeste (5,7 to 8,2 m s -1 ) ocorrem durante 12% do ano. A direção do vento é predominantemente de nordeste entre os meses de

setembro a abril e de sudoeste entre os meses de maio a outubro (GARCIA, 1997). Os regimes de fluxo na lagoa estão relacionados aos desníveis que ocorrem dentro da lagoa e na zona costeira ocasionados por estes ventos. Ventos de NE tendem a baixar o nível do mar na barra, impelindo as águas da lagoa para o Canal do Norte ocasionando o escoamento das mesmas em direção ao mar (regime de vazante). Os ventos de SW e SE, pelo contrário, elevam o nível do mar na barra, impelindo a água do sistema lagunar para o interior e formando uma corrente do mar para a lagoa (regime de enchente). A circulação é, portanto, dominado pela ação destes ventos que interferem diretamente no tempo de residência da lagoa (MOLLER, 1996; FERNANDES, 2001). PREPARAÇÃO DO MODELO A simulação da dinâmica da Lagoa dos Patos foi realizada usando o módulo FLOW do sistema de modelagem Delft3D da Delft Hydraulics. A construção da grade computacional foi feita suavizando as margens da lagoa, para obter o maior número de células ortogonais a fim de reduzir os erros numéricos durante as simulações. A resolução da grade utilizada foi de 400x20 células (Figura 2). As condições de contorno utilizadas no modelo foram: fronteiras fechadas (margens da lagoa) e fronteiras abertas (rios Guaíba e Camaquã, canal do São Gonçalo e Molhes da Barra) (Figura 2). Na condição de contorno do rio Guaíba foi estabelecida a distribuição temporal de descargas para o período de simulação, assim como no rio Camaquã e no canal do São Gonçalo. A condição de contorno sul (Molhes da Barra) foi prescrita como maré semi-diurna com amplitude de 0,5m, freqüência de 28,8h e fase de 233º (HERZ, 1977). Figura 2: Grade e localização das condições de contorno do modelo. A validação do modelo foi realizada utilizando a salinidade, procedimento bastante comum, pois segundo Wang (1999) representa muito bem os processos de transporte do sistema. Para a validação e determinação do tempo de residência foram utilizados os dados do Programa Mar de Dentro, que durante o período entre fevereiro de 1999 e janeiro de 2000, foram realizados 11 cruzeiros. Nestas campanhas de campo foram coletadas amostras em 8 estações dentro do corpo da lagoa, no seu eixo principal, 3 estações nos principais tributários (Rio Guaíba, Rio Camaquã e Canal do São Gonçalo) e ainda uma estação na plataforma, logo em seguida da saída dos Molhes da Barra (Figura 3). Já tempo de residência foi obtido após a validação do modelo, adicionando um traçador à descarga do rio Guaíba e medindo o tempo que esse traçador leva para chegar ao estuário.

Figura 3: Estações de amostragem do Programa Mar de Dentro. RESULTADOS E DISCUSSÃO Para validar o modelo e obter a circulação da lagoa, a salinidade obtida nos cruzeiros de amostragem foi comparada com os valores simulados. A estação 8 de amostragem é a mais próxima a saída do estuário para o oceano, por isso esta região apresenta maior profundidade e presença de cunha salina, tornando essa região mais complexa em termos hidrodinâmicos. Apesar destas características, os resultados da simulação representaram quase que exatamente os valores amostrados (Figura 4b). Na estação 7 o modelo apresentou valores calculados e medidos bem próximos no período de vazante e alguns desvios durante períodos de enchente. Entre dezembro de 1999 e janeiro de 2000, altos valores de salinidade (maiores que 25) foram encontrados, enquanto que deveriam ser encontrados valores entre 10 e 15 (Figura 4a). Estes resultados são devido à localização da estação, pois a estação 7 está localizada na parte superior do estuário, que é uma região de mistura da água doce com a água salgada proveniente do oceano, além disso nesta região a profundidade tem uma brusca variação de 6m para 1m, resultando numa região de alta turbulência, que não conseguiu ser reproduzida pelo modelo. Salinidade a 35,00 30,00 25,00 20,00 15,00 10,00 5,00 0,00 P7 dez-98 jan-99 fev-99 mar-99 abr-99 mai-99 jun-99 jul-99 ago-99 set-99 out-99 nov-99 dez-99 jan-00 fev-00 Salinidade b 35,00 30,00 25,00 20,00 15,00 10,00 5,00 0,00 P8 dez-98 jan-99 fev-99 mar-99 abr-99 mai-99 jun-99 jul-99 ago-99 set-99 out-99 nov-99 dez-99 jan-00 fev-00 Figura 4: Distribuição da salinidade ao longo do tempo na estação 7 (a) e 8 (b). Observando a estação 6 os resultados simulados são mais próximos aos reais que na estação 7, isto se deve ao fato de que nesta região a circulação é mais estável em função da menor turbulência. A estação 5 também apresenta o mesmo comportamento, entretanto, com valores simulados sempre um pouco menores que os reais, assim como a estação 4, onde a salinidade é ainda menor. O comportamento diferenciado das estações 4 e 5 é provavelmente ao vento aplicado ao modelo, pois o vento utilizado foi o registrado em Rio Grande (Figura 1), sem levar em consideração a variação espacial desta forçante. Porém estas estações podem estar sobre a influência de ventos da porção norte da lagoa. Já as estações 1, 2 e 3 não apresentam qualquer influência da salinidade. Os resultados obtidos pelo módulo hidrodinâmico do Delft3D, foram

similares aos obtidos por Moller (1996), Fetter (1998) e Castelão (1999), todos usando o POM (Princetom Ocean Model). Depois de estabelecer as condições hidrodinâmicas da Lagoa dos Patos, passou-se a fase de avaliação do tempo de residência e sua variação em função do vento. Para tal análise foi adicionado um traçador à descarga do rio Guaíba (seção 1, Figura 5a) e determinado o tempo que esse traçador levou para atingir o estuário (seção 2, Figura 5b). Figura 5: Traçador saindo do Guaíba (a); traçador atingindo o estuário (b). Em um primeiro momento, não foi aplicado o vento na lagoa, nestas condições o tempo que o traçador levou para atingir a seção 2 variou de 20 dias para períodos de altas descargas (±11200 m 3 s -1 ) a 35 dias para períodos de baixas descargas (±4500 m 3 s -1 ). Já aplicando a ação do vento ao modelo foi obtido tempos de residência variando de 18 dias para períodos de altas descargas e ventos de quadrante norte a 38 dias para baixas descargas combinadas com ventos de quadrante sul (Tabela 1). Niencheski (1994) determinou um tempo de residência da de 20 dias, porém este valor foi obtido levando em conta um valor médio de descarga da lagoa, não mencionado pelo autor, o que leva a crer que tanto o valor da descarga quanto a uniformidade espacial utilizadas por Niencheski tenham produzido a diferença citada. Tabela 1: Variação do tempo de residência. Período Sem ação do Com ação do vento (dias) vento (dias) Dezembro 1998 33 30 Janeiro 1999 35 35 Fevereiro 1999 35 38 Março 1999 35 32 Abril 1999 33 36 Maio 1999 33 36 Junho 1999 29 31 Julho 1999 27 29 Agosto 1999 20 18 Setembro 1999 25 22 Outubro 1999 29 25 Novembro 1999 30 28 Dezembro 1999 33 30 Janeiro 2000 35 35 Fevereiro 2000 35 38

CONCLUSIONS O uso da salinidade para validar o modelo demonstrou bons resultados, uma vez que a simulação apresentou valores próximos aos reais, com exceção das estações 4 e 5. Entretanto, os desvios observados não foram devido ao modelo e sim aos dados de descarga e ventos, pois só foi possível obter as descargas médias mensais e ventos sem variação espacial. Os resultados mostraram que ventos de nordeste diminuem o tempo de residência, assim como altas descargas dos tributários. Enquanto que ventos de sudoeste e baixas descargas aumentam o tempo de permanência da água na lagoa. A combinação de ventos nordeste com altas descargas resultam em um tempo de residência de 18 dias, enquanto que ventos de sudoeste e baixas vazões determinam um tempo de residência de 38 dias. Assim conclui-se que o tempo de residência da lagoa é dependente da combinação da intensidade e direção dos ventos com as descargas dos principais tributários. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: AMBROSETTI, W.; BARBANTI, L.; SALA, N. Residence time and physical processes in lakes. Journal of Limnology. v.67, p. 1-15, 2003. CASTELÃO, R. M. Estudo da dinâmica da Lagoa dos Patos através da modelagem numérica. 1999. 83p. Monografia (Graduação em Oceanologia) - Fundação Universidade Federal do Rio Grande, Rio Grande, 1999. FERNANDES, E. H. L. Modelling the hydrodynamics of Patos Lagoon. 2001. 198p. Thesis (Ph.D.) - University of Plymouth, 2001. FETTER, A. R. H. Estudo da circulação e processos de mistura da Lagoa dos Patos através do modelo de circulação oceânica da Universidade de Princeton (POM). 1998. Oceanografia (Mestrado) - Fundação Universidade Federal do Rio Grande, Rio Grande, 1998. GARCIA, C. A. E. Hydrographic Characteristics. IN: SEELIGER, U.; ODEBRECHT, C.; CASTELLO, J. P. Subtropical Convergence Environmental. Germany: Springer-Verlag, 1997. p. 20-24. HERZ, R. Circulação da águas de superfície da Lagoa dos Patos. 1977. 722p. Tese (Doutorado em Oceanografia) - Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas. Departamento de Geografia.Universidade de São Paulo, São Paulo, 1977. MOLLER, O. J. Hydrodinamique de la Lagune dos Patos (30ºS Brésil): mesures et modélisation. 1996. 199p. Tese (Doutorado em Oceanografia) - L Universite Bourdeaux, Bourdeaux, 1996. NIENCHESKI, L. F.; WINDOM, H. L. Nutrient Flux and Budget in Patos Lagoon estuary. The Science of the Total Environment. v.149, p. 53-60, 1994. PEREIRA, R. S. Processos que regem a qualidade da água da Lagoa dos Patos, segundo o modelo Delft3D. 2003. 149p. Dissertação (Mestrado em Engenharia Oceânica) - Fundação Universidade Federal do Rio Grande, 2003. WANG, P. F.; MATIN, J.; MORRISON, G. Water Quality and Eutrophication in Tampa Bay, Florida. Estuarine, Coastal and Shelf Science. v.49, p. 1-20, 1999. WINDOM, H. L.; NIENCHESKI, L. F.; SMITH, R. G. Biogeochemistry of Nutrients and Trace Metals in the Estuarine Region Patos Lagoon (Brazil). Estuarine, Coastal and Shelf Science. v.48, p. 113-123, 1999.