MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO AUDITORIA INTERNA SECRETARIA DE ORIENTAÇÃO E AVALIAÇÃO PARECER CORAG/SEORI/AUDIN-MPU Nº 129/2014 Referência : Correio eletrônico de 27/9/2013. Protocolo AUDIN-MPU nº 1295/2013. Ofício nº 3489/2013/MPF/PR-TO/CHEFIA. PR-TO-00011312/2013. Assunto : Acidente envolvendo veículo oficial e motocicleta. Ausência de perícia técnica e registro de ocorrência. Sindicância. Interessado : Procuradoria da República no Estado do Tocantins. Trata-se de consulta encaminhada pelo Excelentíssimo Senhor Procurador-Chefe da PR/TO, por meio da qual solicita manifestação deste Órgão de Controle Interno acerca de qual procedimento adotar no caso de acidente de trânsito, ocorrido em 17/9/2013, que culminou em avarias em veículo oficial da Unidade, em consequência de colisão com motocicleta. 2. Asseverou o i. Consulente que a consulta foi realizada em razão de o Técnico do MPU/Apoio Técnico-Administrativo/Segurança Institucional e Transporte responsável pela condução do veículo ter decidido retirar-se do local sem solicitar perícia ou registrar boletim de ocorrência. Informa ainda que, conforme relato do mencionado servidor, este resolveu retirar-se do local, porque não houve qualquer dano físico ao piloto da motocicleta e, ainda, por ter observado a total falta de condição financeira do motociclista para arcar com eventuais prejuízos. Acrescenta também que o servidor comunicou o ocorrido ao Chefe do Setor de Transporte da PR/TO, providenciando o conserto do veículo às suas próprias expensas. 3. Diante disso, considerando o disposto na Portaria PGR n.º 513/2013 e as informações consubstanciadas no Parecer CORAG/SEORI/AUDIN-MPU/Nº 108/2008, questionou: a) o servidor que conduzia o veículo oficial dispôs-se ao pagamento dos prejuízos havidos no acidente. Todavia, não foi realizada perícia. Nesse caso, deve-se instaurar a sindicância ou PAD para apurar a desobediência à obrigação de permanecer no local do acidente até a realização da perícia e de registrar a ocorrência na Delegacia de Polícia (Portaria PGR n.º 513/2003, art. 18, 1º)? OU b) sendo a finalidade da perícia e do registro da ocorrência na Delegacia de Polícia permitir a apuração da responsabilidade pelos eventuais danos resultantes do acidente, para que, em seguida, sejam adotadas as medidas tendentes à reparação dos prejuízos havidos, poder-se-ia entender 1/7 sel-129-2014i-acidente veículo oficial. sindicância. PR-TO.doc
prejudicada essa obrigação pela opção imediata do servidor de arcar com todas as despesas, dispensando assim a instauração de qualquer procedimento disciplinar? 4. Em exame, inicialmente, cumpre salientar que, conforme assentado no item 4 do Parecer mencionado pela Unidade, segundo as disposições da Lei nº 8.112/90, o servidor responde civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular de suas atribuições, por conduta dolosa ou culposa, sendo tais responsabilidades independentes entre si, na medida em que o agente público poderá ser obrigado a ressarcir eventual dano (responsabilidade civil) e não estar sujeito a sanção administrativa, por não haver, na conduta, infração disciplinar (responsabilidade administrativa), vejamos: Art.121. O servidor responde civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular de suas atribuições. Art.122. A responsabilidade civil decorre de ato omissivo ou comissivo, doloso ou culposo, que resulte em prejuízo ao erário ou a terceiros. ( ) 2º Tratando-se de dano causado a terceiros, responderá o servidor perante a Fazenda Pública, em ação regressiva. ( ) Art.124. A responsabilidade civil-administrativa resulta de ato omissivo ou comissivo praticado no desempenho do cargo ou função. Art.125. As sanções civis, penais e administrativas poderão cumular-se, sendo independentes entre si. Art.126. A responsabilidade administrativa do servidor será afastada no caso de absolvição criminal que negue a existência do fato ou sua autoria. (destacamos) 5. Por outro lado, se da irregularidade no exercício das atribuições, houver o cometimento de infração disciplinar, o servidor ficará sujeito às penalidades previstas no art. 127 da Lei nº 8.112/90, devendo a Administração observar, na fixação da sanção, as disposições estabelecidas no art. 128, ambos abaixo transcritos, com os pertinentes destaques: Art. 127. São penalidades disciplinares: I - advertência; II - suspensão; III - demissão; IV - cassação de aposentadoria ou disponibilidade; V - destituição de cargo em comissão; VI - destituição de função comissionada. 2/7 sel-129-2014i-acidente veículo oficial. sindicância. PR-TO.doc
Art. 128. Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais. Parágrafo único. O ato de imposição da penalidade mencionará sempre o fundamento legal e a causa da sanção disciplinar. (grifo nosso) 6. A Lei em referência também disciplina os procedimentos a serem adotados para apuração de eventuais irregularidades praticadas por servidor público, que poderá, na literalidade da Lei, ocorrer mediante a instauração de sindicância ou processo administrativo disciplinar, consoante preceitos a seguir reproduzidos: Art. 143. A autoridade que tiver ciência de irregularidade no serviço público é obrigada a promover a sua apuração imediata, mediante sindicância ou processo administrativo disciplinar, assegurada ao acusado ampla defesa. 1º. Revogado 2º Revogado 3º A apuração de que trata o caput, por solicitação da autoridade a que se refere, poderá ser promovida por autoridade de órgão ou entidade diverso daquele em que tenha ocorrido a irregularidade, mediante competência específica para tal finalidade, delegada em caráter permanente ou temporário pelo Presidente da República, pelos presidentes das Casas do Poder Legislativo e dos Tribunais Federais e pelo Procurador-Geral da República, no âmbito do respectivo Poder, órgão ou entidade, preservadas as competências para o julgamento que se seguir à apuração. (Incluído pela Lei nº 9.527, de 10.12.97) Art. 144. As denúncias sobre irregularidades serão objeto de apuração, desde que contenham a identificação e o endereço do denunciante e sejam formuladas por escrito, confirmada a autenticidade. Parágrafo único. Quando o fato narrado não configurar evidente infração disciplinar ou ilícito penal, a denúncia será arquivada, por falta de objeto. Art. 145. Da sindicância poderá resultar: I - arquivamento do processo; II - aplicação de penalidade de advertência ou suspensão de até 30 (trinta) dias; III - instauração de processo disciplinar. Parágrafo único. O prazo para conclusão da sindicância não excederá 30 (trinta) dias, podendo ser prorrogado por igual período, a critério da autoridade superior. Art. 146. Sempre que o ilícito praticado pelo servidor ensejar a imposição de penalidade de suspensão por mais de 30 (trinta) dias, de demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade, ou destituição de cargo em comissão, será obrigatória a instauração de processo disciplinar. (grifamos) 3/7 sel-129-2014i-acidente veículo oficial. sindicância. PR-TO.doc
7. Nesse sentido, importa ressaltar que a sindicância administrativa é um procedimento apuratório sumário que tem o objetivo de apurar a autoria, a natureza, as circunstâncias da irregularidade praticada, que possa resultar na aplicação de penalidade de advertência ou de suspensão de até 30 (trinta) dias (art. 145, II). Por sua vez, o Processo Administrativo Disciplinar é o procedimento apuratório a ser utilizado quando a conduta levada a efeito pelo servidor ensejar a aplicação de penalidade de suspensão por mais de 30 (trinta) dias, de demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade, ou destituição de cargo em comissão (art. 146). 8. Portanto, em linhas gerais, quando a autoridade competente tiver ciência de irregularidade deverá promover a apuração dos fatos para fins de ressarcimento de eventual dano ao erário, verificar se, da conduta, resultou infração disciplinar e quais as penalidades a serem aplicadas, conforme a gravidade, e, ainda, na hipótese de a infração configurar ilícito penal providenciar o encaminhamento dos autos ao Ministério Público (art. 154, parágrafo único, da Lei nº 8.112/90). 9. Quanto às espécies do gênero irregularidades funcionais, como pode-se depreender da norma e sem a pretensão de esgotar o assunto, alcançam, por exemplo, eventuais danos causados ao erário (dano a veículo, por exemplo), condutas que configurem a inobservância de deveres funcionais, como os previstos no art. 116, ou práticas que incidam nas proibições do art. 117 do Estatuto do Servidor Público. A propósito, veja-se o que dispõe o art. 129 da Lei nº 8112/90 sobre as irregularidades passíveis de aplicação da penalidade de advertência: Art. 129. A advertência será aplicada por escrito, nos casos de violação de proibição constante do art. 117, incisos I a VIII e XIX, e de inobservância de dever funcional previsto em lei, regulamentação ou norma interna, que não justifique imposição de penalidade mais grave.(destacamos) 10. Nesse momento é importante observar que a Lei se refere a irregularidade como gênero, em sentido amplo, sem deixar margem, em princípio, para que o gestor público pudesse dispensar a instauração de procedimento apuratório em nenhuma hipótese. Todavia, faz-se necessário obtemperar a literal disposição da Lei com os princípios estabelecidos no art. 37 da Constituição Federal, especialmente o da eficiência, e com o princípio fixado no art. 14 do Decreto-Lei 200/1967, os quais são de observância obrigatória pelo Administrador Público, vejamos: CONSTITUIÇÃO FEDERAL Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: 4/7 sel-129-2014i-acidente veículo oficial. sindicância. PR-TO.doc
DECRETO-LEI 200/1967 Art. 14. O trabalho administrativo será racionalizado mediante simplificação de processos e supressão de controles que se evidenciarem como puramente formais ou cujo custo seja evidentemente superior ao risco. 11. Assim, s.m.j, entende-se possível que, uma vez alcançada a concretização material e efetiva da finalidade de interesse público posta pela Lei, em homenagem ao princípio constitucional da eficiência, seja dispensada a abertura de sindicância naquelas hipóteses de condutas de menor gravidade, sem dolo, sem má-fé, sem prejuízo ao interesse público, pois que de outra forma seria privilegiar a simples burocracia, o desperdício de recursos públicos, em detrimento dos princípios que regem a atuação do Administrador Público. A avaliação sobre a não instauração de sindicância em cada caso deverá levar em conta, por exemplo, a natureza e a gravidade da conduta, a ausência de dolo e de danos, as circunstâncias que envolvem os acontecimentos, os riscos ao interesse público, bem como os antecedentes funcionais do servidor. 12. Nesse sentido, da possibilidade de dispensa de instauração de sindicância, tem-se o disposto nos arts. 18 e 19 da Portaria PGR n.º 513/2003, abaixo transcritos, a qual estabelece que em caso de colisão de veículo oficial, eventual procedimento apuratório deverá ser instaurado somente quando for necessário, in verbis: Art. 18. Aos motoristas será atribuída a responsabilidade pelo cometimento de infração de trânsito e implicará no pagamento da multa por parte do motorista infrator, independente de qualquer outra penalidade cabível, devendo ser obedecido o procedimento estabelecido em ordem de serviço própria. Art. 19. Será instaurado, quando necessário, sindicância ou processo administrativo disciplinar, caso haja acidente e resulte em dano ao erário ou a terceiros, com o fito de apurar a responsabilidade. 1º Em caso de colisão de veículo oficial, fica o motorista obrigado a permanecer no local do acidente até a realização de perícia, bem como comunicar à Seção de Transportes sobre o sinistro e registrar ocorrência na Delegacia de Polícia. 2º Se o laudo pericial, sindicância ou processo administrativo disciplinar concluir pela responsabilidade (dolo ou culpa) do condutor do veículo, este responderá pelos danos causados, pelas avarias e quaisquer prejuízos resultantes do acidente e indenizará o erário. 3º Se o laudo pericial, sindicância ou processo administrativo disciplinar concluir pela responsabilidade (dolo ou culpa) de terceiro envolvido, a Instituição oficiará ao condutor ou proprietário do veículo para o devido ressarcimento dos prejuízos causados. Havendo omissão, o procedimento deverá ser encaminhado à Advocacia-Geral da União. (grifamos) 5/7 sel-129-2014i-acidente veículo oficial. sindicância. PR-TO.doc
13. Dessume-se do normativo interno que a abertura de procedimento destinado a apurar a responsabilidade, mesmo em caso de acidente com danos, não será obrigatória em todos os casos, em respeito ao princípio constitucional da eficiência, da economicidade e do alcance da finalidade de interesse público. Numa segunda linha de comando, a norma descreve que em caso de colisão de veículo oficial caberá ao motorista: aguardar no local a realização de perícia, providenciar o registro da ocorrência e, ainda, comunicar à Seção de Transporte sobre o acidente, que configuram procedimentos preliminares com vistas a apurar eventual responsabilização e a resguardar o interesse público. 14. Desse modo, tem-se que, segundo já consubstanciado no Parecer CORAG/SEORI/AUDIN-MPU Nº 108/2008, na hipótese de acidente, a Administração deve se orientar, na apuração de eventual responsabilidade civil (reparação de possíveis danos ao erário ou a terceiros) pelo laudo da perícia técnica realizada, sendo a abertura de sindicância somente necessária quando, apontado como responsável pelo acidente o servidor público, este se recusar a ressarcir ao erário o dano causado ou na hipótese de o veículo ter sido usado para fins diversos do previsto na Portaria PGR nº 513/2003. Outrossim, conforme também enunciado no Parecer retro (itens 5 e 7), a apuração de irregularidades no desempenho das atribuições tem a finalidade de ressarcir o dano (responsabilidade civil), bem como aplicar eventual penalidade cabível, conforme a infração disciplinar porventura existente (responsabilidade administrativa). 15. No caso em tela, o servidor retirou-se voluntariamente do local do acidente, não solicitou a realização da perícia técnica e não registrou Boletim de Ocorrência no Órgão competente, ao que parece, fundado na consciência de que, não havendo vítima e se responsabilizando pelos prejuízos ao erário, tais procedimentos estariam dispensados. A voluntariedade parece não ter sido no sentido de omitir a conduta a que está obrigado pela norma interna (permanecer no local do acidente e aguardar a perícia), mas foi dirigida e a um primeiro súbito de vista, pode ter sido por erro ao atendimento do interesse público na reparação do dano, dada a informação que o outro envolvido não detinha condições de arcar com o conserto do veículo oficial. De fato, conforme anuncia a Unidade, o servidor espontaneamente pagou os custos do reparo do veículo oficial. Em princípio, instaurar sindicância para apurar o caso pode significar simples medida burocrática, tendo em vista, inclusive, que o ressarcimento do dano fora efetuado, em conformidade com o caput do art. 19 da Portaria PGR nº 513/2003, acima colacionado. 16. A respeito da efetivação dos princípios referidos, em situações semelhantes, vale anotar que, no âmbito do Poder Executivo, a Instrução Normativa nº 4/2009 da Controladoria Geral da União estabelece que em caso de irregularidades consubstanciadas em extravio ou dano a bem público a apuração do fato será realizada por meio de simples Termo Circunstanciado Administrativo (TCA) e que o encerramento da apuração para fins disciplinares estará condicionado ao ressarcimento ao erário do valor correspondente ao prejuízo causado, consoante leitura dos arts. 1º e 4º, in litteris: Art. 1º Em caso de extravio ou dano a bem público, que implicar em prejuízo de pequeno valor, poderá a apuração do fato ser realizada por intermédio de Termo Circunstanciado Administrativo (TCA). 6/7 sel-129-2014i-acidente veículo oficial. sindicância. PR-TO.doc
( ) Art. 4º Verificado que o dano ou o extravio do bem público resultaram de conduta culposa do agente, o encerramento da apuração para fins disciplinares estará condicionado ao ressarcimento ao erário do valor correspondente ao prejuízo causado, que deverá ser feito pelo servidor público causador daquele fato e nos prazos previstos nos 3º e 4º do art. 2º. 17. Não se pode olvidar, no entanto, que o Regime Disciplinar instituído na Lei nº 8.112/90 visa coibir, evitar e reprimir condutas indesejáveis no serviço público, em desfavor da sociedade, não devendo se admitir comportamentos contrários ao interesse público sem a devida responsabilização pelos atos ou danos causados, essa é a regra, pois que a satisfação do interesse público deve ser o querer supremo do gestor público. 18. Nos termos do acima exposto, somos de parecer que a Autoridade competente, tendo como condicionantes as circunstâncias de cada caso concreto e o atendimento do interesse público, poderá dispensar a instauração de sindicância. É o parecer que submetemos à consideração superior. Brasília, 13 de janeiro de 2014. SELMA AVON CAROLINO VANDERLEI Analista do MPU/ Finanças e Controle De acordo. À consideração do Senhor Auditor-Chefe. JOSÉ GERALDO DO ESPÍRITO SANTO SILVA Coordenador de Orientação de Atos de Gestão Aprovo. Transmita-se à PR/TO e à SEAUD. Em / 1 /2014. MARA SANDRA DE OLIVEIRA Secretária de Orientação e Avaliação SEBASTIÃO GONÇALVES DE AMORIM Auditor-Chefe 7/7 sel-129-2014i-acidente veículo oficial. sindicância. PR-TO.doc