O Redobro de Clíticos no Dialeto Mineiro do Português Brasileiro e no Espanhol Rio-Platense
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- Ana Luiza Barreto Barateiro
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1 O Redobro de Clíticos no Dialeto Mineiro do Português Brasileiro e no Espanhol Rio-Platense Carolina Ribeiro Diniz Programa de Pós-Graduação em Lingüística Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) carolrib@terra.com.br Abstract. This paper aims to research the phenomenon of clitics doubling in Brazilian Portuguese spoken in the state of Minas Gerais, as well as to compare it with the River Plate Spanish. This phenomenon occurs whenever a clitic pronoun co-occurs with an internal argument of the verb. In sentences such as Eu te vi você, the presence of the clitic te co-occurring with the DP você may be interpreted as the existence of an agreement operation [AGREE] between the verb and the object. According to this, we will consider these clitics as manifestations of the (accusative) phi-feature in the finite verb, such as the agreement between the subject and the verb. Both agreement operations signal the assignment of structural Case. Keywords. Clitics doubling; case assignment; agreement; phi-features Resumo. O presente estudo tem por fim pesquisar o fenômeno do redobro de pronomes clíticos no dialeto mineiro do português brasileiro e no espanhol rioplatense, no âmbito do quadro teórico da gramática gerativa. Este fenômeno ocorre quando um pronome átono co-aparece com um argumento interno do verbo. Em frases como Eu te vi você, a presença do clítico te co-ocorrendo com o DP você reflete a existência de uma operação de concordância [AGREE] que se dá entre o verbo e o objeto. Desse modo, desenvolvemos uma teoria em que consideraremos que esses clíticos possuem estatuto semelhante ao de morfemas de concordância sujeito-verbo. Em ambas as situações, a concordância tem a função de permitir atribuição de Caso estrutural. Palavras-chave. Redobro de clíticos; atribuição de Caso; concordância; traçosphi 1. Introdução O presente estudo tem por fim pesquisar o fenômeno do redobro de clíticos no PB e no espanhol rio-platense, no âmbito do quadro teórico da gramática gerativa. Este fenômeno ocorre quando um pronome átono co-aparece com outro elemento (um XP), argumento temático do verbo lexical, conforme se vê pelo exemplo abaixo: (1) Eu te vi você. Estudos Lingüísticos XXXVI(1), janeiro-abril, p. 152 / 161
2 Estruturas como as de (1) representam um problema crucial para a teoria gerativa porque, de acordo com o filtro de Caso, o verbo pode atribuir Caso acusativo a um único argumento e, no entanto, no exemplo acima, o verbo ver estaria, aparentemente, (i) c- selecionando dois argumentos com uma mesma função sintática: o clítico te e o item você e (ii) atribuindo Caso acusativo duas vezes. Com base em dados como esse, a presente pesquisa pretende responder às seguintes questões: (2) a. Como se daria a atribuição de Caso em estruturas com redobro de clítico? b. Não seria o redobro de clíticos uma das maneiras como o verbo em PB atribui o Caso acusativo e realiza os traços-phi [+PESSOA acusativo ]? Assim sendo, uma das hipóteses que assumiremos no decorrer desta pesquisa é a de que o redobro de clíticos no PB seria parte de um epifenômeno mais geral decorrente de uma série de mudanças gramaticais pelas quais estaria passando o PB. Outra hipótese que aventaremos é a de que o redobro de clíticos acusativos em PB pode estar diretamente correlacionado com o mecanismo de atribuição de Caso acusativo. Segundo essa proposta, teríamos que, assim como o verbo apresenta traços-phi [PESSOA nominativo ] como reflexo da concordância entre sujeito-verbo, a ocorrência do clítico acusativo será também entendida como sendo reflexo da concordância entre o verbo e o seu objeto. Essa relação seria, ao final das contas, a maneira pela qual o PB realiza traços-phi [PESSOA acusativo ] no verbo. 2. Descrição do redobro de clíticos no PB O redobro de clíticos consiste na co-ocorrência de um pronome átono proclítico ao verbo e de um sintagma nominal ou preposicional como argumento interno do predicado da oração. Sejam os exemplos abaixo retirados do dialeto mineiro: Verbos transitivos diretos (3) Eu vou te i levar você i lá no carro. [Fala espontânea] (4) Faz as criança feliz e me i faz eu i feliz. [Reportagem do programa Via Brasil, Globo News, exibido em 11/02/06] (5) Eu te i esperei você i um tempão. [Fala espontânea] (6) João me i viu eu i. [Fala espontânea] (7) Você me i deixô eu i um pouquinho preocupada. [Corpus de BH-MG (Ramos, 2003)] (8) Foi essa doida que me i pôs eu i aqui. [Fala espontânea] (9) Igual outro dia que me i mandaram eu i pra reunião. [Fala espontânea] Verbos transitivos indiretos (10) Eu num vou te falar com você que se você vier... [Corpus Oral de Itaúna-MG (Oliveira, 2005)] (11) O funcionário... ah... ele me i perguntou pra mim i se eu trouxe os documentos. [Fala espontânea] Estudos Lingüísticos XXXVI(1), janeiro-abril, p. 153 / 161
3 (12) Eu te i dei o desconto procê i. [Fala espontânea] (13) Essa caneta, me i empresta pra mim i? [Fala espontânea] (14) Por que vocês não me i dão esse bebê prá mim i? [Fala espontânea] (15) Eu te i trouxe o livro procê i. [Fala espontânea] (16) Então eu aguardo ele me i falá comigo i. [Fala espontânea] Os dados explicitados acima mostram a ocorrência de redobro pronominal com a primeira e com a segunda pessoa do singular. Referente à terceira pessoa, observa-se que a ocorrência de redobro com os clíticos o(s)/a(s)/lhe(s) parece não mais acontecer, possivelmente, devido à não-produção de estruturas com este tipo de clítico no dialeto mineiro. Não obstante, Castilho (2005) aponta que a ocorrência desses clíticos em estruturas de redobro foi bastante produtiva no português medieval, conforme se pode ver abaixo: (17) a. E os religiosos o olhavam a ele. (SAID ALI, 1964:94) b. Izabel não buscava coroas, antes as coroas a buscavão a ella. (VIEIRA) c. Não lhe fora melhor a Sichen não ver a Diana. (VIEIRA) d. Ele não via nada, via-se a si mesmo. (MACHADO DE ASSIS) Atualmente, de acordo com os dados coletados até o momento, parece que o redobro no PB ocorre apenas quando o objeto (quer direto ou indireto) é um pronome carregando os traços [+eu, +tu]; à diferença do português clássico que permitia redobro de clíticos acusativos e dativos com pronomes pessoais, pronomes de tratamento em segunda pessoa, sintagmas nominais e com o pronome indefinido todos, conforme os exemplos de Gibrail (2003): (18) a....que também nos sacrificou a nós... (M. DE ALORNA; SÉC. XVIII; P.166) b....me fazia a mim uma visita o senhor estupor, meu amo... (A. COSTA; SÉC.XVII; P.111) c....e lhe traga a Vossa Excelência muito cedo as ordens (A. VIEIRA; CARTAS; SÉC. XVII; P.240) d. Mas se o intento de Christo era acautelarnos aos cathólicos. (A. VIEIRA; SERMÕES; SÉC.XVII; P. 89) e....e tomandoos a todos, que eraõ dezassete, lhos trouxeraõ atados (F. MENDES PINTO; SEC. XVI, P.22) Apesar de parecer que as ocorrências de redobro se restringem à primeira e à segunda pessoa do singular apenas, foi possível encontrar em nossos corpora uma única ocorrência que equivaleria à primeira pessoa do plural: o clítico se copiando os traços-phi [PESSOA acusativo ] do DP a gente na posição sintática de objeto, conforme vemos abaixo: (19)...se a gente não se gostar da gente... [Fala espontânea] Estudos Lingüísticos XXXVI(1), janeiro-abril, p. 154 / 161
4 Todas essas peculiaridades do redobro se devem, possivelmente, à reestruturação gramatical que tem sido observada quanto ao sistema de concordância SUJEITO-VERBO e VERBO-OBJETO e ao ponto na estrutura sintática em que os traços-phi vêm sendo realizados no PB [cf. Duarte, 2003; Naro e Scherre, 2003; Paredes Silva, 2003; Galves, 2001]. Vejam que os dados de redobro de clítico fornecem evidências adicionais a favor da hipótese de que estaria ocorrendo, no português contemporâneo, uma reformulação no sistema pronominal que compreende o seguinte: (i) a ocorrência de pronomes átonos do Caso acusativo para a primeira e segunda pessoas do singular apenas e "a ausência de clíticos para todas as outras pessoas" (Gomes, 2003: 87 e 89); (ii) o uso de a gente em lugar de nós tanto na função de complemento como na de sujeito (Omena, 2003:63); (iii) reinterpretação do pronome te, passando a referir-se à segunda pessoa indireta, gramaticalizada sob a forma você (Galves, 2001:155); (iv) reanálise do pronome lhe como pronome de tratamento correspondente a você (Galves, 2001:139 e 155); (v) cliticização dos pronomes fortes ou perda do estatuto de lexema pleno decorrente da redução na forma de alguns pronomes como eu>ô, você(s)>ocê(s)>cê(s), ele>el, ei, eles>ez, eis (cf. Vitral 1996, 2001, 2002; Ciríaco, Vitral e Reis, 2004; Corrêa, 1998). Outro processo de mudança pelo qual estaria passando o PB, que afetaria de alguma forma nosso objeto de estudo, é sinalizado pela expansão de contextos de preenchimento do sujeito. Este preenchimento, decorrente do enfraquecimento do parâmetro pro drop observado por Galves (2001) fez com que o estatuto morfológico de [AGR] passasse a ser [+FRACO]. Portanto, a realização fonológica do sujeito seria um reflexo da redução do número de flexões verbais: "de seis para quatro e, mais freqüentemente, três oposições" (Duarte, 2003:122) - fato que nos levaria a concordar com a afirmação desta autora (p.117) de que o sujeito pleno no PB é a opção não-marcada. Esta simplificação redundaria em perda de traços de pessoa e número no sistema de flexão do verbo e teria no redobro um mecanismo compensatório cuja finalidade seria, nos termos de Tarallo (1990, apud Roncarati, 2003:144), a preservação do "equilíbrio instável do sistema. 3. O redobro de clíticos no português e no espanhol: semelhanças e diferenças O redobro de pronomes clíticos na língua espanhola é amplamente produtivo, apresentando pequenas diferenças dialetais que serão ilustradas a partir das variantes rioplatense (Argentina e Uruguai), peninsular (Espanha) e portenha (Buenos Aires) apresentadas neste estudo. Segundo Jaeggli (1986:165), o espanhol rio-platense apresenta o redobro de objeto direto pelo clítico acusativo somente se este for [+ANIMADO] e [+ESPECÍFICO]. Além de ter este atributo como condição para o redobro, o objeto direto deve vir obrigatoriamente precedido pela preposição a. A presença da preposição a é que torna o redobro possível. Desse modo, para que ocorra o redobro de pronomes clíticos neste dialeto é necessário a presença de uma preposição realizadora de Caso anteposta ao DP, Estudos Lingüísticos XXXVI(1), janeiro-abril, p. 155 / 161
5 pois, segundo Jaeggli (1986:164), "Es el doblado de clíticos el que depende crucialmente de la presencia de la preposición". Ao contrário do que ocorre no PB, não temos, em espanhol, frases como: (20) *Juan me vio yo. (21) *Juan te vio tú. Ou seja, no PB é possível encontrar pronome tônico de primeira e segunda pessoas em posição de objeto, conforme ilustram as situações sintáticas arroladas abaixo, enquanto que no espanhol esta estrutura é barrada. (22) Você me deixô eu um pouquinho preocupada. [Corpus de BH-MG (Ramos, 2003)] (23) E se os camarada voltar e te matar você também? [Corpus de BH-MG (Ramos, 2003)] No dialeto rio-platense, assim como no espanhol peninsular, são possíveis orações com objetos pronominais (diretos e indiretos) redobrados, precedidos pela preposição a em todas as pessoas, tanto em singular quanto em plural. O redobro de objetos diretos não pronominais, contudo, é uma característica do primeiro dialeto, conforme atesta Everett (1996:49). Assim, os clíticos dativos podem ser redobrados irrestritamente em todos os dialetos do espanhol como nas frases abaixo: (24) Le entregaron el libro a ella. (25) Le regalé la mochila a Juan. No dialeto rio-platense, contudo, é possível redobrar um objeto direto não pronominal animado, conforme o exemplo (26). No PB, por sua vez, não encontramos atualmente estruturas redobradas de objetos não pronominais sejam estes diretos ou indiretos. (26) Lo vi a Juan Ao estudar o espanhol portenho, Suñer (1988:180) cita exemplos de redobro de objetos diretos [-ANIMADOS] com presença e ausência da preposição a, reproduzidos abaixo: (27) Lo vamos a empujar al ómnibus. (28) Yo la tenía prevista esta muerte. Assim como Jaeggli (1986:157), Suñer (1988) também considera que os clíticos são gerados como parte do verbo, o constituinte núcleo do SV. Não obstante, ela considera que os clíticos acusativos e dativos não absorvem traços de Caso, nem recebem papel temático, posto que nunca ocupam uma posição argumental. "Los clíticos del español son manifestaciones de concordancia con el objeto, que deben ajustarse al Principio de Coincidencia" (Suñer, 1988:76). Este princípio é definido pela autora como a necessidade de concordância entre o clítico e o SN e faz com que o redobro de clítico se mostre paralelo aos fenômenos de concordância com o sujeito uma vez que em ambos os casos há uma coindexação única. Apesar de enfatizar que o redobro de objetos inanimados é menos comum que o de objetos animados, para explicar estes exemplos, a autora diz que o objeto direto redobrado deve ter como característica principal a especificidade. Assim, contrariamente à Estudos Lingüísticos XXXVI(1), janeiro-abril, p. 156 / 161
6 proposta de Jaeggli, a presença da preposição a não seria uma condição para o redobro, ela não seria um atribuidor de Caso, mas um marcador de animação ou distinção. O português brasileiro, por sua vez, apresenta uma importante inovação em relação ao espanhol rio-platense e em relação às línguas românicas em geral, uma vez que passa a permitir a duplicação dos traços-phi [PESSOA acusativo ] por meio de um clítico sem exigir que o DP objeto pronominal seja antecedido por qualquer preposição. O mesmo ocorre em situações de objeto indireto, como nos mostram os exemplos do corpus coletado por Alan Jardel de Oliveira (2005): (29) falei na frente da mãe dele eu te dou você duas oportunidade duas sugestão [Corpus Oral de Itaúna-MG (Oliveira, 2005)] (30) mas você faz pra mim que eu te dou você tanto. [Corpus Oral de Itaúna-MG (Oliveira, 2005)] Se compararmos os dados do PB, em (31a) e (31b), por um lado, e do espanhol rioplatense, em (32a) e (32b), por outro, vemos que o PB não permite que a preposição anteceda o DP objeto direto, oposto ao que acontece nos dados do espanhol em que a preposição funcional a é obrigatória. (31) a. Eu vou te i levar você i lá no carro. b. *Eu vou te i levar a você i lá no carro. (32) a. Lo vi a Juan. b. *Lo vi Juan. 4. Proposta Teórica Tendo em vista a reorganização do paradigma do sistema pronominal do PB e a maneira como os traços-phi [PESSOA nominativo e acusativo ] vêm sendo realizados no momento sincrônico, poderíamos conjecturar se (i) o preenchimento obrigatório do sujeito, (ii) o surgimento de pronomes fracos nominativos em posição de sujeito, i.e. Spec-TP, e (iii) a ocorrência de pronomes clíticos fracos acusativos na posição de Spec-AgroP/vP seriam, ao final das contas, reflexos de um mesmo e único epifenômeno, qual seja: todas essas realizações pronominais podem ser vistas como novas maneiras por meio das quais o PB está acionando realizações de traços-phi [PESSOA nominativo e acusativo ] no momento sincrônico. Se antes tínhamos um sistema de [AGR] forte da concordância sujeito-verbo {-o; -s; -Ο; - mos; -is; -m} e paradigma de clíticos acusativos consistente e rico {me, te, o/a/lhe, nos, vos, os/as/lhes}, agora temos, em substituição a este sistema, o surgimento de um novo sistema paradigmático, o qual consiste de: (i) pronomes fracos nominativos {eu/ ô, você(s)/ cê(s)/ cê(s), ele/ el/ ei, eles/ ez/ eis} na posição de Spec-TP, em geral, retomando DPs em posição de tópico/foco, conforme abaixo: (33) Eu... ô num vô com você, não. (34) Você... cê estuda lá no bairro. Estudos Lingüísticos XXXVI(1), janeiro-abril, p. 157 / 161
7 (35) Eles... ez vão ao clube sempre. (ii) pronomes clíticos, especialmente me e te, que retomam DPs na posição de objeto acusativo e dativo. (36) Agora me deixa eu dormir. [Fala espontânea] (37) Menino, eu vou te i bater nocê i. [Fala espontânea] Vejam que todas essas evidências nos levam a pensar que a reduplicação do objeto por meio de pronomes clíticos pode ser vista, então, como sendo simplesmente reflexos de uma mudança mais geral na maneira como o PB realiza traços-phi no momento sincrônico, situação que está em consonância com a hipótese teórica proposta por Galves (2000) e que estamos a adotar aqui, segundo a qual concordância, clíticos e pronomes são matrizes de traços-phi que são gerados como morfemas livres ou presos dependendo da parametrização das categorias funcionais das línguas. Nessa linha de raciocínio, a ocorrência do clítico acusativo adjungido ao verbo pode ser interpretada como sendo um processo de gramaticalização do clítico passando a afixo de concordância objeto-verbo no PB contemporâneo. Ou seja, estes clíticos seriam afixos, realizações de traços-phi [PESSOA - acusativo], reflexo da concordância objeto-verbo. Assim, consideremos as frases abaixo: (38) Eu te i vi [cv] i. (39) Eu te j vi você j. Adotando a proposta de Vitral (2005) para detectar o processo de mudança da condição de clítico para afixo, admitiremos, então, que na frase (38) o pronome te i licencia um pro, estando co-indexado com a categoria vazia e, por ser argumento interno do verbo recebe papel temático e Caso acusativo. Desse modo, proporemos que este elemento [+ARGUMENTAL] é gerado na posição de objeto e, como clítico que é, adjunge-se ao verbo na sintaxe visível. Para a frase (39), postularemos que a presença do clítico te j co-ocorrendo com DP você j reflete a existência de uma operação de concordância [AGREE] que se dá entre o verbo e o objeto você. Segundo esse raciocínio, o aparecimento do clítico será visto como sendo a cópia dos traços-phi {2 a pessoa e singular} do objeto no verbo, o que, por sua vez, permite a transmissão de Caso acusativo ao DP objeto. Assim, o pronome te j de (39) não recebe papel temático, ou seja, é [-ARGUMENTAL], pois é inserido diretamente na posição de adjunção a I por meio da operação JUNTAR. O fato de te j não surgir em I através da operação MOVER evidencia sua natureza de afixo e corrobora a hipótese de que os pronomes redobrados por um XP estariam passando por um processo de afixação. 5. Considerações finais Com base na proposta teórica delineada na seção anterior, consideraremos os clíticos me e te não mais como um DP argumento temático do verbo, mas antes como afixos de concordância, instanciações de traços-phi decorrentes da operação AGREE que se dá entre o objeto e o verbo. Assim sendo, as construções de redobro de clíticos acusativos podem ser entendidas como um dos mecanismos que auxilia a atribuição de Caso estrutural ao DP objeto durante a derivação sintática. Possivelmente, esta é a razão pela qual o PB dispensa a ocorrência da preposição a antes do objeto direto. Essa nossa intuição está em Estudos Lingüísticos XXXVI(1), janeiro-abril, p. 158 / 161
8 consonância com o que prediz Alexiadou e Anagnostopoulou (2001: ), segundo o qual a cliticização é resultado da operação de verificação de traços-phi do verbo por meio de movimento apenas dos traços-phi do DP objeto até o núcleo de vp, sem que toda matriz fonológica do DP acusativo precise mover-se até Spec-vP. 6. Referências ALEXIADOU, A; ANAGNOSTOPOULOU, E. The subject-in-situ generalization and the role of case in driving computations. Linguistic Inquiry, v.32, n.2, spring BISPO, Karla Cristina Iseke; SALLES, Heloisa Maria Moreira Lima. Estudo Comparativo do Dativo no Português Brasileiro e em Línguas Românicas e Germânicas. Universidade de Brasília, Disponível em: ww.unicamp.br/.../um-estudocomparativo-do-dativo pdf. Acesso em: 18 Set CASTILHO, Célia Maria Moraes de. O processo de redobramento sintático no português medieval: formação das perífrases com estar Tese (Doutorado) Instituto da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, CHOMSKY, Noam; LOBATO, Lúcia. Linguagem e mente: pensamentos atuais sobre antigos problemas. Brasília: Ed. UnB, CIRÍACO, L; VITRAL, L; REIS, C. Intensidade e duração de formas reduzidas no Português brasileiro, Revista de Estudos da Linguagem. Belo Horizonte, v.12, n.2, p , jul./ dez CORRÊA, L.T. A forma clítica de pronome pessoal no dialeto mineiro: uma variante sociolingüística Dissertação (Mestrado em Estudos Lingüísticos), Faculdade de Letras da UFMG, Belo Horizonte, CYRINO, S (1993) Observações sobre a mudança diacrônica no PB: objeto nulo e clíticos. In: ROBERTS, I e KATO, M (Orgs). Português Brasileiro: uma viagem diacrônica. Campinas: Ed. Unicamp DUARTE, F. B. Caso, Função sintática e Papéis Temáticos. Belo Horizonte: UFMG, ms, 2006a, no prelo.. (2002) Predicados ergativos. Juiz de Fora: UFJF, ms.. (2005) Derivando estruturas com clítico de posse em Português. Belo Horizonte: UFMG, ms. ; RAMOS, J. Ordem de constituintes, conteúdo de traços-phi e mudança gramatical no PB, Belo Horizonte: UFMG, ms, no prelo, 2006b. DUARTE, Maria E. L. Do pronome nulo ao pronome pleno: a trajetória do sujeito no português do Brasil. In: ROBERTS, I e KATO, M (Orgs). Português Brasileiro: uma viagem diacrônica. Campinas: Ed. Unicamp A evolução na representação do sujeito pronominal em dois tempos. In: PAIVA, Maria da Conceição; DUARTE, Maria Eugênia Lamoglia (Orgs). Mudança Lingüística em Tempo Real. Rio de Janeiro: Contra Capa Livraria, Estudos Lingüísticos XXXVI(1), janeiro-abril, p. 159 / 161
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